1 INTRODUÇÃO

 

Entende-se que a sociedade sofre constantemente com os efeitos da globalização, que culminam diretamente sobre a vida e, principalmente, sobre as atividades humanas, de modo que é necessário que haja um instituto proficiente a garantir matérias como a nacionalidade, condição jurídica do estrangeiro, os conflitos que surgem no âmbito das leis e jurisdição e, até mesmo, os direitos que podem vir a ser adquiridos na esfera internacional. É, portanto, a partir dessa necessidade que surge o Direito Internacional Privado, a fim de disciplinar essas questões e amparar a sociedade perante a internacionalização (DOLINGER, 2014).

Diante do que é apresentado acerca da separação de poderes, esta é interpretada a partir de uma segregação de funções em que a decisão atinge a corte constitucional, em último grau, ou seja, o desfecho das decisões é em uma última palavra dada pelo guardião da constituição. No entanto, é preciso dar uma atenção especial aos diálogos institucionais, estes que têm a finalidade de se transmutar em um método de análise do processo constitucional, considerando que, mesmo com uma instituição que decida a último grau, isso não implica dizer que outra instituição não poderá refutar (MENDES, 2008). Sendo assim, no âmbito do Direito Internacional Privado, em paralelo com o instituto dos contratos internacionais, nota-se a relevância em considerar os diálogos institucionais, visto que naquela relação predominam diversas entidades.

Ao tratar de relações contratuais, é fundamental dissertar acerca do princípio da autonomia da vontade, este que teve grande influência francesa – a partir do idealismo, consagrado pela Revolução de 1789 – e foi inserido no ordenamento brasileiro através do Código Civil Brasileiro de 1916. Este, por ser regado pela centralização do homem, considerava que a vontade deste seria capaz de criar e extinguir atos e fatos jurídicos. No entanto, a forma desse código não trouxe isso expressamente, mas ainda respaldou que o elemento vontade ainda seria primordial para a validade de um negócio jurídico (PEIXOTO, 2012).

Ainda na esfera dos contratos internacionais, é preciso considerar as normas e princípios que permitem a execução daqueles. Dessa forma, é possível citar a CISG, a Lex mercatoria e, ainda, os aspectos da Arbitragem – interna e internacional. Esses elementos, portanto, propiciam uma melhor compreensão acerca do tema, tendo como ponto de partida, o sistema de diálogos institucionais.

A partir do que foi explanado, o trabalho pretende desenvolver uma análise acerca dos procedimentos de contratos internacionais que vigoram atualmente, levando em consideração o sistema de diálogos institucionais.

No âmbito do Direito Internacional Privado, frente à atual sociedade globalizada, é imprescindível tratar sobre os contratos internacionais e os preceitos que permitem sua dinâmica. Além disso, ao abordar o tema, é preciso explanar a partir do sistema de diálogos institucionais, que concederão as diretrizes para tal relação. Desse modo, compreender os princípios, bem como os institutos que circundam o Direito Internacional Privado, sobretudo, os contratos internacionais, é fundamental para que seja estabelecida uma conexão entre os organismos tratados.

O trabalho foi desenvolvido a partir do tema em questão com o intuito de promover a compreensão e, sobretudo, instituir noções sobre o assunto, de modo a retratar o regimento dos contratos internacionais, estabelecendo parâmetros com os diálogos institucionais. Assim, pretende-se ampliar o conhecimento quanto ao que se trata os diálogos internacionais, bem como a procedência dos contratos internacionais e os regulamentos envolvidos.

Visto isso, nota-se a importância em tratar do tema, uma vez que este compreende elementos que, atualmente, estão em evidência no âmbito jurídico-social, manifestando-se, assim, a relevância científica do trabalho.

Destaca-se, também, que se trata de um tema atual, constatando a necessidade de desenvolvimento teórico acerca do assunto, de modo a ampliar a esfera de discussões e controvérsias jurídicas e doutrinárias. Sendo assim, o trabalho tem o intuito de introduzir pensamento crítico e analítico diante do tema abordado, a fim de explorar a matéria, em face do Direito Internacional Privado.

 

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O princípio da autonomia da vontade e o surgimento da CISG

 

O princípio da autonomia da vontade surge ainda na Idade Média, quando poder e querer são dissolvidos, tornando-se elementos distintos. Diante disso, o querer é visto como uma liberdade de vontade, esta que será condição primordial para considerar a igualdade humana. No entanto, o querer depende da efetividade do exercício, ou seja, do poder, de modo que a liberdade de vontade apenas será possível em detrimento das condições plausíveis. A autonomia da vontade, que remonta a concepção de ausência absoluta de coação, proporciona a ideia de que, perante a possibilidade de contrato, todos os indivíduos serão igualmente livres para contratar. Contudo, a liberdade de um indivíduo é limitada pela liberdade do outro. Nesses termos, é preciso entender que, diante de uma relação contratual, uma das partes exercerá a imposição de sua vontade, de modo a restringir os limites da outra parte (ASSIS, 2005).

No contexto de autonomia da vontade, trata-se, em paralelo, do princípio da boa-fé

A autonomia da vontade ou liberdade subjetiva reside justamente nessa possibilidade do indivíduo querer ou não querer qualquer coisa. Já a boa-fé significa manter palavras e acordos, porque o homem de bona fides é o que "faz (fiat) o que foi dito", ou seja, o princípio da boa-fé implica o cumprimento dos pactos e compromissos (pacta sunt servanda). Ao acoplar o princípio da autonomia da vontade ao princípio da boa-fé, a tecnologia jurídica estabelece que o contrato é lei entre as partes e imprime à pacta sunt servanda uma noção de inflexibilidade que os romanos jamais pensaram em imprimir. Dado, porém, que o homem é livre para querer qualquer coisa (autonomia da vontade), abre-se a possibilidade dele querer (no contrato) o seu próprio mal ou coisas que não dependam dele, não realizáveis (ASSIS, 2005, p. 01).

Por outro lado, é preciso analisar que o Estado, diante das circunstâncias atuais, não poderia permanecer estático quanto ao desequilíbrio nas relações contratuais, desinentes de uma voluntariedade arbitrária, uma vez que essa desestabilidade está propensa a impactar diretamente na máquina pública e, então, provocar um caos econômico-social. Entretanto, mesmo com o chamado dirigismo contratual, que busca manter um equilíbrio no estabelecimento das relações contratuais, estas apenas existem a partir de um acordo de vontades, de modo que ainda é substancial a autonomia da vontade perante os contratos (PEIXOTO, 2012).

A CISG, sigla em inglês que identifica a Convenção de Viena das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias, em 10 de abril de 1980 foi aprovada unanimemente, por uma conferência diplomática em que sessenta e dois Estados participaram. Passou a vigorar a partir de 1º de janeiro de 1988, mas somente para os onze primeiros Estados que depositaram os instrumentos de adoção, juntamente ao Secretário-Geral das Nações Unidas. Atualmente, a CISG é adotada por setenta e nove países – o Brasil tornou-se signatário em 2013. A CISG é considerada como um corpo de regras substantivas e divide-se em quatro partes. Tem como objeto disciplinar a formação do contrato de compra e venda, de modo a observar as obrigações e deveres entre o comprador e o vendedor, partes do contrato (FONSECA, 2009).

Uma das principais causas do sucesso da CISG foi justamente o cuidado na determinação de seus parâmetros interpretativos. Nessa perspectiva, também há a necessidade de observância da boa-fé no comércio internacional para que a Convenção atinja plenamente os seus objetivos. Da mesma forma, atenta-se ao fato de que a Convenção não buscou apenas garantir um regime uniforme para os contratos de compra e venda internacional, através do seu caráter internacional e da observância da boa-fé. Afirma Bonell24 que o objetivo é ainda mais amplo: consiste em oferecer outras regras que serão mais receptivas do que as tradicionais leis nacionais para a efetiva necessidade do comércio internacional (CISG-Brasil, 200?, p. 09).

Visto isso, há de se falar ainda que “o caráter internacional e a promoção da uniformidade constituem os princípios primeiros a orientar o intérprete da Convenção. A boa-fé deve, igualmente, ser considerada” (FONSECA, 2009, p. 01). Com isso, os julgadores devem afastar da interpretação da convenção, quaisquer conceitos jurídicos domésticos, utilizando-se tão somente de valores jurídicos adequados e referentes à universalidade, perante à esfera da Lei Uniforme (FONSECA, 2009).

Quanto à garantia da uniformização da Convenção em questão é preciso considerar o método de como é interpretada por todos os países signatários. No entanto, não é suficiente que a Convenção seja interpretada em casos individuais, uma vez que a máxima uniformização não será atingida nessa hipótese. A partir disso, surge a necessidade de juízes e árbitros se posicionarem como investigadores, a fim de consolidar decisões justas e adequadas ao caso concreto (CISG-Brasil, 200?).

A essência da vontade revela, sobretudo, uma completa ausência de coação, o que enseja a fundamentação da autonomia da vontade. Sendo assim, institui-se a noção de que todos os indivíduos serão livres e iguais, em detrimento de suas vontades, para contratar. Contudo, em face das condições de igual liberdade dos indivíduos, a autonomia da vontade de um ser será sempre e em qualquer hipótese limitada pela autonomia da vontade do outro. Os contratos serão estipulados, então, de modo a preservar correlações de força, em que um sujeito impõe sua vontade, limitando a autonomia do outro. Nessas características, conclui-se que o princípio da autonomia da vontade e o princípio da igualdade são formas de domínio, em que o vínculo entre as partes é uma adesão inexorável (ASSIS, 2005).

No que se refere o princípio da autonomia da vontade, nota-se que este deve ser reconhecido e, sobretudo, indiscutível, uma vez que os sujeitos, perante a liberdade de vontade, poderão suspender a aplicação do contrato ou, do mesmo modo, poderão derrogar suas disposições ou alterar os efeitos a serem produzidos. Sendo assim, o que é inserido pela convenção nem sempre será o que regerá o contrato, considerando que a vontade das partes deve ser predominante (FONSECA, 2009).

 

2.2 O princípio da autonomia da vontade, a Lex mercatoria e a Arbitragem

 

Quanto à esfera da autonomia da vontade e a função social dos contratos, entende-se que, atualmente, a vontade dos sujeitos dos contratos submete-se, essencialmente, ao interesse coletivo, de modo a respeitar os limites delineados no ordenamento brasileiro. A legislação propõe que a liberdade de contratar seja exercida aos termos da função social dos contratos, de modo a eximir os excessos do individualismo, e permitir que o Estado intervenha, impondo limites ao princípio da autonomia da vontade, uma vez que esta deve estar em consonância com os preceitos da função econômico-social do negócio jurídico em questão (CURVELO, 2012).

Nas condições de contratos de compra e venda internacionais, faz-se referência ao instituto da CISG

A CISG aplica-se a contratos de compra e venda internacional de mercadorias, celebrados entre pessoas domiciliadas em países distintos, desde que tais países sejam signatários da Convenção ou que, segundo as regras de direito internacional privado aplicáveis ao caso, o contrato seja regido pela lei de um país signatário. Assim, o primeiro critério para que se tenha a aplicação da CISG é o caráter internacional do contrato, determinado em razão do local do estabelecimento comercial das partes contratantes. Além disso, devem ser observadas as exclusões feitas no Artigo 2º, em que se estabeleceu a não aplicação da Convenção quando as mercadorias transacionadas se destinam ao consumo pessoal, familiar ou doméstico; ou foram vendidas por meio de leilão ou processo de execução judicial; ou ainda dizem respeito a títulos de crédito, moeda, quotas, ações, navios, aeronaves, hovercraft, embarcações ou eletricidade. Nesses casos, mesmo que se trate de compra e venda internacional de mercadorias, em que estejam preenchidos os requisitos do primeiro Artigo, a Convenção não se aplica (CISG-Brasil, 200?, p. 16).

A CISG é resultado de mais de 10 anos de trabalho desenvolvido pela UNCITRAL, e surgiu com o intuito de proporcionar uma dilatação na participação dos Estados, uma vez que era necessária uma perspectiva mais ampla acerca das relações de compra e venda internacional, considerando que as Convenções de Haia de 1964 não foram bem aceitas pelas uniões, de modo que apenas alguns países, a maioria da Europa Ocidental, participaram das atividades e, em detrimento disso, as resoluções dessas convenções estavam restritas às determinações dos Estados participantes, propiciando um distanciamento dos países que não pactuavam. A CISG, por sua vez, trazia a ideia de viabilizar um documento universal, ou seja, que estivesse à disposição de todos os Estados que se propusessem a participar (CISG-Brasil, 200?).

A Lex mercatoria pode ser definida, de maneira livre, como a lei do mercado. O conceito, sobretudo, surgiu na Europa medieval e, até por volta do século XVII, se espalhou pelo mundo através dos comerciantes, por mar e terra. Manifestou-se pelo fato de que o mercado pretendia sempre evoluir, bem como as regras internas dos Estados e, para que não houvesse um impedimento nesse aspecto, era preciso um regimento específico a fim de incentivar tal desenvolvimento. No entanto, no âmbito do comércio internacional, a Lex mercatoria – assim como o instituto da arbitragem, que será visto mais adiante – foi se expandido até se tornar elemento indispensável perante a relação de contratos internacionais (SOMMER, 2014). Diante disso, faz-se a abordagem de que

a Lex mercatoria, por não se originar de um sistema jurídico interno, não encontraria obstáculos derivados de regras cogentes e pouco flexíveis destes referidos sistemas.

Assim, a nova Lex mercatoria, por não se confundir com o direito do comércio internacional, se reveste de alto dinamismo, uma vez que seu nascedouro se perfaz através da usos e costumes da prática do comércio internacional.

No entanto, os usos e costumes na Lex mercatoria se materializam de forma diferente que o usual, tornando-se, de fato, uma regra aceita pelos comerciantes, não apenas com a finalidade de serem criadas regras, mas sugerindo-as, através de contratos-tipo ou de regras formadas por entidades internacionais tais como a CISG e a UNIDROIT (SOMMER, 2014, p. 01).

Contudo, além do disposto, a Lex mercatória se ampara e se desenvolve nos parâmetros dos laudos arbitrais, de modo que, a partir destes, estabelece repertório jurisprudencial arbitral, promovendo auxílio na interpretação de casos novos, perante as relações internacionais e, para além disso, auxilia na adaptação das regras apátridas em face da realidade das novas relações negociais internacionais (SOMMER, 2014, p. 01).

Ao se tratar de contratos internacionais, não há como deixar de analisar os conflitos internacionais e, para tal, deve-se destacar o procedimento arbitral, este que tem como finalidade deliberar sobre o assunto, de modo a traçar soluções pacíficas para os conflitos, uma vez que os Estados envolvidos poderão utilizar-se de alternativas para solucionar os litígios e, então, resguardar os direitos adquiridos perante o contrato. A arbitragem surgiu a partir da lacuna judicial existente para os contratos firmados internacionalmente, tornando-se uma regra genérica, universal, capaz de versar sobre assuntos internacionais e, sobretudo, satisfazer as partes perante um desacordo que envolve regras e limites distintos (ZANINI; VAZ, 2014). Frente a isso, dispõem-se as vantagens da aplicação da arbitragem internacional

A arbitragem internacional apresenta como principais vantagens: a especialização dos árbitros, o que torna a solução mais equitativa; a celeridade, por não estar submetida às formalidades cartorárias, bem como resultar em uma decisão definitiva; ser sigilosa, até mesmo pelas quantias monetárias que envolvem tais litígios; ser um método menos dispendioso; flexibilidade procedimental, vez que as partes escolhem o procedimento e a lei aplicável; local neutro para ser proferida a decisão; efetividade, pelo cumprimento espontâneo das partes e o baixo impacto na relação comercial das partes (ZANINI; VAZ, 2014, p. 01).

Por fim, ainda sobre a arbitragem internacional, no Brasil a Lei nº 9.307/96 estabelece regras para o instituto da arbitragem, no entanto, não diferencia a arbitragem nacional da arbitragem internacional, apenas estabelecendo os compromissos arbitrais em consonância às cláusulas arbitrais, estas que são estipuladas no contrato, antes mesmo que haja qualquer conflito, de modo que determina quais as regras serão aplicadas para solucioná-lo (ZANINI; VAZ, 2014).

 

2.3 As críticas acerca do princípio da autonomia da vontade e a vigência da CISG

 

Contratos são firmados a partir de um acordo de vontades estipuladas pelas partes envolvidas, em que ocorrerá a criação, modificação ou, até mesmo, a extinção de direitos. No entanto, o princípio da autonomia da vontade insere que, por haver a liberdade contratual das partes, implicará o poder de determinar o que for de interesse, livremente.  No entanto, essa liberdade deverá existir nos limites da função social do contrato, ou seja, de modo que o interesse coletivo seja observado, como bem expõe o ordenamento brasileiro (CURVELO, 2012).

Sobre a autonomia da vontade, suscitam-se diversas discussões e ideologias doutrinárias. Sérgio Henrique da Silva Pereira dissertar acerca do tema

Pela filosofia libertária, cada ser humano é propriedade de si mesmo, ou seja, pode o próprio ser fazer o que bem quiser com sua vida: vender-se como trabalhador escravo até se prostituir. Alguns libertários dizem que não há nenhuma moral que possa nortear as relações humanas, ou seja, pode até negociar o "canibalismo consentido" (PEREIRA, 1026, p. 01).

Diante da discussão em questão, há de se falar que “a CISG está construída sobre princípios muito compatíveis com aqueles que fundamentam nossas relações jurídicas no âmbito do contrato de compra e venda civil/comercial” (CISG-Brasil, 200?, p. 17)

A CISG, Convenção que disciplina, de maneira restrita, os contratos de compra e venda internacionais, estipulando os deveres e obrigações entre o comprador e devedor, surgiu a fim de se tornar mecanismo universal de formação de contratos dessa natureza. No entanto, é preciso observar que essa Convenção não trata de questões como a validade das cláusulas, ou mesmo usos e costumes, sendo, portanto, utilizadas as legislações internas. É, portanto, uma Convenção limitada à constituição dos contratos internacionais, não observando alguns elementos essenciais para tal relação (CISG-Brasil, 200?).

Relacionando o princípio da autonomia da vontade e o instituto da CISG, entende-se que

Unânime é, por exemplo, a consagração da autonomia da vontade como um dos princípios que embasam a CISG, o que resta explícito no próprio texto do Artigo 6º, que garante às partes de uma relação contratual excluir a aplicação da Convenção ou mesmo derrogar ou modificar os efeitos de qualquer um de seus dispositivos, exceção feita tãosomente ao Artigo 12, por se referir a matéria de ordem pública do país signatário. Esta permissão também é reforçada individualmente em vários outros dispositivos, que contemplam expressões como “unless otherwise agreed” (cf., e.g., Artigos 9 e 35) ou “in accordance with the contract” (cf., e.g., Artigos 29 a 35), ou que de alguma forma estabelecem o contrato como fonte primária das obrigações das partes, fornecendo uma regra subsidiária, em caso de omissão no contrato (CISG-Brasil, 200?, p. 18).

Nesse aspecto, considera-se o princípio da autonomia da vontade como fundamental ao instituto da CISG, encontrando sustentação do artigo 8º desta, de modo que estabelecido o procedimento de interpretação das condutas e declarações das partes envolvidas no contrato, deve ser observada, essencialmente, a intenção daquele que constituiu o ato ou, até mesmo, foi o responsável pela emissão da declaração. Ainda, nota-se que a autonomia da vontade atua essencialmente na formação do contrato, uma vez que, quando não há a intenção de vínculo, não é possível que o contrato produza efeitos, tornando impossível qualquer hipótese de instituição de vínculos contratuais. Ademais, até mesmo a revogabilidade do contrato depende da vontade das partes, em especial do proponente (CISG-Brasil, 200?).

É, portanto, nesse cenário que surgem críticas relacionadas à Convenção em questão, em consonância ao princípio da autonomia da vontade, uma vez que, como dissertado, elementos intrínsecos aos contratos não são abarcados pela CISG, de modo a propiciar conflitos inerentes a essa questão e, assim, demandará de institutos que supram tais interesses, bem como o procedimento arbitral. Considerando que este deve preencher as lacunas existentes entre relações internacionais (ZANINI; VAZ, 2014), a não observância do princípio da autonomia pela CISG, deverá ser, em caso de conflito, acatado por outros regimentos.

 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Incidem sobre toda a sociedade internacional, constantemente, diversos efeitos desinentes da globalização, estes que interferem diretamente na vida e, principalmente, nas atividades humanas. Sendo assim, manifesta-se a necessidade de um instituto capaz de regular as relações recorrentes daqueles efeitos, ou seja, relações estabelecidas por todo o mundo, entre nações diversas, dotadas de ordenamentos e jurisdições específicos, esses que podem causar conflitos de interesse e resoluções. Desse modo, o Direito Internacional Privado emerge, com a finalidade de disciplinar as questões que envolvem diferentes Estados e amparar a sociedade que se depara com a internacionalização.

Na esfera do Direito Internacional Privado, discute-se sobre os diálogos internacionais, instituto que objetiva promover métodos de análise aos processos constitucionais, uma vez que, mesmo com a hipótese de uma instituição julgar em última instância, não cessa a possibilidade de outra instituição refutar tal decisão.

Acerca do tema do presente trabalho, tratando-se de contratos internacionais, é preciso considerar a teoria do Direito Internacional Privado, bem como os princípios e regimentos envolvidos, e, sobretudo, observar o instituto dos diálogos internacionais, uma vez que, nesse âmbito, diversas entidades nacionais são partes, ocasionando conflitos de regras e interesses, de modo a demandar regulamentos específicos que solucionem as diligências.

Para tratar do regimento dos contratos internacionais, o trabalho explora, fundamentalmente, o princípio da autonomia da vontade, inserido no ordenamento brasileiro pelo Código Civil de 1916. Este princípio, por sua vez, está relacionado à noção de que a vontade do homem é determinante para a criação, ou até mesmo a extinção, de atos e fatos jurídicos e, por isso, deve ser relevada perante a instituição dos contratos.

Sobretudo, o trabalho considera as normas e princípios acerca da execução dos contratos internacionais, de modo a explanar a respeito da CISG, da Lex mercatória e sobre os aspectos da arbitragem, sejam internos ou internacionais. Tais considerações permitem um enriquecimento na compreensão do tema em questão, de modo a designar elementos que correlacionam o Direito Internacional Privado, o instituto dos diálogos internacionais e a esfera dos contratos internacionais.

O objetivo do trabalho é desenvolver uma análise acerca dos procedimentos de contratos internacionais, de modo a evidenciar quais são os aspectos dos diálogos internacionais, perante os contratos internacionais, no âmbito do Direito Público. Em vista disso, expõe o princípio da autonomia da vontade em sentido amplo e, ainda, antes do surgimento da CISG, a fim de estabelecer parâmetros de comparação desse princípio. Destaca, também, as críticas suscitadas sobre este princípio após a vigência da CISG. Ainda, discorre sobre a arbitragem, desenvolvendo seus aspectos no âmbito interno e internacional, bem como traduz o princípio da Lex mercatoria, ambos em face da execução dos contratos internacionais.

Considerando que se trata de um tema muito evidente na sociedade internacional atual e, sobretudo, ainda muito recente, ainda há uma grande escassez de doutrina e jurisprudência que abarquem o assunto. Sendo assim, o trabalho tem a intenção de estabelecer noções, promovendo uma maior compreensão acerca do tema, uma vez que retrata o regimento dos contratos internacionais e estabelece parâmetros no âmbito jurídico-social. Para além, introduz pensamento crítico e analítico acerca do tema, coadunando com os princípios do Direito Internacional Privado. Explana, também, o sistema de diálogos internacionais, concedendo diretrizes que circundam os institutos em questão.

 

REFERÊNCIAS

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