Jarsen Luis Castro Guimarães

I. INTRODUÇÃO
A história da humanidade tem demonstrado a necessidade de um agente regulador de normas e fiscalizador do cumprimento desses preceitos estabelecidos e acordados por todos. Nesse sentido brota à figura do Estado influenciando o modo dos homens relacionarem entre si, como também na tomada de decisões com relação a conflitos internos e externos das sociedades. Internamente surgem problemas que chantageiam a paz tão sonhada pelas pessoas, são as ameaças não ortodoxas entre as quais se destacam o terrorismo, os delitos ambientais, os crimes organizados e o narcotráfico.
O consumo de substâncias psicotrópicas sempre esteve presente na humanidade, acompanhando o homem desde tempos mais remotos. Registra-se o uso do ópio e da maconha há cerca de 3000 a.C (Luis Duarte Patrico apud Almeida, 2003). A classificação em lícitas e ilícitas, porém, é algo recente. Segundo Lima, substâncias que antes foram lícitas hoje são consideradas ilícitas. A mesma substância pode ser ilícita em determinado país e lícita noutro.
A droga mais consumida no mundo é a maconha (cannabis). Os entorpecentes que derivam do ópio estão concentrados nos continentes Asiático e europeu. A cocaína, por sua vez, encontra-se em maior quantidade nas Américas e pouco na Europa. No continente europeu estão concentradas as chamadas drogas sintéticas (anfetaminas e ecstasy). Contudo o ecstasy já está sendo difundido em diversos países, inclusive no Brasil.
Segundo relatório do Escritório das Nações Unidas para o controle de Drogas e Prevenção do Crime, o consumo de drogas ocasiona problemas em todos os setores da sociedade. É capaz de corromper a vida social e institucional dos Estados Democráticos de Direito. Representa um problema de saúde pública, principalmente os casos de emergências em decorrência da overdose, até sua intervenção no aumento do trabalho da polícia em decorrência das mortes e violências causadas pelo tráfico. Assim, narcotráfico é alvo dos Estados que investem no enrijecimento das políticas de repressão à produção, trafico e consumo de drogas, além das preocupações com a economia mundial. A discussão sobre o combate às drogas assume posição de destaque nas agendas dos Estados, principalmente americanos, nas políticas de segurança. Existe uma urgência em se combater o tráfico a fim de se conseguir uma paz social.
Nesse sentido, o trabalho está dividido em duas partes. Primeiramente discorre-se sobre as funções do Estado, dentro de um pensamento liberal clássico, posteriormente observa-se o narcotráfico como uma ameaça não ortodoxa para os Estados no plano internacional e nacional.

II. O ESTADO E SUAS FUNÇÕES: PROCESSO HISTÓRICO
As funções do Estado têm sido discutidas bem antes do seu nascimento. As descrições aqui mencionadas têm como base o trabalho de Waltz (2004).
Para Adam Smith, o pai da Economia Moderna, o Estado se preocupava externamente com a defesa e internamente com a justiça. Para esse liberal clássico, o Estado deveria ter três funções fundamentais: defesa externa, defendendo o Estado de possíveis invasores; paz interna, mantedor e zelador da ordem social; e as questões sociais, isto é, atuando em setores que não são de interesses do âmbito privado.
Hobbes, na obra Leviatã (1651), expõe pontos de vista sobre a natureza humana e a necessidade do Estado. Segundo Hobbes, no Estado Natural, nenhum homem se ergue tão acima dos demais por forma a estar além do medo de que outro homem lhe possa fazer mal, mesmo que alguns homens possam ser mais fortes ou mais inteligentes do que outros. Dessa forma, cada um tem direito a tudo, porém como todas as coisas são escassas, existe um constante combate de todos contra todos. Entretanto, os homens têm um desejo de acabar com esse conflito, por isso formam sociedades entrando num contrato social.
De maneira geral, a concepção do Estado para os liberais baseava-se no pressuposto da harmonia, associada ao pressuposto de perfeição infinita dos homens, laissez faire, de tal forma que as funções do Estado se reduziriam e a maioria delas desapareceria. Esse argumento também era apresentado no campo internacional, uma vez que entre os Estados, as relações baseavam-se no pressuposto da harmonia e da perfeição infinita, de tal forma que a probabilidade de um possível conflito sofreria uma constante redução.
Para Espinosa, no século XVII, os Estados, supõe, são como homens; ambos exibem a necessidade imperiosa de viver e a incapacidade de organizar seus assuntos de modo coerente de acordo com os ditames da razão. Mas os Estados podem reagir à sua própria opressão ao passo que os indivíduos não. Segundo Espinosa, os indivíduos, diariamente são vencidos pelo sono, com freqüência pela doença e pela enfermidade mental e, no final, pela velhice. Assim, os indivíduos, a fim de sobreviver, têm de associar; já os Estados, por sua própria constituição, não estão sujeitos a uma necessidade semelhante. Nesse sentido, surge a necessidade do Estado como protetor do indivíduo, tanto internamente quanto externamente. Espinosa reforça esse pensamento ao expressar que as guerras entre Estados são, portanto, tão inevitáveis quanto os defeitos presentes à natureza do homem.
No século XVIII o filósofo alemão Emanuel Kant, define os homens como membros tanto do mundo dos sentidos como do mundo do entendimento, ou seja, emoção e razão. Se estivessem totalmente no mundo da razão, eles sempre agiriam de acordo com máximas universalmente válidas, que eles mesmos imporiam a si. Seguiriam o imperativo categórico. Mas, como os homens são igualmente membros do mundo da emoção, os impulsos e as inclinações sobrepujam a razão, e o imperativo categórico é seguido com tão pouca freqüência que, no estado de natureza, reinam o conflito e a violência. Para solucionar tal problema, alguns homens, agindo a partir do conhecimento empírico e, portanto, meramente contingente, têm de contar em seu meio com um juiz, e um juiz capaz de impor suas decisões, para ser possível evitar a violência. Assim, somente depois do estabelecimento do Estado, os homens têm alguma oportunidade de se comportar moralmente. Então, antes que o Estado seja estabelecido, a incerteza e a violência tornam impossível o comportamento moral dos homens. Os homens precisam da segurança da lei para que seja possível o aprimoramento de sua vida moral. Em sua análise, Kant também observa a importância do Estado como zelador da paz internamente quanto externamente, porém no âmbito externo relata que, no nível do Estado, um sistema político adequado permite aos indivíduos comportar-se eticamente; um sistema de adequação comparável não é possível no âmbito internacional. Ainda assim, temos de alimentar a esperança da paz entre os Estados, ou seja, para a paz externa o Estado civil não é o bastante. A paz entre os Estados e dentro de cada um deles é essencial ao desenvolvimento das capacidades peculiarmente humanas. Os Estados no mundo são como os indivíduos no estado de natureza. Não são perfeitamente bons, nem controlados pela lei. Conseqüentemente, o conflito e a violência entre eles são inevitáveis. Dessa forma, Kant propõe como solução a combinação de duas análises: um Estado Mundial e o aprimoramento do Estado. Assim, o objetivo de sua filosofia política é estabelecer a esperança de que os Estados possam aprimorar o suficiente e aprender o bastante com o sofrimento e a devastação dos conflitos para tornar possível um regimento legal entre eles que não se sustente pelo poder, mas seja voluntariamente observado. Nesse sentido, dois fatores são de suma importância, o aprimoramento interno dos Estados e um regime legal externo.
Para o filósofo suíço Rousseau, o Estado de natureza de Hobbes é uma ficção construída a partir de suposições de que homens na natureza possuem todas as características e hábitos que adquirem em sociedade, mas sem restrições que estas impõem. Concordando com Rousseau, o pensador francês Montesquieu retrata que Hobbes atribui antes do estabelecimento da sociedade, coisas que só podem acontecer como conseqüência desse estabelecimento. Antes do estabelecimento em sociedade, os homens não haviam desenvolvido o orgulho do vício e da inveja. Como não tem orgulho nem inveja, o homem só ataca o outro se levado pela fome.
Em alguns momentos, Rousseau concorda com as idéias de Hobbes e Espinosa sobre a questão da formação do Estado e da sociedade segundo os quais foi um ato de vontade que serviu como recurso para escapar de uma situação intolerável. Tendo essa linha re raciocínio Rousseau escreve o "Contrato Social". Já, ao descrever o estabelecimento do Estado como ponto culminante de uma longa evolução que contém elementos de experiência, interesse percebidos, hábitos, tradição e necessidade, elabora "Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens".
Assim, no estado de natureza, tanto para Rousseau como para Espinosa e Kant, os homens são governados pelo "instinto", pelos "impulsos físicos" e pelo "direito de apetite"; e a "liberdade... só é limitada pela força do indivíduo". Os acordos não podem ser mantidos, pois "na falta de sanções naturais, as leis da justiça não têm vigência entre os homens". Então, segundo Rousseau, alguns homens unem-se, estabelecem regras que controlam situações de cooperação e competição e organizam os meios de fazer essas regras serem cumpridas. Os outros são obrigados a seguir o novo padrão, pois os que se acham fora da sociedade organizada, os que são incapazes de cooperar de modo eficaz, não podem se opor à eficiência de um grupo unido e que goza dos benefícios de uma divisão social do trabalho.
A passagem do estado de natureza ao estado civil "produz no homem uma mudança muito notável ao substituir em sua conduta o instinto pela justiça e ao conferir às suas ações a moralidade de que antes careceriam". A liberdade natural se torna liberdade civil e a posse se torna propriedade. Assim, o objetivo do Estado é a preservação e a prosperidade de seus membros. O corpo político, considerado isoladamente, pode ser considerado como um corpo vivo organizado que lembra o do homem. Na qualidade de ser vivo, o mais importante de seus cuidados é o cuidado com sua própria preservação.
Cordovil e Nascimento (2010) ao fazerem uma análise comparativa sobre reflexões para análise dos novos conflitos internacionais entre as idéias de Waltz e Huntington constataram que as contribuições de Huntington em "choque de civilizações" de 1997, ajudaram na compreensão de fatos "extra-estatais" nas quais podemos destacar as questões não ortodoxas do Estado.
Para Aron (1979) O Estado tem uma importante contribuição nas relações internacionais. Conforme o autor, as relações internacionais são relações entre unidades políticas, cada uma clamando seu direito de fazer justiça de tal forma a ser o árbitro central na decisão de julgar. Porém, devido à falta de um juiz central de modo a impor e fazer cumprir regras os Estados comportam-se como no estado de natureza de Hobbes. A arma usada para o convencimento para a imposição de idéias e vontades é a diplomacia.
Bobbio (2003) aprofunda os limites de participação do Estado sem deixar de lado a importância do capital. O Estado é tão importante que por ele se promoverá a guerra e a paz. Nesse sentido, a função do Estado como zelador da paz interna e externa está implícito em Bobbio. No que tange a política internacional, o autor ressalta o investimento em armas pesadas de modo a se manter a paz entre os Estados, o que ele denomina de "equilíbrio do terror", na qual a paz seria confinada não ao tradicional e instável equilíbrio de força, mas, ao contrário, a uma nova e mais estável forma de equilíbrio, que é o equilíbrio da impotência, ou seja, terror paralisante.

III. AMEAÇAS NÃO ORTODOXAS: NARCOTRÁFICO
O consumo de substâncias psicotrópicas sempre esteve presente na humanidade, acompanhando o homem desde tempos mais remotos. Registra-se o uso do ópio e da maconha há cerca de 3000 a.C (Luis Duarte Patrico apud Almeida, 2003). A classificação em lícitas e ilícitas, porém, é algo recente. Segundo Lima, substâncias que antes foram lícitas hoje são consideradas ilícitas. A mesma substância pode ser ilícita em determinado país e lícita noutro.
A droga mais consumida no mundo é a maconha (cannabis). Os entorpecentes que derivam do ópio estão concentrados nos continentes Asiático e europeu. A cocaína, por sua vez, encontra-se em maior quantidade nas Américas e pouco na Europa. No continente europeu estão concentradas as chamadas drogas sintéticas (anfetaminas e ecstasy). Contudo o ecstasy já está sendo difundido em diversos países, inclusive no Brasil (Guimarães, 2009).
Segundo relatório do Escritório das Nações Unidas para o controle de Drogas e Prevenção do Crime, o consumo de drogas ocasiona problemas em todos os setores da sociedade. É capaz de corromper a vida social e institucional dos Estados Democráticos de Direito. Representa um problema de saúde pública, principalmente os casos de emergências em decorrência da overdose, até sua intervenção no aumento do trabalho da polícia em decorrência das mortes e violências causadas pelo tráfico.
O narcotráfico é alvo dos Estados que investem no enrijecimento das políticas de repressão à produção, trafico e consumo de drogas, além das preocupações com a economia mundial. A discussão sobre o combate às drogas assume posição de destaque nas agendas dos Estados, principalmente americanos, nas políticas de segurança. Existe uma urgência em se combater o tráfico a fim de se conseguir uma paz social.

3.1. CONVENÇÕES INTERNACIONAIS E COMBATE AS DROGAS
O controle das drogas psicotrópicas, no âmbito internacional, é realizado por meio de tratados, acordos ou convenções celebrados pelos países membros das Nações Unidas. No início do século XX os governantes de países começaram as tentativas de controle do consumo e tráfico de drogas no âmbito internacional. As principais conferências realizadas nesse sentido são observadas abaixo:
1909 ? Conferência de Xangai: Reuniu treze países para tratar do problema do ópio indiano infiltrado na China. Não produziu resultados práticos.
1911 ? Primeira Conferência Internacional do Ópio (Haia).
1912 ? Primeira Convenção Internacional do Ópio: resultante da conferência de 1911 e popularmente conhecida como a Convenção do Ópio, regulamentou a produção e a comercialização da morfina, heroína e cocaína. Foi prejudicada em sua execução pela Primeira Guerra Mundial, entrando em vigor apenas em 1921.
1921 ? Criação da Comissão Consultiva do Ópio e Outras Drogas nocivas: sucedida pela Comissão das Nações Unidas sobre Drogas Narcóticas por conseqüência da criação da Sociedade das Nações cuja Convenção constitutiva reconheceu a atribuição de elaborar acordos sobre tráfico de ópio e outras drogas prejudiciais.
1924 ? Conferência de Genebra: ampliação do conceito de substância entorpecente e instituição do sistema de controle do tráfico internacional por meio de certificados de importação e autorização de exportação.
1925 ? Acordo de Genebra: surgido da conferência vinculada ä sociedade das nações de 1924, torna realidade os dispositivos da Conferência de Haia de 1912.
1931 ? Conferência de Bangkok: revisão do acordo de Genebra de 1925.
1931 e 1936 ? Duas novas conferências realizadas em Genebra estabelecendo obrigações dos estados participantes em tomarem as providências para proibirem, em seus respectivos territórios, a disseminação do vício.
1946 ? Assinado protocolo atualizando acordos anteriores sob convocação da ONU.
1948 (Paris) 1953 (Nova Iorque) ? firmaram-se outros protocolos. O de Nova Iorque restringiu a produção de opiláceos na fonte, permitindo sua destinação apenas para o uso médico.
30/03/1961 ? Convenção Única de Nova Iorque sobre Entorpecentes: composta de cinqüenta e um artigos relaciona os entorpecentes, classificando-os segundo suas propriedades e quatro listas. Estabelece as medidas de controle e fiscalização prevendo restrições especiais aos particularmente perigosos; disciplina o procedimento para a inclusão de novas substâncias que deverão ser controladas; fixa a competência das Nações Unidas em matéria de fiscalização internacional de entorpecentes; dispõe sobre medidas que devem ser adotadas no plano nacional para a efetiva ação contra o tráfico ilícito, prestando-se aos Estados assistência recíproca em luta coordenada, providenciando que a cooperação internacional entre os serviços se faça de maneira rápida; traz disposições penais, recomendando que todas as formas dolosas de tráfico, produção, posse, etc., de entorpecentes em desacordo com esta convenção, sejam punidas adequadamente; recomenda aos toxicômanos seu tratamento médico e que sejam criadas facilidades a sua reabilitação.
21/02/1971 ? Firma-se a Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas (Viena): passa a controlar a preparação, uso e comércio de psicotrópicos.
25/03/1972 ? em Genebra, firma-se o Protocolo de Emendas à Convenção Única sobre Entorpecentes de 1961: modificando-a e aperfeiçoando-a. Altera a composição e as funções do Órgão Internacional de Controle de Entorpecentes, amplia as informações que devem ser fornecidas para controle da produção de entorpecentes naturais e sintéticos e salienta a necessidade de tratamento que deve ser fornecido ao toxicômano.
1977 ? Convocação pela Secretaria Geral das Nações Unidas da Conferência Internacional sobre o Abuso de Drogas e Tráfico Ilícito para rever o documento Comprehensive Muldisciplinary Outline, composto de quatro capítulos, dois deles referindo-se ao controle do fornecimento e à supressão do tráfico ilícito. Faz sugestões práticas sobre o planejamento de programas efetivos para a supressão do tráfico ilícito em todos os níveis (nacional, regional e internacional).
20/12/1988 ? Conclusão da Convenção contra o Trafico ilícito de entorpecentes e de Substancias Psicotrópicas (Viena).
11/11/1990 ? Entra em vigor internacional a Convenção contra o Trafico Ilícito de entorpecentes e de Substancias Psicotrópicas que complementa as Convenções de 1961 e 1972, acrescentando, entre outras coisas, o éter etílico e acetona no rol das substâncias controladas.
Assim, o combate ao tráfico de drogas é visível no plano internacional, mas os seus resultados, muito embora grandiosos, ainda necessitam de uma maior efetivação para o controle dessa ameaça não ortodoxa para o Estado. A proibição do comércio de drogas remonta ao final do século XIX e início do XX. Conforme Coggiola (2006), o excesso de consumo de ópio pelos ingleses levou a Inglaterra a promover uma convenção internacional em Xangai com a participação de 13 países, conhecida como Opium Commission. Nessa reunião os Estados Unidos conseguiram constranger potências internacionais (países que contavam com grandes indústrias farmacêuticas e com monopólios na Ásia, Inglaterra e Alemanha) que se interessavam pelo lucrativo comércio do ópio e seus derivados. Nesta reunião não foram elaboradas determinações para o combate ao uso de drogas.
O resultado dessa conferência foi a Convenção Internacional do Ópio, assinada em Haia em 1912, visando o controle da produção de drogas narcóticas. Cogita-se que esta reunião foi patrocinada pelos Estados Unidos. Neste encontro foram fixados pontos mais específicos, obrigando os Estados que dela fizeram parte a coibir em seus territórios todo o uso de ópio e cocaína que não atendessem às determinações médicas. A intenção era proibir o uso indiscriminado de substâncias capazes de causar alterações no comportamento humano.
O governo estadunidense não tinha em seu país leis como a que estava defendo no encontro em Haia. A questão era justamente obrigar os países que participaram do acordo, inclusive ele mesmo, a realizarem reformas legais internas no sentido de criarem leis específicas de combate ao uso de drogas ilícitas.
A evolução da legislação de combate às drogas nos Estados Unidos passa pela proibição da importação e exportação de bebidas alcoólicas como lei federal. No âmbito internacional os Estados Unidos mantém uma postura de criadores de políticas repressivas tomadas como base para tratados internacionais neste assunto.
No Brasil do início do século XX, o controle de substâncias psicoativas era abordo de maneira transversa, juntamente com a necessidade de disciplinarização do espaço urbano nos moldes europeus e à imunização compulsória da população. Até a década de 1910, a venda e o uso desses produtos passíveis de qualquer controle por parte do Estado. O que existia era um controle moral e conservado que condenava o uso de drogas. Na década de 20 por sua vez o Brasil não podia mais refutar esta atuação, uma vez que tinha se comprometido na Convenção de Haia.
Em 1921 surge a primeira lei restritiva na utilização de ópio, morfina, heroína e cocaína no Brasil. Adaptando-se ao modelo de Haia, o Brasil previa a punição para todo tipo de utilização dessas substâncias que não seguissem prescrições médicas. Com a participação assídua do Brasil em convenções internacionais sobre o controle de drogas, a legislação brasileira foi passando por reformas e atualizações do ordenamento jurídico interno seguindo determinações acordadas nesses encontros especializados. Importante ressalta que antes da segunda guerra os encontros eram liderados pela Ligas das Nações. Após este período, as reuniões começaram a se dar no âmbito das Nações Unidas, sempre com a incitação dos Estados Unidos.
A postura brasileira, motivada por acordos externos, pode ser exemplificada em dois institutos jurídicos: o Decreto-lei 891/1938, editado pelo Estado Novo do presidente Getúlio Vargas, modernizando as determinações antidrogas no país, baseando-se nos documentos assinados nas convenções de Genebra de 1931 e 1936; a reforma da legislação sobre tóxicos em 1967, através da incorporação da Convenção Única sobre entorpecentes, considerado o mais completo arcabouço proibicionista de abrangência mundial assinada na sede da ONU m 1961. Esta convenção ampliou o alcance das medidas proibicionistas, além de burocratizar a estrutura regulatória internacional das drogas ilícitas.
A Convenção Única foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto 54.216/1964. Em 1976 é editada a Lei 6.386 apresentando uma compilação e ampliação de normas anteriores, revogada pela lei 11.343/2006. A nova Lei de Drogas confirma que o Brasil não foge à política padronizada de repressão ao comércio de drogas. Adota a "teoria dualista do sistema penal com regras de imputação e princípios de garantias processuais de dois níveis" protege os consumidores (Bonho, 2006).

3.2. O TRÁFICO DE DROGAS NO BRASIL
O tráfico de drogas representa uma atividade em âmbito mundial, envolvendo muitos países, com alta lucratividade. Há países que são produtores. Os maiores produtores de folha de coca são Colômbia, Peru e Bolívia. Já os produtores de haxixe são: Marrocos, Afeganistão e Paquistão. Os de maconha, Colômbia, México, Nigéria e África de sul, segundo a Interpol (UNODCCP, 2000).
Existem várias rotas do tráfico que levam dos países produtores na América do Sul e Central, África e Ásia ao consumo na América do Norte e Europa. Ressalta-se, porém, que há uma importante rota de cocaína saindo do Peru e Bolívia passando pelo Brasil. O Brasil, no entanto, não é apenas rota para o tráfico, pois também tem produção e consumo. Informações da Polícia Federal de 2000 indicam a produção de haxixe e maconha no Brasil, bem como o refino da cocaína e o comércio de outras drogas como lança perfume.
Soares et all (2005) observou em alguns Estados do Brasil a questão do tráfico de entorpecentes não só como uma questão ilícita, mas na formação de um Estado paralelo ao Estado de direito, proporcionando certas serviços que são carentes ou não oferecidos pelo Estado. Assim, nesse contexto, ao invés de combater o tráfico de drogas por meio de políticas sociais a ação do governo brasileiro em políticas de contenção do uso e do tráfico de drogas se divide em três direções: tratamento de dependentes químicos, campanhas contra o uso de drogas e a utilização do aparato de segurança e justiça para reprimir o tráfico de drogas. No combate ao tráfico o país conta com ações das polícias e esporadicamente do exército. A polícia federal age na localização e destruição de plantações, no fechamento de refinarias e na apreensão de drogas nas rodovias federais, aeroportos e portos. As polícias civis e militares atuam as áreas urbanas, apreendendo drogas e armas, prendendo e investigando usuários e traficantes.


3.2.1. TRÁFICO DE DROGAS NA AMAZÔNIA
Silva (2008) retrata essa questão ao afirmar que as novas ameaças internacionais, como o narcotráfico, são elementos pertinentes para questionamentos em torno das regiões de fronteira da Amazônia. Conforme Couto (2010), a Amazônia se mostra como um local de passagem das redes internacionais do tráfico de drogas. O tráfico de entorpecentes na Amazônia envolve uma atividade organizada em rede que se materializa no território. Segundo o autor, a territorialização do tráfico de drogas nas metrópoles não pode ser entendida como um sistema fechado, mas como um sistema interconectado, fazendo parte de um sistema global.
Assim, o tráfico de entorpecentes é observado como um grande ameaça não ortodoxa para os estados, seja o Estado Nacional ou Estado Internacional. As políticas de combate a essa ameaça têm que buscar soluções para médio e longo prazo, entretanto o combate tem que ser imediato, seja por meio do endurecimento das políticas de repressão e/ou por meio de políticas econômicas e sociais educativas e redutoras de desigualdades.

IV. CONCLUSÃO
As respostas obtidas neste trabalho são importantes principalmente no que tange ao conhecimento das responsabilidades do Estado no combate a certas ameaças não ortodoxas, como é o caso do narcotráfico. Como observado, tornam-se necessárias adicionar novas estratégias de combate ao crime às tradicionais, como o aumento da penalidade imposta ao infrator ou do contingente policial. A interação social do indivíduo e os estímulos para a sua boa formação na forma de escolas de qualidade, praças de esporte/lazer, bibliotecas públicas, entre outros, assim como as condições oferecidas pelo poder público para a criação de estágios/empregos são fatores primordiais para que o problema da criminalidade seja controlado. Portanto, no combate à criminalidade é imprescindível o aumento dos investimentos públicos tanto na formulação e aplicação de políticas de segurança quanto na área social como: lazer, educação, esporte, geração de emprego. Porém, sem esquecer que essas ações têm que ser conjunta, governo e sociedade, seja no âmbito local, regional, nacional ou internacional, caso contrário qualquer tentativa estará fadada a ser mais uma política ineficaz. É o Estado e o seu poder de combate as ameaças não ortodoxas.
V. REFERÊNCIAS

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ARON, R. Paz e guerra entre as nações. Brasília: Ed. Universidade Nacional de Brasília, 1979.
BOBBIO, N. O problema da Guerra e as vias da paz. São Paulo, Ed. UNESP, 2003.
BONHO, L.T. Notas introdutórias sobre o direito penal do inimigo. Jus Navigandi, Teresina, ano10,n.1048, 15 de maio de 2006.
COGGIOLA. O. O comércio de drogas hoje. Olho da história, N 4, 2006. Disponível em: <www.oolhodahistoria.org.> Acesso em 12.10.2010.
CORDOVIL, S.P.S. & NASCIMENTO, D.M. Huntington e Waltz: Reflexões para análise dos "novos conflitos internacionais" IN: NASCIMENTO, D.M.(ORG.) "Amazônia e Defesa: dos fortes às novas conflitualidades". Belém, NAEA-UFPA, 2010.
COUTO, A.C.O. Tráfico de narcotráficos na metrópole de Belém: das redes ilegais a territorialização perversa. IN: NASCIMENTO, D.M.(ORG.) "Amazônia e Defesa: dos fortes às novas conflitualidades". Belém, NAEA-UFPA, 2010.
GUIMARÃES, SINARA G.Q.A. Identificação criminal: Perfil dos presos por tráfico de drogas da Justiça Federal, Subseção de Santarém-Pa. Monografia de Especialização do Curso de Ciência Criminais. UFPA, 2009.
MARTINS, I. O comportamento criminal sob o enfoque de um modelo sócio-econômico. Consulta em http://www.citynet.com.br/retratofalado/Artigo5.htm em outubro de 2010.
SILVA, F.C.T. A Amazônia e as novas ameaças mundiais. IN: NASCIMENTO, D.M.(ORG.) "Relações internacionais e defesa na Amazônia". Belém, NAEA-UFPA, 2009.
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