“Montesquieu: Sociedade e Poder” de José Augusto Guilhon Albuquerque; aborda com clareza a figura emblemática de Charles-Louis de Secondat, mais conhecido como barão de Montesquieu. Figura paradoxal que agrupa uma gama histórica e crítica sobre as inúmeras formas de governo, bem como os meios e as condições da configuração da lei, a saber, o jusnaturalismo que fundamenta por sua vez o Estado de Direito.

Montesquieu é uma figura emblemática do iluminismo francês, viveu entre os anos de 1689-1755, durante o reinado de Luís XIV (o Rei-Sol), que governou absolutamente a França entre os anos 1643- 1715. Durante o governo do Absolutista de Luís XIV, Montesquieu viu a França insatisfeita devido a gastos exagerados da corte real bem como a Guerra da Grande Aliança entre os anos de 1688-1697, gerando grande revolta e insatisfação da população que padecia de miséria e fome. No ano de 1702 veio a Guerra da Sucessão Espanhola trazendo ainda mais gastos ao país que só viria terminar com os tratados de Rastatt e Baden com a Áustria que colocaria fim no conflito.

Um ano depois o rei viria falecer, Luís XV tinha apenas cinco anos e a França dá inicio ao período regencial, o primeiro a assumir é o Duque de Orleans, falecendo em 1723, assume então o Duque de Bourbon, que lidera o país durante um período de grande prosperidade e paz. Em meio a guerras de sucessão Austríaca e polonesa o Duque de Bourbon veio a falecer era o ano de 1733. Assume então o rei Luís XV, em meio ao conflito; a França apresenta uma calma em meio à tormenta, mas com sua morte assume o rei Luís XVI, que foi um péssimo governante, gerando altos gastos a corte, o resultado de suas ações custaria sua própria cabeça e ao povo a Revolução Francesa.

Montesquieu é fruto deste ambiente denominado iluminismo, sendo que na França não havia liberdade, sendo tudo determinado pelo estado absolutista. O iluminismo quer ser então um movimento intelectual profundamente político, buscando além de tudo a liberdade externa.

O iluminismo francês quer modificar os moldes políticos e religiosos diferentemente do que apresentava o iluminismo inglês. A regra, o iluminismo enquanto movimento cultural é que quer lançar luzes sobre a obscuridade, pois tudo estava apegado à tradição.

É importante ressaltar que o iluminismo não é uma escola propriamente dita, mas um grupo de valores seguido por pensadores da época, geralmente denominados “enciclopedistas”, tinham como tese central o questionamento dos costumes, da moral, das tradições e instituições tradicionais. Os iluministas franceses se autoproclamavam como filósofos “como homem culto”, bem como os sofistas almejavam conhecer tudo, o conhecimento era a via sacra para a ascensão social em uma política de sangue.

Consideravam-se também cidadãos livres e iguais da “República das Letras”. Todos se igualavam; escreviam para conquistar a fama, sendo a grande maioria do estado monárquico (em especial Montesquieu), tinham que demonstrar confiança, sabedoria em seus escritos para participarem do circulo fechado da sociedade francesa.

Como buscavam a fama sem fazer concessão a ninguém, lançavam críticas para um público específico; escreviam para a camada burguesa bem formada. Escreviam contra a política e a religião que determinava a sociedade francesa, por causa destas críticas muitos foram perseguidos, censurados até mesmo exilados.

As obas eram editadas no exterior e entravam no país clandestinamente, geralmente eram passadas de mão em mão pelos cafés (centros iluministas), como também festas e nas lojas maçônicas.

A importância de Montesquieu para a noção da lei fundamenta na própria leitura que o mesmo faz entorno da ideia da lei (teocentrismo), como direito divino, ao qual, as leis passavam a exprimir certa ordem natural, ligada a vontade imutável e ideal.

Como enciclopedista ao pensar o espírito das leis alicerça importantes bases históricas no que diz respeito ao fundamento e aplicação das leis nas mais variadas tipologias de governo, seja ela, a monarquia, democracia, tirania ou aristocrática.

Chamado de Teórico Político da Revolução Francesa escreve, e, ao mesmo tempo, eleva a política para o campo das ciências, ou seja, retira o caráter teológico para delegar a mesma uma um método positivo e experimental aproximando-a física newtoniana.

Ao longo do texto fica claro que Montesquieu quer descobrir as causas históricas, morais, jurídicas, geográficas dos costumes dos povos (o fato é que quando um cientista faz sua experiência ele quer saber quais as causas que determina tais fenômenos). Quer conhecer os costumes e verificar as condições necessárias para intervir na sociedade para viver melhor.

Ao analisar ponto a ponto, Montesquieu deixa claro que a razão se incumbirá de organizar a sociedade, seja no funcionamento da sociedade até a sua manutenção, ressalva que “o que deve ser investigado não é, portanto a existência de instituições propriamente políticas, mas sim a maneira como elas funcionam”. p. 116  

As leis são relativas à natureza do governo, deixando claro que as instâncias de poder se relacionam de acordo com cada tipologia que por sua vez se distribui na sociedade nos diferentes grupos e classes da população; em outras palavras o princípio do governo é a paixão que o move. Assim temos na Monarquia- a Honra, na República- a virtude e no despotismo – o medo.

Montesquieu ao analisar as Leis nas suas diferentes tipologias ordena através da razão pontos específicos para o fluir do ordenamento da legalidade, o jusnaturalismo; porém sem deixar de lançar críticas a sistemas despóticos como o absolutismo e determinados costumes, a saber, a religiosidade espanhola e a hierarquia da igreja.

Constata-se que através da razão e da experimentação das relações entre os homens e das instituições busca fomentar através do conhecimento a segurança. Sacia a curiosidade buscando conhecer as leis morais para modificá-las. Delega a ciência a maior conquista para a aplicação das leis , pois quanto mais se conhece mais espaço, e, maior será o campo de sua aplicação, e assim possibilita a utilidade do conhecimento mostrando através de um resgate histórico os equívocos do passado e ao mesmo tempo proporcionando o novo.   

O ponto central dos textos de Montesquieu é criticar o absolutismo francês, a religiosidade espanhola e a hierarquia da igreja, em especial a infalibilidade papal e as verdades dogmáticas. Outra característica observada é que enquanto critica as instituições francesas elogia as instituições Inglesas (Monarquia Constitucional).

Ao pensar o espírito das Leis, apresenta a divisão dos poderes ao qual quem cria a Lei não pode criá-la em proveito próprio, portanto, o criador não pode executá-la, e quem executa não pode fiscalizar; temos aqui a tripartição dos poderes executivo, legislativo e judiciário.

Outro ponto observado no texto e várias vezes citado refere-se a positividade da lei, as leis não são invenções, princípios ideais, ela é sim um fenômeno social concreto, ou seja, as leis são criadas a partir da própria necessidade histórica de um povo, portanto não são absolutas. Assim cada região de acordo com a sua necessidade deve criar sua própria lei. Percebe-se em vários momentos a crítica que Montesquieu faz ao absolutismo (poder que emana de Deus).

De antemão, a origem do poder é o Tratado Social, transferido para uns o poder, ou seja, o poder emana do povo (e não de Deus), e, deve ser governado para o bem do povo.

Observa ainda cada tipo de governo e caracteriza a eles certos princípios:

A Democracia “República”, participação de todos, cujo fundamento é a virtude e por virtude deve-se entender amor e prática de igualdade.

Monarquia é o poder exercido por um, mas segundo certas construções legais (leis), uma monarquia constitucional o fundamento é a honra e a obediência.

Despótico ou Despotismo, o governo de um, mas exercido sob a regência do medo dos súditos, segue por medo e não por respeito.

É importante destacar que essas formas de governo podem cair em degeneração, a saber, a democracia pode se tornar uma anarquia para isso basta perder a virtude.

A monarquia pode transformar-se em oligarquia, ou seja, o governante perde o respeito pela população e passa a cuidar de “seus” interesses particulares, para isso basta perder a honra; que por sua vez a população perderá o respeito.

O despotismo pode se tornar uma ditadura basta ao déspota perceber que a população perdeu o medo para efetivar a Ditadura.

Percebe-se que a divisão dos poderes é a forma para não perder as virtudes, dividindo precária a preocupação pela revolução.

O poder Legislativo que faz as leis, os princípios de ordem, deve ampliar diferentes partido políticos para que aja uma construção segura das próprias leis e dos costumes. Configura-se aqui a noção de liberdade a partir do critério da própria lei positiva e natural, a saber:

“É preciso ter em mente o que é independência e o que é liberdade. A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem; e se um cidadão pudesse fazer o que elas proíbem, ele não teria mais liberdade, porque os outros também teriam esse poder” p, 172

 

O executivo governa segundo a lei construída por todos. Deve executá-la segundo a própria lei, ao qual, todos devem ser agraciados pela lei, em outras palavras, quem executa, executa segundo a lei.

Assim cabe ao poder Judiciário fiscalizar se a lei está sendo executada, segundo ao qual foi criada.

É importante ressaltar que Montesquieu dá grande destaque para a efetivação de um novo modo de pensar a política e a estruturação do poder.

Não sedimenta sua análise em uma visão simplificada, mas busca fomentar através do costume da história da própria extensão territorial a aliança de um governo capaz de agrupar as relações sociais em harmonia e paz, cujo escudo Máximo seja a independência entre os poderes para legitimar sua própria veracidade e virtude ao longo do tempo.

Referências Bibliográficas

ROUANET, Sergio Paulo. As razões do Iluminismo. São Paulo, Companhia das Letras, 1987.

WEFFORT, C. Francisco. (Org). “Os Clássicos da Política”15°ed. Vol I. Ed. Ática Rio de Janeiro, 2008