Resumo

O presente artigo apresenta reflexões a partir da pesquisa bibliográfica e apresenta o tema letramento e sua relação com a inclusão social do indivíduo. Discute sobre o processo de leitura e escrita, o ensino pouco significativo e suas práticas artificiais, bem como reflete sobre o analfabetismo funcional e suas consequências nas relações sociais.

Palavras-chave: letramento; ensino; inclusão social.

INTRODUÇÃO

Este artigo apresenta algumas reflexões realizadas durante estudos, levantamento bibliográfico e discussões a respeito do que é ser uma pessoa alfabetizada e letrada, ou alfabetizada sem ser letrada ou ainda ser letrada sem ser alfabetizada e qual a relação do letramento com a inclusão social do indivíduo. Fez parte desse estudo também, considerar o conhecimento obtido através da prática como docente de instituições públicas no estado da Bahia, cujos educandos são de uma vasta diversidade social e cultural. Saber ler e escrever tem se revelado condição insuficiente para responder adequadamente às demandas contemporâneas da sociedade. É preciso ir além da simples aquisição do código escrito e passar a fazer uso da leitura e da escrita no cotidiano. Assim, as práticas sociais de leitura e de escrita emergem como questão determinante na inclusão social do sujeito. A desigualdade gerada pelo sistema capitalista tem marcado a sociedade brasileira contemporânea. O processo de marginalização acomete um segmento da sociedade que iremos nos referir neste trabalho: os marginalizados da cultura do seu povo e do seu tempo por não estarem incorporados à civilização letrada. O trabalho reflete sobre o processo de leitura e de escrita, o seu ensino e a sua prática na vida social, bem como a inclusão precária de indivíduos que engrossam as filas dos chamados analfabetos funcionais. Os progressos dos programas educacionais atuais localizam-se na transição do analfabetismo absoluto ou da alfabetização rudimentar para um nível básico de habilidade de leitura e matemática. PRÁTICAS SOCIAIS DE LEITURA E ESCRITA A inserção do indivíduo na cultura letrada favorece a vida em sociedade e a formação pessoal. Permite o desenvolvimento do senso crítico e o conhecimento do mundo. A leitura e escrita possibilitam a inserção na sociedade do conhecimento, da informação e na atuação do cidadão pertencente a uma realidade na qual pode ter voz e entendimento do que acontece ao seu redor. Quanto mais longe desse conhecimento e domínio da leitura, mais próximo da marginalização, dependência e manipulação se torna o cidadão. Para Villard (1999), mais importante do que atender a formação acadêmica do aluno, a leitura é fundamental para a formação do cidadão. E só tem real sentido quando o indivíduo é capaz de atribuir sentido ao que lê, “ler é construir uma concepção de mundo, é ser capaz de compreender o que nos chega por meio da leitura, analisando e posicionando-se criticamente frente ás informações colhidas para exercer a cidadania”. (Villard, 1999. p.4). A leitura está diretamente relacionada à capacidade de interpretar, dar sentido ao que está escrito e assim exercer a própria cidadania. Desse modo, a leitura não pode apenas se resumir a uma decifração mecânica. Através da aprendizagem da leitura são desenvolvidas atividades de reflexão que expandem os conhecimentos do estudante e seu papel reflexivo e crítico na sociedade. É importante reforçar, como já dito anteriormente, que é preciso que se dê sentido ao que se lê. Mais que somente decodificar o que está escrito. Para Jolibert: “Ler é atribuir diretamente um sentido a algo (...). Ler é questionar algo escrito como tal a partir de uma expectativa real (necessidade, prazer) numa verdadeira solução de vida (...). Ler é ler escritos reais que vão desde um nome de rua numa placa até um livro, passando por um cartaz, uma embalagem, um jornal, um folheto, etc. No momento em que se precisa realmente deles numa determinada situação de vida, “para valer” como dizem as crianças. É lendo de verdade, desde o início que alguém se torna leitor e não aprendendo primeiro a ler”. (Jolibert, 1994, p.15). Assim o ato de ler se estabelece além da simples conversão de grafemas em fonemas. O significado que está atribuído ao contexto desta leitura é que vai torná-la significativa e revelar a sua prática dentro de um contexto sócio-cultural significativo para o indivíduo e para o meio social. O ensino da leitura deve ser feito com o contato dos mais diversos tipos de textos sociais, o saber decodificado não garante o desenvolvimento da capacidade de saber ler, de ver além dos olhos. A leitura não é restrita ao aprendizado das correspondências letra-som. Mais do que decodificar códigos, a leitura vem carregada de significados do contexto em que estamos inseridos. Para ter significado, a leitura não pode ser apenas uma descrição mecânica daquilo que se lê, não pode apenas se restringir a um processo de decodificação de converter letras em sons, e a compreensão da leitura somente como uma consequência natural desta ação, Segundo Freire: “uma compreensão crítica do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo... Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção entre o texto e o contexto”. (Freire, 1981/1987, p.11) Uma compreensão de memorização sobre a leitura é equivocada e vem produzindo indivíduos que são capazes de decodificar os textos que lêem, mas com enormes dificuldades em compreender o que estão lendo, pois não são capazes de dar significado àquilo que lêem. O letramento surge como uma necessidade de reconhecer e nomear práticas sociais de leitura e de escrita mais complexas e avançadas, que vão além das práticas de ler e escrever, resultantes da aprendizagem do sistema de escrita, segundo Soares: “o termo letramento surgiu porque apareceu um fato novo para o qual precisávamos de um nome, um fenômeno que não existia antes, ou, se existia, não nos dávamos conta dele e, como não dávamos conta dele, não tínhamos um nome para ele” (Soares, 1998/2006, p.34). A palavra letramento tem sua origem na tradução da palavra inglesa ‘literacy’, que significa a condição de ser letrado. Etimologicamente, a palavra vem do latim ‘litera’ (letra), com sufixo ‘cy’ (qualidade, condição, estado). Nesse sentido, podemos dizer que é condição que assume aquele que aprende a ler e escrever, envolvendo-se em práticas de leitura e de escrita. Letramento no Brasil, ‘illetrisme’ na França, ‘literacia’ em Portugal, surge como uma questão fundamental, pois passa a se dar mais ênfase nas relações entre as práticas sociais de leitura e de escrita, do que apenas a aprendizagem do sistema de escrita. Assim letramento é: “o resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita” ( Soares,2006, p.18). Desta forma, a prática da leitura e da escrita possibilita ao indivíduo condições para a inserção em novas ações culturais, linguísticas, políticas e cognitivas. Em países mais desenvolvidos social e economicamente, os problemas em relação às práticas sociais de leitura e de escrita também se tornam relevantes ao se constatar que embora alfabetizada, a população não domina habilidades de leitura e escrita para uma participação efetiva nas práticas sociais e profissionais. É evidente então a necessidade não apenas de decodificar sons e letras, mas de entender os significados e usos das palavras em diferentes contextos. Disso depende o sucesso do próprio indivíduo numa sociedade grafocêntrica, em que a prática da leitura e escrita são imprescindíveis para inclusão social. Muito além de alfabetização, o letramento possibilita ao sujeito a flexibilidade linguística necessária ao desempenho adequado que lhe será exigido em sociedade. Somente o letrado é capaz de analisar diferentes textos, comparálos, pesquisar os porquês das diferenças, compreender regras sobre o uso da língua e saber aplicá-las no contexto devido. Enfim, o conhecimento e a informação são os meios para se conquistar oportunidades de trabalho e renda, através da qualificação do indivíduo. E as consequências positivas são nos diversos âmbitos: sócio-culturais, cognitivos e linguísticos. O resultado, basicamente, será um indivíduo socialmente inserido na cultura grafocêntrica, capaz de desenvolver um pensamento cognitivo mais elaborado e com um amplo vocabulário na linguagem oral. À escola, cabe o papel de despertar o interesse dos educandos pela leitura e pela escrita. Só assim poderemos ter indivíduos aptos a ler criticamente a realidade, com maiores perspectivas de crescimento, na busca por uma melhor qualidade de vida, em uma sociedade cada vez mais consciente e justa. [...]