TEMÁTICA: Nietzsche e a Desconstrução da Metafísica.

Autora: Camila Sampaio Moreira.

 

Resumo: A presente pesquisa tem por objetivo explicitar as contribuições do filósofo Nietzsche para a emancipação da razão diante da moral. Uma vez que a moralidade não é outra coisa que mera obediência aos costumes.Nietzsche elabora sua crítica da moral cristã-ocidental e dos conceitos a ela associados, como "alma", "Deus", "pecado", "sujeito" e "livre-arbítrio", que segundo o filósofo seriam ficções prejudiciais à vida. Para o filósofo a existência da vida encontra-se nos prazeres da arte, seu pensamento propõe uma filosofia estética da existência, modificando o ambiente de reflexão sobre a existência do plano puramente imaginado para o real. E é nessa capacidade criadora e artística do homem que o filósofo aponta um novo caminho para a metafisica, apontando uma nova formação de valores.

 

Palavras Chaves:Costume - Moral- Metafisica- Nietzsche-Razão.

 

INTRODUÇÃO:

A referente pesquisa bibliográfica foi realizada pela leitura da obra Aurora de Friedrich Nietzsche. Onde o autor faz uma severa critica a moral, nos levando a um estágio de reflexão sobre os preconceitos morais que nos foram postos, cujos padrões de certa forma oprimem e pune o homem da liberdade. Para o filósofo a humanidade vive oprimida,alimentando em si a falsa ilusão de serem salvos e libertados por meio da natureza moral.O objetivo do filosofo é nos fazer compreender que todos os valores fundados na renuncia e na diminuição da vida, todas as chamadas virtudes que tendem a mortificar a energia vital, e a destroçar e a empobrecer a esperança e a vida, degradam o homem e, por conseguinte, são indignas dele.

 

_________________________________________________

* Graduanda em filosofia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú- UVA.

Cursado a disciplina de Metafisica II ministrada pelo prof. Geovane Paulino.

A construção de uma nova metafisica com bases na razão e consciência humana se faz um desafio proposto pelo filósofo, desafiando a moral tendenciosa e dogmática das religiões, bem como os saberes herméticos de verdades universais, cujas bases têm como principio a crença na cultura e na tradição.

Na obra Aurora, podemos perceber que o filósofo Nietzsche faz por meio de seu discurso poético uma severa crítica a moral. O mesmo começa a se questionar se a moral é realmente algo justo e de significativa estima para os indivíduos, para Nietzsche, a moral tem a característica predominante em acreditar em realidades que não existem. Para o mesmo, os juízos morais são puras interpretações de determinados fenômenos, cujos juízos morais, bem como os juízos religiosos, não distinguem o real do imaginário, não passam de uma “semiótica”elaborada em si mesma.

Muitos filósofos e homens do senso comum, nãotiveram esta percepção do verdadeiro conceito da moral, um dos principais alvos do filósofo éKant, que fundamenta nosso conhecimento por meio de nossas práticas, construindo assim um saber ilusório, pautado em falsos preceitos éticos e morais.Por tais motivos, a humanidade sempre esteve aprisionada a tais preceitos, reprimindo-se pelo medo e pelas consequências que as feridas morais poderiam nos trazer. A humanidade que alimenta em si a falsa ilusão de ser salva e libertada por meio da natureza moral se torna cada vez mais, uma humanidade corrompida, onde todos se tornam pecadores, doentes e miseráveis, pois acolhemos a moral de tal forma a ponto de recusarmos a nossa vontade de potência, nos tornando personagens fictícios de nossa própria história, condenados a viver de aparência para que possamos seguir os padrões da sociedade, “cujas regras sociais” oscilam em torno da natureza moral.

Amoralidade se pararmos para refletir, não é outra coisa e, portanto, não mais do que mera obediência a costumes, não importa quais sejam, os mesmos encontram-se enraizado de forma tão tradicional, que se torna quase impossível ir contra esta corrente ideológica. Para Nietzsche o modelo de homem livre está nos príncipes do Renascimento: valente, hábil, sem moral (acima do Bem e do Mal), apenas se guiando por sua vontade de poder, a sua energia vital. O super-homem é aquele que aceita a vida como ela é: incerta, conflituosa e sem ilusões, livres das correntes da tradição, cuja autoridade superior a que se obedece não porque ordena o que nos é útil, mas porque simplesmente ordena, causando no espirito dos fracos o medo, que se encontra superior ao intelecto, dominando todo o ato de potência que o homem poderia vir a ressaltar, por meio de suas escolhas, tornando-se moral, ao sacrificar os costumes e a obediência na qual toda a vida teve que seguir.

Podemos perceber em Nietzsche uma metafisica fragmentada, para o filósofo o principio de liberdade estar na potencialização da vontade, sendo a tragédia pura manifestação da vida. Em Nietzsche a felicidade encontra-se no trágico sendo a dor necessária para o desenvolvimento da humanidade.

O espírito dionisíaco é diametralmente oposto à aceitação resignada da vida, a atitude de quem vê nela a condição negativa destes valores de bondade, de perfeição, de humildade, que são a sua negação. É a manifestação da vontade orgástica da vida em sua totalidade enquanto potência infinita. O que Nietzsche que dizer neste aforismo, que a aceitação integral da vida transforma a dor em alegria, a luta em harmonia, a crueldade em justiça, a destruição em criação.

Neste víeis podemos fazer uma analogia ao filósofo Schopenhauer, onde a vontade é um principio puramente metafisico, sendo inerente ao homem. Tudo que existe no universo é a concretização da vontade e do desejo enquanto potência. Quanto mais desejamos mais dor acarretamos em nós próprios. Embora Schopenhauer vise à vida como um sofrimento sujeito a negação da vontade para suportar a fadiga da existência, Nietzsche dá uma nova perspectiva para essa vontade que não deve ser negada e sim provocada, compreendendo que é através dessa provocação que a vontade se manifesta como ação criadora no homem.

Esta superação deve ser exigida por todos nós enquanto seres racionais, livres para escolhermos o caminho no qual julgamos ser o ideal para cada um de nós. Fazermos uso de nossas manifestações individuais, nos torna cada vez mais seres autônomos, mesmo reprimidos pelo restante da massa temos a convicção que podemos ser diferentes dos demais, por termos pensamentos que se diferenciam dos mesmos.

 

“Oh, deem-me loucura, seres celestiais”! Loucura, para que eu finalmente creia em mim mesmo! Deem-me delírios e convulsões, luzes e trevas repentinas, apavorem-me com ardores e calafrios que nenhum mortal até agora sentiu, com fragores e formas errantes, façam-me urrar e gemer e rastejar como um bicho: mas que eu tenha fé em mim mesmo! ’’(Pág. 22: Aurora: Nietzsche/ Coleção, Companhia das Letras.).

 

Nietzsche tinha um conceito diferente de loucura, o mesmo afirmava que onde houver loucura haverá também um grão de gênio e de sabedoria. Os loucos conseguem romper um jugo de uma moralidade e instaurar novas leis. Segundo o filósofo é a loucura que abre alas para a nova ideia, que quebra o encanto de um uso e uma superstição de venerados. Os loucos assassinam as leis e conseguem ser superiores a ela. Se não formos superiores as leis morais seremos objetos e marionetes das mesmas, aprisionados em um estado de loucura oculta, sombria, oprimida. Somente a loucura nos liberta e define realmente quem somos. Na visão do filósofo a loucura nos revela quem somos, e o que somos capazes de fazer quando não estamos titulados pelas leis morais que a todo custo nos policia constantemente.

O prazer na crueldade encontra-se presente na sociedade em que vivemos já se tornou um habito natural do homem. Muitos matam, aterrorizam e oprimem os menos favorecidos pela simples satisfação de seu ego. A moral, também nos causa este estágio de dor, por ser algo na qual toda a humanidade se sacrifica para obter algum retorno, como diria Nietzsche, uma espécie de sofrimento voluntário, tornando o martírio deliberado em um sentimento de valor, para cumprir as leis dos costumes, na qual há muito tempo nos tornamos escravos.

É de tal modo que o homem moral é definido na sociedade, um homem virtuoso, que se sacrifica com o frequente sofrer, do duro viver, da privação, da cruel mortificação, como meio de disciplina, de autodomínio, cujo anseio oscila em torno de uma felicidade individual. A humanidade encontra-se contaminada com a pura ilusão de que tudo será recompensado, e todo martírio não será em vão. Demorará anos para que a humanidade sofrida e oprimida perceba segundo Nietzsche, que é impossível executar bem o preceito, somos inteiramente fracos e pecaminosos, e no fundo incapazes de exercer a fundo o papel da moralidade, sendo de tal modo já mais poderemos reivindicar felicidade e êxito, os preceitos e promessas morais foram dados para serem melhores do que nós. Neste sentido, a história dos sentimentos morais é muito diferente da história dos conceitos morais.

Não importa o quanto à humanidade possa ter evoluído, em algum ponto ela parece ter estacionado. O cristianismo constituiu todo o valor moral pautado no fanático amor a Deus, condenando em geral a racionalidade, convidando a todos os homens a manifestar-se na sua força e esplendor extremos, como amor, temor e cega esperança em Deus. Dificilmente poderemos demonstrar que o cristianismo é apenas um recanto onde a humanidade se refugia nos momentos de desespero e angustia, elevando a Deus toda a sua confiança, depositando no mesmo toda a responsabilidade que no fundo só a nós pertence.Se há tempos estivéssemos compreendido o verdadeiro significado do cristianismo, há muito tempo o mesmo já teria evaporado da humanidade. Pois sua função foi sempre fechar o máximo o circulo e proclamar a dúvida como pecado. O individuo deve ser lançado na fé sem uso da razão, pautado em um estágio de cegueira e vertigem, elevando um eterno cântico sobre as ondas em que se afogou a razão.

Este é o papel do cristianismo na visão do filósofo, que não ver nesta razão um sentimento verdadeiro e leal, uma moral que nos condena e nos priva de qualquer potência individual. Desviar-se desta doutrina, é ter coragem de deixar a contemplação cristã pela verdadeira contemplação filosófica, que consegue enxergar para além do senso comum. Sem a tutela divina, visto que Nietzsche declara a morte de Deus, o homem se torna então, criador de seus próprios valores, a grande pergunta que faz então o pensador alemão é a seguinte, será o homem capaz de ser seu próprio criador?

A construção de uma nova metafisica com bases na razão e consciência humana se faz um desafio proposto pelo filósofo desafiando a moral tendenciosa e dogmática das religiões, bem como os saberes herméticos de verdades universais, cujas bases têm como principio a crença na cultura e na tradição. A humanidade vive escondida por debaixo de máscaras, cuja moral só existe para esconder de fato as pretensões e personalidades que todos nós indivíduos possuímos e que não temos coragem para demonstrar por medo dos castigos, das punições das leis e das criticas pessoais do restante da massa.

Outra forma de se desprendermos deste mundo “moral e tecnicista” segundo Nietzsche, é na afirmação da arte enquanto contemplação. O filósofo vê na música a própria afirmação da vida por nos oferecer momentos de verdadeiro sentimento, pois só a música colocada ao lado do mundo, pode nos dar uma ideia do que deve ser entendido por justificação do mundo, como fenômeno estético que percebe que a vida sem a música é simplesmente um erro, uma tarefa cansativa, um exílio. A música, enquanto arte essencialmente dionisíaca é o meio para se desprender da individualidade, Nietzsche ver na música uma junção de apolíneo, cenas e palavras. Para o mesmo, a música é um conjunto de representações onde podemos expressar todo o nosso sentimento, por ter o poder de nos levar a um estado de êxtase, de prazer, não por recordamos precisamente de algo ou de alguém, mas por apreciarmos a verdadeira arte, que é a única que pode nos oferecer força e capacidade para enfrentar as dores da vida.

 

"E os que foram vistos dançando foram julgados insanos pelos que não conseguiam ouvir a música.”

Outro ponto divergente entre Nietzsche e Schopenhauer é o conceito de música, para Schopenhauer a música é uma forma de fugir do mundo sendo focalizada como um instrumento de contemplação da vontade porque ela é, ao mesmo tempo, a materialização da vontade. Em Nietzsche, a música é focalizada em seu aspecto produtivo sendo elemento fundamental para a realização da tragédia, pois é na tragédia que se encontra a expressão da verdadeira alegria. E Schopenhauer vê na tragédia apenas a renúncia à vontade de viver, o caminho da resignação também compatível com o caráter contemplativo que encontramos em sua música. Embora Schopenhauer vise à vida como um sofrimento sujeito a negação da vontade para suportar a fadiga da existência, Nietzsche dá uma nova perspectiva para essa vontade que não deve ser negada e sim provocada, compreendendo que é através dessa provocação que a vontade se manifesta como ação criadora no homem.

Conclusão:

Concluímos assim que Nietzsche põe cruamente o dilema da metafisica tradicional proposta pelos seus antecessores. Sua filosofia envolve a filosofia do silêncio, sendo em si trágico. O trágico em Nietzsche produz em si uma forma artística do drama exatamente para poder representar o silencio. É só nele que surge a possibilidade da transcendência porque nele o humano abandona-se na escuta de si mesmo.

 REFERÊNCIAS:

 ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.NIETZSCHE, F. Aurora. São Paulo: Companhia Das