Morreu um cara

A morte é um defeito da vida. Não tem escapatória. Você pode fugir das contas. Das namoradas, das responsabilidades... mas a morte vai te encontrar. Não tenha dúvidas.

A gente pode até pensar que não, pois muitos jovens não morrem... mas nenhum velho escapa!!! Então, meu jovem, se você ainda não morreu enquanto jovem... vá se preparando, pois você não vai escapar nem da velhice nem da morte.

Ah! Você ainda não entendeu porque a morte é um defeito da vida? Te explico! Por melhor que seja a vida. Por mais sofrida que ela seja. Mergulhada na riqueza ou na pobreza, a vida sempre acaba em morte. Ainda não criaram uma vida que não termine na morte.

Aliás, isso já ensinavam os filósofos de antigamente. Aristóteles ao explicar as quatro causas, demonstra que só não tem fim uma causa não causada. O princípio originante das coisas finitas, esse não tem fim. Mas, a vida começa com um nascimento. Portanto a vida é finita. Termina na morte.

E, para dizer a verdade, a morte é muito mais importante que a vida. Compare: acabou de nascer um vivente... quantas pessoas o visitam? Umas poucas mulheres que vão se solidarizar com as dores do parto da mãe que acabou de parir. Acabam dizendo que a cria é linda, mas é só. Experimenta morrer! Vem gente do arco do chapéu. Gente que nem conhecia o defunto acaba aparecendo, nem que seja em busca de um gole de pinga. Mas vem! A morte é a situação da vida que mais junta gente.

Outra coisa boa, na morte: você morreu, não deve mais pra ninguém! Acabaram os teus problemas. Se você tinha alguma pendência, os teus parentes é que vão se virar. Você estará lá, bem tranquilo, deitado num caixão, rodeado de flores... Em paz! Durante a vida? É essa correria que não para mais. Só para na morte...

Mas não é sobre a morte que desejo falar, hoje. Quero falar sobre aquele cara, que morreu. Era cantor de rap (ou funk ???) ... ou sei lá que tipo de música desses ritmos doidos que fazem tanto sucesso no meio da maçada. E pelo jeito o cara não era dos piores, pois morreu e permanece vivo na mídia. Além de, com certeza, na lembrança de suas três esposas e filhos. Morreu e tá vivo na memória. São as contradições da morte...

Mas o cara morreu. Deixou algum legado, evidentemente. Possivelmente obras sociais nos morros e favelas. Afinal era essa sua base de origem. Fez-se a partir das periferias. Sua obra, entretanto, foi na música. Cantou e compôs e a garotada vibrou e contou junto e fez festa e admirou sua prodigalidade: afinal foram mais de trinta filhos. Mas ele morreu. E só tinha 49 anos. Só que a mídia o mantém presente no dia a dia. Pelo menos nestes últimos dias.

E o Hélio Jaguaribe? Também morreu! É como eu disse, não escapa ninguém.

No meio da intelectualidade o Jaguaribe foi um fenômeno. Cientista político e sociólogo, na verdade um cara que se propôs a pensar o Brasil, propondo alternativas. Queria soluções. Escreveu livros. Deu aula. Fez palestras... Mas morreu, noventa e cinco anos depois de ter nascido. A morte não perdoa. Tolera alguns jovens, mas mata todos os velhos!

O primeiro marcou pelo som. Se foi capaz de fazer pensar, não sei. O que sei é que numa busca na internet, de imediato apareceram “Aproximadamente 4.790.000 resultados (0,42 segundos)”. E, só para comparar e medir a popularidade, a internet me disse que exitem “Aproximadamente 224.000 resultados (0,23 segundos)” para Hélio Jaguaribe.

Quer dizer, o cantor tem mais de vinte vezes mais resultados, para apenas 49 anos de vida, do que o professor e pensador em 95 anos. Evidentemente um é mais popular que o outro, mas qual deles prestou maior serviço para o Brasil?

Mas morreram. A morte não perdoa. É o defeito da vida. E você, já terminou a leitura? Agora espere sua vez!

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO