Era plena quarta feira, manhã, quase todos os detentos estavam no pátio do PVM como era conhecido o presídio Vida Mansa, haviam tomado o café da manhã e estavam a espera da hora do almoço, uma rotina árdua no dia a dia dos detentos. Próximo ao alambrado, no qual havia um enorme buraco pelo qual os moleques vinham pegar a bola advinda de algum chute enviesado do campinho ao lado, se encontravam Arlindo Astrolábio Cruz, vulgo Marmota e Agnaldo Indumentário Couto, vulgo Caveira, numa espécie de troca de ideias. - Aí véio, por que a turma num deita o cabelo daqui pela brecha aí mano, dá no campinho, nas popular, muro e um rasga pra liberdade? Diante a indagação de seu colega Caveira, o Marmota fica indignado e responde: - Tu tá ficando brogoió meu, arriscá um gambé acertá um pipoco na tua molêra? Nesse exato momento cai uma bola perto deles, que o Marmota apanha e arremessa ao moleque que acaba de passar pelo buraco: - Aí baguá, vem cá, compra uma bira aí fora pra nois. Quando o garoto se aproxima, faz um cumprimento e pega o dinheiro, Marmota continua: - O troco é teu, cola lá. Enquanto o garoto dá as costas e sai, a conversa entre os dois encarcerados prossegue: - Sair daqui num é pobrema, o pobrema é ficar aqui na galera, tá ligado. Expressa-se o Marmota. - Oh véio! Num tô sacando. Replica o Caveira. - A maior parte que tá preso aqui, tem interesse em ficá, na casa de pedra, presta atenção, as mulé dos cara recebe dinhero do guverno enquanto os cara tá em cana, tá ligado, oh Caveira. - Só mano! - Já no meu caso, eu tô fazendo um pé de meia atraveis da mulé, para abrir um negolcio, mais só saio quando tivé dinhero junto o suficiente. - Tá pensando em ser comerciante, Marmota? - Vou investir numa biqueira, o ponto já tenho é o barraco, o dinhero é pro bagulho, sacô. - E como tu vai fazer pra sair na hora certa, Marmota? - Mais tu é otário Caveira, é só se apegá com o Jesus, o da cruz, melhor adêvo num tem. A gente vira evangélico e os irmão dá um jeito de livrar nois. - Só mano! Oh Marmota, tu nem tem medo dos botas te dá uma biabada ou até mermo um sapeco e tu saí de paletó de madeira, se tu passa muito tempo aqui dentro. - Tu é um bichenoio mermo Caveira, tu nunca viu falá dos dereitos humano não meu, nois semo bandido mais também semo gente, pesar que a familha dos cara que nois passa o cerol fica dispotregida, parece que os home do guverno num considera vítima morta como gente não, mais isso num é pobrema nosso. - Marmota, te aprecio, tu é escovado meu. - Tu é meu truta Caveira, mermo lesado, tu é meu truta, vamo pegá a cordurama que tá na hora.