O QUE É A VERDADE II

No futuro descobriremos verdades que deixarão de ser verdades no passado.

A verdade é relativa. A verdade está sempre no efeito, nunca na causa. Por isso ela é relativa.

Se alguém não fala com você, parece te ignorar e é uma pessoa que nunca teve contato com você, ou a causa disso está em você ou está nela. Mas o efeito está SEMPRE nela, e é uma verdade para ela: ela “não gosta” de você. Você pode saber que ela está errada, pois pode não existir um motivo para ela não gostar de você. Então ela não está com a verdade. Mas esta é a tua verdade, não a dela. Cada um tem a sua própria verdade.

Por ser relativa, é muito difícil, senão impossível definir a verdade. Ela só pode ser definida em termos relativos, o que a torna relativa também. Assim, a verdade não precisa ser verdadeira (absoluta, imutável para sempre).

A verdade está intrinsicamente ligada aos nossos sentidos. É uma “invenção” humana. Mais: é uma invenção de cada um, que pode permanecer ou se dissolver no momento seguinte. Nesse sentido, também os demais animais têm sua verdade. Por serem desprovidos do sentido de lógica, o conjunto-verdade deles é muito maior que o nosso. Não estou dizendo aqui que eles conhecem a verdade e nós não. Não existe isso de “conhecer a verdade”, pois esta expressão implica em se conhecer a verdade absoluta, que ninguém e nada conhece.

Alguns definem a verdade como a descrição da realidade. Mas, pelo fato de a realidade não ser confiável, isto torna a verdade derivada daí não confiável também, apesar de ainda continuar verdade pela definição (ela descreveu uma “realidade” e, enquanto ela estiver de acordo com aquela realidade, ela é verdadeira em relação àquela realidade).

Veja o caso acima, em que uma pessoa não (parece) gosta de você. Nesse sentido de gostar, a realidade para você é que ela não gosta de você, e, daí, você tira uma verdade. Mas, a realidade para aquela pessoa pode não corresponder exatamente à tua realidade. Então, em relação à tua realidade, você tem uma verdade. Em relação à realidade dela, você não tem uma verdade.

Aí, você cria coragem, e vai lá perguntar para ela se ela gosta de você (tentando descobrir se a verdade dela bate com a tua) ou perguntar porque ela não gosta de você (passando para ela uma verdade que é tua):

  1. Você gosta de mim?
  2. Por que você não gosta de mim?

Ela poderá responder não para a primeira pergunta. Querendo ou não, esta resposta te forçará a fazer a segunda pergunta, mesmo que seja para você mesmo (você fica se questionando porque ela não gosta de você).

Respondendo não, ela pode:

  1. Estar criando uma verdade para ela mesma que não corresponde à realidade do que ela pensa (tá te zoando).
  2. Estar querendo se livrar de você (não quer papo agora).
  3. Ter um motivo para não gostar de você, que pode estar baseado num fato verdadeiro ou falso, mas, em qualquer caso, verdadeiro para ela.

Fazendo a segunda pergunta, você vai descobrir se é um desses casos. Os dois primeiros vão destruir a tua verdade. O terceiro pode destruir a tua verdade, quando você der explicações para ela, o que vai gerar um fato oposto ao que ela estava pensando (vai destruir a realidade que ela tinha construído sobre você, vai gostar de você e tornar falsa tua verdade de que ela não gosta de você), ou vai confirmar a tua verdade (a tua vai bater com a dela). Neste último caso, uma realidade nova (um fato novo) para você, mas não nova para ela, vai surgir, apesar de ele já preexistir (ela não gostava de você antes de você saber o motivo que sabe agora).

A tua verdade agora está reforçada pela verdade dela. Você tem a tua verdade (ela não gosta de mim) e a verdade dela (porque eu sou isso/fiz aquilo).

Mas, a tua verdade te afeta. Você vê como um ataque a você. Por isso você foi questionar aquela pessoa. Agora você ficou sabendo que foi você quem forneceu as armas para aquele ataque. O que te resta agora é destruir a verdade dela, seja reparando ou se reparando ou deixando que o tempo faça essa destruição (ela pode ver qualidades em você que, com o passar do tempo, a fará esquecer aquela realidade). Mas, a verdade dela vai sempre estar com você.

Outras pessoas costumam definir a verdade como a descrição de um fato. Ora, um fato pode estar inserido na realidade (não confiável) ou numa ficção. Mas, a verdade continua sendo verdade, pela definição.

Dessa maneira, um ou mais testemunhos não tornam um fato verdadeiro (absolutamente). Para alguém de fora do grupo de testemunhas, o fato não será tão verdadeiro quanto as testemunhas fazem parecer.

Onde está a verdade absoluta?

Uma coisa é certa: em termos daquilo que chamamos de realidade palpável, que envolva pessoas, suas reações e reações acima da capacidade humana que afetam ou poderiam afetar nossos sentidos, a verdade absoluta não existe para nós, enquanto dependermos de nossos cinco sentidos e mesmo de um sexto sentido que alguns acham que tem.

É em cima disso que as pessoas criam suas verdades. Umas se baseiam em fatos que seus sentidos lhes mostraram (estas são as que acreditam, da mesma maneira que você acreditou que uma tal pessoa não gostava de você. No fim, aquilo se confirmou ou não), enquanto outras se baseiam em não-fatos que seus sentidos lhes entregaram, ou seja, nada lhes mostraram, a não ser um vazio. Estas últimas são as que não acreditam. Elas têm tanta razão quanto as que acreditam, pois é lógico acreditar em um fato que se apresenta (e ele é sempre real e verdadeiro para quem o percebe), mas não é lógico acreditar num fato que não se apresenta (o que não se percebe é irreal e falso).

A verdade absoluta é aquilo que se apresenta, independentemente de nossos sentidos, independentemente de percebermos ou não, real e verdadeiro eternamente.

Os que acreditam, talvez percebam um pedaço da verdade absoluta. Os que não acreditam nunca percebem o mínimo dela, mesmo que ela esteja lhes roçando a face.

Brasilio/Dezembro-2009.