O Roto e o Rasgado

Nova reunião da cúpula do chamado G20 se aproxima neste início de Novembro, desta feita em pauta destacada a crise mundial, notadamente na região da Zona do Euro e seus 17 países com problemas para equilibrar suas finanças.

O que se espera dos países emergentes, notadamente os do chamado BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - é algum tipo de ajuda ou socorro financeiro direto para sanear economias em franco processo de estagnação ou até mesmo recessão, em países com níveis de desemprego mais do que alarmantes, em torno de 20% - coisa de período de guerras.

O tal socorro esperado viria na forma de alguma intrincada composição junto ao EFSF – sigla em inglês do Fundo Europeu de Estabilização Financeira, ou da compra de títulos da dívida pública de países com problemas de reservas.

A nós, brasileiros, causa estranheza algumas notícias veiculadas de que o governo brasileiro estaria cogitando algum tipo de ajuda à Grécia ou a países europeus. Noticias de que algo em torno de que algo em torno de 10 a 20 bilhões de Euros sairiam dos cofres aqui de Pindorama para somar-se aos declarados 440 bilhões da mesma moeda de que dispõe o referido fundo.

De um lado, notícias desencontradas sobre o tamanho do saneamento necessário para tapar o rombo coletivo no velho continente falam em algo em torno de 1 ou 2 trilhões de Euros – isso mesmo, margem de 100% de variação (ou erro)(!). Por isso os chineses querem entender melhor e mais detalhadamente a real situação, não sem antes reunirem-se às vésperas com os presidentes de seus pares no grupo dos 5 emergentes com o intuito de discutir estratégias e conseqüências e eventualmente o que pedir em troca.

A desconfiança se justifica, principalmente porque a crise vem se arrastando há já alguns anos, e parece que as medidas saneadoras tomadas pelas autoridades européias, além de não terem tido eficácia no sentido de reverter a situação, também não encontram respaldo popular, e é sem sombra de dúvida necessário ter muita cautela antes de queimar recursos fazendo parte de um esforço conjunto fadado previamente ao total fracasso.

Também, o montante dos recursos da suposta “ajuda” do Brasil mencionada acima nos parece tão ínfima, que sequer faria cócegas nos pés do monstro da crise, basta ver os números do buraco financeiro de um país com economia tão pequena como a Grécia, a bola da vez, o que dirá de economias mais expressivas como a Espanha e Itália, ou o trilhão necessário para o bloco todo.

Por outro lado, o nosso lado, quem nos ajuda?

A meta de crescimento do PIB brasileiro para o ano de 2011 já foi revista para baixo, e para o ano que vem, nossas bolas de cristal ainda estão com o foco meio embaçado para dar suporte sério aos exercícios de adivinhação e futurologia, mas o certo é que não vem coisa boa por aí.

Nossos problemas estruturais ainda estão todos por resolver, embora a fumaça e os fogos de artifício do último governo tenham vendido a idéia de que tudo por aqui já está solucionado e que as coisas vão às mil maravilhas.

À parte dos necessários investimentos bilionários para a realização da Copa de Futebol em 2014 e das Olimpíadas em 2016, nossos sérios problemas típicos de país subdesenvolvido como saneamento básico – água tratada e coleta de esgotos: 55% das residências brasileiras não têm ligação de coleta de esgotos e, das que tem, dados do IBGE informam que 70% dos seus dejetos coletados são repassados diretamente à natureza sem qualquer tipo de tratamento -, saúde pública sucateada e falida – não quero ser morbidamente repetitivo aqui ao relatar os casos quase diários de doentes vagando desesperadamente de hospital em hospital à procura de vagas, nem dos que são internados para tratamento em corredores, onde permanecem em pé por dias recebendo atendimento (imagine o tipo de atendimento que lhes são conferidos). Se trouxerem cadeira de casa, aí ficam internados sentados. 57% das estradas brasileiras são avaliadas como em péssimo estado ou apenas regular. Aeroportos saturados e com instalações notoriamente insuficientes para atender sequer à demanda diária normal. Produção de energia elétrica funcionando com um gargalo difícil de transpor, impedindo uma grande explosão na instalação de indústrias de transformação.

Bem, eu disse que não iria me repetir, certo?

A situação geral daqueles de onde se espera ajuda? Vejamos um pequeno panorama do perfil econômico dos socorristas em ordem das letras do grupo BRICS (dados de 2010, obtidos da CIA – Central Intelligence Agency – www.cia.com/theworldfactbook)

Brasil

População: 192 milhões de habitantes

Área: 8.514.876 km2

PIB 2010 (*): US$ 2.090.314.000.000

Renda per capita: US$ 10.887/ano

IDH: 0,696

Exportações: US$ 201.900.000.000

Importações: US$ 181.700.000.000

Reservas Internacionais: US$ 288.600.000.000

 

Rússia

População: 142 milhões de habitantes

Área: 17.075.400 km2

PIB 2010 (*): US$ 1.465.075.000.000

Renda per capita: US$ 10.317/ano

IDH: 0,719

Exportações: US$ 400.100.000

Importações: US$ 248.700.000

Reservas Internacionais: US$ 479.400.000.000

 

Índia

População: 1.210 milhões de habitantes

Área: 3.287.590 km2

PIB 2010 (*): US$ 1.537.966.000.000

Renda per capita: US$ 1.271/ano

IDH: 0,519

Exportações: US$ 225.400.000.000

Importações: US$ 359.100.000.000

Reservas Internacionais: US$ 287.100.000.000

 

China

População: 1.338 milhões de habitantes

Área: 9.596.960 km2

PIB 2010 (*): US$ 5.878.257.000.000

Renda per capita: US$ 4.391/ano

IDH: 0,663

Exportações: US$ 1.581.000.000.000

Importações: US$ 1.327.000.000.000

Reservas Internacionais: US$ 2.876.000.000.000

 

 

África do Sul

População: 49 milhões de habitantes

Área: 1.221.037 km2

PIB 2010 (*): US$ 505.214.000.000

Renda per capita: US$ 10.243/ano

IDH: 0,597

Exportações: US$ 81.860.000.000

Importações: US$ 85.830.000.000

Reservas Internacionais: US$ 43,830.000.000

 

Os dados da Zona do Euro (retirados do www.europa.eu – o sítio eletrônico do serviço de inteligência americano não os dispunha atualizados até 2010):

 

População: 321 milhões de habitantes

PIB 2010: US$ 14.820.000.000.000 (ou 12.220 bilhões de Euros)

Renda per capita – Este dado está prejudicado como fator de comparação, pois foi encontrado com ampla margem de variação em seus 17 membros, de US$ 7.000 a US$ 78.000/ano. Pode-se colocar como uma estimativa de algo em torno de US$ 32.000/ano.

IDH: da mesma forma, informação prejudicada dada à grande diferença de condições de desenvolvimento encontrada em seus países membros.

Exportações (Somente considerado as vendas para países de fora da Zona do Euro):

US$ 1.952.000.000.000

Importações (Somente consideradas as importações oriundas de países de fora da Zona do Euro): US$ 1.690.000.000.000

Reservas internacionais: US$ 0

Dívida Externa do bloco: US$ 13.000.000.000.000

 

Considerados os números acima (PIB sete vezes maior que o nosso, Dívida externa idem, renda per capita de quase o triplo da brasileira, mais outros fatores, como a cultura, como a política social, como o estágio de desenvolvimento econômico atual), não creio que o Brasil tenha grandes contribuições econômicas a dar para a recuperação do velho continente. À exceção da China, olhando a grosso modo e sem entrar em detalhes, tampouco vejo em qualquer outro país emergente do grupo dos BRICS condições de influir de forma decisiva na situação da Europa.

 

O roto oferecendo a mão ao rasgado...

 

Wagner Woelke