O saudoso professor Lindolpho teve uma longa e produtiva vida. Trabalhou com grande disposição até os oitenta anos. Nunca o vi cansado ou desanimado. Entrava em sala de aula como se fosse um jovem, sempre sorrindo e foi dessa forma que fez a sua longa travessia. Hoje soube, tardiamente, a notícia do seu falecimento. Tardiamente porque não pude dizer adeus ao amigo de tantos anos.

O professor Lindolpho, na sua juventude, optou pelo sacerdócio e se ordenou padre, mas no meio do caminho tinha uma pedra, como diria o poeta Carlos Drummond. Mas era uma pedra simbólica que atravessou seu caminho na vida religiosa e o levou para outra missão.

Ele conheceu uma moça judia que alterou os seus planos de vida. Deixou a vida religiosa para viver um grande amor. Duas religiões antagônicas, mas unidas na mesma divindade, não foi uma barreira para um casamento feliz.

Como é comum entre os sacerdotes que se retiram da vida religiosa, foi ser professor, lecionando no estado e no município de São Paulo. Foi também diretor de escola pública e professor universitário, lecionando mais de duas décadas na FEI. Graduou-se em Filosofia, Pedagogia, Letras e Administração, além de cursos de especialização.

Mas sua amada partiu cedo, vítima de uma doença incurável e assim, Lindolpho ficou só com as duas filhas do casal ainda meninas. Com coragem e determinação, cumpriu a missão de pai com muito amor e dedicação.

Não se casou novamente, mas sendo um notório pé de valsa, divertia-se nos fins de semana fazendo uma das coisas que lhe dava grande prazer: dançar. Comentava que dançava a noite inteira sem se cansar. Cada música era uma nova alegria que precisava ser vivida intensamente, dizia sempre.

Era um leitor assíduo e aproveitava suas horas de lazer com Balzac, Victor Hugo e Flaubert, sempre no original, pois seu conhecimento de francês lhe permitia tal prazer. Dizia sempre que no idioma original, conseguia penetrar na alma das grandes obras primas.

Quando se aposentou, o fez em grande estilo. Promoveu uma grande festa numa churrascaria, onde foi homenageado por parentes e amigos que com ele labutaram no magistério. Despediu-se de todos com alegria e fraternal abraço.

Depois disso veio a um encontro de alguns colegas em minha casa. Foi o primeiro a chegar e só foi embora no início da madrugada, ainda dirigindo seu possante. Neste dia cantou, declamou e riu de modo a ouvir-se de longe. O resto é silêncio.