O Despertar de um Gigante?

Brasil à beira de um abismo, mas rodeado de oportunidade.

“Não temos sido puros e ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer " pelo menos não fui tolo" e assim não ficarmos perplexos antes se apagar a luz...

Mas eu escapei disso Lori, escapei com a ferocidade com que se escapa da peste e esperarei até você também estar mais pronta.”

Clarice Lispector

Sempre sinto calafrios ao ouvir o hino da nação. Sinto-me envolto pela energia que envolve as pessoas que estão bem ali do meu lado e tantas outras espalhadas desde o Oiapoque ao Chuí, sem mencionar aquelas que estão pingadas mundo afora. Tem gente que pensa que o hino é dedicado a time da seleção, mas na verdade é uma ode a todos os brasileiros. Devíamos ouvir o hino mais vezes, é uma pena que só o tocam em jogos de futebol.

Mas eu senti, também, calafrios ao ver fotos de todas as manifestações que eclodiram ontem pelo Brasil, do mesmo jeito que sinto quando ouço o hino nacional. A denominada “WhiteMonday”, ou até mesmo “Primavera do Brasil”, denominação que li nas redes sociais, despertou em mim e, aparentemente, em tantos outros jovens um sentimento de união semelhante àquele evocado em um jogo internacional. Não me senti parte de um mero grupo manifestante, mas pedaço de um verdadeiro país, uno e determinado a um objetivo.

Uma dúvida que levanto, portanto, qual seria esse objetivo ao qual me senti motivado? E essa é, infelizmente, uma resposta que a maioria dos manifestantes não sabe responder. Cheguei a escutar que é um protesto sem causa certa. Isso não existe, e, se existir, é mais uma disputa de quem grita mais alto do que um movimento sério. Opto por não acreditar nessa possibilidade e continuo a indagar, qual a razão dessa manifestação?

Alguns pouquíssimos leigos responderão que se trata do aumento de 0,20 centavos nas tarifas de transporte público de São Paulo (alguns engraçadinhos me afirmaram que se trata do aumento de 0,40 centavos porque tem a ida e a volta); outros dirão que é uma resposta popular aos gastos excessivos e absurdos do governo petista para com a Copa do Mundo e com as Olimpíadas; os pragmáticos me dirão que é uma revolta contra a corrupção, enquanto os radicais pedem o Impeachment da Dilma; e os mais integrados no Movimento Reivindicalista Estudantil me darão 20 (um para cada centavo do aumento tarifário citado) motivos ligados a falhas e problemas da situação política brasileira. Todas (ou quase) são respostas válidas, mas, definitivamente, incompletas.

Incompletas pois resta uma única porém essencial questão final: “E ai? O que que agente quer?”. E, de fato, o movimento ainda não definiu uma meta. Prostesta-se por protestar? O grito pela luta e a luta pelo grito é uma causa válida para mobilizar quase 100 mil pessoas ao redor do país? Um entendimento distorcido das palavras de Gandhi afirmaria tal validade: “A alegria está na luta, na tentativa, no sofrimento envolvido e não na vitoria propriamente dita.”

Porém o real significado dessas palavras de Gandhi não é o estabecimento de uma luta pela luta, instaurando uma espécie de teoria do caos na sociedade. O indiano, com essas palavras, sabia que a luta por si, sem efetividade, sem fim ou sem reivindicação, não iria por a comida na boca de quem tem fome e muito menos libertar o país das correntes de um governo corrupto. A luta é só a primeira etapa do movimento.

Dito isso, afirmo uma única verdade: o movimento “Primavera Brasileira” (ou quaisquer que seja a denominação utilizada) está, assim como seu objetivo, incompleto.

Incompleto por dois motivos essenciais, primeiro porque, na realidade, o gigante ainda não acordou! Na realidade ele se encontra muito distante de sua completa força. Basta que se analise, um movimento de tamanha repercussão midiática e influência nos mais diversos círculos sociais contou com a participação presencial de, no máximo 100 mil pessoas, enquanto o Corso de Teresina (tido como o maior do mundo mas mesmo assim, apenas um Corso) contou com mais de 200 mil. O país tem potencial para mais do que isso, muito mais.

E ainda, é incompleto pois lhe falta meta, lhe sobra desejo mas peca no momento de canalizar este desejo em reinvidicações sólidas. A oportunidade foi construída por aqueles que iniciaram este grande movimento, mas para que toda esta potência não se perca nas linhas do tempo é preciso concretizá-la. Particularmente, apenas vejo uma realização possível que solucionaria todos os problemas que afligem o povo brasileiro: a Conscientização.

A Conscientização de que as reais armas de combate ao governo corrupto já foram conquistadas e garantidas em Constituição, somos dententores do Poder Democrático! Nas palavras do presidente norte-americano Abraham Lincoln, “Uma cédula eleitoral tem mais força que um tiro de espingarda”. A Conscientização de que o voto consciente e bem utilizado é, sem dúvida alguma, o trunfo verdadeiro em favor da sociedade. Resta, apenas, fazer com que o povo saiba utilizá-lo.

E esse deve ser a herança que este movimento nos deixa. Transformar um país de apáticos políticos em uma nação de cidadãos completos nos termos aristotélicos, lobotomizar do cérebro brasileiro a idéia de que política é uma atividade “imoral e suja” para conscientizá-lo que se a política se apresenta dessa maneira, é apenas porque nós a deixamos. Em poucas palavras, a concretização desse movimento deve ser a Conscientização de um povo que esqueceu sua força e importância. Brasil, usa teu poder! Conscientiza o povo do poder que tem.

Antes de concluir, gostaria de fazer uma última crítica ao movimento, para a qual lançarei mão das palavras de Nietzsche: “Quem luta com monstros deve velar por que, ao fazê-lo, não se transforme também em monstro. E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti.” Manifestantes, não tornem-se monstros, não minem o potencial da manifestação com ações desmedidas ou crimonosas. O objetivo não é a luta pela luta, é a luta pela conscientização, futuro e país melhor.

O Gigante ainda não acordou, apenas abriu seus olhos e se deparou com um mundo sujo. Resta decidir se vamos deixar que ele apenas cerre novamente seus olhos ou o faremos despertar para as oportunidades que se apresentam.

Rafael Rio Lima Alves de Medeiros

Acadêmico de Direito da Universidade Federal do Piauí