O QUE É A LOUCURA

Para nós, alguém está louco quando age de um modo fora dos padrões estabelecidos. Por exemplo, se alguém começa a falar extremamente alto numa praça pública, alguns já o tacham de louco; se esse alguém começa a falar extremamente alto dentro de sua casa, a vizinhança vai tachá-lo de louco; um vizinho que acabou de se mudar para a casa ao lado também vai tachá-lo de louco. Mas se ele for apenas um tanto surdo, é certo esse vizinho chamá-lo de louco? Sabemos que toda pessoa meio-surda fala muito alto. Nesse caso ele não é louco, certo? Então, em alguns casos, alguém é louco até que eu saiba exatamente o que faz com que ela aja fora dos padrões estabelecidos. Agora, se além de ele falar alto, fala só coisas desconexas, aí sim, até quem o conhece vai tachá-lo de louco. Mas, e se ele fala coisas desconexas bem baixinho? Ou, se ele nem fala, mas apenas pensa coisas desconexas? Alguém vai tachá-lo de louco, ainda que ele realmente seja? Não, claro que não. Então, alguém é louco quando faz coisas fora dos padrões estabelecidos e suas ações afetam nossos sentidos materiais. Se ele corre de um lado para outro, ele é tachado de louco porque nós podemos vê-lo fazer isso. Se ele for uma criança, é doente; se for um adulto, é louco mesmo. Se a criança atira uma pedra contra uma vidraça é moleque; se é um adulto (e está sozinho) é louco.

Por que agimos assim? Por que temos a tendência de julgar alguém a priori? Por que temos preconceito? Porque temos medo de ficarmos sozinhos, fora da maioria. Porque achamos que ajudar é nos tornarmos iguais a quem estamos ajudando. Se ajudarmos o louco, estaremos loucos ou ficaremos; se ajudarmos o doente, ficaremos doentes. O bom é não ajudarmos ninguém para ficarmos imunes, para não termos nada que nos possam cobrar. Será que isso não é uma doença, uma espécie de loucura?

Então existem dois tipos de loucura: uma que depende do contexto em que o candidato a louco se encontra e outra que independe de contexto, que é doença mesmo. Do primeiro nem vou tratar, porque se um louco de verdade for encontrado lá, então ele pertence ao segundo tipo.

Quando alguém está tendo alucinações constantes, essa pessoa é colocada no grupo loucos (não gosto desta palavra nem de suas derivadas, mas não tem outra que defina tão bem este tipo de estado). A Ciência define a alucinação como COISAS QUE ESTÃO NA MEMÓRIA, MAS QUE PARECEM QUE ESTÃO ENTRANDO PELOS SENTIDOS. Acho essa definição muito simples e incompleta. Se estão na memória então entraram pelos sentidos, e se entraram pelos sentidos então não foram alucinações. A menos que as informações que entram para a memória possam se embaralhar e formar coisas que nunca entraram pelos sentidos. Pode ser. Pode ser também que essas coisas venham de fora e entrem diretamente na memória sem passar pelos sentidos e de lá saírem dando a impressão que estão entrando pelos sentidos, ou podem, até mesmo, estar entrando pelos sentidos de quem as experimentam. Mas a própria memória é um dos nossos sentidos, imaterial, mas é. Então o alucinado pode ser louco ou não, mas todo louco é um alucinado.

Ele se vê como um objeto que pode ser atirado para qualquer lado. Adapta imagens a tudo e a todos, imagens essas que o ameaçam ou o faz rir ou que têm medo dele (daí ele ataca). Imagem de seu pai, imagem de sua mãe, de seu filho, de uma criança, da professora, de um cão, de uma pedra, do mal, do bem, tudo junto e alternando.

O que causa a loucura? Acho que é falta de sincronismo entre pensamento e memória, entre consciência e inconsciência. Esse sincronismo não existe nos bebês. Um adulto agindo como um bebê seria tachado de louco, mas o bebê agindo como bebê não pode ser tachado de louco, porque não o é, assim como o adulto agindo como adulto. Se um bebê começar a agir como um adulto ele estará louco? Claro que não. Será tachado de louco quem disser que viu tal fato.

Mas tem muito mais que isso. O louco se fere e fere os outros. É destruidor, é bondoso, é indiferente. Experimenta todas as emoções simultaneamente ou em sequência não lógica. É como se, de repente, uma pessoa sã se transformasse no receptor de todos os pensamentos do mundo. Sim, porque qualquer ato é precedido de um pensamento. Se quem pensou não realizou, o receptor vai realizar.

Somos todos causadores das loucuras e estamos sempre a um passo dela. Em nós ou em algum lugar indeterminado existe um filtro poderoso que impede a recepção de todos os pensamentos, de todas as vibrações psíquicas ou pseudo-psíquicas (causadas por interações entre vibrações não-psíquicas).

Qual seria o passo que falta para nos tornarmos loucos? Para nos tornarmos loucos basta perdermos a consciência de nós mesmos. A consciência que temos de nós mesmos é que controla nossas atitudes e determina nossos limites em relação a nós mesmos. A consciência que temos dos outros determina nossas atitudes e limites em relação a eles. A perda desta consciência, mesmo mantendo a primeira, também é loucura. Loucura nada tem a ver com maldade. O maldoso não é louco; o louco não é maldoso. Maldade implica consciência de si mesmo e dos outros. O louco não fica mau, mas o mau pode ficar louco, e aí ele estará curado da maldade. Hitler não era louco, era mau.

O que seria o filtro que nos impede de ficarmos loucos? Ele não pode ser algo fora de nós, porque se for, tem que ser algo inteligente, que sabe manipular e escolher o que é prejudicial e o que não é. Este ser teria que ser bom e mau e mais poderoso que o homem. Qualquer ser mais poderoso que o homem necessariamente é melhor que ele, portanto não pode ser mau. O único que tem essa característica é o próprio homem. Portanto o filtro está em nós. E esse filtro é nossa própria consciência. É ela que separa o que é bom do que é prejudicial. É ela que nos permite calcular nossas ações, medir se elas vão prejudicar alguém ou não. Isso é controle, é estar controlado.

Loucura é, de novo, a perda da consciência, a perda do controle, a perda da capacidade de discernir entre o que é prejudicial e o que não é.

Mas, o que causa a loucura?

Sabemos que temos uma força em nós, uma força interior que chamamos de espírito ou alma. Nosso espírito, pelo menos enquanto vivos, só pode se manifestar através do corpo. O corpo não fica louco, assim como uma pedra não fica louca. O que fica louco é o espírito, a alma. Porém o corpo pode causar a loucura do espírito. Se o corpo está prejudicado de tal modo que haja dor constante e intensa para o espírito, ele pode ficar louco; se o espírito não consegue vislumbrar um futuro, como se livrar da dor ou ver a paz que virá ou ver algo além do nada, ele pode ficar louco; se o espírito não consegue se manifestar plenamente através do corpo, isso poderá ser chamado de loucura; se ele se manifestar descontroladamente através do corpo, isso será loucura.

Ficar louco é descer a um nível extremo de ignorância, seja por inveja, ciúme, orgulho, ou pela perda da própria consciência.

Brasilio Jan/2000