O QUE É O NADA, AS FORMAS E AS IDÉIAS

Não podemos definir o nada – essa já é sua definição! Se o definirmos da maneira usual de definir coisas, o estaremos indefinindo, ou seja, estaremos destruindo o seu significado, pois isto é a única coisa que ele possui: significado.

Pelo fato de não podermos definir o nada é que temos uma boa idéia do que ele seja. É mais que uma idéia, é um sentimento. Mas é um sentimento que não tem uma causa definida, e mesmo que tenha uma causa, esta é uma constante, pois, para nós, o nada está sempre presente. Ele pode ter tido um início, junto com o início de nosso consciente. Mas isso significa o início de uma percepção, o que implica a anterioridade do nada.

Para nós, uma pessoa que não existe faz parte do nada, mas se ela passar a existir não terá vindo do nada.

Aparentemente, a sensação do nada vem como uma reação à sensação que temos do tudo. Mas a sensação do tudo não é completa, pois não estamos aptos a definir o tudo também. Se bem que nem tudo nas sensações deriva de algo definido, por isso, talvez, a sensação do tudo seja, sim, completa. Qualquer coisa que for acrescentada no tudo, que nos era desconhecida, não vai alterar a sensação.

Através desse sentimento do que é o tudo é que sentimos o que é o nada.

Podemos concluir que tudo já existe. O que ainda não conhecemos não está no nada, mesmo que nunca venhamos a conhecer.

O nada não contém coisas e nem ingredientes para produzir coisas, pois estes ingredientes seriam, de certa forma, coisas também.

Quando eu disse que “tudo já existe”, esta afirmação só pode ser aplicada 100% à matéria, pois são as combinações entre os elementos (que já existem) é que dão forma às coisas.

Fica por resolver a questão do antes desses elementos, sejam eles o que forem: átomos ou partículas elementares (elétrons, neutrinos, quarks). Não vieram do nada, não tiveram início. O que tem início vem de onde?

Algumas coisas surgem de combinações naturais dos elementos. Outras surgem através da manipulação desses elementos pelo homem. No segundo caso deu-se forma a uma idéia. E no primeiro caso?

As combinações criam coisas que não existiam, mas estas coisas não são elementares em si, por isso não existiam, são APENAS formas, não vieram do nada, como alguns dizem. Podemos argumentar, sim, que a forma não existia e, portanto, era nada. A forma pode desaparecer, ir para o nada novamente, mas seus elementos constituintes permanecem. Com três palitos de fósforos você forma um triângulo, mas o triângulo não existe, só uma forma-triângulo. A ideia do triângulo é passada por um rótulo que se cola na forma para diferenciar de três palitos numa fila circular (sim, circular é girar em 360 graus. Não é preciso que se tenha sempre o mesmo raio).

Uma casa que não existia é apenas uma forma criada através da combinação dos tijolos. Ela é uma forma que confundimos com uma coisa. Se você se agigantar de tal modo que a casa lhe pareça um grão de areia, ela não mais será a coisa “casa”, mas um grão de areia. Mas os tijolos estarão lá!

Lá no fundo, no microscópio, teremos a mesma casa que você via antes de se aumentar de tamanho. Da mesma maneira, os grãos de areia que você pisoteia agora na praia podem ser casas! Cuidado aonde pisas!

Veja que formamos coisas com outras coisas já prontas, que são apenas formas também. Aquém destas (no nível molecular ou atômico), não temos mais formas, porque não podemos visualizá-las. Não sabemos o que são.

As formas são concretizações de idéias, tenham elas vindo de uma cabeça humana ou não. Sabemos que algumas formas não foram construídas pelo homem. No entanto, não há como dissociá-las de como resultante de uma ou mais idéias, apesar de muitas parecerem simples acidentes.

No caso das combinações naturais referidas há pouco, poderíamos dizer que uma entidade superior deu forma às suas ideias. Aí então, tudo se transforma numa questão de manipulação: pela entidade superior, pela Natureza e pelo homem.

O homem sempre compreendeu bem isso, daí ele ter colocado nas mãos da entidade superior tudo aquilo que ele é incapaz de criar. Daí ele ter dado forma a essa entidade superior. É uma forma desprovida de sub-blocos, pois é uma forma-idéia. Isso, porém não implica que essa “invenção” seja falsa, pois não sabemos se a causa dela foi uma necessidade interna (foi criado como eu crio – eu não criei – alguém mais capacitado criou) ou externa (uma idéia incutida na cabeça dos homens – uma revelação ao pé de ouvido).

As combinações naturais, por outro lado, não podem ser produtos da aleatoriedade, porque isso implicaria todas as possibilidades, inclusive de formas. Sentimos que a quantidade de formas que estão por aí poderia ser bem maior, mas não é o caso. Tem coisas que não combinam. Há uma lei, e só existem duas maneiras de surgir uma lei:

1)      Alguém escreve (tem a idéia). Aí, ela é normalmente uma regra, um protocolo – mas é tudo lei.

2)      Ela é observada na Natureza (e alguém a anota).

Uma lei não é uma coisa, no sentido de ser composta por elementos materiais. Ela não tem uma forma que possa ser sentida. Não importa o teu tamanho agora, você vai percebê-la sempre do mesmo jeito.

Deixemos de lado as leis humanas, pois todos sabemos como e por quem foram criadas.

Existem várias leis naturais. Elas nunca mudam em sua essência, mas o efeito de uma única lei pode variar segundo as circunstâncias.

A lei da gravidade, por exemplo, vai variar seu efeito sobre você caso você se agigante, mas ela em si não muda. É nesse sentido que “você vai percebê-la sempre do mesmo jeito”.

As leis humanas determinam como as coisas a que elas se referem devem funcionar. E as leis naturais?

Das duas, uma:

1)      Determinam como as coisas vão funcionar.

2)      O funcionamento das coisas explicita as leis.

No primeiro caso elas têm que preexistir às coisas que regem (ou ao modo delas funcionarem) e, daí, têm que ter sido criadas (pensadas). Isto nos obriga a admitir a entidade superior e poderíamos parar por aqui.

No segundo caso elas são apenas efeitos colaterais do funcionamento das coisas. Se uma coisa alterar seu jeito de funcionar, a lei observada estará alterada.

Assim é. As leis naturais não foram pensadas, não foram criadas. Não são resultantes de uma idéia, mas resultantes de coisas que podem ter sido resultantes de uma idéia. Aparentemente dispensamos a entidade superior.

De onde surge uma idéia? Vem do nada?

Sabemos que coisas (matéria) não vêm do nada, mas idéias não são coisas. Idéias, enquanto não existem, são comparáveis ao nada, estão nele, fazem parte dele, são ele, mas não derivam dele. Qual é a diferença entre uma idéia que não existe (está no nada) e um lapso de memória? Enquanto no nada são equivalentes. Uma idéia pode passar a existir. Um lapso de memória é equivalente a uma idéia que nunca vai existir.

Vamos um pouco adiante e tentemos fazer o caminho de volta: idéias podem resultar em coisas. Para isso, a idéia pode ser de dois tipos:

1)      Idéia pensada.

2)      Idéia acidental.

Idéia pensada implica uma entidade pensante. Idéia é uma seqüência de pensamentos que “formata” alguma coisa, seja a própria idéia, uma ação ou algo concreto (que possa ser percebido pelos sentidos), nesta seqüência. Não tem como dar saltos (idéia para algo concreto, por exemplo), mas é possível ter-se apenas a idéia, ou a idéia mais a ação. Mas o próprio fato de se ter a idéia já é uma forma de ação. Mais: a própria idéia pode embutir, além da ação, uma coisa concreta, simultaneamente. Mas a concretização, às vezes, só é perceptível para o autor da idéia. Por isso, parece que há um salto, e daí, um “milagre” ou mágica.

Mas, de onde veio a idéia. Como ela começou?

A maioria das idéias se inicia pela observação de um “problema” externo. O problema é a causa da idéia. Muitas vezes não há uma causa externa presente, mas, obrigatoriamente, houve uma causa no passado, com possibilidade até de ter sido de outras vidas. Uma causa pode também ser formada de uma causa externa em conjunto com outras causas internas, mas a externa sempre existe.

Em idéias acidentais podemos classificar todas aquelas para as quais não há como associar uma entidade pensante que seja humana.

Vejam o exemplo da penicilina. Havia um problema, mas ninguém conseguiu concretizar a idéia da cura (de uma doença, no caso). Então, um acidente “aconteceu”, e Alexander Fleming ficou na posição de quem teve a ideia.

Claro que foi uma “ideia” de um conjunto bem maior, pois não era SÓ a penicilina que serviria para combater a tal doença.

Qual a diferença entre fazer um único movimento que ganhe o jogo de xadrez e descobrir a penicilina?

Tentativa e erro pode levar uma eternidade, nos dois casos. Tentativa e erro é conhecer a arma sem conhecer o alvo. Para ter a idéia de que o bolor era efetivo, Fleming teria que conhecer cem por cento o alvo (a bactéria) antes.

Vejam o corpo humano. A idéia de criá-lo não foi de nenhum homem (se alguém queria uma verdade absoluta, aqui está uma). Mesmo que tenha sido um acidente, nenhum homem pode se colocar na posição de quem teve a idéia.

Bom, idéias pensadas têm como causadores um problema externo. E idéias acidentais, aquelas que resultaram em coisas que estão aí sem terem sido criadas pelo homem, têm uma causa?

Vamos supor duas coisas e analisar cada uma delas:

1)      O que aí está é o resultado de idéias (e, forçosamente, estas idéias têm um autor).

2)      O que aí está é o resultado de acidentes que, depois, não permitiram outros acidentes que destruíssem o que foi feito (ou ocorreram de um jeito menos pior – apesar de pior e perfeito só poderem ser definidos depois).

Em termos do que vemos por aí, não temos muito o que discutir sobre o caso 1. O que vemos, apenas vemos. Não temos em mãos provas de seu autor, o que nos faz pensar que não existe um autor. Isto é plausível.

Se admitirmos que existe um autor sem que verifiquemos isto, então nada mais teremos para discutir. Ou talvez tenhamos: ele formou tudo o que aí está com as partículas elementares. Estas partículas são ondas de energia postas em movimento da mesma maneira que as ondas de pensamento. Essa energia deriva da “cabeça” do autor, ou seja, é seu pensamento.

Então, tudo o que aí está não veio do nada, mas veio de uma cabeça pensante e que ainda pensa (sim, porque quando você para de pensar numa forma ela desaparece, e o mundo ainda está aí!).

A questão que fica aqui é: quem é o autor e de onde ele veio? As suas idéias (o que aí está) tiveram como causa um problema?

Para mim, a questão 2 merece uma discussão bem menor. Primeiro porque ela é tão ou mais simplista que a questão 1; segundo, ela é muito mais improvável.

De qualquer maneira, o “acidente” tinha que começar com alguma coisa, isto é, antes do acidente alguma coisa já existia, e estas coisas eram as partículas elementares, as ondas de energia postas em movimento da mesma maneira que as ondas do pensamento. Ora, essas ondas não têm como terem sido causadas por um acidente, pois estamos tratando do acidente primordial!

O que é essa energia e de onde ela veio? Quem é o autor e de onde ele veio? Ele tinha um problema que o levou a criar tudo o que aí está?

Para começar, ele não veio do nada, porque o nada não existe, é só um sentimento reativo. Isso implica que ele sempre existiu, ele é. A nossa dificuldade em aceitar isso se deve ao forte conceito que temos de tempo e espaço, que são limitadores. Ora, perguntar quem o inventou é a mesma coisa que perguntar quem inventou a eletricidade, ou a gravidade, ou a luz.

Ele tinha um problema para ter a idéia de criar tudo o que aí está? A resposta correta é: sim, tinha. E qual era? Talvez ele quisesse eliminar o enorme (infinito) sentimento que ele tinha do nada. Essa é exatamente a maneira com que agimos em situação semelhante. Não é?

E como ele criou? Energia-pensamento (do mesmo modo que fazemos!).

O que ele é? Energia-pensante. Não “energia que pensa”, mas, pensamento como força. Não creio que haja uma língua no mundo que possa defini-lo com poucas palavras. Pense no que você é e você terá um guia para saber como ele é.

Se a base de toda a matéria é formada pelas partículas elementares, então a matéria não pode ser destruída. O que desaparece é a forma, devido ao fim da cooperação entre as forças que mantêm a forma. A forma vem do nada, é o nada e continua na percepção que temos. Matéria não vem do nada, mas tudo que percebo teve um início para mim. Tudo que percebo tem as mesmas características temporais daquilo que acabou de iniciar, daquilo que vai iniciar daqui a pouco e terminar ou não. Não consigo perceber nada que não tenha duração, por ínfima que seja eu percebo. Até a percepção que tenho de mim mesmo tem uma duração. Por isso me dou um início. Dizem que este início foi quando eu nasci (ou fui concebido fisicamente), mas eles não estavam em mim para poderem afirmar isso. E só me lembro a partir de bem depois. Por isso, esta sensação de inicio, seja do que for, pode não ser verdadeira. Por isso a invenção do nada como o conhecemos.

Brasilio – Fevereiro de 2005/Julho 2005.