LITERATURAS AFRICANAS E SUA RELEVÂNCIA SOCIAL.

Por Layane Stefani Silva | 08/02/2019 | História

LITERATURAS AFRICANAS E SUA RELEVÂNCIA SOCIAL.

O continente africano é uma fonte de água corrente e límpida no que tange à literatura. Quando pensamos em literatura africana de língua portuguesa, nomes como Pepetela, Luandino Vieira e Paulina Chiziane veem à mente. Além disso, a África também é berço de quatro ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura: Wole Soyinka, Nadine Gordimer, Naguib Mahfuz e J. M. Coetzee.

As literaturas africanas ganharam força por meio de movimentos anticolonialistas: o estopim se deu principalmente através de negros em diáspora – fenômeno que se caracteriza pela imigração forçada de homens e mulheres do continente africano para outras regiões do mundo. Um dos primeiros registros ocorreu nos Estados Unidos com William Edward Burghardt e W. E. B. Du Bois, este conhecido como pai do Pan africanismo – movimento político/cultural que batalhava a favor da emancipação de países africanos envoltos pela arbitrariedade colonial, tal como por uma concepção de unificação africana desempenhou grande influência sobre os escritores negros estadunidenses da época.

Tempos depois, na década de 1920, ainda nos EUA, surgiu o "New Black Movement" ou Harlem Renaissance. O movimento de cunho literário e cultural tinha como objetivo acabar com os rótulos e ideais preconcebidos associados ao negro no âmbito social. Escritores amplamente conhecidos como Claude Mackay, Langston Hughes e Richard Wright, elevavam a honra da cor negra cravejada na pele da população, em suas obras, ao invés de lastimarem-se sobre as dificuldades vividas.

O movimento se difundiu em diferentes partes do globo, chegando até a França, local onde se enraizou, ganhando essência. Conhecido por Negritude, a palavra criada por Aimé Césaire e derivada de négre – termo em francês de cunho difamatório usado contra o negro – foi utilizada com o sentindo invertido para desmoralizar o colonizador com um de seus principais meio de domínio racial: a linguagem. No começo, direcionada apenas na esfera cultural, com o passar dos anos, o movimento se estendeu alcançando novos ideais.

Mesmo com algumas ressalvas, a Negritude foi levada para diferentes países, inclusive ao Brasil, através de Luís Gama. A postura adotada pelo poeta negro juntamente a sua obra “Primeiras Trovas Burlescas” introduziu o discurso de afirmação racial no país, todavia, somente na década de 1940 por intermédio do Teatro Experimental Negro (TEN), as ideias do movimento francês apareceram no Brasil e, assim como na sua versão original, a Negritude chegou aqui como protesto de uma parte pequena da nação denominada: burguesia intelectual negra – composta por estudantes, musicistas, escritores, artistas, entre outros – à soberania branca.

Apesar de sua ampla magnitude cultural, a Literatura Africana que hoje carrega temas inspirados não somente no sofrimento das guerras civis e da exploração europeia, bem como no contraste de países recompostos e países carentes, nas belezas naturais, nas religiões e culturas do continente, ainda sofre com o descaso nos países de língua portuguesa.

No Brasil, isso advém da grande carga racista que infelizmente ainda detemos, pois o país com a segunda maior população negra no mundo, ficando atrás apenas da Nigéria com exatamente 54%, e que até então padece com a representatividade negra nas mídias visuais, onde 21% das mulheres e 13% dos homens protagonistas de comerciais televisivos são negros, no qual segundo a ONU, a cada sete em dez pessoas assassinadas são negras e que dos 4.222 indivíduos mortos resultantes da ação policial neste ano, um pouco mais de 75% eram negros, no lugar em que na última década o feminicídio caiu 8% em relação às mulheres brancas e subiu cerca de 16% entre as mulheres negras, uma nação com a enorme mancha da escravidão recente na história, onde grande parte da sociedade não entende os reais motivos para a existência de cotas nas instituições de ensino, com todos esses problemas citados e tantos outros talvez seja difícil pelo menos imaginar que desde 2003, esteja em vigor a Lei Federal 10639/03 que regulamenta o estudo sobre a história e a cultura africana e afro-brasileira em todos os níveis de ensino das redes pública e privada do país, contudo, não é isso que ocorre.

Seja pela relutância dos professores, seja pela escassez de conhecimento do assunto por parte dos alunos e dos pais, seja pelo desconhecimento da Lei, seja pela deficiência na formação docente ou até mesmo falhas no poder público, impedem que conteúdos referentes à literatura africana, extremamente importante para a formação de um país onde mais de 50% dos habitantes são negros, sejam ponderados, analisados e apreciados.

Jéssica Fabrícia da Silva, formada em Letras pela Unesp de Araraquara e mestranda em Literatura Africana pela Unicamp, afirma que a literatura africana é origem de um conhecimento mais abrangente sobre a cultura do continente que apenas ganha repercussão e notoriedade como o prisma da violência e das catástrofes. Segundo ela, “África é diversidade e também é arte”.