LUIZ ANTONIO DE BRITO

OS OPERADORES LOGÍSTICOS E A NEGOCIAÇÃO DE MÃO ÚNICA

Trabalho final de conclusão do curso de Gestão Empresarial da Universidade Presidente Antonio Carlos – Unipac, campus regional de  Araguari-MG.

MARÇO - 2005

RESUMO

A negociação é uma das mais imprescindíveis ferramentas de negócio, pois é quando se necessita ser ético, conciso e harmônico nas argumentações para que no final tenha-se um acordo que satisfaça os interesses de ambos os envolvidos, o que muitas vezes não é fácil. Principalmente, quando do outro lado da mesa o interlocutor não quer deixar seus propósitos por outros às vezes mais equilibrados, que favoreça igualmente ambas as partes. Experiências que uma pequena transportadora de cargas teve em negociação de frete com duas importantes empresas logísticas demonstraram que de certa forma estas surgiram, claro, para favorecer grandes corporações que terceirizam estoque ou distribuição ou ambos, para se dedicarem exclusivamente às suas funções básicas: produzir e vender. Mas, por outro lado, estes operadores logísticos que não contam com frota própria, têm provocado no setor de transporte um controle de preços de frete às vezes beirando ao unilateralismo e num verdadeiro processo de ganha-perde, haja vista a grande oferta de serviço, seja por transportadoras institucionalizadas ou por motoristas autônomos que crescem a cada dia. Neste momento, é importante ao transportador em geral saber negociar e ter preços competitivos, não deixando de acompanhar sua planilha de custos para não correr o risco de comprometer a sua sobrevivência.É importante, principalmente no transporte de carga fracionada, ter uma carteira de clientes o maior possível e evitar que o faturamento fique muito concentrado em poucos, pois cliente com muita carga é mais assediado pela concorrência e pode a qualquer momento mudar de transportadora.

OPERADORES LOGÍSTICOS E A NEGOCIAÇÃO DE MÃO ÚNICA

Não se trata de novidade alguma o fato de que a gente vive constantemente em um processo de negociação. Negociamos até conosco mesmo, quando decidimos fazer uma coisa e não outra. A negociação pode tornar-se um problema quando um dos interlocutores vai com seu ponto de vista sacramentado, não abrindo perspectiva de também ser levado em conta às posições alheias. Aqueles que se consideram intocáveis ou donos da situação quase sempre tendem a se comportar assim. Neste caso eles se sentam à mesa apenas para cumprir um ritual, um jogo de cena no qual o vencedor terá de ser eles, custe o que custar. Tanto tem se falado em logística, que vejo a logística empresarial como tendência de mercado indiscutível e a chegada de grandes operadores logísticos ao país trouxe uma modernização, haja vista eles estarem melhor equipados com tecnologias de gestão. Por exemplo, no transporte eles tendem a racionalizar o escoamento dos produtos de maneira não só a baixar custos, mas também diminuir prazos de entrega dos fornecedores às indústrias e destas ao distribuidor/consumidor final. Porém, nem tudo são flores! Trataremos de um aspecto da logística, no tocante ao transporte, que se enquadra perfeitamente no modelo de prepotência acima descrito. Isto talvez seja possível dado ao excessivo número de transportadoras e autônomos existentes no mercado (veja quadro abaixo) e com práticas de preço das mais variadas em decorrência das variantes de sempre, como: uma transportadora é institucionalmente legalizada, outra não; uma paga corretamente seus tributos, a outra não; Há as que seguem corretamente o acordo coletivo da categoria enquanto outras sequer registram seus funcionários; Muitas têm gerenciamento de riscos ou indenizam corretamente seus clientes quando devido, enquanto a grande maioria transporta apostando unicamente na sorte. Enfim, existem muitos outros itens que impactam na hora de definir valores e o transportador se for responsável tem que diluir tudo em seu frete para tentar sobreviver neste mercado pervertido. E é neste clima em que os operadores logísticos, que terceirizam transporte, acabam sendo os definidores de frete, seja numa cidade, região ou mesmo em todo o país.

Transporte Rodoviário

Transportadores Rodoviários de Carga

* Empresas de Transporte Rodoviário12.000

- Micro, pequenas e médias93,7%

- Grandes6,3%

* Transportadoras de carga própria50.000

* Autônomos250.000

* Frota Nacional1,12 milhões

FONTE: CNT – Departamento de Estatísticas e Pesquisas

A experiência com grandes operadores logísticos

Na década passada, tivemos a primeira experiência negativa com um operador logístico, quando a empresa em que trabalho, uma pequena transportadora com tradição em cargas fracionadas, prestava serviços de distribuição para uma grande indústria veterinária e simplesmente fomos informados de que o transporte todo seria centralizado no operador logístico, o qual repassaria a carga para as transportadoras. Mas o pior de tudo era saber que este atravessador repassaria às transportadoras apenas 1/3 do frete que emitisse. Neste caso não houve negociação e sim um comunicado da intermediação - a partir de então - de um atravessador, como acontece em diversos setores de nossa economia. Certamente não consideravam relevante o volume mensal transportado conosco, pois somente assim justificaria a indiferença a nós dispensada.Outro episódio sintomático, envolvendo outro grande operador logístico, ocorrera no ano passado, quando tivemos que renegociar uma tabela de frete com uma grande indústria multinacional de máquinas agrícolas, tendo em vista a em vigor se encontrar extremamente defasada. Neste caso, a culpa era nossa, transportador, por não ter à época uma política efetiva de analisar periodicamente os acordos de prestação de serviços, renegociando um ou outro que possa ocasionar fretes fora da realidade do mercado e – em especial -, da planilha de custos da empresa. A proposta deveria ser apresentada diretamente ao representante do cliente, uma operadora logística com matriz na Holanda que vem ano a ano registrando um crescimento vertiginoso no Brasil. Inclusive assumiram todo o processo de estocagem e distribuição dos produtos para os concessionários da marca. Vale salientar que a omissão dos nomes da transportadora, das indústrias e dos operadores logísticos é por motivos éticos.

E Se Eles Forem Mais Poderosos?

Foi com este questionamento acima e que também dá título ao terceiro capítulo do livro Como Chegar ao Sim: a Negociação de Acordos sem Concessões – de William Ury, Roger Fisher e Bruce Patton (ed. Imago), que focamos nossas inspirações e aspirações. Nele os autores orientam que antes de qualquer coisa é preciso desenvolver sua MAANA – Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo. Embora outros estudiosos falem em BATNA (sigla em inglês de bestalternative to a negotiatedagreement), que se traduz em "melhor alternativa para um acordo negociado". Diz o livro: "Se o outro lado tiver grandes canhões, você não precisa transformar a negociação num tiroteio". Continua, "Quanto mais forte ele se afigurar em termos de poder físico ou econômico, mais você se beneficiará de negociar com base nos méritos; À medida que ele tiver os músculos e você os princípios, tanto melhor você se sairá quanto maior for o papel que conseguir assegurar para os princípios". Uma das recomendações mais comuns é a de jamais dar início a uma negociação sem estar munido de boas alternativas suplementares. Sem dúvida eles são muito poderosos e a gente uma pequena transportadora com faturamento bruto anual abaixo de dois milhões de reais. Desde a montagem da indústria na região, a transportadora sempre esteve lhe prestando serviço, mas a conversa agora tinha um interlocutor e por isso não se poderia viver do passado. Era preciso agora demonstrar os méritos que nos colocava entre os principais parceiros em distribuição de produtos daquela indústria, para – quem sabe -, alcançar sucesso na rodada que estava por vir. O que mais amedrontava a diretoria da transportadora naquele momento era o fato de que a concorrência estava crescendo em larga escala, com transportadoras irregulares – inclusive em legislação trabalhista - ou agindo deslealmente com a categoria ao praticar preços suicidas à grande maioria das empresas de transporte. Não era segredo algum o forte interesse dos concorrentes em conseguir um meio de acesso ao restrito grupo de transportadoras em atividade dentro daquela indústria. Tinha-se o receio de alguma delas estar disposta a nos excluir de vez, apresentando tabela semelhante àquela praticada no momento, talvez com ajuda de algum informante interno, o que poderia nos impossibilitar de obter sucesso na tão almejada renegociação. Não tínhamos escolha, por se tratar de questão de sobrevivência, então continuamos determinados em corrigir a tabela. Era indispensável que a gente visualizasse toda a cadeia de serviços para enxergar se havia alguma brecha a críticas, que nos colocasse em risco neste processo. A princípio, achamos difícil alguma outra transportadora se instalar com a estrutura operacional que dispúnhamos. Não que fossemos detentores de uma qualidade inigualável, mas porque a estrutura operacional empregada é extremamente onerosa, o que - a priori -, inibe a uma concorrência mais acirrada.

A simulação de uma negociação e a primeira proposta

Formalizamos através de ofício o pedido de reajuste baseado no INCT-fipe (Índice Nacional de Variação dos Custos do Transporte Rodoviário de Carga) indicador apurado pela Fundação Getúlio Vargas e instrumento utilizado pelas transportadoras para atualizarem seus preços. O INTC tornou-se esta referência nacional porque faz um apanhado dos custos tanto em pequena como em grandes distâncias e sob o aspecto de carga fechada ou fracionada, já que esta última se mostra mais onerosa tendo em vista que é feita a coleta, que segue para o depósito da transportadora para depois seguir com outras mercadorias para o destino final. Este mesmo indicador já havia sido cogitado, extra-oficialmente por funcionários do operador logístico, para servir de referência oficial parafuturos reajustes na tabela de frete. Baseamos então no INTC relativo aos últimos 12 meses, muito embora coubesse a apuração de pelo menos dois anos, haja vista a falta de reajuste ao longo deste período.Pensamos que logo seríamos convocados para outra reunião na sede da indústria, aonde o operador logístico também tem seu QG e local no qual participamos em outras ocasiões de reuniões para delimitar prazos ou procedimentos novos às operações conjuntas. Talvez o nosso grande erro fora não colocar o percentual acumulado dos últimos 24 meses sem reajuste, por achar que eles concordariam imediatamente sem quaisquer restrições. Ledo engano! Muitos especialistas aconselham a pedir mais do que se imagina obter numa negociação para ao final se obter algo razoável. Aliás, em geral orienta-se que é preferível deixar o oponente fazer a primeira oferta, o que neste caso não era possível ser aplicado dada à urgência de tornar a tabela mais equilibrada e a esperança de fechar acordo no teto máximo de reajuste. Em processos assim, indústria e operador logístico ganham quando se fecha em níveis abaixo do que estabelecem entre eles, mas o mérito indiscutivelmente vai para o operador logístico. É ele quem recebe as honras por estar concluindo a distribuição dos produtos ao concessionário da marca de maneira eficaz, a um custo inferior à média do mercado. Esta posição de supremacia faz parte da cultura engendrada, onde o rei é o cliente/indústria, mas quem tem o poder nas mãos quando se trata da operação de distribuição é o coordenador da logística de transporte. Retornando à tentativa de acordo, desta vez nós fomos procurados e o contato veio por telefone de um negociador até então desconhecido. A ligação originada em São Paulo deixou claro que eles dariam um tom mais distanciado e burocrático à nossa reivindicação e, por que não dizer, talvez até ditatorial. Ficou clara a política do operador logístico, ou seja, não deixar que haja negociações sobre assuntos de relevância, como é este sobre aumento de frete, com quem já se tem contato mais próximo no dia-a-dia dos serviços. Para resolver toda natureza de situações, se faz com o pessoal da própria região. Agora, se o assunto é preço de frete, quem dita as regras é o pessoal do QG de São Paulo. Tática interna que certamente é usual justamente por inibir algum tipo de condescendência do seu pessoal em assuntos nos quais envolva cifrão e que possa ocasionar eventualmente algum tipo de desvantagem. Depois das devidas apresentações e com uma cordialidade nitidamente disfarçada, o primeiro enfoque dado ao assunto foi de que o que pleiteávamos de aumento não havia recebido o endosso da alta cúpula da indústria e que eles teriam autorizado o repasse de apenas 10 por cento. A proposta na verdade estava bem abaixo do INCT apurado em 12 meses, o qual apontava para algo superior a 14%, significando que poderia haver uma depreciação acima de 20% em nossa prestação de serviço somente no último ano.

A negociação já preconcebida e a arte de representar

Segundo o consultor em administração, Gerald R. Griffin, em seu livro Maquiavel na Administração – Como Jogar e Ganhar o Jogo do Poder na Empresa (ed. Atlas) "um executivo sensato evitará jogar muitos jogos, mas deverá ser um bom jogador quando for chamado a competir. Isto só se consegue com preparação. Se um executivo estiver preparado, quando um adversário o desafiar no campo de batalha organizacional ele será vitorioso". O meu adversário, acredito poder agora tratá-lo assim diante dos últimos acontecimentos, demonstrara que a negociação seria unilateral. Por quê? Ele não quis saber qual o motivo de estarmos propondo um aumento de 14% e nem declarou que tal reajuste estaria fora da realidade do mercado, pois dificilmente teria argumentos para refutar a análise da FGV, uma das instituições mais respeitadas em estudos econômicos do país. Ficava evidenciado naquele instante de ele já estar com uma idéia preconcebida e não dispor de vontade para abrir mão dela. Naquele instante se nos colocássemos irredutíveis a um acordo o clima tenderia a se fechar, pois ali não tinha a presença física nem o olho no olho e, sim, uma fala distante e sem brechas para aproximação ou, se aceitássemos imediatamente a contraproposta ficaria demonstrado que não houvera negociação alguma, mas absolutamente a manifestação de um e a recusa de outro que além de dar as cartas, também imporia a partir daquele momento o ritmo do jogo e isso demonstraria certo amadorismo, fechando-nos as portas para quaisquer reivindicações futuras. Mas ele precisava saber que os números apresentados não condiziam com as necessidades reais da transportadora. Na verdade todo negociador nato aprecia ter opositores à sua altura, que ao final de uma rodada bem-sucedida demonstra aos colegas de empresa quão valioso fora o trabalho em benefício da instituição. Contudo ainda estava longe de ocorrer isso.Apresentamos as razões da majoração: que se tratava de percentual legitimado por uma instituição fidedigna, a FGV, e que há muito tempo não atualizava a tabela. Tudo em vão, pois do outro lado da linha telefônica ouvimos apenas que era o único índice autorizado a dar acordo. E como se já não bastasse a desconsideração demonstrada, ainda disse precisar de uma resposta para passar à direção da fábrica para tomar as providências necessárias. Ele havia ligado não para negociar, mas sim para comunicar/intimidar. Deixou no ar que se de algum modo não fechássemos nos números que apresentara, outro transportador poderia assumir nosso posto. Naquele instante restava-nos pedir uma trégua sob o argumento de passar aos nossos superiores a posição do cliente sobre aumento nos preços do frete. A batalha naquele momento estava perdida e quanto antes nos recompuséssemos para umassompossemos o antes nos recomp perdida e quanto antes nos recompossemos nova rodada, melhor seria.

À espera de um milagre em um possível acordo

A gente tem a impressão de que o vencedor sempre é aquele que consegue se articular incisivamente ou que faz uma apresentação impecável, mas os especialistas não compartilham desta idéia. Para muitos o negociador se destaca quando ele consegue ouvir e questionar mais do que se partir para a intimidação. Para o advogado criminalista Gerry Spencer, autor do livro Como Argumentar e Vencer Sempre (ed. Campus) "todo mundo, toda pessoa pode apresentar o argumento vencedor. A mágica da argumentação vitoriosa tem sua origem na pessoa, não nas palavras; na alma, não na retórica".Naquele dia refletimos bastante sobre a nossa prestação de serviço em cargas fracionadas, a respeito de possíveis pontos fracos, de falhas operacionais. Enfim, sobre tudo que poderia conspirar contra nós. Concluímos estar com um nível de serviço bem próximo do ideal e com base em apontamentos originados pelo próprio cliente, que naquele momento estava infringindo todos os princípios éticos e de administração ao querer interferir diretamente nos preços de nosso serviço. Isto não quer dizer que você não possa dar descontos à sua clientela, mas jamais se deixe levar por clientes a ponto de vender algo por um valor que não se encaixe nas margens mínimas que a sua empresa defenda.Se o serviço está qualificado e o preço para quem o contrata se mostra bastante atrativo, restava apenas a sondagem em outras transportadoras que também pudessem enfrentar impasse semelhante. Neste caso, seria possível com outra que fizesse rota distinta das nossas, não implicando numa concorrência direta. Bastara um telefonema para sabermos que os dez por cento de aumento era número apresentado a todos os "parceiros" da indústria. A padronização de negociação não fazia jus às especificidades de cada transportadora, haja vista ter rotas distintas com características bastante singulares, como asfalto em péssimas condições e estradas sem pavimentação em alguns trechos, o que na verdade não era o nosso caso.Após todas estas descobertas, refletimos que a primeira coisa que deveríamos mudar ou aprender com isso era deixar a ingenuidade e saber da existência de aspectos defendidos - seja numa negociação ou parceria – que são encontrados apenas em um mundo ideal. Em Como Chegar ao Sim os autores acreditam nesta possibilidade "aquele que atende aos interesses legítimos de cada lado à medida do possível, soluciona de modo justo os conflitos de interesse, tem durabilidade e leva em conta as normas da comunidade". Contudo há controvérsias neste assunto com as quais passamos a compartilhar.

Flexibilidade como harmonizadora de acordos

Deixada a ingenuidade de lado e conscientes de que aquele cliente é muito importante para a saúde financeira da transportadora, já que representa entre 10 e 25% do faturamento bruto, dependendo da época do ano, resolvemos montar um plano "b" .Aliás, todos devem ter um plano extra quando estiver em negociação, mas para isso torna-se prioritário conhecer ao menos um pouco o oponente. Reportando novamente ao livro Maquiavel na Administração "antes de jogar os jogos do poder, é de sua responsabilidade conhecer seus adversários e saber da motivação deles para jogar. Na realidade, um bom executivo conhece seus amigos e as razões porque são amigos. E também é de seu interesse conhecer seus inimigos e dar-lhes o respeito que merecem". O plano "b" significa na verdade fazer mais concessão e, principalmente, buscar não ficar vulnerável a apenas um único cliente como nos encontrávamos até então. Significa colocar em pauta sempre a possibilidade de diminuição da carteira de clientes, inclusive pensando na eventualidade de saída de seu mais lucrativo cliente, o chamado cliente preferencial. Agora, mais indispensável se tornava a captação de novos clientes em potencial, diminuindo a ociosidade existente em algumas rotas.Mas quanto à negociação em si, para não abalar a relação e demonstrar interesse no acordo, decidimos propor que, baseado no histórico de bons anos de serviço àquela indústria, seria feita uma concessão baixando o pedido de aumento em 50% da diferença entre o que foi reivindicado e o ofertado pela indústria. Abaixo disso, deixamos claro que se tornaria inviável a continuidade das operações. Era necessário demonstrar flexibilidade para a negociação e um espírito cooperativo, mas sem se depreciar. No outro dia recebemos o deferimento de nossa contraproposta de 12% de reajuste. Perdemos dois pontos percentuais, mas quem sabe na próxima negociação a transportadora os recuperasse. Novamente ali, quando estávamos recebendo a notícia da aprovação de nossa segunda proposta, mais uma demonstração antiprofissional e déspota do interlocutor. Ele diz que um novo reajuste somente aconteceria a partir de julho, quando na verdade os índices discutidos foram de abril a abril e somente em 1º de junho entrariam em vigor.E mais, deixou a entender que o indicador da FGV, embora constando no contrato como base de reajuste, não era a garantia de obtê-lo integralmente quando chegada à hora de revisar a tabela. Eles arrumam o indicador econômico correto por ser voltado para planilhas de custos de transportadoras e, ao mesmo tempo, dizem que ele por si não é suficiente para garantir reajuste. É um contra-senso abominável.

O aprendizado

Estas duas experiências, em especial a última, nos dão nítida impressão de que os grandes operadores logísticos, obviamente os que não têm frota própria, vieram com o propósito único de centralizar o serviço de transporte – neste caso específico -, de grandes corporações, controlando mercados regionais através da inclusão e exclusão de transportadores e provocando-lhes um achatamento das margens de lucratividade através do poder econômico. Tudo que vivenciamos fora de grande valia, já que descobrimos a necessidade de se fazer um acompanhamento mais eficaz e pormenorizado dos acordos de frete existentes. Promovendo as devidas alterações quando necessário, sentando e renegociando - com base em apontamentos palpáveis -, pode-se evitar arranhões nas relações com o cliente. Não reajustando no tempo hábil, o cliente depois não aceita aumento acima do normal sob o argumento de afetar também o desempenho dele no mercado. Ele não quer saber se você praticou uma mesma tabela por um longo tempo. Isto é problema que não lhe diz respeito. Em resumo, os aumentos têm que ser - no mínimo -, anuais. Outro aspecto de suma importância é não deixar a sua carteira ficar extremamente concentrada nas atividades de alguns poucos clientes, pois o seu negócio acaba se tornando refém destas atividades, o que pode em alguns casos ser catastrófico. Diante disso, procure enxergar a aptidão de seu negócio e a quem você pode atender e, por fim, vá à busca destes clientes em potencial, pois há de se preferir ter mil clientes fidelizados que você os atenda como preferenciais a ter apenas um que transporta o mesmo tanto de mil, contudo é promíscuo e mais assediado pela concorrência, podendo mudar de transportador da noite para o dia, provocando a queda brutal em seu faturamento. Neste ramo de prestação de serviços é interessante que se tenha uma rede de contatos, pois quase sempre tem um ou outro detalhe compartilhado que pode até ajudar na conclusão de um acordo. Tenha bons relacionamentos com os clientes (inclusive com os funcionários deles), pois assim quando os perguntar sobre o atendimento da transportadora e de eventuais concorrentes no dia-a-dia, você sempre terá feedback e eles não hesitarão em dizer a verdade. Conheça seus adversários diretos; de preferência antes deles o conhecerem, porque assim você tem mais chances de surpreendê-los do que o contrário. E por fim, procure entender o mercado tal como o psicanalista busca desvendar os mistérios da psique humana. Entendam ser constantes as mudanças à nossa volta, tornando indispensável o aprimoramento de nossas vocações básicas com o intuito da busca incessante da qualificação e eficiência, regada a um relacionamento de cordialidade e de interesse pelo bem-estar do cliente/empresa, pois assim você também poderá compartilhar e transportar no mínimo parte deste sucesso, contribuindo ainda mais para a efervescência de seu negócio. É indispensável que, seja por intermédio de operador logístico ou por área própria de distribuição, as empresas entendam que o transportador é parte fundamental de quase todo o negócio e que ele precisa estar integrado à cultura da empresa, para defendê-la mesmo não sendo efetivamente um empregado registrado e, para isso, precisa ter um tratamento condizente com esta necessidade do próprio mercado. Todos, sem exceção, devem cuidar do negócio como se seu fosse. Lembre-se, há negócios em que o transportador é o contato mais próximo com cliente, depois do vendedor. Para o transporte de sua empresa se personalizar, com nível de excelência, é necessário haver interesse também pelos problemas dos custos de transporte, pois querendo ou não ele influencia o preço dos produtos. Se sua empresa tem uma transportadora que atende parte significativa de seu campo de atuação, há de se procurar pagar um preço justo pelo serviço e assim garantir com a solidez deste parceiro a qualidade e padronização das entregas de seus produtos. Somente desta forma diminui-se a distância entre a exploração e o preço justo e quando estiver em negociação de frete faça questão de fechar um acordo de ganha-ganha, para ambas as partes saírem motivadas.

"As vitórias nunca são tão completas que o vitorioso possa ignorar qualquer tipo de consideração, especialmente {a necessidade de ser justo}".

Maquiavel, em O Príncipe

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FISHER, Roger, URY, William, PATTON, Bruce. A Negociação de Acordos Sem

Concessões. Rio de Janeiro: Imago, 1994.

GRIFFIN, Gerald R. Maquiavel na Administração: Como Jogar e Ganhar o jogo do

Poder na Empresa. São Paulo: Atlas, 1994.

A TEORIA e a prática da negociação. Revista HSM Management, São Paulo: jul-ago.

nº. 45, p. 123-127. 2004.

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. São Paulo: Paz e Terra,1996.