O QUE É O MERECIMENTO

O que você tem feito para merecer a paz? O que você tem feito para merecer felicidade? O que você tem feito para merecer calma em teus momentos mais estressantes? Merecimento é algo que se recebe ou é algo que se cria?

Ficamos sempre achando que merecemos algo, que alguém ou alguma coisa nos dê o que achamos que merecemos naquele momento. Estamos sempre cobrando, via um pensamento ou via uma oração. Não paramos por um só instante para analisarmos se merecemos. Queremos o que achamos que merecemos e ponto final. Muitas vezes até obtemos, mas não percebemos ou desvalorizamos, porque o desejo desenhou algo que era bem menor do que o desenho feito pelo próprio desejo, da mesma maneira que criamos uma expectativa de medo muito grande quando vamos andar numa montanha russa pela primeira vez e, depois, vemos que o medo causado ficou bem abaixo do que esperávamos. Aí perdemos um pouco de interesse. A segunda vez não tem mais graça.

Temos uma forte tendência de desejar, de querer, pois é muito mais fácil desejar que algo venha até nós do que fazer, do que construir, do que ir buscar. Ir em busca dá uma ideia de trabalho e trabalho dá uma ideia de cansaço. Achamos que qualquer espécie de trabalho é cansativo, então desejamos, pedimos, oramos. Depois sentimos uma frustração pelo desejo não ter resultado em alguma coisa, mesmo que o tenha, mas a diminuímos. Nós mesmos nos damos um exemplo, todos os dias, de que só o trabalho resulta naquilo que queremos. Demora, mas resulta. Pode até cansar-nos, mas resulta. Tendo consciência, mesmo lá no fundo do inconsciente, de que o resultado do trabalho demora, procuramos pular essa fase pedindo e orando. Não obtendo resultados ao pedir, ao orar, maldizemos aqueles a quem pedimos ou oramos, mas, em nenhum momento perguntamos se merecemos aquilo que desejamos. Sentimo-nos perdidos e desemparados nesse Universo, com um sentimento de falta de um pai ou mãe universal. Aí caímos e ficamos chorando e chamando por eles, não sabendo para onde olhar ou onde buscá-los, mas não nos mexemos para iniciar essa busca. Talvez chorando eles venham até nós. Mas, saiba que não teremos lágrimas suficientes, porque essa espera será do tamanho da eternidade.

Veja os passarinhos, eles desejam ou vão em busca? Veja aqueles gnus da planície africana na época da seca. Será que eles ficam desejando que a pastagem verdejante que veem na outra margem do rio venha até eles? Não e não. Eles vão em busca dela, caindo na boca de crocodilos dentro do rio ou nas garras de leões lá do outro lado do rio. Este é um exemplo extremo de trabalho, mas real.

Quem de nós deseja vida mais difícil, mais trabalhosa? Ninguém, mas ninguém mesmo. Mas, nossos crocodilos e leões estão sempre à nossa volta, só aguardando o momento de nos devorarem, se assim o permitirmos.

Nossos crocodilos e leões são o trânsito pesado, os ônibus e trens lotados no nosso caminho para o trabalho (que chato, que cansativo – será que não dar para ganhar sem trabalhar?), as dificuldades financeiras, os conflitos com desconhecidos, com conhecidos e conosco mesmos.

Mas eu pergunto: que gnu não trocaria de vida conosco? Todos. Cada um deles faria essa troca correndo até aqui, trabalhando, porque não desejam, vão atrás e, assim, merecem.

Então, não aguarde teu prêmio, vá buscá-lo. Você quer paz? Construa-a. Quer felicidade? Exercite-a. Quer calma? Abra teus olhos e olhe para aquilo que te tira a calma. Abra os olhos e saia da escuridão. Na escuridão vive o desconhecido, aquilo que o homem mais teme, o que mais o apavora.

Quer acabar com teus conflitos internos? Igualmente, abra teus olhos e encare-os de frente. Só com essa atitude você acaba com mais da metade deles. Só com a atitude em si. Não precisa nem iniciar um trabalho.

Não conhecemos nem 1% do Universo, mas temos a capacidade de encará-lo de frente, de pensar sobre ele, com trabalho, não com desejo, como se ele fosse uma imagem nossa que vai nos pegar no colo e nos levar aonde está o nosso desejo.

Não conhecemos nem 1% de nós mesmos, mas temos a capacidade de nos levar até onde está o objeto de nossos desejos.

Merecer é conquistar com trabalho. Trabalho físico e trabalho mental. Desejar, querer, não é trabalho mental. Trabalho mental é libertar a mente, derrubar barreiras, acabar com qualquer tipo de preconceito. Só assim teus desejos serão satisfeitos como se você nada estivesse fazendo para obtê-los, como se não estivesse trabalhando. Aí, sim, você passa a merecer.

O merecimento exige o sacrifício total e para sempre de teus preconceitos, sejam externos ou internos. Isso não é tarefa fácil, pois preconceitos são como cascas de feridas. Assim não só deseje. Deseje e trabalhe.

A frustração que sentimos depois de um desejo satisfeito é a medida negativa de um trabalho que não fizemos para satisfazer aquele desejo. Quando você trabalha por aquilo, quando você dá algo em troca, sua satisfação é positiva e não negativa (frustração).

Brasilio – Setembro/2010.