RESUMO

O presente artigo analisa o tema da Imprevisibilidade e modificações supervenientes em contratos de EPC Full. Verificou-se que o Tribunal de Contas da União entende pela possibilidade de reequilíbrio do contrato, apesar do fato de, nessa modalidade contratual, haver transferência dos riscos do empreendimento à Contratada. Apesar disso, por força da gestão de riscos, as possibilidades de aditivos em contratos do tipo EPC são tratadas de forma excepcionalíssima, recomendando, inclusive, a Elaboração de orçamentos detalhados, de modo a se evitar falhas na fase pré-contratual com consequências no momento da execução do ajuste. Pretende-se verificar a posição do TCU quanto aos requisitos necessários ao reequilíbrio de contratos de EPC, detalhando-se os riscos e cuidados inerentes a essa modalidade contratual. A análise utiliza-se de pesquisa jurisprudencial para a definição de conceitos e, a partir disso, apresenta uma análise crítica à luz da Doutrina.

1) INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo analisar, de forma crítica, o entendimento firmado pelo Tribunal de Contas da União acerca da onerosidade excessiva em contratos de construção de grandes obras, especificamente aqueles estabelecidos na modalidade Engineering, Procurement and Construction (EPC Full). O tema é de grande relevância porque essa modalidade contratual, aplicada à grandes obras de engenharia, tem como característica a transferência de maiores riscos ao contratado, abrindo, em princípio, menor margem a concessão de aditivos, pois o contratado é que estabelece as soluções que, sendo alteradas, devem também ser por ele assumidos seus eventuais custos. Considerando que esse tipo de contrato é denominado preço global e contempla o fornecimento integral, há casos em que se torna excessivamente oneroso a ponto de inviabilizar a continuidade de grandes obras de infraestrutura. Dessa forma, uma adequada compreensão do tema à luz do entendimento consolidado do TCU tem como objetivo avaliar o risco dessa modalidade de contratação e assegurar o atendimento ao melhor interesse público, que de um lado representa uma melhor eficiência dessa modalidade contratual com a mitigação de riscos para a administração e, de outro, a continuidade dos empreendimentos de grande porte imprescindíveis ao desenvolvimento econômico do país. A pesquisa procura descrever de forma precisa o entendimento do TCU acerca do tema, apontando as possíveis as vantagens e as desvantagens do contrato EPC, os processos de gerenciamento de aquisições, os tipos de contratos e os riscos proporcionados às empresas de engenharia. Para tanto, serão analisados todos os acórdãos proferidos pelo Plenário do TCU acerca dessa modalidade contratual, cuja metodologia de pesquisa será apresentada ao leitor de forma que possa ser replicada ou mesmo refutada. Para a elaboração do presente trabalho, utilizou-se o seguinte critério de pesquisa: (ENGINEERING, PROCUREMENT AND CONSTRUCTION e onerosidade). Ao todo foram identificados 6 (seis) acórdão, os quais foram analisados em sua integralidade, muitos dos quais fazem referência a empreendimentos de grande porte, como a construção de plataformas para exploração de petróleo em alto mar e a instalação de parques eólicos. É certo que o critério de pesquisa poderia ser estendido com o parâmetro “epc full”, alcançando um total de 13 (treze) acórdãos, contudo, para efeito metodológico, optou-se pelo critério no qual a expressão “onerosidade” fosse mencionada expressamente, de forma a aproximar a pesquisa do seu objeto de estudo. Apesar disso, com o objetivo de se aprofundar na análise dos julgados, foram também analisados os julgados apontados como relevantes para a compreensão da matéria. Com efeito, ao longo do trabalho, foram analisados os seguintes julgados: Acórdão 571/2013 – plenário; Acórdão 300/2013 – plenário; Acórdão 3282/2011 – plenário; Acórdão 1742/2011 – plenário; Acórdão 773/2012 – plenário; Acórdão 2060/2012 – plenário; Acórdão 2894/2012 – plenário; Acórdão 2876/2014 – plenário; Acórdão 3426/2014 – plenário; Acórdão 3493/2014 – plenário; Acórdão 2383/2016 – plenário; Acórdão 2839/2016 – plenário; Acórdão 3096/2016 – plenário; Acórdão 225/2017 – plenário; Acórdão 1183/2018 – plenário; Acórdão 2196/2018 – plenário. Dessa forma, o trabalho poderá ser ampliado, incorporando outras opções e critérios de pesquisa, de forma que reflita, de maneira fidedigna, o entendimento do TCU acerca do tema “Contratos de EPC”

2) CONTRATO EPC - MODALIDADE E CARACTERÍSTICAS DE GESTÃO

Inicialmente, como forma de introduzir os assuntos que serão abordados no decorrer do presente trabalho, cuidamos de fazer uma breve exposição conceitual no que tange às características de contratos firmados na modalidade EPC. Isso porque, essas ferramentas serão imprescindíveis para se estabelecer um claro entendimento da posição adotada pelo Tribunal de Contas da União quando a essa modalidade contratual. O fluxo cada vez maior de investimento privado nas grandes obras de engenharia ocorrido nas últimas décadas, em especial no segmento de infraestrutura, trouxe consigo a necessidade de um gerenciamento mais eficiente na construção desses empreendimentos, impulsionando a busca por novas formas de contratação, que minimizassem custos, reduzissem prazos, fornecessem garantias aos investidores e trouxessem vantagens, de um modo geral, tanto para a Contratante quanto para a Contratada. 6 Nesse ambiente, dentre as várias modalidades de contratos de construção, tem ganho destaque os temas relativos a alocação de riscos, a forma de remuneração e a aplicação de penalidades, que impactam diretamente na forma, conteúdo e valor do orçamento a ser apresentado. A modalidade EPC (Engineering, Procurement and Construction), do tipo Turnkey Lump Sum (contrato de empreitada global com preço e prazo determinados), veio suprir a necessidade desse novo modelo gerencial, que se caracteriza por abarcar a totalidade da cadeia do processo construtivo. Esse modelo contratual ganhou destaque, em meados dos anos 1990, com a estabilização da economia brasileira, quando passou-se a adotar, como forma de captação de recursos para grandes obras de infraestrutura, o sistema de financiamento de projetos (project finance). 7 Nesse formato contratual, o fornecimento integral do projeto básico e executivo, a provisão de todos materiais, os equipamentos e serviços da construção, a montagem, os testes e a colocação em operação são efetuados por uma única parte - a Contratada - e isso tudo a um preço fixo e previamente estabelecido, com prazos predefinidos. Assim, na data previamente prevista, a obra deve ser entregue com qualidade e em condições de garantir a performance fixada nos projetos, atendendo todas as normas e regulamentos legais. Seguindo essa linha, na modalidade EPC, a Contratada se obriga a garantir a plena performance final do empreendimento, já que lhe compete exclusivamente a responsabilidade pela concepção e desenvolvimento dos projetos, devendo levar ao resultado almejado pelo Empreendedor, a quem cabe fornecer as diretrizes necessárias e o estudo de viabilidade do negócio. [...]