1. INTRODUÇÃO
Os aços são os metais mais versáteis utilizados pelos seres humanos,
por sua capacidade de se adequar as mais variadas aplicações desejadas.
A adição de carbono ao ferro provê características ao material como a
resistência à tração, compressão e flexão, uma maior resiliência, tenacidade,
resistência ao impacto aliada a uma maior dureza, resistência ao desgaste e
a fadiga, tudo isso em um único material com uma espessura e massa do
produto final menor do que se comparado a outros que apresentam as
mesmas ou somente algumas das características mencionadas.
Com essas propriedades adicionais e um crescente aumento da
produção de petróleo e gás associado a demanda energética e de matérias
primas derivadas do petróleo, foi necessário o desenvolvimento de um aço
que pudesse aguentar as solicitações de trabalho no fundo do oceano ou em
território em condições climáticas adversas. Isso possibilitou sua utilização
nas mais diversas aplicações, como em tubulações para extração de petróleo
e gás natural, peças automotivas, ferramentas de alto e baixo desempenho,
navios, entre outras.
Conseguir essas características, significa que teremos benefícios,
como não precisar fabricar produtos com grandes dimensões para que o
material aguente o trabalho a ser realizado, aumentamos os níveis de
segurança e confiabilidade do produto. Assim, economizaríamos matéria
prima, reduziríamos a massa final do produto, gastos adicionais com
transporte, na montagem e manutenção e, até mesmo, viabilizando novos
projetos que antes eram impossíveis de serem realizados.
Para que todo esse desenvolvimento fosse possível, foram avaliadas
e catalogadas metodologias, além de serem realizados testes de integridade
estrutural nos aços produzidos. Assim, determinaram-se requisitos que tem6
o nome de aços de alta resistência e baixa liga (ARBL). Dentre esses aços
temos aqueles com uma estrutura ferrítica-perlítica, que contém uma adição
de elementos de liga, que a complementação de um processo de laminação
controlada, tem sua resistência mecânica aumentada sem que seja
necessário aumentar a quantidade de carbono ou manganês, que são
prejudiciais a soldabilidade e tenacidade do material.
Os aços ARBL com o uso de aditivos tem características especiais
para o uso em sistemas dutoviários e são classificados segundo a American
Petroleum Institute (API), que na norma API 5L adota requisitos que devem
ser seguidos para a fabricação de tubos, como o limite de escoamento, limite
de resistência, composição química, tecnologia de fabricação do aço,
tecnologia da fabricação dos tubos, etc., sendo assim, possível, organizar,
em diversas categorias ou graus, os tubos fabricados.
A partir dessa norma, foram delimitados vários tipos de aço, conforme
seu limite de escoamento mínimo, que vão do API-5L-A25 até o API-5L-X100.
Nesse contexto, o tema escolhido será sobre o aço API-5L-X80 utilizados em
tubulações para extração de petróleo e gás, no qual serão abordadas
características sobre a microestrutura, aditivos e processos de fabricação.
Partindo da premissa de que houve um aumento crescente na
demanda de energia, petróleo, gás e de seus derivados, como a gasolina,
diesel e nafta para a fabricação de polímeros, no Brasil, na última década,
também houveram um aumento significativo na fabricação dos tubos para
transporte das matérias primas. Então, este estudo tem por objetivo avaliar
as características dos aços, como dureza, resistência a impacto, tração,
composição química, tipos de aditivos utilizados e os efeitos que provocam,
o e processo de fabricação. O estudo justifica-se pela importância ambiental
e econômica que o uso dos aços provoca no país, visto os desastres naturais
que podem ocorrer quando se dá uma falha catastrófica, como o
derramamento de petróleo no oceano, ou, ainda, a quantidade de empregos
que a indústria é capaz de gerar.7
2. REFERENCIAL TEÓRICO
A partir da década de 1970, com a introdução do processo de laminação
controlada com resfriamento acelerado no Brasil, em substituição à laminação
convencional, foi dado um avanço no desenvolvimento dos aços ARBL. Isso proveu
uma melhora de suas características, no que se diz a tenacidade do material,
soldabilidade e resistência mecânica. Esses materiais são aços microligados que
apresentam uma microestrutura composta por ferrita-perlita, sendo similar à de um
aço baixo-carbono, porém com o advento de pequenas adições de elementos de
liga, combinações diversas entre temperatura e deformação durante o processo de
laminação, que refinam o grão e precipitam carbonetos e nitretos dos elementos
microligantes, os quais impedem a recristalização, garantindo, assim, as
propriedades acima citadas. Conforme ilustrado no comparativo da figura 1,
diferentes processos de fabricação à diferentes temperaturas e variações nos
elementos de ligas podem gerar aços com diferentes granulometrias.
Figura 1 –
Comparativo
da granulometria dos aços com diferentes processos de fabricação.8
2.1 COMPOSIÇÃO QUÍMICA
Conforme a norma para a fabricação dos aços API-5L-X80, a composição
química deve ser a seguinte, para que consigamos algumas das características
citadas e possamos manufaturar o produto para que atinja os níveis desejados.
Figura 2 - Composição química do aço X80.
2.1.1 CARBONO
O carbono é o elemento central quando falamos no aumento da resistência
mecânica dos aços e reduz a suscetibilidade a trincas quando exposto ao frio,
melhora a tenacidade e ductilidade, porém, também é ele quem diminui a
soldabilidade do material, fator importante na fabricação de tubos, apesar de que já
existem processos que não envolvam solda. Então, para que possamos ter um
produto com as qualidades desejadas e equilibradas, devemos utilizar, no caso do
aço X80 para tubulações que serão soldadas, uma baixa quantidade de carbono e,
se utilizar de outros mecanismos para endurecimento do material.
2.1.2 NITROGÊNIO
Caso o nitrogênio (N) se apresente na forma livre no aço, pode comprometer
a tenacidade do mesmo. Então, para se evitar problemas, devemos diminuir o seu9
teor, combinando-o com outros elementos para formar nitretos que sejam estáveis
a altas temperaturas.
2.1.3 TITÂNIO
O titânio é comumente utilizado para formar e precipitar os nitretos que são
estáveis a altas temperaturas, diminuindo também o teor de N livre no aço. Além de
controlar, desse modo, o tamanho do grão austenítico durante a fase inicial da
laminação, as partículas de TiN, em certa concentração no aço, são capazes de
melhorar a tenacidade, desde que sejam finas e bem distribuídas.
2.1.4 ALUMÍNIO
O alumínio que sobra após a solidificação do aço, que não estiver presente
na forma de alumina, forma nitreto de alumínio, que possui um efeito refinador do
grão.
2.1.5 NIÓBIO
É capaz de fazer com que o aço seja laminado em uma temperatura onde a
recristalização e recuperação da austenita não ocorre, originando-a fina e encruada.
Isso faz com que aumente o número de locais onde ocorre nucleação de grãos de
ferrita, diminuindo o tamanho do grão e formando precipitados que melhoram o
endurecimento por precipitação. Assim, a adição de Nb reduz o tempo de laminação
e a carga aplicada no processo.
2.1.6 VANÁDIO
Aditivo utilizado para aumento de dureza pelo método de precipitação de
nitreto de vanádio na matriz da ferrita.10
2.1.8 MANGANÊS
É um candidato a substituir o carbono sem prejudicar o endurecimento, além
de melhorar a soldabilidade e, caso tivermos uma boa relação entre C e Mn,
poderemos melhorar a tenacidade do material. Ele também possui o efeito de
temperar o aço, podendo formar ferrita-bainita.
2.1.9 BORO
Utilizado para aumentar a temperabilidade do aço, pois concentra-se nos
contornos de grão dificultando a nucleação da ferrita em formato poligonal, que tem
menor resistência que a acicular.
2.1.10 MOLIBDÊNIO
Tende a conter a precipitação, forçando-a a ocorrer em temperaturas mais
baixas o que acarreta em um maior refino dos materiais precipitados. Ele também
aumenta a temperabilidade, sendo capaz de diminuir a quantidade de perlita e
facilitar a produção de martensita.
2.2 LAMINAÇÃO CONTROLADA E RESFRIAMENTO ACELERADO
O principal tipo de processamento pelo qual passa o lingote de aço é a
laminação, que consiste na redução da seção transversal por meio da compressão
gerada pela passagem entre dois cilindros que giram em torno de si, podendo ser
repetido várias vezes até que se atinja a espessura desejada. Dentro da laminação,
existem a laminação a quente, na qual aquecemos o lingote previamente até a
temperatura de recristalização para então laminarmos a chapa, e a laminação a frio,
que trabalha em temperaturas inferiores à de recristalização. Para o processo de
laminação ser executado, primeiramente devemos cortar em placas, os lingotes,11
para depois resfriarmos e as mandarmos para um forno onde são reaquecidas em
temperaturas próximas a 1200oC, para garantir que os elementos microligantes
estejam dissolvidos, antes da laminação.
Para a produção dos aços ARBL, devemos ter um maior controle das temperaturas
afim de conseguirmos atingir os objetivos da fabricação do produto. Para isso foi
desenvolvido a laminação controlada com resfriamento acelerado, no qual temos a
adição de elementos de liga como o Nióbio (Nb), Vanádio (V) e Titânio (Ti), com o
objetivo de podermos aumentar a temperatura de recristalização do aço, logo,
quando ele passar pelo processo, os grãos de austenita irão se deformar no sentido
preferencial em que corre a placa, ficando alongados ou com perfil acicular, em
forma de agulha, conforme detalhado na figura 2. Contudo, o tamanho do grão
resultante irá depender do grau de redução da chapa - ou a distância entre os rolos
da laminação - e, também da quantidade de precipitados que irão segurar os grãos
naquele tamanho na temperatura em que se está trabalhando. Esse processo
possibilita a transformação de uma austenita encruada em austenita-ferrita,
produzindo, por fim, um aço com uma granulação fina e com elevada resistência
mecânica e tenacidade.
Figura 3 - Processo de laminação12
Figura 4 - Esquema do grão após o processo de laminação controlada com
resfriamento acelerado.
Após sequências de laminação e recristalização, os elementos de liga
começam a surtir efeito no material, retardando o processo de recristalização e,
caso processemos o material neste estado, teremos uma nova recristalização,
porém será heterogênea e, para evitar isso, devemos ter um tempo de espera, entre
uma laminação e outra, até que não haja mais recristalização da austenita.
Só então podemos realizar uma nova laminação, em um gradiente de
temperaturas que vai da região de não recristalização da austenita e temperatura
Ar3, que dão aos grãos um formato achatado, aumentando a área de superfície e
formando novas bandas de deformação. A ferrita presente no material começa um
processo de nucleação, e irá se depositar tanto nas bandas de deformação13
formadas anteriormente, quanto nos novos contornos de grão, tendo como
resultado uma ferrita refinada e chapas com espessuras reduzidas em torno de
75%.
Figura 5 - Esquema das fases de laminação quanto as temperaturas
Após a laminação o produto deve ser resfriado e, para se enquadrar nas
normas dos aços API-5L-X80, passa pela técnica de resfriamento acelerado, na
qual tende a atingir os níveis de escoamento na ordem de 80 ksi (550Mpa). Nela o
material que laminou a quente é resfriado com água ou uma mistura de ar e água
sobre as chapas, onde as variáveis do processo são as temperaturas de início e
final, junto à taxa de resfriamento. Ao atingir a temperatura final, o resfriamento é
interrompido e a chapa é resfriada ao ar até a temperatura ambiente, evitando a
formação de martensita. Assim, conseguimos refinar o tamanho do grão ferrítico,
ganhamos um endurecimento por precipitação mais efetivo, entre outros.
Um exemplo dessas variáveis é apresentada abaixo, onde, na primeira
imagem, é aplicado um resfriamento a uma taxa de 461oC/minuto, e isso formou14
uma microestrutura com formato acicular. Já na segunda foi aplicada um
resfriamento de 3oC/minuto, produzindo uma ferrita poligonal com ilhas de
martensita-austenita.
Figura 6 - Microestrutura acicular
Figura 7 - Microestrutura de ferrita poligonal com ilhas de martensita-
austenita15
Também, na norma para os tubos produzidos com aços X80 são definidos os
limites de resistência, escoamento e a absorção de energia em teste de impacto,
conforme a figura abaixo.
Figura 8 - Propriedades do aço, onde:
*PF: ferrita poligonal
**AF: ferrita acicular
2.3 Testes de dureza
O teste de dureza na escala Vickers, divide a carga aplicada pela área de
superfície onde foi desenvolvida a endentação. Como a carga aplicada é pequena,
de 1 a 100 kgf, esse teste só é capaz de medir microdurezas e tem como unidade
de medida a sigla HV que significa, Hardness Vickers, e também pode ser calculada
pela fórmula:
Figura 9 - Fórmula para cálculo da dureza Vickers
Onde: F é a carga aplicada e d é a média das medidas das duas diagonais.
A carga é aplicada por um endentador em formato de pirâmide quadrada com 136o16
entre faces. A imagem abaixo ilustra a impressão deixada na peça após a
endentação:
Figura 10 - Impressão deixada pelo endentador Vickers
Para a realização dos testes foi utilizada uma chapa de aço API-5L-X80 com
espessura total de 19,1 mm e composição química de baixo carbono, nióbio, titânio
e vanádio. Dessa chapa foram extraídas amostras longitudinais na direção da
laminação, representando a parte interna dela, que variam de 1 mm a 18 mm de
produndidade. As mesmas foram preparadas para os testes através de lixamentos,
polimentos e atacadas com ácido nital 3%. Após a microestrutra foi analisada e
caracterizada pela técnica de microscopia de varredura eletrônica e, além disso, os
perfis de dureza do aço foram dados por testes de microdureza na escada Vickers.17
Primeiramente o material a ser estudado foi preparado nos parâmetros
citados no parágrafo acima e, então foi realizado o teste de dureza Vickers por toda
a seção do material, sendo as endentações separadas por um milímetro uma das
outras. Foram realizados, ao todo, dezoito endentações em cada corpo de prova,
sendo nove ao total. Com os dados obtidos, foi possível a montagem da tabela
abaixo, demonstrando um comparativo das durezas por corpo de prova e por
milímetro assim como a média das durezas por aquela seção e, também um desvio
da média e a média de dureza geral.
Figura 11 - Resultados do teste de dureza.
Agora, podemos observar que a média das durezas (228 HV ou 2235,996
MPa) é inferior àquela medida próximo as superfícies, como no ponto 18, que é de18
241 HV (ou 2363,487 MPa) e no ponto 1 que é de 234 HV (ou 2294,838 MPa). A
diferença de dureza entre as próprias superfícies pode ter ocorrido por uma possível
maior granulação do aço nessa região, devido a um resfriamento mais rápido.
Nas imagens a seguir está ilustrado a diferença de granulometria entre as
superfícies a 18mm e a 1mm, respectivamente, que justificam a diferenças de
dureza apresentada no teste.
Figura 12 - Microestrutura a 18mm da superfície
Figura 13 - Microestrutura a 1 mm da superfície19
CONCLUSÃO
Assim, com todas as informações descritas, podemos perceber que as
propriedades do material não dependem somente de sua composição química, mas
também dos processos de fabricação que são utilizados aliados ao controle dos
parâmetros de fabricação, como no caso apresentado.
Isto posto é possível que controlemos as propriedades dos materiais afim de
fabricarmos o aço proposto com pequenas adições de elementos que substituirão
o carbono, dando a mesma dureza proporcionada por ele, porém com a vantagem
de não influenciar na capacidade de solda do aço. Além disso, é possível
influenciarmos na granulometria do material simplesmente controlando a
temperatura do processo de laminação e depois resfriando-o rapidamente.