O PAC e a lenda grega

 

No cenário das disputas eleitorais ─ as eleições se aproximam ─ articula-se  o movimento oposicionista, que pretende averiguar a quantas anda o PAC ─ Plano de Aceleração do Crescimento ─ patrocinado, escusa dizer, pela Situação, e gerenciado por Dilma Rousseff, candidata do Governo à Presidência da República.   

 

Gosto da idéia. Digo, gosto da idéia de fiscalizar o gasto público. Mas duvido muito que a fiscalização possa prosperar, se o critério das buscas não estiver bem definido, antes da primeira vistoria.  

 

Inclusive, a iniciativa corre o risco de malogro ou até mesmo de ridículo, caso a Oposição se descuide de fixar, ainda em gabinete,  o critério norteador da pesquisa, critério esse que permita separar o joio do trigo, vale dizer, que permita estabelecer com clareza  os possíveis desvios da rota estabelecida pelo Plano.  

 

Um procedimento à primeira vista aceitável seria orientar-se pelas diretrizes políticas do PAC.

 

Galho fraco! As diretrizes estão aí, lógica, sonora e nitidamente perfiladas na própria designação do Plano, e assim se apresentam insistentemente  ao descortino do povo: aceleração e crescimento.  

 

Pronto! Se for por aí, o gabarito está montado. Sobre estas pilastras ─ aceleração e crescimento ─ instala-se comodamente o crivo de avaliação política do PAC.

 

Um gabarito simples. Apenas dois requisitos: aceleração e crescimento.

Uma beleza! Certo?

 

Errado! Em política simplicidade nunca foi um atributo confiável, e o gabarito pode simplificar-se ainda mais.   

 

Quero dizer com isso que o gabarito, montado sobre as diretrizes nominais do Plano, pode levar a Oposição a  um beco sem saída.

 

Com efeito, ainda que pareça perdulária, deficitária, inconclusa, insignificante, ou malograda aos olhos da Oposição, obra nenhuma deixará de carrear crescimento, de algum modo e em certa medida. Em outras palavras,  crescimento é um requisito consubstancial ao Plano e à ideologia dominante, uma espécie de estigma a que nada consegue escapar, inclusive, é claro, as crateras abertas no solo para a extração de areia e barro, e as clareiras rasgadas na mata para retirar o madeirame.

 

Segue-se daí que, para evitar desgaste e perda de tempo, não resta à  Oposição outra saída senão simplificar ainda mais o seu gabarito, eliminando o item supérfluo do crescimento ─ supérfluo como item de pesquisa ─ e ver o que pode fazer com o item que restou, o item da aceleração.

 

Francamente não creio que possa fazer muita coisa. O conceito de aceleração em política é metafórico, ou seja, resulta da transferência do sentido que a palavra possui em sua esfera própria, no caso a mecânica. Ora, se já na esfera da mecânica o conceito em sua exata compreensão é pouco acessível à maioria das pessoas, imagine-se a dificuldade de compreendê-lo investido na retórica de políticos em plena campanha eleitoral.

 

Não, não será através das filigranas do discurso parlamentar que a Oposição conseguirá arrefecer a força política  do PAC, se é isso o que pretende.   O PAC mostra-se invulnerável a esse tipo de estocada. Outras vias de ataque, se for o caso, terão de ser experimentadas.

 

Talvez, sopesando as dificuldades, ocorra à Oposição que a  invulnerabilidade do Plano não seja tão definitiva quanto parece. Seria então o caso de uma invulnerabilidade relativa, como a de Aquiles, o herói grego. Aquiles, reza a lenda, era imortal por todo o corpo, exceto no calcanhar.

 

Se a Oposição acreditar que a política  imita a lenda, e resolver sair à cata do calcanhar-de-aquiles do PAC, cenas épicas certamente mostrarão o colosso  grego em ação, durante os debates pela TV.

 

Só o futuro conhece o que será exibido, mas apenas duas cenas disputam a primazia da exibição: a cena  da morte de Aquiles, ferido no calcanhar pela flecha de Páris, e a cena de Aquiles arrastando pela praça de Tróia o cadáver de Heitor.

 

Ainda que não consiga alcançar os seus objetivos, ainda que o titã triunfe ao final, a Oposição não tem o direito de desistir das buscas. Não tem o direito de nos privar do espetáculo.