“Não dá nada!” São as palavras que eu escutei muitas vezes quando fui procurado para atuar em causas criminais, frase tão curta quanto o conhecimento e a inteligência das pessoas que a pronunciavam. Àqueles que me proferiam a malfadada frase, eu perguntava o que entendiam por “não dá nada”, ao que eles me respondiam simplesmente que, em virtude do fato praticado não seriam levados à prisão. Concluindo: as pessoas acham que a única punição passível de ser aplicada a uma infração penal é a pena de prisão. Se isso não vier a acontecer, eles acham que “não deu em nada”.

 

Acontece que vivemos sob a égide do Princípio da Intervenção Penal Mínima, pelo qual o Direito Penal só deve atuar como ‘’ultima ratio’’, ou seja, quando estritamente necessário. E mais, quando ele for aplicado, busca-se a imposição de penas outras que não a de restrição de liberdade. O objetivo de tal princípio é justamente, diminuir a população carcerária com sua deletéria promiscuidade que praticamente torna impossível uma futura ressocialização do apenado. Leva-se em conta que a liberdade é a regra; a prisão é a uma exceção.

 

O que eu quero advertir é que, muitas vezes as pessoas, através de uma sentença penal transitada em julgado, são condenadas a penas alternativas ou substitutivas e saem propalando que simplesmente “não deu nada”. Não é bem assim. Os outros efeitos da sentença, tal como a reincidência, o nome no rol dos culpados, o impedimento de obtenção de benefícios penais, etc, permanecem durante um tempo razoavelmente longo. Fora os efeitos extrapenais como por exemplo, a dificuldade na obtenção de um emprego.

 

A esse respeito, quero chamar a atenção para um fato que está se tornando corriqueiro atualmente. Basta andarmos pelas ruas da cidade, pelas praças, nos parques, para nos depararmos com jovens fumando seu “baseado” totalmente à vontade e a qualquer hora do dia, ao contrário do que acontecia há algum tempo atrás, quando bastava aparecer um policial na área e víamos todos fugindo em disparada.

 

Curioso, conversei com um desses jovens e o questionei o porquê de tanta indiferença para com as autoridades. Ele me respondeu que, com as modificações na lei de tóxicos, não há mais apenamento para o usuário de drogas. Ou seja, a maioria dos jovens passou a entender que a maconha para uso próprio estava liberado.

 

Quero deixar um aviso aos navegantes. A coisa na verdade, não é exatamente assim como ele está pensando. O uso de drogas continua sendo considerado infração penal previsto no art. 28 da lei 11.343 de 2.006. Através do referido artigo, são punidas várias condutas, tal como, adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. A única modificação que houve em relação à legislação anterior, é a o apenamento previsto em abstrato para quem pratica tais delitos, já que agora são previstas sanções de advertência, prestação de serviços à comunidade ou medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

 

Ah, e será o juiz quem irá determinar se a droga destinava-se ao consumo pessoal ou não, levando em conta a natureza e a quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e aos antecedentes do agente. Como se vê, é muito tênue a linha que distingue o delito de uso para consumo próprio do delito de tráfico previsto no art. 33 do mesmo diploma legal, ao qual é aplicado um apenamento bem mais exacerbado, já que poderá levar o indivíduo a uma pena de reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos. Ao mínimo descuido, o usuário poderá ser enquadrado como traficante, bastando para tanto praticar durante o uso alguma das condutas que configuram o segundo delito, tais como oferecer, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente a um parceiro eventual.

 

Bem, e se o jovem é daqueles que está “se lixando” para as penas de advertência, de prestação de serviços à comunidade ou medidas educativas, devo alertar que futuramente, eles poderão sentir consequências nefastas pelo fato de terem contra si uma sentença penal transitada em julgado, ainda que não tenham sido levados à prisão em função dela. Terão eles os seus antecedentes maculados e, caso venham a necessitar de uma certidão negativa para fins de obtenção de um emprego, para aprovação em um concurso público, etc, não irão conseguir e então perceberão que aquela história que eles achavam que “não dava nada”, na verdade “não estava com nada”.

 

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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