Onda
Por Gilberto Landim | 06/09/2006 | ContosPortai-vos com sabedoria para com os que são de fora; aproveitai as oportunidades. (Colossenses 4:5)
-- Colega me arruma um real, que tô sem dinheiro, desempregado, numa pior. Peço por favor que num repare, um dia vou sair dessa crise. Me tira dessa hoje, quem sabe amanhã será outro dia.
Era assim que Onda vivia. Pedindo dinheiro às pessoas que praticavam surf na praia, da qual era mais íntimo que do banheiro de sua casa. Passava praticamente o dia inteiro surfando até um dia, quando negociou sua última prancha, para gastar com as minas do bairro.
É uma história a princípio horrível, se considerar que Onda chegou a ser um campeão mundial de Surf, tendo ganhado um bom dinheiro nesse esporte tão famoso.
Havaí, honras, dinheiro e fama. Seu nome estava na mídia. Era convite para anúncios, filmagens e um monte de atividades lucrativas. Maremoto! O que foi que aconteceu com Onda para ter tido sua vida destruída?
Jacó, um marketeiro experto, resolveu ganhar um dinheiro alto, e, procurou uma pessoa desconhecida para investir, proporcionando-lhe um retorno meio-a-meio. Viu Onda se saindo bem, assediou-lhe, propondo torná-lo um destaque internacional no Surf. Como o garoto não tinha nada na cabeça, tudo o que pintasse era lucro, de imediato topou a transação.
-- Ta legal brother. Tudo que eu faturar, 50% vai pro teu bolso e o resto do cascalho é meu. Vamos à vida, valeu!
-- Onda, escuta uma coisa. Num gostei do Jacó. Além do mais o bicho é ladrão. Leva metade do que tu fatura. Aí, nada a vê, ta sabendo? Maluco, se liga na real: o mercado cobra entre 10 a 20%. Como é que tu vai dá metade pra esse vagabundo. Tô fora. Clusive, seguinte: enquanto tu num detonar esse bicho, num quero mais vê tua cara, fui.
-- Roberta Caroteno, se mandou e eu num tô guentando de saudade. Mas essa cara é louca, quer que eu brigue com o home que me fez, nada a vê, mesmo. Quer saber, tô pulando fora dessa pessoa e vô arrumá outra imediatamente. Sô jovem e preciso tirá uma Onda.
R. C., tanto insistiu, que acabou por lograr sucesso em seu propósito, obrigando Onda a rescindir o contrato com o marketeiro, que sem se opor, desfez o acordo formal.
Dia seguinte, Jacó já estava na praia conversando com outro surfista, que veio a substituir Onda, até seu definitivo declínio.
-- Brother, me arruma um real, disse Onda para um surfista que estava vindo com sua prancha.
-- Menino. Vamos lá no quiosque beber uma água de coco. Quero ter uma conversa séria com você.
-- Preste atenção, se ligue, esteja muito atento ao que vou lhe falar. Sua falta de atenção pode resultar em uma incalculável perda para você.
-- Certa história árabe, diz que na vida do ser humano, passam três cavalos brancos. Cada eqüino representa uma grande oportunidade na vida do homem. O quadrúpede passa muito rápido e é preciso ser ainda mais veloz do que ele para agarrá-lo.
O seu primeiro cavalo já foi embora.
-- Legal, cara! Tu então vai me arrumá o segundo bicho?
-- O segundo animal, passa mais depressa do que o primeiro e o terceiro mais rápido do que o segundo. Eu estarei lhe propondo uma parceria. Vou comprar três pranchas bonitonas e financiá-las a você, para montagem de um curso de surf. Receberei as parcelas de acordo com o pagamento das aulas. Não precisa me pagar royalties, juros, comissão ou qualquer outro tipo de lucro, que venha a passar pela sua cabeça. Vou divulgar seu trabalho para torná-lo um grande professor, desse esporte que nós dois tanto apreciamos.
-- Quatro anos se passaram e Onda agora tem mais de 150 alunos matriculados em seu curso. Que coisa gostosa! Amanhã vou ao aeroporto buscar meu amigo.
-- Apóstolo, encontrar com você causa-me uma alegria que eu não sentia pelas pessoas mais chegadas da família. Meus dois irmãos, não produzem em mim a serotonina que causa a sua aproximação. Passei todos os dias deste mês pensando, na quantidade de gente que você deve ter desinteressadamente, ajudado. Parece que o alivio do sofrimento das pessoas é um grande presente para você. Abrace-me meu bom amigo!
-- Rapaz. Estou duplamente encabulado e surpreso com você. Parece-me alguém muito sensível. Eu é que faço questão do abraço. Como é que está conseguindo falar sem erro de português? disse Apóstolo.
-- Veja, meu amado. Eu sou estudante de Oceanografia. A perda do primeiro cavalo branco, havia me assolado de tal forma, que, decidi falar só gíria. Uma espécie de protesto. Queria tirar uma Onda.