O relacionamento por vezes difícil entre os jovens e a escola não pode ser reduzido a um mero problema juvenil ou mesmo a um fracasso da própria instituição escolar, mas representa bem as mudanças culturais típicas de nosso tempo.

 O processo de socialização tem tido significativa alteração nas últimas décadas, as tensões e desafios atuais nem sempre são compreendidos pela família ou pela comunidade em que ocorrem. Jovens hoje tem, talvez pela primeira vez na História, saber próprio, que se manifesta em roupas, comportamentos, linguagem e adereços característicos, distintos dos de outras faixas etárias.

 Enquanto em épocas anteriores a criança e o jovem eram quase inexistentes do ponto de vista comunitário, hoje são eles que determinam a moda, suas práticas e símbolos em tudo denotando um modo de ser diferente de seus pais ou professores. Se, antigamente, eram os últimos a falar no ambiente familiar, não tinham opinião a ser considerada, hoje determinam muitas vezes até as compras da família, além de suas atitudes.

 Falamos inclusive em adultescentes, ou seja, adultos que em tudo se aproximam dos adolescentes, na forma de agir e na aparência física, como se estes fossem modelo a ser imitado, ideal a ser perseguido, já que portar-se como alguém extremamente jovem poderia nos garantir a eterna juventude, e fossemos então Peter Pans que jamais amadurecerão. A complexidade emocional indispensável à maturidade tem sido rejeitada em detrimento de uma vida aparentemente mais espontânea e simples, como a das crianças.

 Isso obriga a escola a se colocar novas interrogações, a repensar sua metodologia, a responder ao desafio que representa aos adultos que durante centenas de anos foram os definidores de atitudes e maneiras de viver. Em particular no Brasil, dada a desigualdade social enfrentada e sentida mais incisi­vamente pelas classes menos favorecidas, com pouco acesso aos bens de consumo e, portanto, mais alijadas daquilo que é apreciado e valorizado pela juventude, conflitos tem explodido no ambiente escolar.

 A instituição escolar, como toda organização, tem sua missão, ou seja, a explicitação das razões de sua existência, um público-alvo, um produto e um ambiente no qual realiza suas ações. Tais ações dizem respeito ao contexto sociocultural, envolvendo seres humanos e suas desavenças, de forma coletiva e/ou individual. Elas se estabelecem por meio de decisões dicotômicas, muitas delas extremamente complexas, e em qualquer nível de ensino uma das mais importantes é a polêmica entre formar elite, trabalhando com a alta cultura que implica em acesso seletivo, ou investir na transformação social possível através do acesso mais democrático e na formação do trabalhador.

 As duas opções demandam acréscimo de conhecimento, e os mesmos princípios que conduzem o desenvolvimento da cognição são aplicáveis também na aprendizagem das regras, das atitudes, da concepção de ciência, de mundo e de funcionamento da sociedade. Porém, apenas aqueles dispostos ao amadurecimento podem enfrentar tais desafios, uma sociedade de crianças provavelmente seria aquela em que não gostássemos de estar, mas que tem sido configurada como possível.

 Escolas e jovens estão procurando modos de coexistência, seguindo as regras do bom senso, aumentando a chance de chegar aos objetivos em segurança e com maior paz, embora sempre um pouco defasados aos nossos desejos.

 À instituição de ensino cabe o papel de modelo neste processo; com clareza de que a escola é constituída pela sociedade, mas também a constitui, ensino e aprendizagem só podem coexistir com maturidade.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.