Odair foi um primo que morou por uns tempos em minha casa quando eu era garoto. Era já moço e eu apenas um frangote que começava a se achar um rapaz. Um belo dia apareceu lá em casa com uma jaqueta de couro preta, dessas que os motoqueiros usavam nos filmes americanos. Quando o vi, corri para ver a Harley Davidson, mas ele não tinha moto e estava mesmo na penúria.  Que pena, pensei. O irmão mais velho dele teve uma Harley e o dia em que apareceu lá em casa pilotando a máquina para uma visita, foi um sucesso no bairro. Minha mãe muito descolada, pegou uma carona na garupa da moto para o trabalho e a vizinhança toda comentou, chegando a afetar a sua reputação entre as senhora e senhores da redondeza. Ela nem ligou e eu, pelo contrário, fiquei orgulhoso da coragem dela. Ela adorava aventuras e depois nos contou o sucesso que fez com suas colegas ao chegar na garupa de um jovem motoqueiro. Precisou explicar que era seu sobrinho e afilhado para não ficar falada na empresa.

Mas voltemos ao primo sem moto e sem dinheiro que morou em casa por dois anos. Ele chegava tarde, minha mãe se preocupava, mas ele era maior de idade e devia saber o que estava fazendo, dizia meu pai.   Algumas vezes ele me levava a tiracolo em bailes e festas ou no futebol de várzea, mas nas noitadas eu não tinha chance. Ele contava as suas aventuras amorosas que eu aguardava ansioso para ouvir as narrações picantes dos seus encontros.

Numa dessas contou-me que depois de um baile levou uma dona para casa e por lá dormiu. A mulher tinha um filho de uns dez anos e dormia no mesmo quarto. Fiquei chocado com a história do menino e por muito tempo aquilo vagou em minha cabeça. Ele mesmo achou desagradável, mas o que fazer? Achei uma tristeza o pobre menino vendo sua mãe trazer homens para casa na sua presença. Imaginava o garoto acordado e ouvindo os gemidos da mãe.  Provavelmente ele ainda não havia lido Freud e o famoso complexo de Édipo. Sorte dele, pois poderia ficar mais encucado ao saber que os filhos desejam a mãe só para eles e inconscientemente gostariam de se livrar dos pais. O problema maior é que essa mulher devia levar um cara diferente por semana para a cama. Pobre menino. Espero que não tenha tido problemas pela vida promíscua da mãe.

O primo já empregado, acabou sendo fisgado por uma amiga de minha irmã, uma linda morena, de origem portuguesa chamada Maria Capitolina, tal como a famosa personagem do Machado de Assis. No início do namoro chegou a contar-me alguns detalhes proibidos, mas depois fechou-se em copas alegando que não ficava bem falar sobre essas coisas da noiva. Era uma falta de respeito com sua futura esposa.  Concordei com ele, mas fiquei com saudades das histórias das mil e uma noites que ele contava. Mas nos intervalos, ele, um incorrigível Don Juan, tinha uns casos paralelos. Um deles era uma vizinha ruiva, bem assanhada, que passava uns tempos na casa da tia. Foram histórias bem picantes que serviram para alimentar a minha imaginação repleta de luxúria dos quatorze anos.

Quase de casamento marcado vi o primo arrumando as malas para voltar para o interior. Sem muitas explicações rompera o noivado. Com as duas alianças no bolso, ele voltou do seu último encontro com a sua Capitu numa noite chuvosa e fria.  Voltou mais cedo do encontro semanal e nunca mais a viu. O noivado acabou tão rápido como começou.  Estava triste, mas não choroso. Reclamou das mulheres e me aconselhou a não confiar nelas. Um dia ela vai se arrepender e eu estarei longe, bem longe. “Mulheres são todas iguais”, resmungou sem esperanças.

Tempos depois o encontrei no interior quando passava férias na fazenda de um tio. Ele estava tirando um ano sabático por lá, indo aos bailes com meus outros primos e ajudando-os na lida com o gado. Mas logo descobri que estava apaixonado por uma morena de olhos azuis que morava na fazenda ao lado e circulava por lá. Depois de alguns dias, já estava de namoro com a moça e prometia, dessa vez, que iria se casar e ter filhos como convém a um rapaz de boa família.

De fato, soube depois que havia se casado e mudado para o Mato Grosso onde seu irmão possuía uma grande fazenda.  Nunca mais o vi, mas soube que conseguiu suas próprias terras, teve filhos e netos como eu. Virou evangélico, abandonando a vida mundana de outrora.  E sempre que me lembro dele, vem à tona aquele menino dormindo no quarto onde a mãe transava com os rapazes que encontrava nos bailes.   Sabe-se lá por quê. Talvez Freud explique.