O Bilinguismo como nova perspectiva educacional

O Brasil é considerado um país monolíngue tendo como língua oficial o Português. Essa legitimação de uma única língua em um país é praticamente obsoleta, já que há outras línguas faladas no Brasil por influências de vários fatores, além da Língua Brasileira de Sinais. Esse monolinguismo é sustentado pelas políticas linguísticas presentes no Brasil, por isso o reconhecimento oficial de outras línguas brasileiras não foi concretizado até hoje. Entretanto, foi mais que comprovado que o Brasil é multilíngue e que cada vez mais aparecem variações.
A Língua Portuguesa é classificada como primeira língua em todo o Brasil, porém há exceções. Para os surdos, a Língua Brasileira de Sinais é a primeira língua e o Português é a segunda língua, o mesmo acontece com as línguas indígenas e as línguas estrangeiras (imigrantes). O reconhecimento do português como segunda língua nesses casos, demorou um pouco. Os direitos lingüísticos foram dados aos indígenas e a imigrantes e que por causa disso existem propostas de ensino bilíngüe. No caso dos surdos, o processo foi demorado, mas em 2002 foi aprovada a lei n. 10.436/2002, reconhecendo legalmente a Língua Brasileira de Sinais como língua, ampliando a visão da população e refletindo novas mudanças na educação brasileira.
Antigamente, não havia oportunidades, como estudo e entretenimento para os surdos, como tem hoje na sociedade. Na década de 30 e 40, havia duas escolas de surdos no Brasil, o Instituto Santa Terezinha, em São Paulo e o Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Rio de Janeiro, porém eram freqüentados por poucos alunos que tinham condições financeiras melhores. Na década de 50, os surdos tiveram algum tipo de educação em instituições de Educação Especial. Eles tinham educação oralizada por estarem juntos de deficientes. A Língua Portuguesa sempre foi privilegiada e com isso os surdos sofreram a negação da língua de sinais e da cultura surda. A transição para o reconhecimento legal de LIBRAS, se deu a partir da década de 60. Na década de 80 e 90, a língua de sinais estava começando a ser usada nas escolas.
Com a lei n. 10.436, LIBRAS tornou a ser disciplina obrigatória nos cursos de Licenciatura e Fonoaudiologia, propõe a criação dos cursos: LETRAS em LIBRAS, pedagogia bilíngue, formação de intérpretes de LIBRAS e do curso de língua portuguesa, e sugere que as escolas públicas ofereçam LIBRAS no contexto escolar. Em 2006, foi criado o primeiro programa de Língua de Sinais na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com a meta de formar professores de Libras. Apesar da lei, em algumas escolas públicas o Português é imposto como a língua superior, ocupando um espaço central. O Português para os ouvintes é como a identidade de um povo, porém para os surdos, é apenas a língua do outro. A língua de sinais é como símbolo de identidade para os surdos e por isso não pode ser menosprezada. Os surdos possuem direitos à educação bilíngue enquanto grupo social e lingüístico, porém a realidade é outra. Ainda essa visão não foi difundida totalmente e muitas escolas são voltadas para os ouvintes, direcionado ao ensino oral, mas não por falta de estrutura, mas por falta de profissionais bem preparados. Além de a educação estar sofrendo mudanças favoráveis devido à regulamentação da Lei 10.436, para atender aos surdos com mais afinco, as tecnologias também estão sendo moldadas para o público surdo, tendo intérpretes de LIBRAS em programas na televisão, ampliando a visão dos telespectadores com relação aos surdos.
A geração dos surdos da década de 60 viveu o processo de negação da língua de sinais e o processo de transição para o reconhecimento legal. Dentro dessa geração existem os CODAs, que são ouvintes, filhos de pais surdos ou de outro parentesco, que cresceram tendo duas culturas e duas línguas. Existem fronteiras e zonas de contato entre os universos surdos e ouvintes e é a partir das experiências de bilinguismo dos CODAs que podem ser explicados algumas diferenças entre um universo e o outro. Estando constantemente nos dois universos, os CODAs sabem e entendem o que cada indivíduo, surdo ou ouvinte, precisa para se interagir. Com toda essa bagagem, os CODAs devem receber atenção especial por serem uma possível solução para melhorias futuras, propondo as adequações necessárias para favorecer os dois universos. Os aspectos visuais e motores das línguas de sinais são muito diferentes das línguas faladas e para as famílias, ter um CODA favorece o contato com o mundo ouvinte. Além de terem a oralidade, a visão espacial também fica mais aguçada desde a infância. Um CODA é um intérprete compulsório e desenvolve com naturalidade a língua de sinais. Ele se sente mais à vontade na zona de contato e é na comunidade surda que ele se familiariza. Ao mesmo tempo, tem que está envolvido com a fronteira, com o Português, com um mundo não-paterno.
Deve haver uma nova implementação educacional levando em conta os diferentes espaços da educação. As escolas da rede pública devem ser bilíngües para a unidade linguística ser completa. Muitos profissionais estão sendo preparados, mas a demanda é maior. O bilinguismo deve ser adotado por todos e os CODAs merecem reconhecimento e merecem ser bem aproveitados para ajudar a melhorar a educação e abrir as portas para uma nova perspectiva nacional. Acima de tudo deve haver o respeito e a valorização de ambas as línguas para a evolução da nossa sociedade.