MÃOS SENSÍVEIS
Por Maria Eunice Gennari Silva | 18/10/2021 | Família
MÃOS SENSÍVEIS
Maria Eunice Gennari Silva
Mais de 50 anos tentando aprender. Apesar de nunca ter desistido, reconheço minhas limitações. Por isso, o máximo que consigo é mudar um vaso de lugar, mesmo assim se não for muito pesado.
A sensibilidade presente em um relacionamento perfeito com as plantas é um privilégio na vida de certas pessoas. E o meu marido, sem dúvida, está entre elas. Durante anos e anos tenho visto sua dedicação ao empreender parte do seu tempo às plantas, plantinhas, raízes, podas, troca de vasos e dos seus espaços, respeitando sempre o que elas solicitam dele - sombra, sol, chuva, luz...
Para mim, o mais bonito é quando ele sente que as plantas estão com sede. Dá gosto ver a água molhando o que, por ele, foi sensivelmente zelado enquanto acontece o processo de desenvolvimento em cada uma delas.
São muitas as vezes que vi sementes e raízes separadas sobre um pires, em potinhos vazios de margarina, ou até mesmo em tampinhas de garrafa de coca cola. Todas elas, carinhosamente, aguardando para que, no tempo certo, fossem colocadas nos seus devidos lugares e, em seguida, transformadas em vasos belíssimos.
Dia desses, lavando a louça do jantar, quase jogo fora no lixo uma tampinha de refrigerante com três minúsculas sementes. Do ouvido já não ouço bem, mas da vista, felizmente, enxergo de um tudo, tanto que consegui recolher duas delas que foram parar no chão. Claro que elas só foram parar lá pelo mal jeito, ou melhor, pela minha falta de sensibilidade em lidar com minúsculas sementes depositadas em um recipiente também tão pequeno.
Mas... graças a uma boa cutucada de Deus, imediatamente, recoloquei-as no lugar de onde elas não podiam ter saído.
Não devia, mas me esqueci deste episódio rapidinho, o que, certamente, explica a minha sensibilidade limitada em relação ao cuidar de plantas. Na verdade, para mim, bom mesmo é vê-las nos vasos, lindas e no momento exato de fotografar, tal qual as 3 sementinhas de maçã que, por pouco, quase foram parar no lixo. No entanto, sem que eu nem percebesse, elas foram aconchegadas no cantinho de um vaso. E, em poucos dias - que beleza! – elas começaram a retribuir a sensibilidade do meu marido exibindo lindas e pequenas folhas verdes.
Agora, no tempo certo, essa mudinha inicia um movimento harmônico no processo natural de transformação. Ela será, conforme sua necessidade e pelas mão sensíveis do meu marido, transferida para um vaso ainda mais bonito e maior, na certeza de que muitas maçãs virão.
Então, eu fico pensando que só pode ser presente de Deus para minha vida - meu marido e a beleza nos vasos lá de casa.
Bendita seja a natureza que encontra, nas pessoas sensíveis, uma disposição especial de transformá-la em colírios para os nossos olhos. Razão pela qual, o privilégio de viver momentos tão simples revela a importância de conhecermos a Deus na Sua plenitude. É neste caminhar que a Sua presença permanece e aperfeiçoa, em nós, o jeito de olhar e amar as nossas relações com os homens e a natureza.
É assim que continuo percebendo os diferentes sabores e saberes proporcionados pela mãos sensíveis do meu marido. Uma convivência que se compartilha compromisso verdadeiro, com sabor de gratidão e evidenciado através de mãos que conhece a terra e a beleza do que ela produz. Coisas que, certamente, sempre estarão gravadas na minha memória... com gosto, com aromas e cores.
Entre tantos sabores que, na verdade, transformam, devagar e continuamente, o meu jeito de olhar, os dissabores não têm tanta importância e, por isto mesmo, nem precisam ser contados. Os dissabores, com mais de meio século, são, agora, apenas aprendizado no tempo que passa. Mas, as mãos sensíveis do meu marido, enquanto lida com a terra, são as mesmas que colocaram boas sementes no meu coração.