“O MOVIMENTO DOS PROFESSORES PÚBLICOS DE MATO GROSSO DO SUL À LUZ DO NOVO SINDICALISMO” Ciro José Toaldo** Pós-graduação em História - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFMS/CEUD – Dourados/MS - CNPQ

O Novo Sindicalismo surgiu no final da década de setenta como contraposição ao sindicalismo atrelado ao Estado, do sindicalismo pelego (sindicato não comprometido com a classe trabalhadora), da burocracia sindical, onde o regime militar controlava os sindicatos e impedia toda e qualquer movimentação reivindicatória da classe trabalhadora. É o período, na visão de Ricardo Antunes “que se abriu com o vigoroso movimento grevista do ABC paulista a partir de maio de 1978, até o fim da década de oitenta, onde inúmeras transformações ocorreram: a retomada das ações grevistas, a explosão do sindicalismo rural, o nascimento das centrais nas fábricas e o aumento dos índices de sindicalização. O novo sindicalismo representava uma nova forma de organização sindical, que atuava por dentro da estrutura sindical”.[1]

Mato Grosso do Sul, nascendo como Estado no final da década de setenta, recebe os reflexos do novo modo de organização da classe operária brasileira e no magistério público estadual, segundo os professores Wilson Valentim Biasotto e José Laerte Tetila, a fundação da Federação dos Professores de Mato Grosso do Sul - FEPROSUL - nasce do descontentamento generalizado dos professores, que assim como os trabalhadores brasileiros viviam as conseqüências do arrocho dos salários que motivou heróicas greves que contribuíram para a abertura política do Brasil... “As greves do ABC paulista e dos professores sulmatogrossense revelam, na sua autenticidade, o verdadeiro herói brasileiro: o povo trabalhador, que não se deixam curvar pelo autoritarismo militar vigente no país desde 1964... O magistério sulmatogrossense estava insatisfeito desde os tempos do antigo Mato Grosso:” Vários fatos inquietavam os professores, antes mesmo da criação do Mato Grosso do Sul em 1979, governadores, como Pedro Pedrossian, representante da oligarquia latifundiária, em seu mandado de 1966/1970, não se preocupa com a Educação. E os professores, desta época ficaram à beira da pobreza, vivem da política de “pão e água”, pois, não recebiam em dia e seus salários eram indignos“.[2] Na evolução da história do antigo Mato Grosso e de seu desmembramento, o que ocorre é uma sucessão de atos injustos cometidos pelos governantes estaduais e federais, contra os servidores públicos em geral e, em particular com o magistério.

O período histórico que está sendo estudado é a partir de 1979, ano das grandes mudanças do sindicalismo brasileiro, com o enorme movimento grevista, ocorrendo uma expressiva expansão do sindicalismo tendo sustentação no Partido dos Trabalhadores e na Central Única Sindical; a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT)[3], elementos fundamentais na organização do movimento sindical brasileiro.

Dentro do movimento dos professores públicos de Mato Grosso do Sul, no final da década de oitenta, com as mudanças proporcionadas pela Constituição Federal de 1988, a FEPROSUL passou a se chamar, após várias discussões, de Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul – FETEMS[4],  em que a Central Única dos Trabalhadores  consegue difundir suas linhas de ações dentro do movimento do magistério público sulmatogrossense.

            Um dado significativo, reforçando uma das hipóteses desta pesquisa é que no VII Congresso Nacional da CUT, realizado no mês de agosto de 2000, ocorreu a eleição de um professor, de artes plásticas, João Felício, ex-presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo – APEOESP - para presidente da CUT. Sendo essa a primeira vez, na história de 17 anos, que essa Central não tem em sua presidência um trabalhador da indústria, ligado ao sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, que deixa de ocupar o mais alto cargo da CUT. Desse modo, demonstra-se a influência do magistério sobre as demais categorias de trabalhadores.

Uma pesquisa sobre sindicato, fruto de um movimento que luta para não sofrer a lavagem cerebral proposta pelo capitalismo, requer ter em mente o anseio daquilo que os trabalhadores desejam.

No entorno das considerações tecidas sobre o Novo sindicalismo e o movimento do magistério público de Mato Grosso do Sul, sustento as algumas hipóteses em minha pesquisa:

  • O movimento dos professores públicos de Mato Grosso do Sul ganhou sustentação e se fortificou com a deflagração do movimento denominado Novo Sindicalismo no final da década de setenta no ABC paulista.
  • A fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) no início dos anos oitenta em âmbito nacional e particularmente no Mato Grosso do Sul, além de ser fruto do movimento do Novo Sindicalismo, ajuda a prosperar e solidificar o movimento do magistério público.
  • A Central Única dos Trabalhadores nasceu e expandiu-se nacionalmente e, no Mato Grosso do Sul, como conseqüência do Novo Sindicalismo ajuda na conscientização e consistência dos movimentos sociais e de um modo especial no movimento dos professores.

Para encontrar esclarecimento no sentido de entender como nasceu o Novo sindicalismo e a nova concepção de luta sindical que possibilitou um novo nível de consciência dos trabalhadores brasileiros, busco estudar autores que, além de contribuir com o embasamento teórico, possam esclarecer as próprias origens do sindicalismo. Para Karl Marx “os sindicatos são um legado do capitalismo e se formaram a partir das diferenciações profissionais surgidas no próprio processo de formação capitalista, no transcurso de séculos e estes têm por finalidade impedir que o nível dos salários desça abaixo da soma paga tradicionalmente nos diversos ramos da indústria e que o preço da força de trabalho caia abaixo de seu valor”.[5]

                O professor Ricardo Antunes argumenta que “a CUT, enquanto movimento de inspiração anticapitalistas, é fundada num ideário com contornos socialistas, vive hoje um momento difícil. Arrisca-se a perder o que de mais importante conseguiu conquistar – sua expressiva base social assalariada – ao longo de seus dez anos. Mas, se até pouco tempo havia um contraponto efetivo, a partir de 1991, com o nascimento da Força Sindical[6], viu este quadro alterar-se ainda mais. Efetuando uma mescla entre o velho peleguismo atrelado e um ideário neoliberal agudamente favorável ao capitalismo e privatizante, a Força Sindical veio preencher um espaço para o qual o velho peleguismo se mostrava incapaz: veio para se construir na nova direita atuante no sindicalismo brasileiro”.[7]

             A pesquisa aborda um quadro teórico comprometido com a História Vista de Baixo[8]. Historiadores como Le Goff e Peter Burke, entre outros, afirmam que a História, ligada aos paradigmas tradicionais, oferece uma visão de cima, concentrando-se nos grandes feitos dos homens, estadistas e generais. Ao restante da humanidade foi destinado um papel secundário no drama da história. Portanto, o referencial teórico utilizado nesta pesquisa prima pelas fontes ligadas com a visão de baixo onde os fatos sejam apresentados como realmente aconteceram, sem distorções.

O historiador José Mattoso em seu livro a Escrita da História – teoria e método afirma que “os documentos só têm sentido quando inseridos numa totalidade, que é a existência do homem no tempo”[9], dentro desta perspectiva estão sendo analisados os documentos  da FEPROSUL/FETEMS (Atas de Assembléias Gerais, de Diretorias e Congressos Estaduais)  dos anos de  1979 até 1991, bem como os documentos do Partido dos Trabalhadores e da Central Única dos Trabalhadores de Mato Grosso do Sul.

As fontes orais são utilizadas para resgatar experiências, visões de mundo e representações passadas e presentes ligadas ao movimento dos professores públicos de Mato Grosso do Sul, onde estou entrevistando os Presidentes das diretorias da FEPROSUL/FETEMS de 1979/1991 e os vice-regionais destas diretorias, além dos presidentes do PT e CUT de Mato Grosso do Sul desde suas fundações até 1991.

O Novo Sindicalismo foi um marco do movimento trabalhista brasileiro. No início do século vinte e um, segundo Gaudêncio Frigotto, em seu livro Educação e Crise do Capitalismo Real, ele afirma que ”é preciso que os sindicatos entrem no embate e na disputa por educação, na esfera pública, de qualidade”. (2000: 204/205) Mas acredito que isto só ocorre se os professores tiverem consciência das dimensões de suas lutas passadas, presentes e futuras.

 

[1] ANTUNES, Ricardo C. O que é Sindicalismo.  São Paulo: Brasiliense, 1986 p.28

[2] BIASOTTO, Wilson V., TETILLA, José Laerte. O movimento reivindicatório do magistério público estadual de Mato Grosso do Sul : 1978 – 1988. Campo Grande: UFMS, 1991 p.50/51

[3] A CUT nasceu da confluência de 3 significativos movimentos sociais: do novo sindicalismo, da oposição sindical e do movimento sindical rural’’. (Antunes, 1995 p. 65)

[4] Cf. ATA da Reunião da Diretoria da FEPROSUL de 23/06/1989.

[5] MARX, Karl. Sindicalismo. Tradução de José Roberto Marinho. São Paulo: CHED, 1980 p. 09.

[6] MEDEIROS, Luiz Antônio de: “A Força Sindical - Central Sindical moderna e ativa surge, num momento que, tanto os trabalhadores quanto a sociedade como um todo necessitam, precisam e exigem uma Central Sindical que não seja “revolucionária”. (PASTORE, 1992. p.79)

[7] ANTUNES, Ricardo. O novo Sindicalismo no Brasil. São Paulo : Pontes, 1995 p. 57.

[8] BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. Trad. Magda Lopes. São Paulo: UNESP, 1992 p. 39-62.

[9] MATTOSO, José. A escrita da História: Teoria e Métodos. Lisboa: Ed. Estampa, 1989 p. 17.