O QUE EXISTE/NÃO EXISTE

Não temos a capacidade de determinar o que existe e nem o que não existe. A questão é de interação. Porém, costumamos confundir existência com interação, dizendo que o que existe é tudo aquilo com que podemos interagir.

Ora, não podemos interagir com a maioria de nossas emoções, no entanto, elas existem. Então, se interajo com algo, esse algo existe, mas, a inversa é falsa: se existe, interajo.

Podemos, então, estender a definição e dizer que tudo o que podemos experimentar existe. Nesse caso, porém, uma ilusão existe; o objeto de um pensamento qualquer existe; todas as emoções e sonhos existem.

Está difícil definir o que é a existência e o que é a inexistência. Vamos tentar de novo.

Só tem duas coisas no universo: a existência e a inexistência.

O que não podemos experimentar (mais), está na inexistência. Se você não consegue experimentar alguém que morreu, não consegue experimentar santos, anjos ou Deus, eles não existem.

O problema aqui é que a inexistência pode estar localizada nos nossos sentidos, ser uma consequência da incapacidade deles de abarcar o todo, de sentir tudo, de traduzir o verdadeiro, o absoluto.

Por outro lado, devido àquela mesma incapacidade, eles podem inventar coisas que só passam a existir a partir deles, não existindo fora de nós.

Interação “real”:

 
   

Interação “inventada” (ilusão? Alucinação?):

 
   

Assim, não podemos definir a existência e a inexistência com base nos nossos sentidos.

Poucas, pouquíssimas coisas, podemos afirmar como existentes. Muito menos ainda, podemos afirmar como inexistentes.

O que parece não existir, pode existir. O que parece existir, pode não existir.

Temos que encontrar outro método para medir a existência e a inexistência absolutas.

O que deixamos de experimentar, como a companhia de um ente querido que morreu, foi para a inexistência absoluta ou foi para um estado que não temos a capacidade de experimentar?

O que nunca experimentamos, está neste estado ou na inexistência absoluta?

Aqui, somos, de alguma maneira, forçados a escolher a primeira parte do ou. Isto porque não podemos experimentar a inexistência absoluta, medi-la, sondá-la. Se pudéssemos, nada existiria lá (ela seria vazia) e tudo estaria na existência, ou algumas coisas existiriam lá e ela não seria a inexistência. Seria, talvez, aquele estado que, de certa maneira, não podíamos experimentar antes. Não podíamos e não podemos experimentar (pegando a primeira parte do ou) por causa de nossos sentidos limitados. É por reconhecer essa limitação que nos sentimos forçados a escolher a primeira parte do ou.

Por essa razão também, não podemos afirmar que aquele ente querido foi para a inexistência absoluta.

Qual, então, seria o método inegável para medir a existência absoluta e a inexistência absoluta?

Sabemos que nesse método não podem estar envolvidos os nossos sentidos. Existirá alguma maneira de experimentarmos algo ou um não-algo sem ser através de nossos sentidos?

Imagine-se totalmente desprovido dos cinco sentidos. O que te restaria?

O segundo sentido mais usado é o mais fácil de desligar: a visão. Basta fechar os olhos.

Em seguida, em ordem de facilidade, vem o paladar e olfato. É fácil achar um lugar em que você pára de sentir cheiros e gostos.

Depois, temos que desligar a audição. Não é fácil achar um lugar para isso, mas, é possível. E é possível desligá-la indo-se para um ambiente acusticamente isolado.

Agora, o sentido mais usado e o mais difícil de desligar: o tato.

Como não sentir a temperatura ao redor? Como deixar de sentir pressão do chão, da cama, da cadeira, contra o corpo?

Nossa temperatura interna é de cerca de 36 oC, mas, você não se sente bem em um ambiente em que a temperatura externa é de 36 oC. Deveria se sentir bem, já que iguala a temperatura do corpo, mas, não se sente. Isso implica que a temperatura na periferia da pele é bem menor que a temperatura “normal” do corpo. Não é 18 oC, pois, isto nos faz sentir frio. Talvez seja . É por aí. Talvez seja 25 oC.

Então, vamos supor que a 25 oC não sentimos a temperatura local.

Agora, como deixar de sentir a pressão do chão? Deixando de sentir a reação à gravidade. Para isso, devemos ir para a gravidade zero, coisa que não é para qualquer terráqueo. Vamos supor que podemos ir para um tal lugar.

Então, você vai para um lugar escuro, sem gostos, sem cheiros, silencioso e com gravidade zero.

Vamos supor ainda que você não está sentindo dor ou desconforto, nem mesmo uma coceirinha. Em suma, você não percebe teu próprio corpo. O que te resta de percepção?

An-hã! Você se percebe, mesmo que não esteja pensando em uma coisa específica. Que sentido é esse? Não é um dos cinco sentidos, pois, estão todos desligados. Não importa, é um sexto sentido e ele, por si só, é prova de que podemos experimentar algo sem o concurso dos cinco sentidos naturais.

Imagine agora que tenha milhões de pessoas ao teu redor nas mesmas condições que você. Cada um se perceberá, mas, nenhum perceberá o outro.

Quem pode garantir que não estamos vivendo em um mundo assim, onde, em vez de pessoas isoladas, haja grupos isolados? Ninguém. Ninguém pode negar isso.

Dentro de cada grupo, os indivíduos se percebem, interagem, mas, não o podem fazer entre grupos.

O que acontece se você perde o sexto sentido na situação anterior (em que já havia perdido os 5)? Você estaria experimentando o não-algo? Você estaria desaparecido (para si mesmo), morto, da maneira que experimentamos aqui (aqueles que continuam vivos em relação a você), em que o corpo desaparece totalmente?

Quando eu durmo, eu desligo os meus cinco sentidos (não vejo meu quarto, não sinto gosto, não sinto cheiros, não ouço ruídos e não sinto o meu colchão).

Se eu sonho, eu me percebo (sexto sentido).

Note que quem se percebe é a minha versão que está acordada no sonho. É ela que tem consciência de si mesma. Minha versão “real” aqui, está inconsciente, deitada na cama. Quando eu acordo, minha versão que estava consciente no sonho se torna inconsciente e minha versão “real” se torna consciente novamente, trazendo na memória tudo o que a versão do sonho experimentou.

E se não sonho? Experimento a inexistência no presente dormindo ou no presente acordado (futuro do presente dormindo)?

Experimento-a no presente dormindo, mas, só terei consciência disso no presente acordado. Tanto a versão “real” quanto a versão acordada no sonho ficam insconscientes. Para a minha versão “real” ter aquela consciência, depois de acordado, preciso ter experimentado uma referência antes do período de inexistência e experimentar essa mesma referência após ele. É a diferença temporal entre as duas experiências que me dará a largura daquela inexistência. Sem as referências, o gap (intervalo) desaparece e não haverá como ter a consciência da inexistência, mesmo a tendo experimentado.

Então, temos duas coisas diferentes:

EXPERIÊNCIA (fato) E CONSCIÊNCIA (leitura do fato)

A consciência é o nosso sexto sentido.

A quantidade de coisas que podemos experimentar é bem maior do que a quantidade de coisas que podemos perceber. Falta-nos o sétimo sentido!

Agora, devemos procurar sentir sem os cinco sentidos e sem a consciência.

Mas, como? É a consciência que faz a leitura dos fatos. Sem leitura é como se não tivesse havido experiência.

Então, não podemos ficar sem a consciência, pois, é ela que nos faz vivos para nós mesmos (interação com fatos).

O nosso sétimo e último sentido, então, seria ampliar a consciência, para que ela leia mais fatos.

Como ampliar a consciência?

Ora, como ampliar um dos cinco sentidos? Por que cegos ouvem bem melhor do que aqueles que enxergam? Por que surdos-mudos, sem problemas visuais, enxergam bem melhor que os que ouvem e falam?

A conclusão é só uma: um sentido ofusca o outro. Todos os cinco sentidos, que são usados pesadamente no dia-a-dia, ofuscam a consciência.

O que são os sonhos senão uma ampliação da consciência? Só se sonha quando a maioria, se não todos, os cinco sentidos estão desligados. Em alucinações, muitos sentidos estão desligados.

Assim, para ampliar a abrangência da consciência, os cinco sentidos tem que ser desligados. Mas, não devem ser simplesmente desligados, por qualquer meio que seja. Tem que haver um controle, pois, o corpo, sendo material, pode ser atingido por outro material que o pode machucar ou até destruir, e o que nos protege disso são os cinco sentidos, principalmente os dois mais utilizados.

Só depois que sua consciência for ampliada, expandida, você expandirá seus horizontes, onde serão incluídas nele coisas que você, erroneamente, afirmava inexistentes. Erroneamente porque não podemos afirmar a inexistência de coisa alguma, nem agora e nem quando tivermos a consciência ampliada, pois, por mais que ela seja ampliada, ainda ficará coisas de fora.

No máximo, você pode e poderá dizer: Esta coisa ou esta entidade não pode me contatar e eu não posso contatá-la.

Contato é interação. Interação é uma via de mão dupla, porém, não simultânea.

Você pode contatar coisas ou pessoas que, por suas vezes, não conseguem contatar você. A inversa é verdadeira: uma entidade pode te contatar, sim, mas, você não pode contatá-la, não pode percebê-la, não pode senti-la.

Você sabe que pode perder contato consigo mesmo. Quando isso acontecer e você puder perceber, você dirá que você não existe!!!.

Então, não diga que isso ou aquilo não existe. Diga e aceite que você não pode fazer contato.

Brasilio – Abril/2013.