O MURO PICHADO

Casa nova, bairro novo e um belo muro de tijolos aparentes apareceu, sem prévio aviso, todo pichado. Minha esposa me telefonou inconformada e disse que precisávamos tomar as providências cabíveis para o caso. Tentei dissuadí-la que não compensava se preocupar com isso e que eu limparia o muro no final de semana. Mas ela não se conformou em ver o seu muro tão bonito, repleto de recados para namoradas. Ela saiu pela rua perguntando para a garotada do bairro se alguém havia visto quem foram os pichadores. Não demorou um deles entregou o ouro, dando o nome de um dos responsáveis. Era um garoto da própria rua.

Decidida a desvendar o caso, ela não teve dúvidas e foi falar com a mãe do pichador, que chamou o filho e lhe deu uma bronca. O menino rapidamente entregou o outro participante do vandalismo. Era um tal de Bacana, que não morava na rua, mas trabalhava numa padaria próxima. Resultado, o Bacana, o Luiz e o Rafael , todos menores, passaram uma tarde limpando o muro, que não ficou lá essas coisas, mas serviu de exemplo para que não caíssem novamente em tentação.

Isso aconteceu há muito tempo, pois hoje os pichadores se profissionalizaram, escalando prédios altíssimos para deixar suas marcas registradas e obrigam alguns estabelecimentos a colocarem uma plaquinha ridícula dizendo coisas assim: “Senhores pichadores: a doação mensal para uma instituição de caridade será cancelada caso essa parede seja pichada”. A pichação, além de enfeiar a cidade, deixa a sensação de abandono e decadência, contribuindo para a deterioração do meio urbano.

Tempos atrás um velho amigo, depois de construir uma bela casa num bom bairro, deparou com problema semelhante e resolveu inovar na forma de reprimir a transgressão. Escreveu num canto do muro o seguinte recado: “Quem pichar esse muro é veado”. Disse ele que nunca mais o muro foi pichado, pois nenhum garoto do bairro quis arriscar a sua reputação por causa de uma pichação sem sentido.

Mas ninguém no bairro imaginou que houvesse sido o próprio proprietário o autor daquela frase de gosto duvidoso no muro, mas eficiente.  Anos depois, passando pelo local ainda dá para ver as letras meio apagadas da advertência.

O dono da casa se mudou e é provável que o novo proprietário não tenha se preocupado em apagar a frase, deixando para a posteridade ou para os arqueólogos do futuro decifrarem a estranha frase com o nome de um bichinho simpático e delicado que existiu nas matas e cerrados brasileiros nos tempos em que Pindorama era bela e verdejante.