O abismo social brasileiro: de que lado nós estamos?

James Costa Arthuso

Dia desses estive refletindo sobre um ditado popular.  Sabe quando um pensamento fixa em sua mente e você não fica satisfeito enquanto não encontra uma resposta no mínimo plausível?  Pois bem, minha reflexão era sobre um ditado que diz algo como “são as diferenças que trazem beleza ao mundo”...

A impressão que sempre tive sobre o assunto é que em um mundo onde tudo fosse igual, realmente, não deveria haver muita graça. É o senso comum. E é claro que existem várias situações em que a diferença é aceitável, até mesmo imprescindível.  Mas será que o ditado em questão valeria para tudo na vida?  Até que ponto ele poderia ser encarado como algo moral, ético?  Pensei em várias questões em que a diferença é moralmente aceita, como o gosto pessoal, a forma de se vestir, a forma de pensar de cada um, etc. Porém, havia uma questão extremamente incômoda que surge quando tratamos das diferenças sociais.

Não é nenhuma novidade dizer que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e que, na maioria das nossas cidades, constatar o abismo econômico existente é algo bem simples. Dados de um estudo da ONU (Organização das Nações Unidas) apresentados no Fórum Urbano Mundial estão aí para comprovar o que nós conhecemos no nosso dia a dia. Dentre as 20 cidades mais desiguais do mundo, cinco são brasileiras.

Tomo, por exemplo, o percurso que faço todos os dias, da minha casa à faculdade. Devo passar por umas seis ou sete áreas em que o IDH (Indíce de Desenvolvimento Humano) deve ser muito baixo, mas chegando à faculdade nota-se uma grande diferença nos bairros ao redor, principalmente quando dirijo o olhar para o lado do Belvedere e adjacências. (Não consigo deixar de fazer uma comparação entre o bairro citado com os antigos castelos medievais que também ficavam no alto das montanhas e abrigavam os “nobres” e os bairros populares e favelas que fornecem a mão de obra barata, seriam as vilas onde ficavam os “camponeses e escravos”!) Viver no Brasil é como passear em um eterno carrossel em que ao redor existissem apenas dois países. De um lado o Haiti, com sua pobreza extrema (classes C, D e E), e do outro, o principado de Mônaco (classes A e B).

É claro que há um esforço das autoridades, principalmente no âmbito federal, em tentar mudar as coisas. Índices do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostram que houve um grande desenvolvimento na renda da população mais pobre com programas como o Bolsa Família. Constata-se nos quatro cantos do Brasil que existe uma nova classe média, economicamente ativa, com renda, com planos e com consumo de longo prazo. E ela foi crucial na crise de 2008, por manter o consumo interno aquecido, não deixando que o país entrasse em recessão como aconteceu no resto do mundo.

E tudo isso é muito bom! O simples fato de saber que existem pessoas saindo da miséria é muito reconfortante. Pessoas que mal tinham como se alimentar. E a contrapartida do Programa BolsaFamília, em que as mães assumem o compromisso de manter os filhos na escola em troca do benefício, é algo muito relevante. É o pensamento no longo prazo. É uma forma de tentar mudar o destino dessas pessoas. Mas alguém pode dizer: eu não acredito em destino porque temos o livre arbítrio! Não há forma de responder essa afirmação a não ser com outra pergunta: será que existe livre arbítrio para os necessitados? No que tange às questões econômicas, com certeza não! E quanto ao ditado, consegui entender porque ele é aceitável em várias situações, mas não se tratando das diferenças sociais. É muito simples. Quando se trata de algo injusto, desumano, egoísta e imoral, as diferenças nunca serão sequer toleráveis.

James Costa Arthuso é estudante do 6º período do curso de Ciências Econômicas da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

“Cinco cidades brasileiras integram lista das mais desiguais do mundo”                           G1\GLOBO.COM-19\03\2010