Eis que ele apareceu em casa, um felino preto e branco, com olhar desconfiado, mesmo sendo ele o elemento surpresa. O mesmo sentimento de pesar tomou conta de todos os membros daquela família, mas ninguém o manifestou.  Sabíamos  que ele não seria aceito, a família por si só já era numerosa.

  Sem sentenciar ele ficou. Sua postura  discreta e soberba era a reposta por ter se agregado a nós. Ficou subentendido pela sua imponência, de que era autônomo e não teríamos nenhum  trabalho extra. Tão certo quanto dois mais dois são cinco, a trajetória harmoniosa não prevaleceu.

   Ruiz! Sim, esse era seu nome de batismo, aparecia vez ou outra e dava o ar de sua graça. Até que um dia ele não apareceu mais e nos deixou preocupados. Já era um ritual vê-lo passar pelo quintal, principalmente quando chovia e se criavam poças  de água de todos os tamanhos e ele com sua destreza esquivava-se  delas sem perder o charme que tão natural chegava a nos irritar.

  A chuva passava, a poça se formava e nada do Ruiz.

  O que teria acontecido com aquele que se tornou “nosso” por simplesmente existir?

A noite o lar era silencioso, apenas a noite. Não podíamos  conversar, apenas ouvir sem muito entusiasmo o jornal e depois com grande satisfação, a novela.

  O som da T.V nos informava: No capítulo de hoje...

Todo o suspense foi interrompido por um grito de espanto. Pela voz percebemos que era a matriarca. Fomos para garagem, lugar  proibido .Apenas o dono entrava naquele santuário para lustrar seu carro. Mas naquele dia o instinto materno fez da regra a exceção e atraída pelo barulho, entrou sorrateiramente na garagem e nos presenteou com o desfecho da história do Ruiz.

  O  princípio ; percebemos que o artigo “o” era inapropriado, o correto seria A Ruiz, o que sonoramente e gramaticalmente não fazia muito sentido.
  O meio  trazia o sentido e nos declarava que a Ruiz era mãe de inúmeros filhotes e ela os lambia com uma determinação metódica e carinhosa.  Ruiz tinha o dom da beleza.

  O fim? Bem , o fim foi triste e feliz. Perceba:

  O destino se traçou no momento em que Ruiz se tornou mãe. Ela precisava de um lugar amplo e tranqüilo para se dedicar aos  filhos .O cenário perfeito seria o sítio.

   Eram muitos os voluntários para abrir o porta –malas,  (conforto- lhe de que ele era enorme e jamais prejudicaria a família felina). A  colocamos lá dentro, acomodada numa caixa.

   Trinta minutos separavam geograficamente as famílias e mudavam nossa rotina familiar  e lá , entre as árvores assistíamos a família  contornar com destreza as poças d’água e nelas víamos refletido o olhar de encanto recíproco.

              Renata 12/2018