O QUE É IMORTALIDADE

Só existem duas maneiras de um ser humano alcançar a imortalidade:

1)      Manter o corpo vivo para sempre.

2)      Considerar que somos espíritos imortais vestindo um corpo.

Qual destas duas maneiras é a mais provável?

Somos recriados fisicamente a cada instante, mas não psicologicamente. No nosso modo particular de ver, a sensação que temos é que o corpo envelhece (isso é fato), mas não o nosso corpo psicológico. Quer alguns queiram, quer não queiram, podemos visualizar aqui três entidades: o corpo que envelhece, a forma do corpo que muda muito devagar (por mais que o tempo passe, quem te conhece vai sempre te reconhecer) e o corpo psicológico, que não muda (você vai sempre se reconhecer, a menos que você sofra uma despersonalização, que é considerada uma doença, pelo menos para aqueles que se dizem entendidos). Para facilitar, vamos chamar o corpo orgânico e sua forma de CORPO apenas, e o corpo psicológico de EU.

Será que o CORPO realmente importa para nós? O que mantém pouco variável o CORPO e fixo o EU? É uma coisa para cada um ou só uma para ambos? É improvável que exista uma quarta entidade que controle aquelas três. Pelo menos não sentimos isso. O que sabemos, com certeza, é que o EU pode fazer qualquer coisa com o CORPO, mas este nada pode fazer com o EU (seja contra ou a favor). Mas, além de poder fazer qualquer coisa com o CORPO (contra ou a favor), o EU pode fazer qualquer coisa consigo mesmo, contra ou a favor. Se você se acha feio, você está falando do teu corpo. Não é ele que está te fazendo feio, é você que está fazendo isso. Por dois motivos: a beleza não é algo absoluto; você não é teu corpo, pois ele muda, você não muda. Se você está doente, não é o EU que fica doente (a menos que queira), é o CORPO.

O CORPO é importante para nós sim, seja ele orgânico ou mecânico (ORGA ou MECA, usando as expressões do filme AI – Inteligência Artificial), pois, até onde a ciência sabe, é só através dele que o EU pode se manifestar. Você pode interagir com um dispositivo que esteja fora do planeta Terra, mas, até agora, é o CORPO que tem que fazer a ponte (interface) para o EU interagir. Futuramente (podem ser necessárias várias gerações ou daqui a 1 segundo), poderemos executar essa interação sem ajuda do corpo, já que é possível hoje o próprio EU causar modificações, tanto no CORPO como em si mesmo, apesar de termos mais facilidade para prejudicar do que para curar (seja uma doença ou uma falta de conhecimento). E, partindo desse nosso jeito corrente de ser, em vez de fazermos aos outros o que queremos que nos façam, fazemos aos outros aquilo que fazemos a nós mesmos! No dia que o EU começar a ser, dali pra frente, só positivo com o CORPO, o ditado bíblico vai começar a valer automaticamente. Por enquanto, parece que o EU não precisa do (ou não quer o) CORPO, assim como parece não precisar do ELES (as demais pessoas). Será que o EU é realmente independente, como nossas ações, para o bem ou para o mal, sugerem?

Como manter o CORPO vivo para sempre e, ao mesmo tempo, garantir a continuidade do EU?

Você poderia continuar a existir numa destas formas:

1)      Duplo, com EUs diferentes. É você e um sósia seu, mas não é você. Esta situação existe, apesar de sósia perfeito não existir (levando-se em conta a parte orgânica).

2)      Duplo, com um mesmo EU. Essa situação não existe, nem mesmo no caso de um corpo (não CORPO) com duas cabeças. Sempre há dois EUs diferentes, mesmo que eles sejam organicamente iguais (CORPO). É isso que leva a ciência a acreditar que o EU é o cérebro (mas, pode estar no cérebro, ou se manifestar através do cérebro, com input e output!!!). Se você der um cascudo numa das cabeças, as duas vão sentir ou apenas a cabeça cascudada vai sentir?

Na Teoria dos Universos Paralelos, essa situação existe, isto é, você não é duplo, mas, sim, “infinituplo”, com todas as possibilidades possíveis, desde sósias perfeitos até corpos físicos e formas que nada tem a ver com você. Mas, forçosamente, obrigatoriamente, o EU é único, mesmo que eles não falem isso na Teoria.

3)      Único, com EUs diferentes. Você está com uma doença mental ou está possuído por um segundo EU, o que dá na mesma. Não admitimos a segunda hipótese porque só conseguimos enxergar um cérebro só. Ora, se um aparelho receptor de radiofrequência (um cérebro só) pode sintonizar várias emissoras diferentes, por que nosso cérebro não?

De qualquer maneira, essa situação existe. Você pode encontrá-la em alguns tipos de hospitais, ou na rua, ou na casa ao lado, ou até dentro de tua cabeça, quando você estiver em conflito consigo mesmo, ou olhando-se num espelho e conversando consigo mesmo, mesmo em pensamento.

Você se olhando no espelho consegue, ao mesmo tempo, ser um duplo com EUs diferentes e um duplo com um mesmo EU.

4)      Único, com um mesmo EU. Esta é a situação que mais existe, à qual damos o nome de “estado normal”. Pelo menos é o que cada um acha de si. Eu sou normal!!!. O problema é que só podemos “enxergar” comportamentos, mesmo os nossos próprios. Ninguém nunca pode saber o que o outro está pensando, mesmo que o outro seja nosso próprio inconsciente. Normal significa bem mais que isso

Bom, devemos concluir que o EU só poderá viver para sempre se o CORPO permitir. Mas, como o CORPO não tem vontade própria, pois ele faz parte da natureza material, assim como os tijolos da parede de tua casa, a vida eterna do EU só poderá depender dele mesmo (nesse caso ele já estaria imortal) ou de um CORPO indestrutível e, ao mesmo tempo, controlável pelo EU. De preferência um CORPO que o próprio EU não possa machucar.

Até o corrente ano de 2010, nada existe que vai te garantir uma vida eterna em teu corpo ou em outro corpo qualquer. Você pode tomar todos os cuidados possíveis para preservar o invólucro de teu EU. Pode tomar todos os remédios e vitaminas possíveis para manter teu CORPO funcionando, mas, não vai impedir com isso o desgaste natural e necessário de teu corpo físico, pois é esse desgaste que o faz funcionar. Interrompa esta atividade e teu EU ficará sem morada mais cedo do que você imagina.

O CORPO é mantido pela alimentação orgânica. Você só pode fazer parte dessa alimentação depois que você morrer. Essa alimentação só pode fazer parte de você se você a transformá-la (quando você morre, você é que é transformado pela natureza). Para você transformar a alimentação em blocos de construção de teu CORPO, você se utiliza do próprio CORPO para isso, o que exige esforço. Esforço leva a desgaste. Com o tempo, o que sai (devido ao desgaste) ultrapassa o que entra, em quantidade. Então, você começa a descer ladeira abaixo. Não tem saída: tua vida começa com você tomando sopinha e acaba com você tomando sopinha.

Há muita pesquisa sendo feita para tentar-se preservar a vida, pelo menos por um pouco mais de tempo. A pesquisa por vida física eterna é feita mais, no meu entender, por alguns desesperados que, provavelmente, sentem que não fizeram tudo que desejam fazer na vida, e o que tem ainda a fazer ultrapassa em muito a duração de mil vidas normais.

Pesquisam-se duas coisas: transplante de cérebro e transferência do EU para uma máquina, um robô consciente.

Transplante de cérebro é uma coisa difícil. Não é como mudar teu computador de uma sala para outra, ou melhor, de um gabinete para outro. É mais difícil que pegar um processador Intel e transformá-lo num processador AMD só com os componentes do primeiro.

O cérebro não é um órgão à parte[1]. Ele faz parte de um sistema que se distribui por todo o corpo. Este sistema contém canais físicos e cada canal físico tem um número indeterminável de canais psicológicos, além de canais fisiológicos. Os canais físicos estão mudando a cada instante (pela renovação celular). Isso afeta os canais psicológicos e fisiológicos. Alguns canais psicológicos têm existência efêmera, do tamanho de uma emoção, por exemplo. E isso afeta os canais fisiológicos e físicos.

Um transplante de cérebro, mesmo que se conseguisse reconectar todos os canais físicos (fibras nervosas), o que não se consegue ainda (mesmo uns poucos), e supondo que os dois indivíduos (doador e receptor) tenham exatamente o mesmo mapeamento físico orgânico, não funcionaria porque os canais fisiológicos e psicológicos não poderão ser refeitos. Mesmo que, de alguma maneira, o fossem, há mais chances de termos um terceiro indivíduo do que um dos dois originais. Sem falar, mas já falando, na possibilidade desse terceiro indivíduo ser defeituoso, mentalmente e, depois, fisicamente, com o passar do tempo.
Vamos usar a imaginação e supor que conseguimos transplantar com sucesso físico e fisiológico o cérebro do indivíduo A para o indivíduo B. Vamos supor que apenas o cérebro foi transplantado. O resto da “fiação” é do indivíduo B, que teve seu cérebro (só o cérebro) jogado no lixo.

Se B acordar e falar: Bom dia, eu sou A, então o EU acompanhou o cérebro (ou está no cérebro, como alguns gostariam que eu dissesse aqui). E se B acordar e falar: Bom dia, eu sou B? O EU não acompanhou o cérebro, ou não está no cérebro ou está é na “fiação”. Se ele acordar e falar: Bom dia, eu sou C, quem ficou louco, A ou B? Sim, o rádio passou a sintonizar outra estação, que não uma das duas primeiras.

Quanto a fazer um upload de um cérebro orgânico para uma máquina, supondo que ela suporte toda a capacidade cerebral, é muito mais difícil ainda, pois ficarão faltando os canais fisiológicos e psicológicos, dos quais não se tem a menor ideia de como funcionam.

A ciência supõe que é a estrutura cerebral que define o EU e suas funções, daí, para fazer o upload, bastaria a máquina replicar a estrutura cerebral do indivíduo que vai ganhar o novo corpo.

O maior entusiasta do EU ROBÔ (isso foi de propósito!), é um cientista americano chamado Raymond Kurzweil. Ele parece ser uma cara legal (pelo que li de seu semblante numa única foto que já vi dele até hoje, naquela revista Wired), mas, mesmo que não seja legal, a contribuição que ele já deu para a humanidade faz dele um cara legal, quer ele queira ou não, quer ele tenha ganhado dinheiro com seus inventos ou não (acho que tem que ganhar sim, mas outros devem ter ganhado muito mais às custas do Dr. Kurzweil).

Ele fala de uma tal de singularidade, onde toda a nossa vida mudará de uma forma inimaginável, da mesma maneira que se fala em singularidade em um buraco negro, onde não se pode imaginar o que ocorre.

Segundo ele, a transferência do EU para uma máquina deve ocorrer de maneira semelhante ao que ocorre hoje, quando o nosso CORPO é totalmente renovado materialmente, apesar de manter a forma geral. O problema é que a Natureza faz isso muito lentamente, peça por peça (ou célula por célula). E o processo parece ser o inverso do que se imagina, apesar do efeito ser o mesmo:  o EU é que é transferido para o corpo, mas reembrulhado lentamente por um novo CORPO. A alternativa que o Dr. Kurzweil coloca para isso é a de ir-se substituindo cada célula, ou conjunto de células, ou tecido ou órgão por um equivalente cibernético, à maneira do Homem de Seis Milhões de Dólares (barato, muito barato), série de TV dos anos 80. Ele era chamado também de Homem Biônico. Hoje é mais usada a expressão cyborg (cybernetic organism).

Já se consegue hoje alguma coisa de real nesse campo, principalmente quanto a braços e pernas, mas nada sobre órgãos e, principalmente, nada sobre cérebro, onde deve ficar alojado o EU, segundo a Ciência.

Deve demorar ainda uns cem anos para se ter um pulmão biônico, por exemplo. Mais cem para fazer o CORPO aceitá-lo. Outros quinhentos anos para ter os demais órgãos e mais uns dois mil para se ter um cérebro biônico que quase faça o que uma formiga faz.

O Dr. Kurzweil fala da Lei de Moore, do desenvolvimento de computadores. Segundo essa lei, a velocidade de melhoria dos sistemas computadores segue uma função exponencial em relação ao tempo (por exemplo, dobra a cada dois anos, significando que o que vai aparecer daqui a dois anos, vai aparecer melhorado um ano depois, e seis meses depois desse depois, e assim por diante).

A evolução exponencial da tecnologia não implica na possibilidade de se ter um MECA completo a partir de um ORGA. Pelo menos não para essa tecnologia que trabalha apenas com energia condensada em matéria.

O Dr. Kurzweil não quer morrer. Eu também não quero, e também não quero que os outros morram. Ninguém quer morrer, mas, apesar desse nosso não-desejo, não temos e nem podemos ter o controle disso. Não podemos ter o controle, porque morrer é uma lei natural, reconhecida pela própria Ciência.

Se a massa e a energia do universo resultam numa constante, viver para sempre romperia a lei de conservação da energia. Eventualmente, toda a massa e energia do universo ficaria contida em humanoides flutuantes, no lugar de planetas e estrelas. Haveria gravidade? Haveria gravidez?!

Só nos resta, então, esperar que haja uma energia totalmente diferente do que conhecemos e do que possamos imaginar, e esperarmos, também, que façamos parte dela, que sejamos partes dela. Sendo assim, essa parte é nosso EU, e assim já somos imortais, pois, se há uma lei de conservação para a energia bruta, muito mais razão há para haver uma lei de conservação para uma energia superior.

Se o EU é imortal, como ter consciência disso? Como interagir com ELES, sejam físicos ou não? Como interagir com as coisas materiais?

O problema é que quem faz estas perguntas é alguém que ainda não devolveu o corpo (não o CORPO) para a natureza. Daí, ele não tem condições de obter resposta sobre algo que está além da matéria e energia cotidianas.

Talvez já estejamos tendo consciência de nossa imortalidade. O fato de estarmos vivos nos dá um vislumbre dessa consciência. Nosso problema é com o significado de eternidade. Achamos que sabemos, mas, na verdade, não temos a mínima ideia de que tamanho é o para sempre. Não temos a mínima ideia de qual é a duração real de nossa vida, assim como você não terá nenhuma ideia de quanto tempo dormiu se for dormir enxergando, acordar cego e ninguém te passar informações.

Ninguém pode saber se quem morre perde seu EU. Só posso interagir através de meu CORPO, assim também, quem morre só poderia interagir através de seu CORPO, que foi destruído junto com o corpo. Se eu não tenho o CORPO não vou conseguir interagir com nada corporal, ou material.

Interajo comigo mesmo. Então, interajo com o meu EU. Assim, posso interagir com ELES, sejam físicos ou não, esteja eu num CORPO ou não. Claro que, quanto mais sintonizados, maior será a interação. A sintonia entre duas entidades é maior quanto mais próximas uma da outra estiverem suas vibrações. É muito mais fácil interagir com um vivo enquanto vivo do que um dos dois estando em situações diferentes.

Finalizando, é melhor ser eterno do que viver eternamente num corpo.

Brasilio – Jan/2010



[1] Diz-se que o cérebro do Einstein foi retirado e está “preservado” em algum lugar. Será que Einstein aprovou isso? Se daqui a três mil anos este cérebro for transplantado em alguém, terá o mesmo efeito que colocar uma abóbora na cabeça do sujeito