Introdução

O presente Artigo enquadra-se no campo filosófico, de uma forma geral, estando especificamente inserido no âmbito da Filosofia da Ciência; o mesmo, pretende apresentar, de forma suscinta, os meândros pelos quais se desenvolveu a ideia de Modernidade; no mesmo trabalho, o autor pretende demonstrar a possibilidade de que, partindo da Noção da Crise de Paradigma, é possível percebermos a emergência do espírito científico moderno.

Em primeiro plano, demonstraremos a integração do termo Paradigma na História das ideias, que a noção de Paradigma pode-se encontrar no pensamento clássico, com Platão e que atinge o seu apogeu de uso nos trabalhos desenvolvidos pelo filósofo da ciência, Thomas Kuhn; este último demonstra como partindo da ideia da crise paradigmática se pode alcançar um novo modelo de vida que no seu caso, é o modelo científico.

Em Thomas Kuhn, um paradigma é tal e válido enquanto possui o poder de coerção sobre os membros de uma comunidade académica; de contrário, o paradigma diz-se estar em crise e, nesse caso, vê-se a necessidade de uma reformulação ou adequação de princípios. Nasce, como resultado das reformulações, a denominada Ciência Normal.

A modernidade, neste trabalho, surge como resultado de crise de modelos orientadores das várias concepções científicas dos tempos antecedentes com mais ênfase para a crise do classissismo.

Deixamos claro que não é nosso interesse tratar todos aspectos da filosofia da ciência de Kuhn mas somente um único lado e no caso, da crise de paradigmas.

Estamos convictos de que muito poderia ser dito neste trabalho e acerca do próprio tema mas, a natureza do mesmo não permitiu que assim fosse feito aliás, este tema constitui uma abertura de possibilidades para mais investigação.

A concretização deste trabalho é resultado de leituras de livros disponíveis e que, logicamente encontram-se devidamente postas na pequena referência bibliográfica.

 

 

Noção filosófica de Paradigma

Do ponto de vista filosófico, a noção de paradigma pode ser entendida tanto segundo uma acepção clássica, como em Platão, assim como segundo uma acepção contemporânea, a partir de Kuhn (1962).

Na visão platónica, um paradigma é um modelo, um tipo exemplar, que se encontra em um mundo abstracto, e do qual existem instâncias, como copias imperfeitas, em nosso mundo concreto. A noção de paradigma deve ser assim entendida como uma das versões de teoria platónica das Formas ou Ideias, sobretudo na República, e tem, portanto, um sentindo ontológico forte, designando aquilo que é real, o ser enquanto causa determinante do que existe no mundo concreto, dele derivado. Isso dá ao paradigma um carácter normativo, que será importante na acepção contemporânea.

Kuhn introduz o termo paradigma em sua obra A Estrutura das Revoluções Científicas. Segundo Kuhn, este termo:

 (...) de um lado indica toda a constelação de crenças, valores, técnicas, etc., partilhadas pelos membros de uma comunidade determinada. De outro, denota um tipo de elemento dessa constelação: as soluções concretas de quebra-cabeças que, empregadas como modelos ou exemplos, podem substituir regras explícitas como base para a solução dos restantes quebra-cabeças da ciência normal (Kuhn, 1962-218).

Os paradigmas podem ser vistos, desta forma, como, “realizações passadas dotadas de carácter exemplar” (ibdem). E, mais adiante, temos que “um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade científica partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma” (Kuhn, 1962-219).

Apesar das diferenças há, contudo, elementos comuns entre as noções platónica e de Kuhn; em ambas, encontramos o carácter exemplar do paradigma e, portanto, sua função normativa.

 

 

A Crise de Paradigma versus, Ciência Normal

Uma crise de paradigma caracteriza-se assim como uma mudança conceitual, ou uma mudança de visão do mundo, consequência de uma insatisfação com os modelos anteriormente predominantes de explicação. A crise de paradigmas leva geralmente a uma mudança de paradigmas, sendo que as mudanças mais radicais consistem em revoluções científicas. Ha, segundo Kuhn, causas internas e externas dessas mudanças. As causas internas são o resultado de desenvolvimentos teóricos e metodológicos dentro de uma mesma teoria e também do esgotamento dos modelos tradicionais de explicação oferecidos pela própria teoria, o que leva à busca de alternativas. Causas externas são mudanças na sociedade e na cultura de uma época, que fazem com que as teorias tradicionais deixem de ser satisfatórias, perdendo assim o seu poder explicativo. Devem, portanto, ser substituídas por novas teorias, mais adequadas a essas ulteriores condições. Frequentemente ambos os tipos de causa vêm juntos em um contexto de revolução científica.

Para Kuhn, a crise de paradigmas se opõe assim ao que chama de Ciência Normal, períodos de estabilidade em que há uma aceitação generalizada de determinados modelos teóricos explicativos. Na verdade, se examinarmos em detalhe, foram bem poucos estes períodos na História da Ciência e da Filosofia. Mesmo no período clássico, em que houve momentos relativamente longos de estabilidade, ocorreram mudanças, muitas vezes significativas, nas teorias e modelos explicativos, embora se possa sempre argumentar tratar-se de mudanças dentro de um mesmo paradigma ou quadro conceitual. Por outro lado, muitas vezes é difícil detectarmos determinadas características do momento pelo qual passamos, e o alcance das mudanças ocorridas só fica mais claro retrospectivamente, a partir de uma análise histórica.

O melhor exemplo disso é, talvez, a própria revolução científica dos séculos XVI-XVII. Esta noção é usada, aparentemente pela primeira vez, apenas pelo cientista inglês Robert Boyle, membro proeminente da Royal Society, em sua obra Considerations Touching the Usefulness of Experimental Natural Philosophy, de 1671.

Um dos períodos mais marcantes e significativos de crise de peradigmas é exactamente a revolução científica dos séculos XVI-XVII, que pode ser considerada um dos principais factores desencadeantes do pensamento da Modernidade. A “nova Ciência”que neste momento se constitui pode ser ilustrada pelo modelo heliocêntrico de sistema solar formulado por Nicolau Copérnico em seu De Revolutionibus Orbium Coelestium, publicado postumamente em 1543, e que se opõe ao modelo geocêntrico de cosmo da tradição aristotélica, formulado na Antiguidade Clássica por Cláudio Ptolomeu (100-178). A crise provocada pelo confronto entre os dois modelos é bem representada pela obra de Galileu intitulada Diálogo sobre os Dois Grandes Sistemas do Mundo, de 1632, em que ele assume a defesa de Copérnico contra Ptolomeu e toda a tradição anterior, obra esta que o levará à condenação, em 1633.

O surgimento desta nova Ciência representa, na verdade, muito mais que a formulação de uma nova teoria científica que vem tomar o lugar de teorias tradicionais, em vigor há praticamente vinte séculos. Equivale a uma crise não apenas científica, relativa a determinadas teorias nos campos da Física e da Astronomia, mas sobretudo uma crise metodológica, que afecta uma concepção tradicional de método científico, bem como uma crise de visão de mundo, de concepção da natureza e do lugar do homem, enquanto microcosmo, nesta natureza, o macrocosmo. Todas estas mudanças têm repercussões profundas além do plano lógico-epistemológico, seja na política, na ética ou na estética, uma vez que representam o abandono da concepção de um mundo fechado e hierarquicamente ordenado, em que cada coisa tem o seu lugar predeterminado, que é a concepção aristotélica de cosmo.

Superação de Crises paradigmáticas/ Surgimento da Modernidade

Um dos grandes problemas do início da Modernidade é o de estabelecer os fundamentos da nova Ciência, de justificá-la como o verdadeiro modelo explicativo do real, em oposição ao anterior, descartado como falso e erróneo. Trata-se, portanto, de mostrar que, apesar de as teorias científicas da Antiguidade terem sido refutadas, é possível formular teorias científicas que verdadeiramente constituam um conhecimento do real, que revelem suas leis, que expliquem seu funcionamento. É preciso evitar que venha a ocorrer com as novas teorias científicas o mesmo que ocorreu com as teorias clássicas, ou seja, que a nova Ciência possa vir a ser igualmente refutada no futuro. É este o projecto epistemológico que encontramos, em última análise, tanto na tradição racionalista, inaugurada por Descartes, quanto na tradição empirista, iniciada por Bacon.

Porém, como estabelecer estes fundamentos da nova Ciência, onde encontrar as bases para estas teorias científicas? Não é mais possível recorrer à tradição clássica, ao saber adquirido, às instituições, uma vez que precisamente estes estão sendo questionados, já que as teorias que defendiam, foram postas por terra. É com base na razão subjectiva que se construirá a nova concepção de conhecimento. O exercício da reflexão filosófica equivale, em larga escala, a revelar ao próprio homem sua natureza racional, a purificá-lo das crenças e preconceitos obscurantistas que lhe foram incutidos pela tradição. Equivale também a retomar o carácter originário do pensamento e da racionalidade, de modo a adoptá-lo como ponto de partida seguro de um novo processo de conhecimento que produzirá, este sim, teorias válidas. O exemplo mais famoso deste tipo de concepção é o assim chamado argumento do cogito, de Descartes (1975). O pressuposto da existência de um indivíduo, dotado de uma natureza racional que caracterizaria precisamente a subjectividade, é central neste novo paradigma, que poderíamos denominar de subjectivista. É neste contexto de pensamento que se constituem as oposições entre o mundo externo e o mundo interior, entre a mente e o real, entre o sujeito e o objecto, como dois pólos de uma relação.

A modernidade se caracteriza por uma ruptura com a tradição que leva à busca, no sujeito pensante, de um novo ponto de partida alternativo para a construção e a justificação do conhecimento. O indivíduo será, portanto, a base deste novo quadro teórico, deste novo sistema de pensamento. É precisamente nisto que consiste o paradigma subjectivista na epistemologia. Este paradigma epistemológico é crítico, exactamente na medida em que é reflexivo, isto é, em que é capaz de submeter esta razão a um exame permanente, garantindo o seu bom funcionamento, e evitando assim que se repitam as falhas da Ciência clássica, cujos modelos explicativos se revelaram falsos. A possibilidade da crítica pressupõe, contudo, a autonomia da consciência subjectiva, bem como seu carácter originário. O modelo de conhecimento é, ele próprio, derivado da subjectividade. Explicita-se o que constitui o processo de conhecimento e que nos fornece o critério de conhecimento válido, que é aquele que está de acordo com este processo.

Para podermos concluir esta parte do nosso trabalho podemos dizer então que toda a filosofia moderna e contemporânea constitui ainda e em grande parte, um reflexo de crises sucessivas do modo epistemológico de concepção do homem e surge como tentativa de superá-las, ou de radicalizá-las em suas diferentes vertentes. Exactamente na medida em que não mais podemos identificar um paradigma dominante no contexto do pensamento referente aos projectos científicos, políticos, éticos, pedagógicos e até mesmo estéticos.

A História da Ciência que, em poucos trechos, recorremos para fundamentar os nossos objectivos nos revelam, entretanto, que os períodos de crise são extremamente férteis porque abrem novas possibilidades ao pensamento. Neste sentido, eles permitem o surgimento de alternativas aos modos de pensar anteriores. Revelam também que, muitas vezes, o verdadeiro sentido do momento pelo qual passamos só pode ser estabelecido e avaliado a posteriori, em retrospecto, quando e se, de acordo com a terminologia de Kuhn, se instaurar um novo contexto de “normalidade”.

 

 

 

 

 

 

 

 

Conclusão

Depois de termos exposto estas poucas linhas que pretendem demonstrar como a partir do conceito de crise de paradigmas se pode chegar a perceber o surgimanto da Modernidade, continuamos ainda a pensar e afirmar que muita coisa poderia ter sido feita e escrita, mas que aqui colocamos o que nos convinha e sempre pensando que trata-se de uma “provocação” académica.

Procuramos ainda, com este trabalho, demonstrar que a visão epistemológica kuhniana que desenvolve por via de manifestações de crises, torna-se uma grande alternativa para a percepção da visão de ruptura de ideais como garantes do desenvolvimento da própria ciência moderna.

A Modernidade é assim, fruto de várias e consequentes mudanças de pontos de vistas sobre o lugar do homem no mundo bem como o sentido que se pode atribuir ao seu pensamento que na antiguidade, esta visão é mais de socialização, de conjunto e que com o evoluir do tempo foi se tornando muito mais subjectiva e individualizada; assim, no projecto da visão científica da modernidade, o homem é homem de si e para si.

Referências Bibliográficas

  1. DESCARTES, R. Discurso do Método. São Paulo, Abril, 1975, Col. Os Pensadores
  2.  __________. Meditações Metafísicas. São Paulo, Abril, 1975, Col. Os Pensadores
  3. KOYRÉ, A. Estudos de História do Pensamento Filosófico. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1991
  4. KUHN, T. A Estrutura das Revoluções Científicas. S. Paulo, Perspectiva, 1962, Col. Debates.
  5. REALE, G. et ANTISERI, D. História de Filosofia, vol. III, S. Paulo, 1990, Ed. Paulinas