O suicídio da galinha que pensava ser uma pata.
Publicado em 18 de junho de 2016 por Carlos José Esteves Gondim
No meu quintal, que apelidei de Meu Nano Universo, crio patos e galinhas Vivem por lá também um jabuti, chamado Porolóco, um coelhinho, de nome Cenourinha, além de alguns intrusos -- e que intrusos! --, como ratos e mucuras. Outros, o visitam frequentemente como japus e muitos passarinhos. Nele existem também uma copa de mangueira-rosa da vizinha e alguns pés de banana, manga, cacau, tucumã do amazonas, nins e algumas outras árvores como uma frondosa paineira.
Recentemente, uma galinha ficou choca e decidiu tomar conta de alguns ovos que sua vizinha, a pata, vinha colocando no ninho ao lado... Totalizavam 10 ovos, quando a pata começou o chocá-los. Como a galinha choca persistia em quere-los para si a tarefa, decidi reparti-los igualmente: 5 ficaram com a pata e 5 com a galinha... No decorrer do período de gestação, ou melhor, incubação, a galinha dava um jeito de puxar para baixo de si, os 5 ovos da pata... Foi preciso eu fazer uma parede, separando os dois ninhos... A incubação chegou ao final, não antes, de um dos 10 ovos terem sido surrupiados ou por um rato ou por uma esperta mucura... Portanto, nasceram 9 patinhos, 5 com a pata e 4 com a galinha.
No seu primeiro dia de vida, a prole dos patinhos nascidos sob a pata saíram do ninho e começaram a explorar o terreiro. Os 4 patinhos da galinha, porém, ficaram com ela dentro do ninho, sob o calor e cuidados da mãe. Dia seguinte, resolvi interferir e toquei os patinhos da galinha do ninho, que os levou para o terreiro. Imediatamente, os 9 patinhos se reuniram em um bando só, sob dois comandos: o da pata e o da galinha. A galinha cacarejava, bicando e ciscando o chão com as suas patas, como se chamasse os patinhos adotados como filhos. A pata, próxima, cercada dos 9 patinhos, grasnava impávida, como se “soubesse” que os filhos eram dela e não da galinha... Mesmo assim, alguns patinhos atendiam ao chamado da galinha e corriam para perto dela... Viveram assim por vários dias, agora confinados em um viveiro dedicado à eles, com fornecimento de comida adequada e suprimento de água permanente. E sem a perturbação dos patos e patas adultos do terreiro.
Na terceira semana de vida, mais um ataque noturno aconteceu entre a prole dos patinhos! Um deles sumiu! -- Teria sido caçado por um rato, uma mucura? Ninguém sabe, ninguém viu... Nessa mesma semana, encontrei um dos patinhos engatado e morto numa tela que separava o viveiro do terreiro... Devidos os tristes fatos acima, tomei uma decisão radical: Vou acabar com a prole dos patinhos! Vendi-os. -- Melhor dar-lhes uma chance de vida, do que vê-los sendo devorados soturnamente durante as noites...
Dia seguinte ao da partida dos patinhos, vi a galinha, estranhamente empoleirada na beira do tanque de banho dos patos do terreiro. Achei estranho. Nunca tinha visto a galinha escalando aquela posição... -- Será que ela estava com muita sede? Não dei bola e fui embora.
No outro dia, aproximadamente na mesma hora, que corresponde ao rotineiro trabalho de distribuir milho e trocar a água do bebedouro, procurei pela galinha por todo o terreiro e não à encontrei. Fui até o tanque de banho dos patos e a cena que vi me espantou e impressionou profundamente: Boiando na água, lá estava a galinha! Morta, mortinha da silva!
Tirei o seu corpo da água e o examinei cuidadosamente. Não vi nenhuma marca de ataque de bicho, ferida ou outro sinal que indicasse a causa mortis... Comecei a conjecturar os possíveis motivos, as causas deste infortúnio. Sem nenhum argumento científico plausível, levantei a hipótese de suicídio! A galinha sentiu profundamente a ausência dos filhos postiços. Quando à vi na beira do tanque, ela na verdade estava procurando por eles... Como não suportou suas ausências, preferiu dar cabo de sua vida, jogando-se na água como uma pata que não era e morrendo afogada!