RESUMO

A presente pesquisa baseia-se na análise das medidas do Conselho Nacional de Justiça no enfrentamento à pandemia da Covid-19 no sistema prisional brasileiro. A problemática do artigo científico consiste em verificar a eficácia das medidas adotadas pelo Conselho Nacional de Justiça no combate à disseminação da covid-19 nos estabelecimentos penais do Brasil. A pesquisa pretende revelar que as medidas adotadas pelo Conselho Nacional De Justiça no enfrentamento à pandemia da covid-19 nos estabelecimentos penais foram eficientes. O presente trabalho consiste em uma pesquisa de natureza básica, cujo objetivos foram alcançados através de uma pesquisa descritiva, pois se apreciou dados coletados durante a pandemia da covid-19 no Brasil, com a sua consequente descrição. Quanto aos procedimentos, esta pesquisa se utilizou de uma abordagem bibliográfica e documental, pois foram usados uma recomendação e relatórios do Conselho Nacional De Justiça. Além disso, também foram utilizadas leis brasileiras que tratam do direito à saúde, principalmente a saúde dos presos, textos de autores em destaque no tema em comento e outras fontes de dados. Assim, conclui-se que as medidas preventivas da covid-19 estabelecidas pelo Conselho Nacional De Justiça na sua recomendação de número 62 do ano de 2020 foram efetivas, pois executadas pela maior parte das unidades federativas do Brasil, principalmente as medidas referentes à soltura dos presos, a suspensão de visitas, a adoção de audiências por videoconferência, dentre outras, que evitaram a infecção de diversos presos pela covid-19.


 


Palavras-chave: Conselho Nacional De Justiça; Covid-19; Sistema Prisional; Medidas Preventivas; Saúde.


 


ABSTRACT


 


The present research is based on the analysis of the measures of the National Council of Justice in facing the Covid-19 pandemic in the Brazilian prison system. The problem of the scientific article is to verify the effectiveness of the measures adopted by the National Council of Justice in combating the spread of covid-19 in penal institutions in Brazil. The research intends to reveal that the measures adopted by the National Council of Justice in facing the covid-19 pandemic in penal establishments were efficient. The present work consists of a research of a basic nature, whose objectives were achieved through a descriptive research, as data collected during the covid-19 pandemic in Brazil was appreciated, with its consequent description. As for the procedures, this research used a bibliographical and documentary approach, as a recommendation and reports from the National Council of Justice were used. In addition, Brazilian laws dealing with the right to health were also used, especially the health of prisoners, texts by authors highlighted in the subject under discussion and other sources of data. Thus, it is concluded that the preventive measures for covid-19 established by the National Council of Justice in its recommendation number 62 of the year 2020 were effective, since they were implemented by most of the federative units of Brazil, mainly the measures related to the release of prisoners, the suspension of visits, the adoption of hearings by videoconference, among others, which prevented the infection of several prisoners by covid-19.


 


Keywords: National Council of Justice; Covid-19; Prison System; Preventive measures; Health.


 


INTRODUÇÃO


 


A disseminação da Covid-19 se deu inicialmente na China em dezembro de 2019. Em decorrência de uma sociedade internacional bastante interligada como também devido à globalização, que relativizou as fronteiras nacionais por todo o planeta, o vírus da Covid-19 se espalhou por todo o mundo atingindo todos os continentes, instalando um estado de emergência na saúde global.


No Brasil, a disseminação da covid-19 teve início no ano de 2020, quando as autoridades brasileiras buscaram evitar que a doença atingisse proporções cada vez maiores, em especial nos estabelecimentos penais, âmbito de atuação do Conselho Nacional De Justiça (CNJ), que por sua vez estabeleceu diversas medidas preventivas através da Recomendação de número 62. Isso porque o vírus tem alto poder de disseminação em tais ambientes, o que poderia desencadear uma situação de calamidade pública envolvendo principalmente os presos.


Diante disso, o problema da presente pesquisa consiste em: As medidas de combate à disseminação da covid-19 no sistema prisional brasileiro estabelecidas pelo Conselho Nacional De Justiça foram eficazes?


Ante ao exposto, a pesquisa objetiva analisar quais as medidas de combate à disseminação da covid-19 nos estabelecimentos penais brasileiros foram adotadas pelo CNJ através da recomendação 62/2020, e se tais medidas evitaram uma grande disseminação da covid-19 no sistema prisional brasileiro.


Cabe ressaltar que é de suma importância o estudo do presente tema, já que a partir dele é possível obtermos uma visão sobre como os presos são protegidos pelas autoridades competentes, principalmente no que se refere à saúde, esta que foi gravemente ameaçada no contexto da pandemia da covid-19.


Utilizou-se nesta pesquisa, para fins de se atingir os objetivos traçados, uma Recomendação e Relatórios do CNJ divulgados durante a pandemia da covid-19. Também foram analisadas leis brasileiras que estão relacionadas ao direito à saúde, em especial a saúde dos presos, textos de autores em destaque no tema abordado, e também outras fontes de dados sobre o tema em comento.


Assim, esse trabalho consiste em uma pesquisa bibliográfica e documental, além de ser descritiva, pois se apreciará dados coletados durante o contexto da pandemia da covid-19 no Brasil, com a sua consequente descrição.


Os dados e informações serão apresentados em três tópicos, a saber: O primeiro abordará a conduta do estado na garantia do direito à saúde dos presos no sistema prisional brasileiro. O segundo tratará das medidas adotadas pelo CNJ no enfrentamento à pandemia da Covid-19 no sistema prisional. O terceiro tópico refere-se aos relatórios de monitoramento da covid-19 e da recomendação de número 62 do CNJ no sistema penitenciário.


 


1 A CONDUTA DO ESTADO NA GARANTIA DO DIREITO À SAÚDE DOS PRESOS NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO


 


A Constituição Federal de 1988 elevou o direito à saúde a categoria de direito fundamental, incluindo-o no rol dos direitos sociais, conforme consta no seu Art.6o (BRASIL, 1988).


Além disso, o direito à saúde passou a ser um direito de todas as pessoas, e também um dever do Estado, conforme consta no Art.197 da Constituição Federal de 1988. O Estado irá garantir o acesso à saúde por todos através de políticas sociais e econômicas que diminuam os riscos de doença e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção (BRASIL, 1988).


Sobre a garantia do direito à saúde previsto na Constituição estendido à todos, vejamos o que diz Santos e Diel (2016, p.10):


 


A Constituição não trata a saúde apenas como a ausência de doenças nos seres humanos, mas sim na ótica da proteção, prevenção e promoção da saúde, preocupando-se não só em tratar os males que podem acometer a população, deixando clara a intenção do Estado em proporcionar digna qualidade de vida aos seus cidadãos, sem distinção.


 


Além disso, no Art.5o, inciso XLIX, da Constituição Federal de 1988, assegura-se aos presos a integridade física e moral. Essa integridade física e moral está incluída no conceito de saúde definido pela OMS, como vimos acima. Assim, a Constituição de 1988, ao proteger a integridade física e moral dos presos, também lhes assegurou o direito à saúde de maneira expressa, sendo mais uma evidência de que o direito à saúde dos presos é um direito constitucional, devendo ser respeitado em todas as esferas (BRASIL, 1988).


Todos os direitos do preso que não sejam atingidos pela sentença penal condenatória são resguardados. Isso quer dizer que ao preso são assegurados o direito à vida, à igualdade, à integridade física e moral, não podendo ser submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, à inviolabilidade da honra, entre outros (MARCÃO,2012, p.35).


Na Lei De Execução penal (LEP), nos termos do seu Art.10, caput e parágrafo único, O Estado tem o dever de prestar assistência ao preso e ao internado. Essa assistência também estende-se ao egresso, e visa previnir o crime e orientar o retorno do preso à convivência em sociedade (BRASIL, 1984).


A assistência a ser prestada ao preso, nos termos do Art.11 da Lei de Execução penal, está dividida em assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa (BRASIL, 1984).


A assistência à saúde do preso, prevista no Art.14 da LEP, observa os direitos constitucionais assegurados às pessoas, e em especial aos presos, como o direito à vida, à integridade física e moral do próprio preso, dentre outros.


Nos termos do Art.14, caput, da Lei de execução Penal, a assistência à saúde do preso terá caráter preventivo e também curativo, além de que a assistência à saúde irá compreender o atendimento médico, farmacêutico e odontológico aos presos (BRASIL, 1984).


Os cárceres brasileiros, numa perspectiva geral, possuem algumas características marcantes. Japiassú (2013, p.104) diz que essas características são a “superpopulação carcerária, cultura do autoritarismo, violência sistêmica, falta de condições de higiene e oferta insuficiente de trabalho e de estudo”.


Santos e Diel (2016, p.5), sobre a situação atual do sistema prisional no Brasil e citando Carvalho, diz que tal autor


 


ressalta a relevância de ser tratada a questão carcerária na sociedade brasileira, descrevendo que a realidade dos presídios em todo país é o retrato fiel de uma sociedade desigual e da ausência de uma política setorial séria e estruturada que enfrente a ineficácia do sistema penitenciário. O autor acrescenta que o quadro do sistema penitenciário é caótico, revelando uma “desassistência” generalizada nos presídios, reflexo da ausência de uma política que rompa com o estado de degradação em que se encontram milhares de homens e mulheres presos.


 


O Brasil contém a quarta maior população carcerária do mundo, contando atualmente com mais de 607 mil pessoas reclusas em um sistema prisional, este que está em estado de superlotação, apresentando déficit superior a 231 mil vagas. Esses são dados fornecidos pelo Ministério da Justiça em 2015, presentes no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ, 2015).


De acordo com Viana (2012), entre todos os problemas enfrentados nas prisões do Brasil, o maior deles consiste no fenômeno da superlotação. Em vista disso, em decorrência da superlotação das celas e das instalações insalubres, os presos estão mais predispostos ao contágio de doenças.


Arruda et al. (2013), sobre o direito a saúde dos presos, destacaram que o acesso à saúde das pessoas privadas de liberdade é ruim, o que mostra a inadimplência do Estado de seu dever de prestar a assistência à saúde do preso.


 


2 AS MEDIDAS ADOTADAS PELO CNJ PARA O ENFRENTAMENTO A PANDEMIA DE COVID-19 NO SISTEMA PRISIONAL


 


Em 17 de março de 2020, o CNJ publicou a recomendação de número 62, com o fim de Recomendar aos Tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção do novo coronavírus causador da Covid-19 no âmbito dos sistemas de justiça penal.


Em vista disso, o Art.1o, caput, da recomendação número 62 do CNJ, diz que tal recomendação vem “Recomendar aos Tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – Covid-19 no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo” (BRASIL, 2020c).


A recomendação de número 62 do CNJ possui finalidades específicas, de acordo com o parágrafo único do seu Art.1o, listadas nos incisos desse mesmo artigo. Dentro dessas finalidades específicas, encontram-se as seguintes: a proteção à vida e à saúde dos presos, dos magistrados e dos servidores e agentes públicos que fazem parte do sistema prisional e de justiça penal, principalmente daqueles que fazem parte do grupo de risco da covid-19, como os idosos, as gestantes e pessoas com doenças crônicas; reduzir a propagação do vírus da covid-19, reduzindo as aglomerações nas unidades prisionais e judiciárias; garantir que haja a continuidade da prestação jurisdicional, sem que ocorra a violação dos direitos e garantias individuais (BRASIL, 2020c).


No inciso I do Art.4o da recomendação de número 62, com o objetivo de possibilitar a saída de pessoas dos estabelecimentos penais, os magistrados são orientados à reavaliarem as prisões proviórias, priorizando-se determinados grupos de pessoas (BRASIL, 2020c)


Na alínea b do Art.4o, inciso I, da recomendação número 62 do CNJ diz que deve-se priorizar a reavaliação das prisões provisórias de


 


pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus; (BRASIL, 2020c)


 


No inciso III do Art.4o da recomendação de número 62 do CNJ, com o fim de evitar a entrada de novos presos nos estabelecimentos penais, os magistrados são orientados à observarem “a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias” (BRASIL, 2020c).


No inciso I do Art.5o desta recomendação, é determinada como medida a ser adotada pelos magistrados, afim de possibilitar a saída dos presos dos estabelecimentos penais, a concessão de saída antecipada dos presos contidos no regime fechado e no semiaberto, dando prioridade também a certos grupos de pessoas (BRASIL, 2020c).


Na alíena a do Art.5o, inciso I, da recomendação de número 62 do CNJ, recomenda-se a concessão da saída antecipada priorizando-se


 


mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência e demais pessoas presas que se enquadrem no grupo de risco; (BRASIL, 2020c)


 


Medidas não menos importantes também no sentido de possibilitar a saída dos presos dos estabelecimentos penais afim de diminuir a propagação do vírus da covid-19 nesses ambientes foram as previstas nos incisos III e IV do Art.5o da recomendação de número 62 do CNJ. Nos termos do inciso III do Art.5o desta recomendação, os magistrados devem tomar como medida a “concessão de prisão domiciliar em relação a todos as pessoas presas em cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo Juiz da execução” (BRASIL, 2020c).


De acordo com o inciso IV do Art.5o da recomendação de número 62 do CNJ, os magistrados ainda ficam obrigados à observarem a medida referente a “colocação em prisão domiciliar de pessoa presa com diagnóstico suspeito ou confirmado de Covid-19, mediante relatório da equipe de saúde, na ausência de espaço de isolamento adequado no estabelecimento penal” (BRASIL, 2020c).


O CNJ, através da recomendação de número 62, do dia 17 de março de 2020, estabeleceu medidas afim de evitar e diminuir a propagação da covid-19 nos estabelecimentos penais.


Nas audiências que ocorrem durante os processos, os réus presos normalmente se deslocavam até o local determinado para a ocorrência de tais audiências. Nessas, o preso entra em contato com várias pessoas, principalmente naquelas que são públicas, onde recebem o público em geral. Com a pandemia da covid-19, e com o fim de evitar o contato dos presos com outras pessoas no ambiente externo, recomendou-se aos magistrados e tribunais, no Art.7º, caput, da recomendação de número 62 do CNJ, que


 


aos Tribunais e magistrados com competência penal que priorizem a redesignação de audiências em processos em que o réu esteja solto e a sua realização por videoconferência nas hipóteses em que a pessoa esteja privada de liberdade, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus (BRASIL,2020c).


 


A pessoa quando é presa em flagrante, dentro de um período de 24 horas deve ser encaminhado para a audiência de custódia, onde o juiz vai decidir se o libera ou se mantém a pessoa presa. Em decorrência da propagação da covid-19, o CNJ, através do Art.8º, caput, da recomendação de número 62, publicada no dia 17 de março de 2020, recomendou aos magistrados e tribunais que


           


em caráter excepcional e exclusivamente durante o período de restrição sanitária, como forma de reduzir os riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerar a pandemia de Covid-19 como motivação idônea, na forma prevista pelo Art.310, parágrafos 3º e 4º , do Código de Processo Penal, para a não realização de audiências de custódia (BRASIL,2020c).


 


Ocorreu a implementação de medidas no sentido de evitar que pessoas com covid-19 tenham contato com a população presa, e consequentemente sendo um vetor de transmissão dentro dos estabelecimentos penais. Assim, o inciso II do Art.9º da recomendação de número 62 do CNJ determina o


 


procedimento de triagem pelas equipes de saúde nas entradas de unidades prisionais e socioeducativas, com vistas à identificação prévia de pessoas suspeitas de diagnóstico de Covid-19 e prevenção do contato com a população presa ou internada; (BRASIL, 2020c)


 


Uma medida muito interessante e importante no combate a covid-19 no interior dos estabelecimentos penais foi o abastecimento obrigatório de remédios e alimentos, permitindo até mesmo aos visitantes dos presos levarem um número maior desses itens. Desse modo, o inciso IV do Art.9º da recomendação de número 62 do CNJ determina que ocorra o


 


abastecimento de remédios e fornecimento obrigatório de alimentação e itens básicos de higiene pela Administração Pública e a ampliação do rol de itens permitidos e do quantitativo máximo de entrada autorizada de medicamentos, alimentos e materiais de limpeza e higiene fornecidos por familiares e visitantes; (BRASIL, 2020c)


 


Quanto a infecção dos agentes públicos pelo vírus da covid-19, foi determinado também que tais agentes, quando infectados, sejam afastados do serviço, afim também de evitar a transmissão do vírus da covid-19 para os presos. Assim, no inciso IX do Art.9º da recomendação de número 62 do CNJ é orientado que ocorra o


 


planejamento preventivo para as hipóteses de agentes públicos com suspeita ou confirmação de diagnóstico de Covid-19, de modo a promover o seu afastamento e substituição, considerando-se a possibilidade de revisão de escalas e adoção de regime de plantão diferenciado (BRASIL, 2020c).


 


Por fim, no Art.11 da referida recomendação do CNJ tem-se uma medida importante para a hipótese de ser restrigida as visitas aos presos nos estabelecimentos penais, onde se previu que nessa situação não pode ser impedido o fornecimento de alimentos e medicamentos pelos próprios visitantes. Em vista disso, o parágrafo único do Art.11 da recomendação de número 62 do CNJ diz que “Na hipótese de restrição de visitas, não poderá ser limitado o fornecimento de alimentação, medicamentos, vestuário, itens de higiene e limpeza trazidos pelos visitantes” (BRASIL, 2020c).


 


3 O RELATÓRIO DE MONITORAMENTO DA COVID-19 E DA RECOMENDAÇÃO 62 DO CNJ NO SISTEMA PENITENCIÁRIO


 


Em maio de 2020, o CNJ criou o segundo relatório de monitoramento da covid-19 e de sua recomendação de número 62. Esse segundo relatório teve como intervalo de tempo objeto de sua análise o período que tem início em 19 de maio e fim em 29 de maio de 2020.


De acordo com o relatório de monitoramento II, foram adotadas medidas diversas da privação de liberdade, em todos os tipos de regimes, seja no aberto, semiaberto ou fechado. Tais medidas possibilitaram a soltura de diversos presos, em especial aqueles pertencentes ao grupo de risco da covid-19. Logo, essas medidas foram importantes no combate a pandemia da covid-19 no sistema prisional, pois a soltura dos presos possibilita inclusive um maior isolamento nos estabelecimentos penais em caso de infecção pela covid-19. Assim, o relatório de monitoramento II expõe que


 


Nesta segunda consulta do Formulário de Monitoramento sobre a Recomendação nº 62 foi incluída uma questão geral sobre as medidas diversas da privação de liberdade concedidas no contexto da pandemia, independente de regime ou condição referente ao aprisionamento dos indivíduos que tiveram este benefício concedido. Entende-se como medidas diversas da privação de liberdade as solturas de pessoas presas (ou em cumprimento de medida socioeducativa, como veremos na seção seguinte deste relatório), de forma temporária ou não (como nos casos de antecipação de pena), visando a prevenção e a redução de riscos dos grupos mais propensos a serem afetados pelo vírus nas instituições de reclusão (BRASIL, 2020b, p.7).


 


Das medidas diversas da privação de liberdade adotadas no sistema prisional, a conversão das prisões em prisão domiciliar foi a mais adotada pelas unidades federativas do Brasil, no intuito de evitar a disseminação do vírus da covid-19. Com isso, possibilitou-se o melhoramento da saúde do preso que foi mandado para sua própria casa, além de diminuir o número de presos nos estabelecimentos penais, já que normalmente estão com uma população bem acima de sua capacidade (BRASIL, 2020b).


As solturas dos presos foram realizadas, tendo em vista os dados levantados pelo segundo relatório de monitoramento da covid-19 e da recomendação de número 62 do CNJ, por a maioria das unidades federativas, com o objetivo de combater a pandemia da covid-19. Com isso, o relatório de monitoramento II mostra que “Entre as 27 unidades da federação, houve solturas de presos especificamente relacionadas à questão da pandemia em 25 UFs, conforme vemos no quadro abaixo. Isso corresponde a 93% do total das unidades da federação” (BRASIL, 2020b).


Alguns estados realizaram muito mais solturas do que comparado a outros. No maranhão, 3.740 presos foram soltos devido a pandemia da covid-19. Por outro lado, no estado do tocantins apenas 65 presos foram soltos. No total, 35.026 presos foram soltos no Brasil. Em vista disso, o segundo relatório de monitoramento evidencia que


 


o número de presos soltos foi consideravelmente pequeno, somando, no total nacional, 4,64% do total (35.026 presos de um total de 755.274). Há, entretanto, variações importantes entre as UFs, desde os 30,2% (3.740 presos) que foram soltos no estado do Maranhão até os 1,46% (65 presos) que foram soltos no Tocantins (BRASIL, 2020b, p. 9).


 


No segundo relatório, o número de presos provisórios que obtiveram a soltura foi bem maior, um total de 8.194 (BRASIL, 2020b). Desse modo, o relatório de monitoramento II afirma que


 


O total de solturas das UFs que informaram esse dado foi de 8.194, um número significativamente maior (136,4%) que as 3.466 solturas que haviam sido informadas na primeira consulta. A quantidade de solturas foi informada por 16 UFs, um número pequeno, apesar de maior do que o da primeira consulta, quando apenas 11 UFs haviam informado esse número (BRASIL, 2020b, p.11).


 


O relatório de monitoramento II demonstrou que as medidas de combate à covid-19 mais adotadas no regime fechado foram a higienização dos espaços nos estabelecimentos penais, o fornecimento de kit de higiene nas prisões e a disponibilização de locais para se isolar em caso de suspeita ou confirmação de infecção por covid-19 (BRASIL, 2020b).


No regime semiaberto, muitas unidades federativas relataram a suspensão do trabalho externo por parte do preso, sendo assim uma importante medida preventiva no combate a covid-19 no sistema prisional. Isso é o que diz o relatório de monitoramento II, afirmando que


 


No que se refere à realização de trabalho externo, consideradas as UFs que mantinham presos que estavam trabalhando, 10 suspenderam a sua realização, com o benefício da remição ficta mantido, enquanto em 14 unidades federativas a suspensão do trabalho ocorreu sem remição (BRASIL, 2020b, p. 19).


 


As saídas temporárias foram suspensas, de acordo com o segundo relatório de monitoramento, em 12 unidades da federação. O segundo relatório de monitoramento afirma que ocorreu “alterações nas saídas temporárias também foram reportadas pelas unidades federativas. A suspensão das saídas temporárias, com 12 UFs” (BRASIL,2020b).


Quanto as audiências por videoconferência para os réus presos, boa parte unidades federativas relataram a adoção de tal medida preventiva. O relatório de monitoramento II demonstra que


20 unidades da federação mencionaram haver adotado a medida com relação à fase de conhecimento criminal (9 UFs a mais do que na primeira consulta), enquanto 18 adotaram a realização de audiências por videoconferência na fase de execução penal (8 a mais do que a primeira coleta) (BRASIL, 2020b, p.24).


 


Em relação a suspensão das visitas aos presos como uma medida preventiva da covid-19, o segundo relatório mostrou que 26 unidades da federação adotaram tal prática. No tocante à entrega de alimentos nessas visitas aos presos, o segundo relatório de monitoramento demonstra que a suspensão da entrega de alimentos manteve-se em 12 unidades da federação, e apenas restrições nessa entrega foram relatadas em outras 11 unidades federativas (BRASIL, 2020b).


Assim, mesmo tendo sido uma quantidade consideravelmente grande de medidas preventivas da covid-19 estabelecidas pelo Conselho Nacional De Justiça através da recomendação de número 62 do ano de 2020, foram muitas as unidades federativas do Brasil que executaram essas medidas, ainda mais em um espaço de tempo relativamente pequeno, o que muito surpreende pela complexidade de algumas das medidas adotadas pelo CNJ.


 


CONSIDERAÇÕES FINAIS


 


Com base na presente pesquisa, concluímos que o direito à saúde está bem normatizado e previsto em lei. A nossa Constituição Federal de 1988 elevou o direito à saúde a categoria de direito social, ou seja, o Estado deve agir no sentido de que todos tenham tal direito satisfeito, incluíndo aqueles privados de liberdade.


A Lei de Execução Penal, criada no ano de 1984, veio para deixar ainda mais nítido a tutela do direito à saúde do preso, e para afastar de vez a ideia que alguns possuem no sentido de ver a população carcerária como um conjunto de pessoas desprovidas de direito, inclusive o direito à saúde, prevendo expressamente o dever do Estado em prestar assistência à saúde do preso.


No entanto, mesmo com tais previsões legais, o acesso à saúde por parte do preso ainda continua sendo muito restrito. Diversos fatores influenciam nessa restrição da satisfação do direito à saúde dos presos.


De acordo com o que foi explanado neste trabalho, alguns desses fatores que são uma barreira para o acesso à saúde do preso são a superlotação dos presídios, a ausência de uma estrutura e de equipamentos adequados para prestar uma boa assistência a saúde do preso, e por fim, a própria inércia das equipes de pessoas responsáveis por prestar a assistência a saúde do preso nos estabelecimentos penais.


De acordo com o que foi exposto no presente trabalho, concluímos que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se empenhou bastante no sentido de combater a disseminação da covid-19 no sistema Prisional do Brasil.


Através da recomendação de número 62, de março de 2020, o CNJ trouxe importantes medidas preventivas da covid-19 a serem implementadas pelos magistrados e tribunais nos estabeleciementos penais do Brasil.


Nessa recomendação, o CNJ determinou aos magistrados e tribunais do país que impusessem restrições as visitas nos presídios, evitando a entrada de novos presos no sistema prisional e permitindo a saída de diversos presos dos estabelecimentos penais, além de estabelecer outras diversas medidas de combate à pandemia da covid-19 no sistema prisional brasileiro, como a higienização constante dentro dos estabelecimentos penais e a restrição das visitas aos presos.


Como vimos, de acordo com o segundo relatório de monitoramento da recomendação 62 do CNJ e da covid-19 no sistema penitenciário, grande parte das unidades da federação adotaram no sistema prisional as medidas preventivas da covid-19 impostas pelo CNJ através da recomendação de número 62.


 As medidas de soltura foram adotadas por mais de cinquenta porcento das unidades da federação. Muitos presos provisórios também foram alvos dessas medidas de soltura.


No interior dos estabelecimentos penais, muito mais da metade das unidades da federação relataram que foram adotadas a higienização, o implemento de ações educativas e a disponibilização de espaços adequados de isolamento em caso de presos infectados pela covid-19.


As unidades da federação também relataram mudanças nas saídas temporárias dos presos no sentido de prevenir a disseminação da covid-19 nos estabelecimentos penais. Dessas mudanças, as mais relatadas foram a suspensão das saídas temporárias e a prorrogação do prazo de retorno.


Quanto às audiências com a participação do réu preso, quase todas as unidades da federação relataram a adoção dessas audiências por videoconferência, seja na fase de conhecimento, como também na fase de execução penal.


Em relação às visitas aos presos nos estabelecimentos penais, na totalidade mais de noventa porcento das unidades da federação relataram a suspensão dessas visitas como forma de combate a pandemia da covid-19.


Desse modo, diante dos resultados apresentados nos relatórios divulgados pelo CNJ, afirmamos que as medidas preventivas e de combate a covid-19 estabelecidas pelo CNJ na recomendação de número 62 foram efetivas, já que em grande parte do país relatou-se a adoção de tais medidas no sistema prisional, evitando-se assim maiores efeitos devastadores da pandemia da covid-19 sobre os cárceres brasileiros.


 


REFERÊNCIAS


 


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