O QUE É DEUS II

Deus é uma necessidade dos humanos. É um desejo por algo que os aliviem, que lhes dê esperança, que lhes tire do “inferno” em que se sentem estar.

Deus não pode ser definido, não pode ser afirmado, não pode ser negado.

Qualquer definição o tornaria conhecido. Ele não é conhecido. Ao contrário: é totalmente desconhecido.

Aquela necessidade nasceu com o homem e morre com ele. Desde o primeiro homem é assim (não importa de onde ele veio – a partir daquele momento ele começou a sentir a necessidade).

Durante toda a sua vida, o que ele percebe, o que ele sente, é aquela necessidade. Muitos que sentiam com força acabaram escrevendo sobre isso; outros, atuando mais como observadores, acabaram escrevendo sobre outros que sentiam a necessidade de Deus. Disso surgiram a Bíblia e outros livros “sagrados”.

Deus é a invenção mais poderosa já criada pela mente humana. É tudo o que o homem desejaria ser: estar mentalmente presente em todos os lugares do universo simultaneamente (onipresença); saber de tudo, no passado, no presente e no futuro (onisciência); ser capaz de resolver qualquer coisa (onipotência). Se bem que essas três coisas só existem em sua mente. Talvez um dia ele consiga isso, se conseguir, também, ser infinitamente bom, pois se ele ficar sozinho, de que lhe adiantará todo aquele poder?

Deus definido assim, qualquer coisa lhe fica submetida, seja uma pedra, as árvores, os homens, o universo ou o demônio.

Este (o demônio) é considerado o motor da necessidade de Deus, ou seja, aquilo do qual o homem deseja fugir, pois o demônio personifica todo o mal e toda a maldade que homem nenhum quer para si. Devido ao resquício que o homem ainda tem de ser o centro do universo, ele tem o defeito de adaptar tudo à sua imagem. Daí, criou uma imagem para o demônio, assim como criou para Deus. E como ele se sente um ameaçador e, estranho, ao mesmo tempo, ameaçado, ele criou estas figuras para aumentar seu poder de ameaça.

O demônio só existirá, então, enquanto a necessidade de Deus não for satisfeita, o que implica que ele é também uma necessidade, mas uma necessidade a ser repelida para que a outra seja alcançada.

O demônio é outra invenção da mente humana. A necessidade dele só existe para aqueles que não se sentem capazes de satisfazer a necessidade de Deus.

Se o homem nunca tivesse aprendido a escrever o mundo seria diferente? Sim, claro. Mas, ele sentiria a necessidade de Deus? Se o mundo, desde o princípio do homem, só contivesse fartura de tudo que o homem necessita, certamente não, ele não sentiria a necessidade de Deus, pois, de certo modo, a necessidade já estaria satisfeita.

Se o mundo seguisse o caminho que seguiu, mas sem a escrita, sim, ele sentiria a necessidade de Deus, mas, ninguém teria escrito sobre isso. Mas sua situação seria bem pior pois, quer queiram quer não queiram, a palavra escrita causa alívio em muita gente, principalmente nos mais “ignorantes”, pois são os que sentem mais a necessidade. Mesmo que estejam enganados, seu alívio é sempre maior que os que se dizem letrados. Estes não conseguem se satisfazer, sua fome é maior, necessitam de explicações. Eles aumentam seus conhecimentos sem aumentar sua competência. Isso faz com que eu me lembre da chamada Lei de Peter: Quanto mais cargos um funcionário galga numa empresa, mais aumenta seu nível incompetência. Eu diria que mais aumenta sua ignorância.

Os “letrados” só podem “achar”; os ignorantes têm sua certeza. Isso os diferencia. No fundo somos todos ignorantes. Só que uns sofrem mais que outros.

De qualquer maneira, a palavra escrita nunca foi responsável pela necessidade de Deus.

O que gerou essa necessidade no homem? Provavelmente a dor, a falta de conforto.

Por que ele sempre sentiu dor e falta de conforto? Provavelmente porque cada um, individualmente, sempre quis se tornar um deus maior que os demais. Isto é, cada um tem seu próprio Deus, sua própria necessidade, e ela é só sua. O outro faz parte da sua dor, de seu desconforto.

Os animais sentem a necessidade de Deus? Se sim, a sentem menos do que os homens. Eles buscam se livrar da dor e do desconforto, mas são mais objetivos. São totalmente ignorantes no que tange a desconforto mental, porém, algo que os aliviem é sempre bem-vindo (não seria uma espécie de Deus?).

As plantas sentem a necessidade de Deus? A elas se aplica o que se aplica aos animais, mas em menor grau.

Os minerais sentem a necessidade de Deus? Parece sem sentido esta pergunta. É sem sentido por causa da definição humana para dor e para desconforto.

Esta pergunta equivale à pergunta “Deus existe?”. Dependendo das definições dadas ao redor, a resposta pode ser sim ou não. Mas um “sim” ou um “não” não fazem uma verdade.

ACHO que Deus, como é concebido pelo homem, não existe.

AFIRMO que nenhum homem pode afirmar que não existe um Deus e nem que existe um Deus.

Brasilio – Junho/2004.