O QUE SÃO INDULGÊNCIAS-

"Tudo o que ligares na terra, será ligado no céu"

O termo latino indulgéntia era usado antigamente como sinônimo de outras palavras, tais como: remíssio (quitação, remissão, perdão), relaxátio (alívio, atenuação), absolútio (dissolução, absolvição), bem como indúltum (perdão). Os historiadores do Império romano usavam a palavra no sentido técnico de "remíssio tributi" ou "remíssio poenae", concessões que os imperadores faziam em certas ocasiões.
O que é exatamente "indulgência"?
Consiste na remissão concedida pela autoridade eclesiástica (e válida diante de Deus) da pena temporal devida ao pecado já perdoado. Entendendo bem: quando nos arrependemos e confessamos, o Senhor Deus ? através da Igreja ? nos perdoa (cancela) a culpa (e assim a pena eterna); todavia, todo pecado acarreta uma série de efeitos negativos (para si e para outros) que precisam ser reparados (penas temporais). Para isto existem: nesta vida ? a oração, a penitência e a esmola (Mt 6,1-18), uma conversão ardorosa, o martírio e também as indulgências; noutra vida ? o purgatório. É, pois, uma graça divina!
A existência das indulgências é a ação da Trindade:
> O Pai se revela ao longo da história da salvação como "rico em misericórdia" (Ef 2,4), que faz de tudo para salvar o que está perdido. Por isso à Igreja foi confiado o "ministério da reconciliação" (2Cor 5,18).
> Jesus Cristo confiou à Igreja as "chaves" do reino dos céus (Mt 16,19); deste modo, ela pode distribuir em Seu nome os tesouros de graças divinas, que são abundantes ? sem adulterar o que é expressa vontade divina. O Decreto Cum postquam do Papa S. Leão X (9.11.1518) o confirma.
> O Espírito Santo foi prometido à Igreja (Jo 16,13), assistindo-a nos diversos momentos da sua história. Deste modo, o "novo" e o "velho" sempre hão de se conjugar (Mt 13,52). As "indulgências" fazem parte deste "novo".
Trata-se do valor infinito e inesgotável das "expiações e méritos de Cristo, nosso Senhor", sobretudo pela sua paixão e morte (Catecismo, 1476), e daqueles que Ele quis associar à sua obra redentora ? especialmente a sua Mãe, Maria, e todos os santos e santas (id., 1477). "De sua plenitude todos nós recebemos graça por graça" (Jo 1,16). O Papa Clemente VI declarou em 1343 que a Igreja recebeu do Senhor a missão de administrar este tesouro espiritual "a fim de que fosse distribuído misericordiosamente àqueles que estão verdadeiramente arrependidos e confessados" (Bula Unigénitus Dei Fílius: DS 1026) ? é o 1º documento oficial do Magistério sobre o tema. Parece que a expressão foi cunhada ao redor de 1230 por Hugo de São Caro, O.P.
Podemos também oferecer na intenção daqueles que já partiram deste mundo (cf. Código de Direito Canônico, cân. 994). O Senhor realizará aquilo que for de acordo com sua vontade e bondade.
Nos primeiros séculos, os pecadores que desejassem a absolvição de suas faltas deviam primeiramente prestar satisfação por elas, a fim de, por amor a Cristo, arrancar do seu íntimo as raízes do pecado (p. ex., uma quaresma de jejum, em que o penitente se vestia com sacos e cilício!). Assim, ao ser absolvido (geralmente na Quinta-feira santa), ficava liberto não apenas da culpa, mas das suas conseqüências.
Acontece, porém, que esta praxe se tornou insustentável, pois exigia condições especiais de saúde, e costumava acarretar graves conseqüências para a vida da pessoa. Assim, a Igreja, assistida pelo Espírito, a partir do século VI foi introduzido um novo costume: o pecador recebia a absolvição logo após a Confissão, e devia realizar a penitência depois (Concílio de Hipona, ano 517, cân. 29). No início esta ainda era longa, mas do século IX em diante foi sendo reduzida, em vez de longas peregrinações, podia-se pernoitar em um santuário; em vez de flagelações, uma esmola etc.
Neste contexto surgem então as "obras indulgenciadas", sobretudo na Espanha setentrional e na França meridional (séc. XI): várias obras de piedade, de penitência e de caridade vão sendo associadas pela Igreja aos méritos do Senhor Jesus a partir de então (Papas Nicolau II ? 1060; Alexandre II ? 1063; Urbano II ? 1095). As diversas peregrinações e cruzadas na Terra Santa estimularam o seu florescimento. As mais célebres estão ligadas à igreja da Porciúncula, ainda válidas até hoje (dia 2 de agosto) ? obtidas por S. Francisco de Assis do Papa Honório III em Perúgia, 1216. O 1º Ano Santo em 1300 ? que surgiu por iniciativa do povo romano e depois foi confirmado pelo Papa Bonifácio VIII ? se deu no mesmo espírito de Lv 25,29 ? tempo para se libertar das faltas e de suas penas.
A história ensina que na Idade Média aconteceram abusos a respeito das indulgências...
No século XX a Igreja católica passou por uma grande renovação espiritual. As indulgências não foram abolidas? Não é algo do passado?
Um adágio antigo reza: "O abuso não tolhe o uso" ? i.e., o fato de um grupo de pessoas fazer mau uso de algo bom não o torna mau. O Concílio Vaticano II (1962-1965) procurou atualizar para os nossos tempos "os próprios valores do Cristianismo" (Balthasar, 1965; in Ratzinger, 1969: 252), e por isso em 1967 o Papa Paulo VI publicou a Constituição Doutrina das indulgências e em 1968 o Manual das indulgências (Enchiridion indulgentiarum), que deixa de lado o que é secundário (contagem de dias, anos etc.), confirma a validade das indulgências (chamadas agora: parciais e plenárias), destaca seus fundamentos (dogmáticos, históricos) e amplia o seu horizonte. Por sua vez, o Papa João Paulo II o enriqueceu em 1985.
Para obter as indulgências- Fazendo aquilo que a Igreja indica (ação exterior: Confissão sacramental, Comunhão Eucarística, oração pelo Papa ? ao menos 1 Pai Nosso e 1 Ave Maria ? e a obra prescrita) e com o mesmo espírito que a anima (disposição interior: aversão ao pecado, não estar excomungado, desejo de obter a graça). Existem obras de piedade (algumas orações como o Creio, Salve Rainha etc., a visita ao Santíssimo, às basílicas romanas, ao cemitério, a bênção Papal, ensinar a doutrina cristã e ouvir pregações, participar de congresso eucarístico, sínodo etc.) enriquecidas pela Igreja com especiais indulgências. O referido Manual contempla diversas situações: I ? Cumprir os deveres e tolerar as aflições com confiança e oração; II ? Socorrer os necessitados com os seus bens; III ? Abster-se do que é lícito em espírito de penitência. Mas atenção: não é possível ter certeza absoluta se obtemos ou não à indulgência nesta vida.
O Papa Paulo VI recorda que cada fiel é livre para "usar dos meios de purificação e santificação com a santa e justa liberdade dos filhos de Deus" (Const. Indulgent. doctr., 11). A tradição teológica ensina: "...outras obras de satisfação são mais meritórias sob o ponto de vista do prêmio essencial" (Sto. Tomás de Aquino, In 4 Sent., dist. 20, q. 1, a. 3, q. 1a. 2, ad 2; cf. S. Th. Suppl., q. 25, a. 1). Não somos obrigados, mas o católico deve ao menos saber de que se trata e valorizá-las! De resto, façamos tudo em nome do Senhor e para a sua glória!
"Nós vos damos graças, Senhor, por todos os vossos benefícios.
Vós que viveis e reinais pelos séculos dos séculos. "Amém" (Indulg. Parcial)

Bibliografias-
.THEODOR Schneider, Manuel de Dogmática-Volume II - Editora Vozes- 4ª edição -1992.
. Catecismo da Igreja Católica-Edição Típica Vaticana, Edições Loyola, 2000.
.Compêndio do Vaticano II - Editora Vozes, 2000


BÁRBARA ARAÚJO ELIAS
BARBACENA,10 DE SETEMBRO DE 2011