Vamos falar um pouco de cérebro e neurologia. Cérebro é um órgão físico. Você toca, olha pega na mão se quiser. Neurologia não é simplesmente a ciência que estuda o cérebro. Neurologia é o modo como representamos a atividade do cérebro. Não podemos pegar na mão o funcionamento do cérebro. Não são partes físicas do cérebro como os hemisférios, lobos ou circunvoluções, redes de neurônios, moléculas ou neuro transmissores.  É o modo como tudo isso se conjuga num funcionamento que transcende a elementos físicos. Neurologia é processo, modo de funcionar, não conteúdo. Por isso desconfie quando a mídia ou certos cientistas atribuem a causa de alguma atividade neurologia a uma parte do cérebro, a uma descoberta de um receptor ou de uma nova molécula. Cérebro e Neurologia não conteúdo e processo. Não se confunda. Se se confundir chegará a um beco sem saída. A atividade neurologia é fruto das relações entre o que acontece dentro e fora do organismo, ao longo do tempo de uma história de vida e das gerações. A Função (Neurologia) esculpe a Forma (Cérebro) ao longo dos tempos.

Nossa neurologia nunca foi tão desafiada evolutivamente como está sendo agora em poucos séculos e mais ainda nas últimas décadas. E provavelmente haverá conseqüências e mutações desde nossa realidade biológica, psicológica e social muito mais impactantes no futuro do em outra época da história humana. Talvez o desenvolvimento tecnológico em cem anos ou menos antecipe o que queremos mudar geneticamente e influir de forma estrutural no modo de nossos corpos e mentes funcionarem. O cérebro humano é o mais dependente do cérebro dos outros humanos para funcionar que qualquer outra espécie. Funções classicamente estudadas como memória, inteligência, linguagem, atenção concentração, criatividade, entre outras, são dependentes da experiência de cada um e do contexto relacional em que elas acontecem. Não são coisas estáticas e fixas.  Assim, não podem ser tomadas como coisas em si mesmas ao investigarmos e lidarmos com elas.

O novo paradigma de funcionamento Neurológico é o da relatividade de suas funções na hora que as avaliamos. Memória, inteligência, atenção, emoção, sentimentos não são coisas físicas perceptíveis como correntes elétricas ou substancias químicas, nem coisas mentais isoladas. São atividades vividas por alguém de uma certa forma em relação a algo ou/e alguém mais, alem de si. Seu estudo e utilização prática implicam em considerá-las meios de comunicação entre pessoas e não coisas em si. 

Uma organização humana familiar com três ou quatros pessoas ou uma empresa de algumas dezenas ou centenas de pessoas oferecem desafios comunicacionais inéditos, pois elas estão inseridas em redes maiores e com uma rede de influências marcante entre as pequenas e grandes num ambiente de alta volatilidade. Ela não é mais uma aldeia isolada nem isolável. Dificilmente seguirá regras predeterminadas por alguém, pois elas rapidamente se tornam obsoletas. Dificilmente os resultados serão os mesmos nem os meios de alcançá-los em anos sucessivos. O que é sucesso num momento tende aceleradamente a perder seu sentido no momento seguinte, no próximo e assim sucessivamente, dando lugar a novas formas do que será o sucesso.

Como ficarão as relações de subordinação de trabalho ou de educação nas próximas décadas? Refiro-me ao famoso “Eu to te pagando pra me fazer X...então faça como eu quero...senão rua!”. “Eu te disse para fazer isso e não aquilo.” “Você devia saber o que eu te digo.” E a resposta passiva do outro lado: “O que você quer que eu faça?” “É assim que você quer?”

Os melhores resultados acontecem com pessoas intensamente motivadas em obtê-los de si e por si mesmo, a partir de sua relação com os outros. 

Os melhores resultados não cessam de acontecer e de se transformar, pois quando mudamos tudo muda. Quanto maior a magnitude da sucessão de mudanças em curso, menos importância as antigas aprecem ter em relação as recentes.  Pessoas comuns não se vangloriam de ter aprendido a falar, andar, dirigir um carro, escrever, ler, atravessar ruas. Mudanças tão importantes como essas ficam em segundo plano quando podemos mudar ainda mais em outros planos. Só damos importância dessas antigas competências quando um dia elas nos faltam por algum motivo.

No mundo empresarial conta-se a história de uma cliente conhecida de uma famosa loja de departamentos que um dia precisou trocar uma nota de cem dólares e não tinha como fazê-lo. Como era cliente habitual da loja, procurou o caixa e ele negou-se dizendo que era contra as normas da empresa. Procurou a gerencia que a atendeu prontamente servindo cafezinho e água e passando quase uma hora explicando a ela porque que apesar dela ser uma cliente preferencial se tratava de uma norma da empresa que deveria ser cumprida. Ela desolada já ia saindo quando reparou num cartaz dizendo: “satisfação garantida ou seu dinheiro de volta.” Ela teve então uma idéia: comprou qualquer coisa com seus cem dólares, foi à caixa, pagou e prontamente devolveu a mercadoria, a  loja realizou a devolução e ela - finalmente – conseguiu trocar seu dinheiro. A loja girou toda a casa para trocar a lâmpada. Ela conseguiu o melhor para ela e da maneira mais fácil: apenas girou o bulbo no suporte.

Uma funcionária acreditava que o chefe não lhe pagava o que merecia. Então ela não fazia o que achava que podia. Isso se tornou uma espiral negativa ao ponto de gerar uma tensão muito grande entre ambos. Ela foi chamada. E ambos expuseram suas diferenças: um queria um trabalho mais resolutivo e a outra parte, melhor remuneração. Então ela teve uma luz: “Se eu trabalhasse de modo a elevar os resultados financeiros e pudesse provar que isso é em parte fruto do meu trabalho, você aumentaria meu salário? Sim, ele concordou. Em três meses a empresa deu um lucro significativamente maior que antes. A funcionária pediu uma reunião com o chefe. Expôs tecnicamente como e porque o lucro obtido teve relação com seu trabalho e pediu um aumento proporcional. O chefe admitiu que era melhor pagar mais essa funcionária pelos resultados alcançados com parte do lucro extra, do que desestimulá-la a ficar como era antes ou pior ainda ela sári ou ser despedida.

Melhor que simplesmente ter lucro, é saber lucrar. Melhor que pedir aumento é saber valer.

Uma paciente marcou hora “porque quer se matar”: “Se realmente queria se matar, por que consultar?” Ela ficou confusa, custou a compreender a extensão da pergunta. O terapeuta refez então a pergunta: “O que quer alcançar de bom se matando?” Quando se deu conta respondeu: “É para me livrar do sofrimento.” O terapeuta voltou a perguntar, com expressão curiosa: “Como você faz para realmente saber que se matando se livrará disso? Afinal o que você sabe sobre a morte?” Silencio. “E sobre a vida?” Ela responde cabisbaixa: “Muito pouco”. Nova pergunta: “Se houver um jeito de aprender novas formas de lidar bem com a sua vida que não teve a oportunidade de aprender, gostaria de saber e aprender? Ela abriu os olhos e disse com um sorriso iluminado pela esperança: “Sim... mas...” E a terapia então teve início.

No campo da saúde física é comum o profissional dizer ao paciente depois de muitos exames: “Você não tem nada!” Faltou completar: nada de ruim. O que falta então de bom, ou melhor, ainda de “melhor” nesse momento (de consulta; de vida) para esse cliente? O que será o melhor para ele agora mesmo? Nesse exato momento de vida?

O que renderia mais resultados positivos: estudar a esmagadora maioria de pessoas infectadas pelo vírus da AIDS que estão morrendo ou os raros casos de pessoas infectadas que não adquiriram a doença ou os raríssimos, excepcionais casos, que parecem ter eliminado o vírus de seus organismos? A urgência nos faz voltar nossa atenção a quem está sofrendo. Queremos ajudar. Entretanto é mais provável que haja muito mais conhecimento útil no estudo de um único caso de remissão do que na imensa massa de casos fatais.

Atender primeiro o sofrimento antes de buscar o bem estar está tão arraigado em nossas mentes que ficamos perplexos, sem saber o que fazer quando defrontados com os raros casos de remissão ou cura espontânea das doenças. O fato é que atingimos alto gru de bem estar como nunca antes na história da civilização, mesmo em países em desenvolvimento. E não sabemos o que fazer com isso.

Não é de se estranhar como grande parte dos cursos superiores, mais ainda em nível de pós-graduação não têm preparado as pessoas para a vida pessoal e profissional como poderia.

Os meios acadêmicos e a educação formal não tem se encarregado de estimular as pessoas a desenvolverem suas competências relacionais em busca do melhor com elas mesmas e com as outras seja qual for o conteúdo ensinado.

Existem meios mais simples e fáceis de conhecer e saber como usar nossas mentes e como os outros usam as deles?

Com certeza. Sempre existe uma forma mais simples e melhor. Usando sua própria sensação e percepção para aprender o que se passa consigo e com os outros e com as coisas é possível identificá-la.

 

A arte da reciprocidade: 

Mova-se e sinta o movimento. Cada vez que se move o movimento já não é mais o mesmo. Se pensar a respeito de um assunto alterará o modo como estava pensando. Senão fizer diferença, pelo menos saber disso já é um sinal de vida. Se nem ficar sabendo disso, para fins práticos você não está vivo em relação a isso.

Se alguém lhe tocar de certa forma, também está sendo alterado por tocá-lo. Ignorar um toque é informação relacional tão importante quanto levar um susto quando a pessoa é tocada.

Se aquilo que e ouve ou fala produz mudanças em você, você está vivo e aquilo que ouviu e falou está vivo em você. Cada vez que você se expressa, tem uma impressão de si que altera sua expressão e também pode alterar o outro que está em rede com você.

Talvez em alguns momentos você tenha necessidade de se beliscar para saber que está vivo. Ou chamar a atenção de alguém para perceber se está vivo. Há sinal de vida quando você percebe alguma alteração. Alterações de estado (estado é uma experiência no plano físico e mental a um só tempo) são provas de vida.

Estar vivo é uma crença fundamental. Não estar também é. Como você acredita que está vivo determina sua vida. Não há outra prova de que você está vivo a não ser pelos resultados que obtém de seus próprios atos.

Certa vez num manicômio um interno acreditava estar morto. Os médicos tentaram provar que ele estava vivo fazendo uma punção na polpa digital a fim de brotar ali uma gota de sangue. Quando o interno olhou a gota de sangue exclamou: que interessante... Mortos sangram! Se lhe chutassem o nariz poderia dizer: olha só que coisa curiosa!...mortos sentem dor no nariz...! 

A vida é prova de si mesma, na intimidade de cada um. Uma experiência a ser seguida e não um problema a ser resolvido.

O problema do interno do manicômio não era o fato de pensar ser um morto ou estar morto. Seu problema é não ter como provar a si mesmo isso, pois não tinha um sentimento de estar vivo. Crenças podem limitar ou expandir o seu senso de estar vivo. O sentimento de sofrimento ou bem estar são os marcadores de como estão suas crenças.  Para testá-las não resta alternativa do que agir e prestar atenção no que acontece.

Se há uma coisa que temos com certeza na vida é que estamos vivos e queremos viver cada vez melhor. Se não fosse assim, não sofreríamos...