UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR DOM BOSCO

CURSO DE DIREITO 

ALESSANDRA DE JESUS DINIZ LEMOS

MEIRISLEI GAMA PAIVA 

ONDE ESTÁ A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE?

Um estudo processual das causas de extinção da punibilidade como base para uma análise

crítica de sua aplicação em crimes da ordem econômica. 

SÃO LUÍS

2013

ALESSANDRA DE JESUS DINIZ LEMOS

MEIRISLEI GAMA PAIVA

ONDE ESTÁ A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE?

Um estudo processual das causas de extinção da punibilidade como base para uma análise

crítica de sua publicação em crimes da ordem econômica. 

Artigo cientifico apresentado à disciplina Processo Penal I, do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, como requisito à obtenção de nota na segunda avaliação.

Profa. Me. Thayara Silva Castelo Branco

SÃO LUÍS

2013

’’Só com serenidade e estrito respeito às regras do devido processo penal é que poderemos, ao mesmo tempo, reduzir as chances de que um inocente seja condenado ou de que o culpado fique solto’’.

                                          Aury Lopes Júnior  

RESUMO 

Sob a luz do Direito Penal e Processual Penal, este artigo apresenta um estudo sobre as causas

de extinção de punibilidade arroladas no Art. 107 do Código Penal, destacando-se aspectos

relevantes como procedimento, legitimidade e efeitos. Ademais, promovo-se uma análise

crítica de sua aplicação nos crimes de ordem econômica.

Palavras-chave: Extinção da punibilidade. Causas. Procedimento.

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1 INTRODUÇÃO

 

              Tema atinente tanto ao Direito Penal como ao Direito Processual, a extinção de punibilidade é reflexo da perda, ou para muitos, da renúncia pelo Estado do seu direito de punir. Tal medida decorre, na sua maioria, de razões supervenientes de políticas criminais que não excluem o crime, mas tão somente a punibilidade a ele associada, decorrente do devido processo legal.

Nesta seara vale ressaltar que a extinção de punibilidade não se restringe aos crimes tipicamente penais, podendo ser aplicada em outras situações que não aquelas contidas no rol exemplificativo ao art. 107 do Código Penal, como é o caso dos eleitos fiscais que abalam a ordem econômica.

No escopo dos crimes fiscais, a extinção de punibilidade tem sido associada ao momento de pagamento da dívida ­­­- antes ou depois do trânsito em julgado da sentença - matéria controvertida, sobretudo pelas constantes mudanças nas leis que regem a matéria.

Dentro deste contexto de interdisciplinaridade, o presente artigo tem como objetivo preliminar fazer um estudo das causas extintivas de punibilidade arroladas no CP e dos procedimentos utilizados para sua aplicação conforme o CPP, que servirá de suporte para uma breve análise crítica acerca dos aspectos que envolvem o momento de pagamento do débito tributário como fator de extinção de punibilidade nos crimes contra a ordem tributária.

Assim, para a composição do trabalho proposto, faz-se uso de pesquisa teórica e jurisprudencial, por intermédio da qual se abordam aspectos inerentes à extinção da punibilidade sob a visão de renomados doutrinadores da área penal e processual penal.

2 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE: CONSIDERAÇÕES GERAIS E CAUSAS

2.1 Considerações gerais

O direito Penal e o Direito Processual Penal preveem casos de extinção da punibilidade, os quais devem ser reconhecidos no momento em que se apresentarem, seja na fase pré-processual, durante o processo ou após a sentença condenatória definitiva. Uma vez constatada a situação que dá causa à extinção da punibilidade, prevista em lei, deve o juiz declarar de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do querelante, do querelado ou do

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réu a extinção da pretensão punitiva ou da pretensão executória. De modo que se ocorrer antes da propositura da ação, esta não poderá mais ser proposta, se durante o processo, a relação processual será trancada, e se após a prolação da sentença definitiva, ela não poderá ser executada (TOURINHO FILHO, 2006, p. 554).

De fato, o art. 61 do Código de Processo Penal - CPP determina que:

Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício.

Parágrafo Único. Caso de requerimento do Ministério Público, do querelante do réu, o juiz mandará autuá-lo em apartado, ouvirá a parte contrária e, se o julgar conveniente concederá o prazo de 5 (cinco) dias para a prova, proferindo a decisão dentro de 5 (cinco) dias ou reservando-se para a matéria na sentença final.

 

A extinção da punibilidade é entendida como renúncia ou abdicação do direito de punir do Estado, ou seja, o Estado deixa de exercer o jus puniende; e, nos casos em que já houver prolatada a sentença condenatória definitiva, extingue-se o jus punitionis, circunstância na qual se desaparece o título penal executório. Essa extinção se dá em face de certas contingências ou motivos de conveniência ou oportunidade que fazem desaparecer os próprios fundamentos da punibilidade, como por exemplo, nos casos de morte do agente de determinado crime, pois, não se teria a necessidade e a utilidade da punição do morto, uma vez que esta não tem como fundamento a vingança, mas, sim, a defesa social no propósito de regeneração do criminoso (TOURINHO FILHO, 2006, p.554).

Dentro as causas que promovem extinção da punibilidade, encontram-se elencadas no art. 107 do Código Penal - CP, a saber: morte do agente, anistia, graça ou indulto, retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso, prescrição, decadência, perempção, renúncia do direito de queixa e perdão aceito (nos crimes de ação privada), retração do agente (nos casos em que a lei admite) e perdão judicial (nos casos previstos em lei).

É importante salientar que o rol contido no artigo supracitado não é taxativo, mas exemplificativo, visto que tanto na legislação penal codificada quantos em leis penais esparsas são verificados outros casos de extinção, como por exemplo, a absolvição do estrangeiro ou o cumprimento da pena aliunde, previstos no art. 7°, § 2°, d, do CP (TOURINHO FILHO, 2006, p. 555), bem como na previsão do art. 34 da Lei 9.249/95 da extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária quando o pagamento do débito ocorrer antes do recebimento da denúncia, artigo este inúmeras vezes debatido pelo Tribunal Superior (OLIVEIRA, 2009, p.74).

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Quanto aos efeitos da declaração extintiva da punibilidade, às vezes há o desaparecimento de todas as conseqüências penais como ocorre na anistia, em outros casos, extingue-se somente a pena como verificado na graça e indulto; ou o jus puniende (TOURINHO FILHO, 2006, p. 554). É importante mencionar que o crime não deixa de existir, tanto que o ofendido pode lançar mão da sentença penal condenatória, com trânsito em julgado, como título executório civil para o ressarcimento do dano, conforme autoriza o art. 63 do CPP.

2.2 Morte do agente

A extinção da punibilidade, nos casos de morte do agente, tem sua previsão legal no art. 107, I do CP e no art. 62 do CPP. Essa causa extintiva tem como base o princípio de que "a morte tudo resolve" (mors omnia solvit), ou seja, a morte apaga tudo, faz desaparecer tudo, exceto a pretensão de ressarcimento do dano, na esfera cível, previsto no artigo 63 do CPP, desde de que observado o princípio da pessoalidade da pena, em que a mesma não pode ser transmitida aos herdeiros, sendo que eles irão arcar com os prejuízos até os limites da herança.

Para que haja a declaração de extinção da punibilidade é necessária a apresentação da certidão de óbito como preceitua o art. 62 do CPP "no caso de morte do acusado, o juiz somente à vista da certidão de óbito, e depois de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade."

Há na doutrina discussão quanto à possibilidade de extinção da punibilidade pela simples consideração de um juiz, na esfera cível, da morte presumida a exemplo de Nélson Hungria. No entanto, Guilherme de Souza Nucci considera haver essa possibilidade nos casos de morte trágica ocorrida em acidentes, cujo procedimento de reconhecimento de sua existência, na Vara dos Registros Públicos, permite a expedição da certidão de óbito. Assim como nos casos previstos na Lei 10.406/2002, em seu art. 7°, de morte presumida, sem decretação de ausência, se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até 2 (dois) anos após o término de guerra. Pois, nesses casos, somente  se considerará a morte presumida após esgotadas todas as formas de averiguação e buscas, devendo a sentença fixar a data do provável falecimento (NUCCI, 2007, p. 209).

Motivo de acirrada discutição doutrinária, é, também, a declaração da extinção da punibilidade mediante apresentação de certidão de óbito falsa. A maioria da doutrina entende ser

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impossível a reabertura do casos, nada mais podendo ser feito a não ser processar quem falsificou e utilizou o documento. Os fundamentos para não reabertura do caso estão relacionados com a impossibilidade de revisão criminal em favor da sociedade, conduta vedada em processo penal, bem como a ofensa à coisa julgada. Sobre a questão se pronuncia Carlos Frederico Coelho Nogueira, citado por Guilherme de Souza Nucci (2007, p.2010), afirmando que:

Assim sendo, se, depois de transitar em julgado a sentença que declarou extinta a punibilidade pela morte do acusado, se descobrir estar ele vivo, não será possível rescindir a res judicata com  o prosseguimento do efeito extintivo e não será por igual o possível o oferecimento de nova denúncia ou de nova queixa contra o mesmo sujeito pelo mesmo fato delituoso. Se vier a ser instaurado novo processo será absolutamente nulo, por ofensa à coisa julgada.(...) Quando muito, o acusado e- conforme o caso- seu defensor poderão ser processados pelo crime de uso de documento falso (art.304 do Código Penal) e nada mais.

Apesar de ser esse o entendimento da maioria doutrinária, o STJ discorda e prevê a possibilidade de revogabilidade da decisão de extinção da punibilidade proferida com base em certidão falsa como se depreende do seguinte julgado:

EXTINÇÃO. PUNIBILIDADE. CERTIDÃO FALSA. ÓBTO. A Turma, entre outras questões, entendeu que pode ser revogada a decisão que, com base em certidão de óbito falsa, julga extinta a punibilidade do ora paciente, uma vez que não gera imutável uma decisão lastreada em uma falsidade. O agente não pode ser beneficiado por sua própria torpeza. Precedente citado no STF; HC 84.525-8-MG, DJ 3/12/2004. HC 143.474-SP, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 6/5/2010. (grifou-se)

Por sua vez o STF já decidiu não fazer coisa julgada a sentença que reconhece extinta a punibilidade à vista de atestado de óbito baseado em registro comprovadamente falso (cf. RTJ, 93/986/1063).

 

2.3 Anistia, graça e indulto: características e diferenças

São causas de extinção da punibilidade previstas no CF/88, respectivamente nos artigos 48, VIII e 84, XII bem como, no CP em seu art. 107, II e no Capítulo I do Título IV do CPP em seus artigos 734 e 742.

        

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Anistiar é apagar da lembrança, esquecer-se  do que ocorreu. É ato que ocorre mediante lei, portanto, somente poderá ser concedida pelo Congresso Nacional. É o jus gratiandi do Poder Legislativo (TOURINHO FILHO, 2006, p. 564).

A anistia refere-se aos crimes de natureza política (anistia especial), entretanto, nada impede que possa ser estendida a crimes comuns (anistia comum) (BONFIM, 2009, p. 157), contudo a CF/88, art. 5°, XLIII estabelece que não poderão ser anistiados a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecente e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, além de serem também considerados inafiançáveis e insuscetíveis de graça.

Quanto ao momento de concessão da anistia, pode ser antes - anistia própria -, ou depois da condenação - anistia imprópria (BONFIM, 2009, p. 157). Se os réus estiverem cumprindo pena, serão postos em liberdade e, se forem primários, continuarão primários. Nesse sentido preceitua o art. 742 do CPP:

Concedida a anistia após transitar em julgado a sentença condenatória, o juiz de ofício ou a requerimento do interessado, do Ministério Público ou por iniciativa do Conselho Penitenciário, declarará extinta a pena.

Assim, os fatos delituosos são cobertos pelo véu do esquecimento, salvo no que respeita aos danos. Embora seja que a lei anistiaste se estenda a todos os implicados (anistia geral), nada impede, que algumas pessoas possam ser excluídas (anistia parcial) desde que devidamente expressa; do contrário, estender-se á a todos que participaram do crime e produzirá seus efeitos, mesmo contra a vontade do beneficiado, exceto nos casos de anistia condicional. Uma vez concedida é irrevogável (TOURINHO FILHO, 2006, p.568).

No que diz respeito á graça a ao indulto, são também medidas de clemência em que, agora, atribui-se ao Presidente da República o poder de concedê-los, mediante decreto, embora tal poder possa ser delegado aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, conforme preceitua o parágrafo único do art.84 da CF.

Diferentemente da anistia, o indulto e a graça pressupõem sentença condenatória com trânsito em julgado, embora haja casos em que o indulto fora concedido antes da sentença transitar em julgado. Outras diferenças básicas dizem respeito aos seus efeitos uma vez que atingem somente os efeitos executórios penais da condenação; e, ainda, quanto às suas destinações a crimes comuns (TOURINHO FILHO, 2006, p.571).

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A despeito da semelhança que há entre graça e indulto eles se diferenciam na medida em que é individual, e o indulto é coletivo, além de ser o indulto espontâneo, enquanto a graça deve ser solicitada pelo condenado, Ministério Público, Conselho Penitenciário ou autoridade administrativa. Na verdade, a Lei de Execução Penal em seus art. 188 e 193, não faz uso da expressão "graça" substituindo-a por ''indulto individual'', enquanto que o indulto propriamente dito é chamado de ''indulto coletivo'' (NUCCI, 2007, p. 987).

2.4 Abolitio criminis

 

Abolitio Criminis, que tem previsão legal no art. 107, III do CP considera licita determinada conduta que outrora era incriminada, ou seja, há a exclusão do tipo penal incriminador com todas suas conseqüências. De sorte que anula toda e qualquer possibilidade de comprimento de pena ou mesmo de propositura de ação com base no fato que deixou de ser crime. Assim, o condenado que porventura esteja cumprindo pena será posto em liberdade e voltará a sua condição de origem, se, por exemplo, ele era réu primário, com a abolitio criminis, permanecerá com a primariedade conforme previsto no art. 2º do CP, "ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória".

2.5 Renúncia

Renunciar consiste na manifestação de vontade do ofendido, por meio da qual ele desiste de exercer seu direito da ação ensejando, dessa forma, a extinção da punibilidade. Admite-se nas ações privadas, uma vez que o titular da ação é próprio ofendido ou seu representante lega. Ninguém pode renunciar direito que não seja seu. Essa renúncia pode ser expressa ou tácita quando, no primeiro caso, verifica-se apresentação de documentos confirmando a vontade em renunciar, conforme art.50 do CPP, ou quando, no segundo, no segundo caso, haja postura contrária ao desejo de processar alguém, admitindo-se todos os meios de prova em contrário, segundo art. 57, CPP. É importante salientar que, por força, do art. 49 do

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CPP, se houver mais de um ofensor, a renúncia se estenderá a todos. Não é possível renunciar em favor de um e propor ação em face dos demais, devido ao principio da indivisibilidade da ação penal privada (BONFIM, 2009, p. 142) Nesse sentido, reforça a manifestação do STF:

AÇÃO PENAL PRIVADA - CRIMES CONTRA HONRA - VEICULAÇÃO DAS ALEGADAS OFENSAS MORAIS MEDIANTE DOCUMENTO ASSINADO POR 10 (DEZENOVE) PESSOAS - OFERECIMENTO DE QUEIXA-CRIME, NO ENTANDO, SOMENTE CONTA 02 (DOIS) DOS SIGNITÁRIOS  -  VIOLÃO DO PRINCÍPIO DA INVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PRIVADA  -  CONSEQÜENTE RENÚNCIA TÁCITA AO DIREITO DE QUERELA - EXTINÇÃO DA PUNIBIBILIDADE. - Tratando-se de ação penal privada, o oferecimento de queixa-crime somente contra um ou alguns dos supostos autores ou partícipes da prática delituosa, com exclusão dos demais envolvidos, configura clara hipótese de violação ao princípio da indivisibilidade (CPP, art. 48), implicando, por isso mesmo, renúncia tácita ao direito de querela (CPP, art. 49), cuja eficácia extintiva da punibilidade estende-se a todos alegadamente hajam intervindo no cometimento da infração penal (CP, art. 107, V, c/c o art. 104). Doutrina. Precedentes. (Inq 2139 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 13/09/2006, Dje-047 DIVULG 28-06-2007 PUBLIC 29-06-2007 DJ 29-06-2007 PP-00029 EMENT VOL-02282-01 PP-00118 RTJ VOL-00202-03 PPP-000956).

Segundo Tourinho Filho, quando, no momento do oferecimento da queixa, houver a exclusão de um ou mais ofensores, isso não implicaria necessariamente em renúncia tácita, visto que tal omissão pode ser suprida pelo Ministério Público (por força do art. 48 do CPP) em que ele aditaria a queixa incluindo os demais. Assim é, também, o entendimento de Mário de Moura Albuquerque, citado por Tourinho Filho: "se o Ministério Público pode e deve fazer isso (quando convencido, é claro, da existência de mais de um autor do crime), conseqüentemente a omissão na queixa do nome de um dos autores do crime não importa renúncia tácita" (TOURINHO FILHO, 2006, p. 602).

A despeito do entendimento acima mencionado, a doutrina não é pacífica quanto à possibilidade do Ministério Público aditar a queixa nas ações privadas fazendo surgir três posicionamentos sobre esta questão: para alguns, a exemplo de Tourinho Filho e Mário de Moura Albuquerque, o Ministério Público cumprindo ex officio seu dever de agir como fiscal da lei, deverá aditar a peça acusatória, incluindo, dessa forma, os agente omitidos; para outros, o aditamento da queixa representaria usurpação ao direito de ação, que, no caso específico da ação penal privada, cabe exclusivamente ao particular; que se omitir alguém por força do artigo 49 do CPP implicaria em renúncia estendida a todos; por sua vez, a terceira corrente posiciona-se entre as duas anteriores em que o Ministério não adiantaria sem que houvesse a manifestação do querelante em relação a

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isso, portanto abrir-se-ia a oportunidade de manifestação do querelante quanto ao aditamento, se for contrário ao mesmo, consubstanciar-se-ia em renúncia ao direito de queixa, nos termos do art. 49 do CPP (BONFIM, 2009, p.140).

Nos casos de ação penal privada subsidiária da pública, a renúncia de queixa do ofendido não implica em impedimento para a propositura da ação, pois o Ministério Público sendo o titular da ação pode oferecer a denúncia, iniciando a ação penal pública. Convém mencionar que a incidência da renúncia só pode ocorrer antes da propositura da ação, ou seja, uma vez iniciada ação penal, já não há que falar em renúncia, pois esta diz respeito ao ato de abdicar do direito de queixa. A desistência da ação em curso poderá ensejar a extinção da punibilidade por outras causas como, por exemplo, perempção e perdão do ofendido, que serão abordados mais adiante. Vale pontuar que o art. 31, do CPP traz a hipótese na qual, diante da ausência ou morte do ofendido, poderão oferecer a queixa seu cônjuge, ascendente, descendente, ou irmão; e a renúncia de um deles não implica na renúncia dos demais.

2.6 Perdão do ofendido

 

O Art. 105 do CP faz a seguinte declaração: "O perdão do ofendido, nos crimes em que somente se procede mediante queixa, obsta ao prosseguimento da ação".

Sabe-se que a ação privada é regida pelos princípios da oportunidade, indivisibilidade e disponibilidade. Portanto, o ofendido propõe a ação penal, se quiser; e depois de proposta pode desistir mediante perdão, constituindo outra modalidade de extinção da punibilidade. Entretanto, diferentemente da renúncia, o perdão pressupõe aceitação do querelado sendo, dessa forma, ato bilateral de vontade. Esse ato somente pode ser exercido dentro da ação penal que exclusivamente priva, ou seja, não comporta perdão do ofendido a ação privada subsidiária da pública para efeito de extinção da punibilidade (TOURINHO FILHO, 2006, p. 605).

Necessária se faz a distinção entre esta modalidade extintiva de punibilidade e o perdão judicial. O perdão judicial não é exclusivo da ação privada, mas pode ser concedido em qualquer ação, desde que autorizada por lei. O momento em que as duas formas de perdão são evidenciadas, também, é diferente, pois o perdão do ofendido se dá no curso da ação, enquanto que o outro, somente após a decisão condenatória; somente o juiz pode concedê-lo e independe da vontade do condenado (TOURINHO FILHO, 2006, p.605)

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Convém mencionar, que a aceitação do perdão pode se dar dentro do processo ou fora dele (extraprocessual); e ainda, pode ser de forma expressa ou tácita. No caso da aceitação processual expressa, o querelado, dentro do processo, manifesta a vontade de aceitar o perdão que lhe foi concedido. A aceitação tácita ocorre quanto o querelado não der nenhuma resposta dentro do prazo de 3 dias após notificação, quanto à concessão do perdão pelo ofendido, e depois de cientificado de que seu silêncio importará em aceitação (art. 58 do CPP). Quanto à aceitação extra processual, ela se dará fora dos autos, e da mesma forma de anterior, pode ser expressa ou tácita. O art. 59 do CPP dispõe da seguinte redação: "A aceitação do perdão fora do processo constará de declaração assinada pelo querelado, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais". A aceitação tácita deverá ser percebida a partir da análise de atos praticados por ambos (querelante e querelado) que revelem o desejo de perdão e aceitação.

2.7 Perdão judicial

 

O perdão judicial, mais uma das causas extintivas da punibilidade (art. 107, IX, CP, art. 51, CPP), deve estar expressamente previsto em lei. Em é exercido pelo juiz, quando este deixa de aplicar a pena, nos casos em que as conseqüências da infração penal atingem o próprio agente de forma tão grave que a sanção se torna desnecessária, como por exemplo, alguém que comete um acidente de carro em que p condutor teve suas duas pernas amputadas em razão do acidente; ou no caso do pai que dirige o carro de forma imprudente e provoca a morte do seu próprio filho (BONFIM, 2009, p. 158).

Há divergências doutrinárias quanto à natureza da sentença concessiva do perdão judicial. As três principais correntes defendem os seguintes posicionamentos, Segundo Bonfim (2009, p. 159):

1ª ) Natureza absolutória. Defende-se em resumo, que não é possível a condenação sem imposição de pena. Ao conceder o perdão judicial, absolve-se o réu.

2ª) Natureza condenatória. Só é possível perdoar quem é culpado. Por isso, condena-se o agente excluindo-o da sanção penal por merecer a aplicação do instituto. Para essa corrente, os efeitos secundários da condenação persistem (lançamento do nome do réu no rol dos culpados, responsabilidade pelas custas). Com relação à reincidência, o art. 120 do CP exclui expressamente seus efeitos.

3ª)Natureza declaratória da extinção da punibilidade. O perdão judicial está no rol do art. 107 do CP. A sentença tem a natureza do instituto, declara a extinção da punibilidade, a renúncia do Estado do direito de punir. Nesse sentido é a Súmula 18 do STJ: "A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não substituindo qualquer efeito condenatório".

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O posicionamento do STJ, quanto aos efeitos extensivos do perdão judicial a todos os crimes cometidos no mesmo ato, tem sua reafirmação a partir do seguinte julgado:

PROCESSO PENAL.   ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. PERDÃO JUDICIAL.   MORTE DO IRMÃO E AMIGO DO RÉU  -  CONCESSÃO  -  BENEFÍCIO QUE APROVEITA A TODOS. Sendo o perdão judicial uma das causas de extinção de punibilidade (art. 107, inciso IX, do CP), se analisado conjuntamente com o art. 51, do Código de Processo Penal ("o perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos..."), deduz-se que o benefício deve ser aplicado a todos os efeitos causados por uma única ação delitiva. O que é reforçado pela interpretação do art. 70, do Código Penal Brasileiro, ao tratar do concurso formal, que determina a unificação das penas, quando o agente, mediante uma única ação, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não. Considerando-se, ainda, que o instituto do Perdão Judicial é admitido toda vez que as conseqüências do fato afetem o respectivo autor, de forma tão grave que a aplicação da pena não teria sentido, injustificável se torna sua cisão. Precedentes. Ordem concedida para que seja estendido o perdão judicial em relação à vítima do Rodrigo Antônio de Medeiros, amigo do paciente, declarando-se extinta a punibilidade nos termos do art. 107, IX, do CP. (HABEAS CORPUS N.° 21.442/SP Rel.: Min. Jorge Scartezzini/5.ª Turma/STJ/DJU de 9/12/02. pág. 361).

 

2.8 Retratação

Retratar-se é desdizer o que se disse, é deixar o dito como não dito, equivale a um arrependimento eficaz (TOURINHO FILHO, 2006, p.620). Em casos determinados pela lei, a retratação funciona como causa extintiva da punibilidade. Assim, os casos previstos são os do art. 143 do CP que trata dos crimes contra a honra, excetuando a injúria; art. 26 da Lei n. 5.250/67,  nos crimes contra a honra cometidos através da imprensa (jornal, revista etc.). Aqui a injúria está incluída; e nos casos do art. 342, parágrafo 3°, do CP caso em que o agente (testemunha, perito, intérprete ou tradutor) retrata-se do falso testemunho ou falsa perícia ou declara a verdade (BONFIM, 2009, p. 160).

Nas hipóteses do art. 342, parágrafo 3°, do CP, a retratação, mediante a declaração da verdade, deve ser completa e ocorrer antes da publicação da sentença no processo em que ocorreu a falsidade. Ao contrário do que ocorre nos crimes contra a honra, nesse caso, a retratação comunica-se aos demais participantes (BITENCOURT, 2008, p. 724).

2.9 Decadência e perempção

As relações jurídicas encontram-se sujeitas a uma série de acontecimentos naturais ordinários, dentre os quais o tempo merece destaque. Este, aliás, sob a forma de três institutos jurídicos previstos no art. 107, inciso IV, do CP - prescrição, decadência e perempção - apresenta-se de grande relevância no direito processual e penal, especialmente quando se adentra

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no tema da punibilidade. Dentro desse cenário, a decadência reflete a perda do direito de ação do ofendido em face do decurso do tempo. Nesse sentido, acrescenta Damásio de Jesus (2007, p. 325) que "atingindo em primeiro lugar o direito de ação, por via oblíqua incide sobre o jus puniende do Estado", motivo pelo qual afigura como uma das causas de extinção de punibilidade.

Inerente às ações penais de iniciativa privada e às privadas subsidiárias da pública, porque relacionada ao direito de queixa e de representação, a decadência - fatal e improrrogável, nas palavras de Prado (2008, p.665) - ocorre somente no período que antecede a propositura da ação, no prazo de 6 meses, contando a partir da data em que o ofendido vier a saber quem é o autor do delito ou do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia, não podendo tal prazo ser prorrogado, interrompido ou suspenso, uma vez que peremptório. Quanto à forma de contagem do prazo, esclarece Lopes Jr (2011, p. 391), que

acabou com toda e qualquer capacidade de concorrente - seja para representar, fazer a queixa-crime, perdoar ou renunciar - quando a vítima tiver mais de 18 anos, pois ela passou a ser plenamente capaz, não havendo mais a possibilidade concorrente de o ascendente, por exemplo, fazer a queixa.

No que concerne à perempção, Greco (2009, p. 202) a define como sendo o "instituto jurídico aplicável às ações penais de iniciativa privada propriamente ditas ou personalíssimas, não se destinando, contudo, àquela considerada como privada subsidiária da pública", em conformidade ao que preceitua o caput do art. 60, do CPP, in verbis - "Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação penal" (grifo nosso).

Nesse diapasão, a perempção pode ser vista, no entender de Mirabete (1997, P. 121) como uma forma de "sanção jurídica, imposta ao querelante por sua inércia, negligência ou contumácia".

Assim, o art. 60 e incisos, do CPP, expõem as causas que determinam a perempção. A primeira delas, contida no inciso 1 do aludido artigo, refere-se à situação em que, iniciada a ação, o querelante, devendo dar andamento ao processo, deixa de fazê-lo por período de trinta dias seguidos. Nesse sentido, não há que se falar em perempção quando a demora ou paralisação da marcha processual se der em razão de outrem que não o querelante (MIRABETE, 2007, p.391).

O inciso II do mesmo artigo, por sua vez, relata a hipótese de ocorrência em face do não comparecimento em juízo, no prazo de 60 dias, de pessoa incumbida de prosseguir no processo no caso de falecimento do querelante.

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Ocorre ainda perempção, o inciso III, do art. 60, quando se verificar a ausência do querelante a qualquer ato do processo a que devesse comparecer, sem que este tenha apresentado justa causa, ou no caso de deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais.

Aduz o inciso IV, por fim, que a perempção poderá acontecer "quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor".

Ainda sobre o assunto, Lopes Jr (2011, p. 398) lembra que, embora não consagrada expressamente, "a desistência" do querelante por ser considerada como uma causa supralegal de perempção, podendo o juiz fazer uso das situações insertas nos incisos I e III, do art. 60, para proceder à extinção de punibilidade pela perempção.

2.10 Prescrição

                          A prescrição, no dizer sempre expressivo de Greco (2007, p.731), é vista como o "instituto jurídico mediante o qual o Estado, por não ter tido capacidade de fazer valer o seu direito de punir em determinado espaço de tempo previsto pela lei, faz com que ocorra a extinção de punibilidade". Trata-se de instrumento de direito material, pois atinge diretamente o jus puniende estatal e o jus libertais do indivíduo (BONFIM, 2009, p. 160).

Seu fundamento, dentre outros como o esquecimento, desnecessidade da pena e a dificuldade da prova, repousa, segundo Tourinho Filho (2006, p. 575), "na circunstância de que a ação no tempo faz desaparecer o interesse do Estado, não só em constatar a infração como, também, em executar a pena imposta", configurando-se dessa forma a inércia do Estado no cumprimento de seu dever. Assim, o legislador fixa um prazo dentro do qual o Estado deve exercer sua pretensão punitiva ou sua pretensão executória, a fim de, processualmente, garantir uma duração razoável do processo.

É nesse contexto que a prescrição apresenta-se sobre duas espécies: a prescrição da pretensão punitiva - verificada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória -, e a prescrição da pretensão executória - ocorrida após o trânsito em julgado da decisão.

Matéria de ordem pública, a prescrição deve ser reconhecida a qualquer momento, tanto de ofício pelo juiz como a requerimento das partes (BONFIM, 2009, p. 161). Para a contagem do prazo prescricional deve-se obedecer ao art. 10, do CP, incluindo-se no seu cômputo o dia do começo e, no caso de concurso formal, concurso material, crimes conexos e crime continuado, este deve ser contado em relação a cada crime de forma isolada (art. 119, do CP, e Súmula 497 do STF).

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É sobremodo importante assinalar que, em consonância com os incisos XLII e XLIV do art. 5° da Constituição Federal de 1988, são imprescritíveis a prática do racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

2.10.1 Prescrição da pretensão punitiva

Causa de extinção da punibilidade produzida antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, a prescrição da pretensão punitiva tem, de modo geral, como parâmetro para o seu cálculo, a pena máxima abstratamente cominada, tomando o disposto no art. 109, do CP. Ressalta-se, entretanto, que a pena concreta poderá ser levada como base, nos casos de prescrição superveniente e prescrição retroativa, itens apresentado os nas próximas seções.

Como se pode notar, o lapso prescricional, à depender do tipo de prescrição, está diretamente vinculado à pena abstrata (prescrição da pretensão punitiva) ou concreta (prescrição da pretensão superveniente, prescrição retroativa e prescrição da pretensão executória).

Assinala-se ainda que se aplicam às penas restritivas de direito, de acordo com o parágrafo único do art. 109 do CP, os mesmo prazos prescricionais previstos para as penas privativas de liberdade. (PRADO, 2008, p.658).

Ademais, os prazos prescricionais devem ser reduzidos da metade quando o agente era, ao tempo  do crime, menor de vinte e um anos, ou, nada da sentença, maior de setenta anos (art. 115, CP). Incidem também no prazo da prescrição da pretensão punitiva, as causas de aumento e diminuição da pena, bem como a exacerbação da pena relativa à forma qualificada do

delito. Por seu turno, não são consideradas as circunstâncias agravantes e atenuantes. (PRADO, 2008, p. 659).

Insta acentuar que, ao contrário da decadência, o prazo prescricional está sujeito à suspensão, em função de causas impeditivas elencadas no art. 116, do CP, e á interrupção, conforme disposto no art. 117 do mesmo diploma legal (TOURINHO FILHO, 2006, p. 577-578).

No concernente aos efeitos gerados, em se tratando de prescrição da pretensão punitiva, todos aqueles resultantes da condenação, se houver, serão apagados (BONFIM, 2009, p. 164).

2.10.1.1 Prescrição superveniente

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Em assonância com a lição sempre precisa de Prado (2008, p. 662), a prescrição superveniente é espécie da pretensão punitiva regulada pela pena in concreto, tendo como base a pena imposta na sentença condenatória.

Também chamada de intercorrente ou subseqüente, ocorre depois da sentença condenatória transitada em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso (art. 110, §1°, do CP), tendo como marco inicial a publicação da sentença condenatória, e o marco final, o trânsito em julgado daquela para ambas as partes - acusação e defesa.

2.10.1.2 Prescrição retroativa

Outra espécie de prescrição da pretensão punitiva do Estado, a prescrição retroativa também se regula pela pena imposta ao réu, tendo, todavia, seu prazo contado de forma regressiva, em consonância com a disposto no art. 110, §2°, do CP - "A prescrição, de que trata o

parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa".

Sob este viés, Greco (2007, p. 737) esclarece que é retroativa a prescrição quando,com fundamento na pena aplicada na sentença penal condenatória com trânsito em julgado para o Ministério Público ou para o querelante, o cálculo prescricional é refeito, retroagindo-se, partindo-se do primeiro momento para sua contagem, que é da data do fato [...]

Assim, complementando o entendimento anterior, corrobora Prado (2008, p. 663),

Se entre a data da consumação do crime e a do recebimento da denúncia ou da queixa, ou se entre a data de recebimento da denúncia ou da queixa e a da publicação da sentença condenatória excede-se o lapso prescricional - aferido com base na pena in concreto -, aplica-se a extinção de punibilidade pela prescrição retroativa.

2.10.2 Prescrição da pretensão executória

Após o trânsito da sentença penal condenatória, o Estado deixa de dispor do direito de punir, adquirindo o direito de executar  a pena cominada na sentença. É sobre este enfoque que surge a prescrição da pretensão executória quando, então, o Estado, em função do decurso de tempo, perde o seu direito de executar a sanção imposta na sentença condenatória (JESUS, 2007, p. 139).

Mais uma vez, considera-se a pena in concreto para a contagem do prazo que, em caso de reincidência é aumentado de um terço, conforme art. 110, caput, do CP.

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Urge salientar a presença de causas de suspensão (art. 116, parágrafo único, do CP) e interrupção (art. 117, incisos V e VI) neste tipo de prescrição. No caso de evasão do condenado, novo prazo prescricional tem início, com base no tempo que restar da pena, conforme arts. 112. II, e 113, CP.

Sobre seus efeitos, importante frisar que na prescrição da pretensão executiva, o único efeito da condenação atingindo é o da pena cominada pela sentença penal condenatória, permanecendo os demais efeitos da condenação (BONFIM, 2009, p. 164), inclusive os civis.

3 DELITOS FISCAIS: QUAL O MOMENTO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE?

Eugênio Pacelli de Oliveira (2009, p.78) faz referência ao tema controvertido da extinção da punibilidade nos casos de parcelamento de dívidas, nos crimes contra a ordem tributária e/ou previdenciárias. As previsões legais da extinção da punibilidade em tais casos encontram-se respectivamente no art. 34 da Lei n° 9.249/95 e art. 168-A, parágrafo 2°, do CP.

Sobre o disposto nestes artigos, garantida estaria a extinção de punibilidade quando o agente efetuasse o pagamento dos valores devidos antes de iniciada a ação fiscal.

Contudo, com o surgimento da Lei n° 10.684/2003, a extinção de punibilidade poderia ser reconhecida em razão do pagamento do débito, mesmo após a instauração da ação penal, incluindo, por oportuno, a possibilidade de parcelamento da dívida, que ocasionaria a suspensão da pretensão punitiva estatal até o pagamento integral do tributo, desobrigando-se  que esta se realizasse antes do recebimento da denúncia.

Recentemente, com o advento da Lei n° 12. 382/2011, o parcelamento formalizado antes do recebimento da denúncia criminal, continua a resultar na suspensão da pretensão punitiva do Estado referente aos crimes tributários até que a dívida seja quitada, contudo, questão controversa é a (in)admissibilidade da declaração da extinção da punibilidade na hipótese do pagamento se operar após o trânsito em julgado da sentença penal, posto que não haveria vedação legal neste aspecto, existindo divergência jurisprudencial acerca desta problemática (CUSTÓDIO, 2011, p. 1).

Neste sentido, a admissibilidade, encontrando fundamento na ausência de previsão legal que determine termo final para o pagamento/parcelamento do débito fiscal, evidenciar-se-ia porque o pagamento do débito mesmo após o trânsito em julgado cumpriria a finalidade para qual a norma foi criada, qual seja, o de arrecadar.

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Aliás, sobre o tema, Nucci (2007, p. 868) tece críticas ao discorrer que "em matéria de crime contra a ordem tributária, verifica-se que, na essência, o Estado não quer a punição do infrator, mas almeja receber o valor do tributo, mantendo o padrão satisfatório da arrecadação".

Roborando no assunto, Oliveiro (2009, p.78) afirma que a utilização do sistema penal nesses casos tem fins meramente arrecadatórios, demonstrando, de forma contundente, sua desaprovação a tal  medida:

Há muito sustentamos que a possibilidade de extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo ou contribuição previdenciária, seja em que momento for, bem demonstra que o interesse público revelado nas legislações pertinentes é meramente arrecadatório. Não há como negar. O Ministério Público vem sendo instrumentalizado como agente de cobrança da Fazenda Pública, com a ameaça da sanção penal.

Por fim, considera ainda o autor ser imoral, desigual e infeliz a legislação que trata dos crimes contra a ordem tributária e previdenciária, quando esta não faz nenhuma distinção entre as ações notadamente fraudulentas (nas quais se utilizam toda a sorte de artifícios para a redução quase completa do pagamento de tributos, em condutas cujo meio empregado, via de regra, é punido na legislação penal comum, como por exemplo, o estelionato e outras fraudes) e as ações de pequenos e médios empresários que, mal-e-mal, dão conta de manter em dia suas obrigações mais elementares e essenciais, com a manutenção de salários e de empregos. (OLIVEIRA, 2009, p.78).

À luz do exposto, a política criminal que permite a extinção da punibilidade em tais casos não tem considerado a lesividade das ações levadas a cabo pelos verdadeiros agentes dos crimes contra a ordem previdenciária, desvirtuando, dessa forma, os fundamentos da extinção da punibilidade.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como exposto, as causas de extinção de punibilidade não se resumem ao disposto no art. 107, do CP, estando o assunto disperso em vários artigos do CPP, bem como em outras leis, como as que tratam de crimes relacionados à ordem econômico.

Assim, com o desenvolvimento do trabalho foi possível verificar a importância do tema arrolado tanto sobre o aspecto penal, quanto sobre o processual penal, especialmente no que se refere à sua utilização enquanto instrumento extintivo d pena e seus efeitos e não do crime.

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No tocante aos delitos de ordem tributária, inegável e a utilização pelo Estado da punibilidade e sua possível extinção de forma desvirtuada, dispondo de um sistema penal já sobrecarregado, para aplicação de sanções, de forma indiscriminada, visando, sobretudo, a arrecadação.

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REFERÊNCIAS

BITENCOURT. Cezar Roberto. Tratado de direito penal, parte geral 1. 13. ed. atual. São Paulo: Sarava, 2008.

BONFIM, Edilson Mougenot. Código de processo penal anotado.2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

CUSTÓDIO, Simone. Crime de sonegação fiscal. Momento processual limítrofe para a realização do pagamento do tributo. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2871, 12 maio 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br./revista/texto/19099>. Acesso em: 18 maio 2011.

GRECO, Rogério. Código penal comentado. 2. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.

__________________. Código de processo penal anotado. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

JESUS, Damásio E. de. Código de processo penal anotado. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

__________________. Código de processo anotado. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. São Paulo: Atlas, 1997.

__________________. Manual de direito penal, volume I: parte geral, arts. 1° a 120 do CP. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2007.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 3ed.. ed. ver. atual.ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de processo penal. 12 ed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

PRADO, Luís Regis. Curso de direito penal brasileiro, parte geral: arts. 1° a 120. 8. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 1. 28. ed. ver. e atual. São Paulo Saraiva, 2006.