Este conto é para as crianças maiores, serve para discutir política de forma inicial. 

 

Onde moram os animais? 

 

Tempos atrás, meu avô resolveu ir caçar... 

Minha avó para perturbá-lo perguntou: 

Onde moram os animais? 

Ele sabiamente, evitando a discussão disse: 

Quando retornar lhe conto. 

Juntou os apetrechos, armas e comida, foi-se mata adentro em busca de uma caçada das boas... 

Depois de muito andar por entre mato, serras e morros, encontrou uma cachoeira logo acima de uma lagoa...  

Olha só estas pegadas, é aqui que a onça bebe água, decerto também vem outros, é este o local da caçada... Vou armar minha rede e também as armadilhas e ficar na espreita, só esperando a finda... 

Para o velho caçador, atirar de longe não servia... 

Dá um tiro e o bicho cai, que graça tem esta vida? 

Pegar vivo, olhar nos olhos, sangrá-lo até a morte... 

Para que o bicho saiba, durante a sangra, quem foi que o caçou... 

E nesta filosofia do olhar, o velho caçador ficava, pra lá de vinte dias nas matas, só de butuca na caça... 

Gostava de caçar com lança, montar armadilha de queda, de laço, de tropeço, subida de rede, entre tantas que sabia, preferia as primitivas, era diversão garantida.  

A zagaia só usava na finda, sangrando o bicho com gosto, bem na tala do pescoço, que é pra não morrer gritando... 

Sua rede ficava no alto, e com luneta espiava, o andar cabreiro do bicho, na mata o velho esperava... 

Tinha dez metros de corda, para descer ligeiro ao chão, onde sangraria o bicho com a velha lança na mão...  

Caçador matreiro não se apressa, espera tranquilo a presa, mascando fumo de rolo, comendo farinha e carne seca... 

Aos poucos aboiando, no meio daquela lagoa, a lua enclarece o sertão e o pensamento voa... 

Pensa que não o zunido, som de mato rachando, os bichos vão enchendo a lagoa com os seus ruídos. Caçador observa, calado, olhos grudados no tempo, o momento certo que o bicho, encontrará seu momento... 

 

Mas a vida acontece, mesmo quando nada é certo, e caçador como pode, saber a hora do bote?  

Quando preparava o bote, zagaia na mão e revólver, eis que surge pra toda sorte, o rugido de uma onça... Bicharada logo esparrama, e caçador só lembrança... 

Mas, pensa que acabou a caça? Caçador é bicho matreiro, sabe esperar o momento, pra acertar bem de jeito... 

E não é que a onça, já cheia da caça comida, vem à beira da lagoa, beber uma água fresquinha. 

Zap! Desce ligeiro o matreiro, agora te peguei bicho feio, estava me espantando a caça, pois não é tua desgraça, eu te caçar por primeiro! 

Mas na vida nada é certo, e caçador se espanta, quando ela lhe suplica: 

Não mate está pobre onça! 

Espantado por ouvir, a onça falando contigo, pensa não ter compreendido: 

O que é que tu disse onça?  

Não me mate ó caçador, tenho filhos, mulher e lembranças... 

Estupefato, o caçador se senta, pensa, pensa, pensa... 

E diz: 

Ô onça, tu que é bicho perigoso, decerto conhece outros, como tu bem carniceiro... 

Vou lhe propor um acordo, já que tu és bem sabida, decerto conhece Brasília e aquela corja mesquinha, que usa gravata fina, caneta e discurso sabido. Porque não me dá ouvido e vai lá com sua turma, comer tudo o que for vivo, lá dentro das duas casas... 

O povo, nesta desgraça, é certo vai dar risada, quando ouvir os lamentos e pedido de ajuda. Não que sejam mal os ouvintes, é que todos sabem há tempos, de onde vêm suas agruras... 

Está certo aceito, nosso acordo será cumprido, Deus que tampe os ouvidos, pois o desespero será grande...  

Passado algum tempo, depois de ter soltado o bicho, o velho caçador encardido, sai de fininho da mata... 

O caçador então parte, para a capital Brasília, só pra ver se lá vinga, da onça cumprir o acordo. E não é que o bicho tinhoso, veio com outros famintos...  

Eitâ mundo veio perdido, agora a coisa tá feia, quero ver a bicharada se fartando do inimigo! 

E a coisa tava feia mesmo, era gritaiada de montão, socorro ajuda a gente, nóis não somos todos ladrão... 

A polícia foi chamada, mas sem pressa, disse que faltava combustível e só era possível atender depois do almoço, decerto na boca da noite, quando finda a gritaria. 

Chama então o socorro, a ambulância tá quebrada!  

As forças armadas... Não temos permissão pra invadir o recinto, é certo que somente agimos em caso de soberania, se fosse na fronteira invadia, mas no congresso, bom dia! 

E foi assim a manhã toda, cada força dando uma desculpa, à tarde os gritos diminuía e a noitinha, nada se ouvia...  

O mundo inteiro estarrecido, o Brasil feliz da vida! 

Mas será que lá existia, ainda algum infeliz com vida?  

Pra encurtar a conversa, a lei fala a imprensa: 

Devagar também é pressa, para que correr risco á toa?  

Quem suportou este dia, decerto não morre esta noite,  

A gente vigia aqui fora e entra no dia seguinte...  

Mas a vida acontece, mesmo quando nada é certo! No outro dia bem cedo, junta polícia e imprensa, ao vivo estão transmitindo, direto lá no congresso... 

E o povo estupefato, vê a onça e seus amigos, agora usando gravata e se aliando ao inimigo. 

Meu avô cabisbaixo disse, é não tem mesmo jeito! 

Quando modifica a situação, eles logo arranjam um meio... 

 Se pudesse caçava tudo, mas não dá vou-me embora... 

...Chegando a casa de noite, cansado de tanta caçada, 

A mulher intrigada pergunta: Onde moram os animais? 

Calmo e serenamente, o velho para e explica: 

Mulher, a partir de hoje, não caço mais bicho no mato, 

 Descobri junto com o mundo, o que os brasileiros já sabiam, 

Onde moram os animais?  

No congresso lá em Brasília! 

 

 

 

Indajaia Carlos Pires (1) Graduado em História; Professor na Rede Particular de Ensino na cidade de Campo Grande.

Adriana Peres De Barros (2) Graduada em Pedagogia; Especialista em Educação Infantil e Alfabetização e Assistente de Desenvolvimento Educacional na Rede Municipal de Ensino Público na cidade de Rondonópolis.

Jane Gomes de Castro (3) Graduada em Pedagogia e Ciências Biológicas; Especialista em Ecoturismo e Educação Ambiental e professora na Rede Municipal de Ensino Público na cidade de Rondonópolis.