O CONTRACTO COMO FUNDAMENTO DOS RELACIONAMENTOS AFECTIVOS

  1. INTRODUÇÃO

O contracto social não é só uma questão que interessa a cidade como um todo, mas é também uma questão intrínseca aos relacionamentos mais estreitos da sociedade, uma vez que, a todo tempo estamos querendo dar e receber amor, o que põe nossos relacionamentos numa condição de troca de afetos. Este artigo pretende explicar como este contracto social se apresenta no seio dos relacionamentos.

      2. O CONTRATO SOCIAL

O contrato social foi uma proposta atribuída pelo filósofo e teórico político Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), que se baseia num contrato entre os indivíduos de modo a construírem uma sociedade justa, o que só pode ser possível mediante ao Estado que protege os direitos dos indivíduos, ou seja, mediante a um contrato. Rousseau defendia que o homem nascera bom, porém, fora corrompido pela sociedade; mais especificamente, o desenvolvimento da arte, da ciência e o advento da civilização, trouxeram a corrupção entre os homens. Ora, Rousseau acrescenta que, antes da civilização, o homem vivia em profunda conexão com a natureza com os outros ao seu redor, o que justificava a presença da harmonia entre todos e que, a partir do momento em que um deles, tendo cercado um terreno, levantou a mão e gritou “isso é meu”, é que surgiu então a propriedade privada e consequente afastamento entre os homens, resultando assim na apropriação de terras, na exploração de mão-de-obra, na luta de todos e consequentes conflitos entre os homens.

Com o passar dos tempos, os valores foram se perdendo. A justiça favorecia apenas uma parte (a elite), surgindo assim a desigualdade entre os homens. Ora, a necessidade de se resgatar a justiça e a harmonia entre os homens era u aspecto a ser atendido. É a partir daí que Rousseau propôs o contrato social, uma espécie de construção social, onde os indivíduos discutiriam sobre como queriam viver, favorecendo não apenas uma parte da sociedade, mas todas as partes, de modo a tornarem possível a justiça que desaparecera na corrupção do homem.

      3. O CONTRATO NOS RELACIONAMENTOS

Aprendemos que precisamos amar as pessoas como a nós mesmos. Aprendemos também que a construção de relacionamentos amigáveis é fundamental para termos uma vida melhor; e que o bom relacionamento com o outro torna nossas vidas mais felizes. Podemos constatar que todas essas aprendizagens levam-nos ao altruísmo (a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro e sentirmos suas dores e angústias). Isto de facto é fundamental para uma vida boa. Ao percorrermos mais profundamente nesta reflexão, poderemos perceber uma espécie de contrato ou trocas nos relacionamentos.

No trabalho por exemplo, fazemos contractos onde estabelecemos como devemos trabalhar e conviver dentro da empresa ou organização. Vejamos ainda os relacionamentos amorosos; podemos constatar que também baseiam-se em trocas de afetos entre os envolvidos. Entramos nos relacionamentos de modo a trocarmos afetos; o amante oferece seu amor para sua amada; e a amada, por sua vez, retribui seu amor para o amante. Duas pessoas unem-se para trocarem beijos, carinhos, palavras e prazeres, ao ponto que, quando uma das partes não corresponde a estas práticas afetivas, a relação se desfaz, ou seja, o contracto se desfaz.

Do mesmo modo, ao entrarmos em uma relação amigável com alguém, fazemos promessas de nunca trairmos e de nunca decepcionarmos este alguém. Ora, no momento em que somos tomados pelo desejo de loucura e, por alguma razão, traímos este alguém, a promessa que se fizera no início da relação quebra-se e o relacionamento se desfaz, ou seja, o contracto se desfaz.

      4. O CONTRA E SOCIEDADE

É importante realçar que este contrato nas relações é, na sua maior parte, inconsciente, afinal, ninguém entra num relacionamento com um papel onde são apontadas as cláusulas do contrato da relação, porém, isto não elimina o facto de existir um contracto. Por outro lado, os contractos nos relacionamentos também podem ser conscientes. São muitos os casais que antes de embarcarem numa relação amorosa, discutem quais devem ser seus limites dentro do relacionamento, o que nos leva a constatar que a Ética, a discussão da melhor forma de viver, não limita-se apenas à cidade como um todo, mas que acontece também nos relacionamentos conjugais.

Observamos assim que estamos o tempo todo a fazer contractos nos nossos relacionamentos afetivos, embora, muitas vezes, não estejamos conscientes disso. Nossa pretensão, ao entrarmos num relacionamento, é que o outro corresponda seu amor e sua amizade e que nós correspondamos também o amor e a amizade que o outro nos dá.

Ora, estabelecer parâmetros de convivência pode ser um bom caminho para as nossas relações, sobretudo nas relações conjugais. Conversar com a pessoa amada sobre como queremos conviver é sempre fundamental para que se construa uma relação mais sólida e harmoniosa. Estabelecer limites previne eventuais decepções, eventuais tristezas e eventuais traições dentro da relação, uma vez que já se conhece quando baixar o desejo da loucura e quando levantá-lo, o que chega, de certa maneira, a tornar nossos relacionamentos mais saudáveis.

      5. CONCLUSÃO

Neste sentido, percebe-se que os contractos não são feitos apenas em locais de trabalho ou em ambientes corporativos, mas que são feitos também nos nossos relacionamentos com os outros, mesmo que muitas vezes não estejamos conscientes disso. Todavia, os contractos acontecem. Estar consciente disso é fundamental na hora de se discutir sobre a melhor maneira de viver, o que torna os relacionamentos mais saudáveis e alegres.

      6. REFERÊNCIAS

Rousseau, Jean-Jacques. (1754). Discurso sobre a origem da desigualdade. eBookBrasil. [PDF].

Rousseau, Jean-Jacques. (1762). Do Contrato Social. eBookBrasil. [PDF].