O QUE É O SONHO IV

Quando você está sonhando, você vê ou faz a realidade do sonho se transformar. Às vezes, você deseja que ela mude e, às vezes, não deseja, mas ela muda assim mesmo. Então, não é apenas você que pode alterar aquela realidade.

Quando ela muda, você percebe, e quem está em teu sonho percebe também. Será que quem está em teu sonho altera a realidade de lá? Se esta pessoa vier para cá, ela altera a realidade aqui? Não, porque ela pode estar aqui, mas não percebemos qualquer alteração em nossa realidade. Então, ela não altera aqui e não altera lá. E você não altera aqui e não altera lá.

Alteração demanda tempo (ou define um intervalo de tempo – eu faço questão de insistir na inexistência de uma coisa chamada tempo, para tentar fazer com que as pessoas parem de tomar o efeito pela causa. Nesse caso específico, o desenrolar da alteração é que define um intervalo que chamamos de tempo e não o contrário: porque o tempo passa é que a alteração acontece. Veja, é exatamente o contrário: devido à evolução da alteração, de um início a um fim, é que temos um intervalo que chamamos de tempo).

A velocidade das alterações na realidade do sonho é diferente da velocidade de "nossa realidade". Por isso, a sensação de tempo lá é bastante diferente da daqui. O que chamamos de tempo, passa muito mais rápido lá, apesar de tuas atividades ocorrerem "na mesma velocidade" de tuas atividades aqui, ou seja, você age normalmente lá, da mesma maneira que age aqui. Porém, dependendo do sonho, você acorda com a nítida e verdadeira sensação de que coisas que você fez lá demandaram (e demandariam aqui) mais tempo do que a quantidade que decorreu do lado de cá.

O mesmo tipo de alteração da realidade acontece nos dois mundos, mas as percepções são diferentes. A percepção que você tem lá é a que você leva daqui. Por isso você descobre, depois que acorda, que tudo lá aconteceu numa velocidade (em termos de relógio, calendário) bem maior.

Se o "tempo" passa mais rapidamente no sonho, então, dormir envelhece. Por outro lado, não dormir, encerra tua vida. Você morre novo, ou seja, não envelhece.

Morre por que? Porque as estruturas que sustentam a tua vida estão no máximo desgaste. O sono é necessário para diminuir este desgaste e tratar da reconstrução.

Não existe esse negócio de envelhecer. O que existe é substituição de estruturas, uma espécie de evolução.

Mas, por que não posso ficar com a mesma idade e com estruturas novas a cada dia?

Se há substituição, não tem como permanecer com as mesmas estruturas. Quanto a ficar com a mesma idade, é você que escolhe: se a duração de tua existência define vários intervalos que você chama de anos e o acumulo destes intervalos você chama de idade, então não tem como você permanecer com a mesma idade.

Por outro lado, as estruturas novas que você ganha funcionam como a continuação das estruturas velhas, pois estas definem também uma passagem de tempo e, daí, envelhecem.

Apesar de nos sonhos executarmos tarefas que definem intervalos de tempo, será que envelhecemos realmente lá, como dissemos?

A sensação que temos é que não. Parece que, lá, permanecemos com a mesma “idade”, apesar do “tempo” continuar passando.

Lá você se fere e sara imediatamente, fica doente e se cura imediatamente, morre e, ao mesmo tempo, está vivo. É como se tudo realmente andasse a uma velocidade extremamente grande lá. Um machucado que duraria 10 dias para cicatrizar, sara em segundos, sem deixar marcas, o que poderia levar 3 meses aqui.

É como se, aqui, esticássemos o intervalo de tempo (sem esticar o passo do relógio) em que fazemos nossas tarefas diárias, fazendo em 1 dia o que demandaria uma semana para ser feito. Enquanto, para você, passaria 1 dia para fazer um trabalho, para teu colega, que faz o mesmo tipo de trabalho passa uma semana, para executar as mesmíssimas tarefas que você executou em 1 dia!!!

Isso implica que, enquanto para você apenas 1 dia se passou, para ele se passaram 7 dias. O que implica, por sua vez, que você só envelheceu 1 dia, enquanto ele ficou 6 dias mais velho do que você.

Então dormir não envelhece?! Sim, envelhece, mas, mais devagar. Agora, sonhar não envelhece? Depende do tipo de sonho e de sua frequência.

Vamos tentar ver de outra forma.

O sonho é uma prova da relatividade do tempo. É uma prova de que o que determina a passagem do tempo como sentimos são as coisas como observadas pela consciência.

Nosso estado vibracional nos sonhos é bem mais alto do que aquele que temos quando acordados. Ao interagirmos com as coisas nos sonhos, a sensação que temos lá é a mesma que temos aqui: o tempo “passa” normalmente, porém, essa passagem temporal lá é muito mais rápida quando comparada com o tempo passado aqui para os mesmos tipos de interações.

É aqui que você perguntaria: Como o tempo passa mais rápido nos sonhos, então envelhecemos mais rapidamente lá?

Refazendo a sua pergunta: As coisas e pessoas envelhecem mais rapidamente nos sonhos?

Se você comparar as coisas e pessoas de lá com o calendário de lá, não, pois, são os passos das coisas e das pessoas que determinam o calendário local; se você comparar as coisas e as pessoas de lá com o calendário daqui, sim, elas estão ficando mais velhas lá do que você aqui.

Mas, uma coisa você tem que notar: envelhecer tem a ver com o tic-tac do corpo (afetado pelo estilo de vida) e não com o tic-tac dos relógios e calendários.

Vamos supor que uma pessoa pare de envelhecer e continue viva (é, pois, até onde sabemos, no momento em que morremos, paramos de envelhecer) normalmente. O calendário e os relógios continuarão “andando”. Em termos de calendário, essa pessoa continua envelhecendo. Em termos biológicos, não (ela parou de envelhecer, como dissemos).

Calendários e relógios (baseados na rotação e translação do planeta ou em nossa consciência – enquanto você observa uma pessoa, esse ato determina uma passagem de tempo) nunca vão parar. Mesmo que o universo desapareça e nós juntos com ele, ficando aqui apenas um relógio que continue funcionando, podemos imaginar que ele vai continuar “marcando” o tempo.

O que determina o meu envelhecimento são as minhas funções biológicas no mundo em que estou e não a passagem do tempo medida por um observador externo ao mundo em que estou. Eu lá no mundo dos sonhos e você aqui na realidade envelhecemos no mesmo passo (ou quase), só que terei muito mais experiência de vida do que você.

No sonho eu sonho, ou seja, posso sonhar que estou dormindo e, nesta dormida em sonho, eu sonho. É sonhar que estou sonhando! Será que no sonho dentro do sonho o “tempo” passa mais rápido ainda? Se assim é, deve haver um sonho aninhado (um dentro do outro até quase ao infinito) em que o tempo passa tão rápido que a sensação de tempo desaparece, ou seja, há um último sonho em que, depois dele, nada existe, não é possível sonhar dentro dele, talvez só dormir, como numa espécie de morte final. Não ficam lembranças do sonho último+1.

No sonho eu penso, isto é, enquanto sonhando, o meu eu lá pensa, raciocina e, às vezes, deduz que está sonhando. Sim, dependendo do contexto em que o sonho se desenrola, você pode comparar a situação com a situação em que você se encontrava quando foi dormir. Se você foi dormir em São Paulo e, de repente, se vê em Londres, facilmente você pode deduzir que está sonhando, e, daí, pode fazer coisas que seriam impossíveis ou temerosas enquanto acordado. O problema é que ninguém sabe quão tênue é a linha que separa uma realidade da outra.

Aquele filme, A Origem (The Inception – o sentido do título original é inserir, colocar alguma coisa em algum lugar – no caso, queriam plantar um pensamento na cabeça de alguém), mostra bem isso, quando a esposa do personagem principal se atira da janela de um prédio, tendo a máxima certeza que está num sonho e que, assim, nada de ruim aconteceria a ela. O problema é que ela estava nesta realidade aqui, sem o saber.

O mesmo filme também dá a ideia de que existe um sonho, dentro de outros sonhos, em que, se você chegar nele, não mais poderá retornar. Seria, então, a sonho último+1, de que falei acima. O filme também mostra que, a cada nível de sonho que se desce, um intervalo de tempo do nível anterior estará multiplicado.

É possível ocorrer um desarranjo cerebral que nos leve a pensar da mesma maneira. Esse é o risco: como saber se estamos num sonho ou não? Uma maneira, é tentar transformar alguma coisa com a força do pensamento. Mas, e se o cérebro estiver afetado de tal maneira que faça com que você enxergue o que você imagina? Para mim, só há uma maneira: ter a certeza máxima. Nenhum desarranjo cerebral, seja natural ou causado por drogas, vai manter a tua certeza máxima inabalável. Assim, se ela permanecer inabalável, você está sonhando (sem trocadilho!). Isso pode ser treinado. É, você pode treinar enquanto sonha!

Sonho em sonho e pensamento em sonho. A diferença entre os dois é tão clara quanto o é aqui na realidade. Pensamento não é sonho e sonho não é pensamento.

Dentro de um sonho posso sonhar e posso pensar, mas, dentro de um pensamento não consigo pensar, simultaneamente, em outra coisa sem interromper o primeiro pensamento. Assim, não é possível aninhar pensamentos como se pode aninhar sonhos. Mais ainda: dentro de um pensamento eu não sonho, mas dentro de um sonho eu penso.

Enquanto acordado, eu penso (tenho pensamentos) e imagino. A imaginação é uma espécie de sonho acordado. É o mais próximo que eu posso chegar em ter um estado de vigília dentro do outro, em contraposição de ter um sonho dentro do outro.

Brasilio – Junho/2011.