O Zero e o Dez em Ecologia.

Era na década de 1980, ou 1990, não lembro muito bem. Eu dava aulas de Ecologia Básica para duas turmas de Agronomia, A e B da Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, FCAP, hoje Universidade Federal Rural da Amazônia, UFRA. Chegara a época das avaliações, Primeiro NPC. Uma das turmas fez a prova na sexta e a outra faria no sábado. Porém, na sexta houve o fato: A FCAP tinha expulso um aluno que teria ido assistir aula, pasmem vocês, – de bermuda! No sábado, tudo preparado para a prova, eu esperando a turma na porta da sala, quando chegou uma aluna, parece do Diretório Acadêmico e me disse: – Professor, os alunos não vão fazer sua prova em solidariedade ao aluno expulso! Eu, surpreso, respondi pra ela que haviam outros meios de se solidarizar, blá, blá, blá. Mas não teve jeito. Ninguém entrou pra fazer prova. Então, chamei o meu chefe de departamento, comuniquei o ocorrido e fui embora. Esperei o prazo para a segunda chamada desta turma.

Enquanto isso, corrigi as provas da outra turma e publiquei suas notas. E nada! Ninguém se inscreveu pra fazer a segunda chamada. Não titubeei. Apliquei zero para toda a turma e publiquei. Foi um alvoroço geral!!! O aluno que foi expulso recorreu às instâncias superiores. Os alunos que levaram zero, também. No caso do zero, logo depois do episódio consumado com a publicação das notas, quiseram me convencer que eu não poderia ter dado zero, porque a prova não teria acontecido! Portanto, sem fato consumado não haveria punição.

As semanas foram passando e então foi marcada a reunião da Congregação, instância maior da então FCAP. Nessa reunião seriam discutidos o zero da ecologia e a expulsão do aluno de bermuda. A “lavagem quase cerebral” continuava em cima de mim. “Não poderia ter o zero, porque a prova não teria acontecido!” Ai, examinei, pensei, avaliei toda a situação e contexto. Na semana da reunião, ou melhor, dois dias antes, pelo andar da carruagem e pelos murmúrios dos enormes corredores do prédio central da FCAP, concluí com os meus botões (da minha bata inseparável): Os caras vão manter a punição do aluno e vão mandar o professor de Ecologia, no caso eu, fazer nova prova. Escrevi então uma carta que previa antecipadamente este desfecho e mandei para os jornais diários. Um deles, o Jornal O Liberal, publicou na íntegra a minha carta, exatamente no dia da reunião da Congregação. Não deu outra! Foi mantida a expulsão do aluno e o professor de Ecologia teria que fazer nova prova. Acertei na mosca! Pena que não era o resultado da Loteria Esportiva da época!!!

Ao fim e ao cabo, como diria meu avô português, foi assim decidido pela Congregação. Dias depois, recebi a comunicação para dar ciência e providência. Foi o que eu fiz. Preparei uma prova, marquei a data e realizei a mesma. Só que não me dei ao trabalho sequer de corrigir nenhuma das provas. Apliquei 10 (dez) para todos os alunos. E pensei novamente com os meus botões: Se eu não posso dar zero, quero ver se não posso dar dez!