Não são raras as vezes em que o humano, supostamente o único animal racional, tem um comportamento muito mais bruto e bestial do que qualquer outro animal, vistos os banhos de sangue, agressões contra animais, destruição de patrimônios públicos e muitas outras selvagerias que comete. Entre essas outras, tornou-se óbvio que o meio ambiente é outro complexo de seres – vivos ou não – que vem sofrendo horrores com a incapacidade de muitos humanos de pensar em fazer o bem e seguir uma conduta condizente com a tão arrogada racionalidade de sua espécie.

Antigamente os cercados envolviam aglomerações humanas protegendo o homem da bestialidade predadora dos animais selvagens. Já hoje, reparemos que as áreas menores de preservação ambiental são quase todas cercadas por muros ou cercas. Estes existem porque protegem os ecossistemas restantes da fúria selvagem dos... humanos. Sem o cercamento, invariavelmente haverá uma severa invasão e destruição da área natural pela ação humana.

Pelos mais diversos motivos, desde uma necessidade de usufruir dos recursos naturais locais até pura maldade, a maioria dos humanos ditos civilizados não demonstra capacidade de usufruir de forma saudável e sustentável os bens que um trecho de ecossistema pode fornecer. Para deter e controlar esse ímpeto destruidor, fizeram-se necessários aparatos socioantropológicos que determinassem o respeito ao ambiente como valor supremo – leia-se religiões sacralizadoras da natureza, que muitas vezes considera(va)m-na um(a) deus(a) – e, mais modernamente, barreiras físicas artificiais entre o território humano e o espaço natural.

O mais interessante é que essa relação irracional da humanidade com a natureza tem sido marcada por uma razão-e-proporção absurda e contraditória: o nível tecnológico de uma civilização é inversamente proporcional ao respeito ao meio ambiente e diretamente proporcional à destruição causada. Tornar-se "civilizado" e "avançado", ao invés de trazer evolução na relação humano-ambiente, recrudesceu os maus instintos do homem, tanto individual como coletivamente.

No âmbito individual, vemos desde roceiros totalmente desinformados e carentes de educação ambiental desmatando santuários ecológicos para ampliar suas propriedades até ricos fazendeiros ordenando a destruição de centenas de quilômetros quadrados de florestas para expandir pastos onde será "cultivado" um gado que, depois de morto, fornecerá a carne de grande parte dos recintos de fast-food espalhados pelas cidades do planeta. Para a natureza, esses agropecuaristas que frequentemente vestem pomposos paletós e se veem como gente muito culta agem pior do que as populações troglodíticas do Paleolítico em termos de bruteza.

Outro gradiente dessa selvageria antiecológica refere-se à poluição: desde o pedestre alienado que, mesmo a um metro de distância de uma lixeira, joga seu saco de pipoca na rua do seu bairro até o patrão de uma indústria química que, recusando-se a investir em gestão ambiental, prefere continuar lançando poluentes supertóxicos num rio.

A selvageria humana em termos ecológicos não é apenas individual como nos casos citados acima. A barbárie também se encarna na coletividade, as aglomerações antrópicas, num fenômeno que costumo chamar de "ecocâncer" e ironicamente tem fundamentos no pensamento filosófico, de origem ora religiosa ora pseudorracional, para o seu alastramento.

O progresso tecnológico e econômico não representou uma evolução humana a ponto de aprimorar a percepção intelectual e filosófica da relação humano-natureza. Pelo contrário, invocou a piora do pensamento antropocêntrico, segundo o qual o homem teria direito divino ou biológico a arrogar a posse do ambiente global e fazer dele o que quisesse, e a escora da humanidade na imatura crença de que os recursos naturais seriam ilimitados. O resultado não foi nem um pouco positivo.

Foi com essa sustentação que as cidades avançaram implacavelmente sobre florestas, campos e savanas, do mesmíssimo jeito com que povos bárbaros, como os hebreus bíblicos, os hunos e os mongóis, passavam por cimas de civilizações sedentárias destruindo suas cidades e massacrando populações inteiras. A mesma barbárie travestida de civilização, aliás, também vitimaria povos indígenas, massacrados e reclusos em minúsculos territórios do mesmo jeito que as unidades de conservação ecológica hoje englobam as poucas áreas naturais poupadas ou reflorestadas. Para sustentar tais cidades, foram semeadas imensas plantações e pastos, também responsáveis por pandêmicas devastações.

Em suma, uma combinação de expansionismo urbano e rural representou para o meio ambiente um câncer em metástase planetária, consumindo todos os ecossistemas terrestres, daí o termo "ecocâncer". A chamada "civilização moderna", se analisarmos bem, nada mais é que uma horda bárbara global vestida com paletós e tailleurs, praticante de uma bruteza irracional que nem mesmo os mais ferozes animais carnívoros da fauna terráquea são capazes de manifestar.

Por mais que o pensamento especista e antropocêntrico negue, a verdade é que o ser humano configurou-se com um comportamento bipolar extremo: ao mesmo tempo em que ostenta o atributo de animal de racionalidade mais acentuada devido a suas capacidades laborais, culturais e intelectuais excepcionais, é em contrapartida o mais selvagem, bruto, bestial e irracional de todas as espécies animais. É a única espécie capaz de destruir o seu próprio ambiente, assim como de matar seus semelhantes por motivos fúteis, e isso não é nada racional.

É irônico ver que uma espécie dita racional em seu modo mais "civilizado" precisa de cercas e aparatos socioantropológicos para não cometer os atos mais bestiais e irracionais possíveis contra o próprio ambiente. Entretanto, há um terceiro recurso, muito mais compatível com o potencial humano de agir como ser pensante e utilizar integralmente seu atributo de racionalidade: a educação. Para o caso de se opor à barbárie antiecológica, a Educação Ambiental.

Praticamente toda a bibliografia especializada em Educação Ambiental aponta-a como radicalmente diferente dos sistemas convencionais de educação. Ao contrário destes, que perpetuam o comportamento humano antropocêntrico, ecocancerígeno e alienado de responsabilidade ambiental, aquela, quando utilizada com todas as suas propriedades – interdisciplinaridade, estímulo do senso crítico, filosofia biocêntrica, etc. –, tem o poder de modificar a percepção humana sobre o ambiente onde vive e rechaçar o respaldo filosófico que autorizava a irracionalização do comportamento humano para com o mesmo.

A irracionalidade do Homo sapiens, nêmese das habilidades racionais do mesmo, existe, é muito forte e está desgraçando o meio ambiente, tornando a presença da "civilização avançada" geralmente nociva, ecocancerígena. Mas, antes tarde do que nunca, felizmente a Educação Ambiental vem aparecendo como antídoto. Ela está em ascensão e tem um grande potencial de, uma vez universalizada com seu poder integral, vencer o desafio de converter o comportamento ecobestial a uma atitude responsável e que realmente dará ao ser humano o atributo pleno de animal racional.