Uma vez disseram-me que a perceção que temos da realidade, do mundo e de tudo, pode ser simplesmente comparada a uma lente num determinado espaço e instante da nossa linha cronológica. Sim, lentes estas que mudam assim como tu também mudas. Por isso, essas lentes vão rodando contigo e acompanham-te, eu não via a minha cidade da mesma maneira que via quando tinha 7, 10, 18 anos ou até mesmo há um mês atrás. Que quer isto dizer? As minhas lentes mudaram, se calhar gostava mais da lente dos 10 anos porque via uma cidade mais feliz porque a lente dos 15 limpou a ideia ingénua do mundo perfeito. O que faz mudar estas lentes és tu, tu cresces, as pessoas que passam pela tua vida podem fazer-te ver de maneira diferente, os sucessos e as derrotas, as diferentes fases da tua vida levam-te a mudar de lente e a guardar as outras na caixa do tempo, criando-se memórias. Podes tentar regressar ao mesmo local no mesmo dia, à mesma hora, com a mesma roupa mas se a tua lente mudou a tua perceção daquele local nunca será a mesma, os sentimentos que aquele sítio te suscitou não serão mais os mesmos. Por mais má que possa ser a visão que tens atualmente, ou que tiveste, não te revoltes contra o mundo, não te revoltes contra o destino, com os outros e principalmente não te revoltes contra ti mesmo. Essa lente eventualmente irá mudar para algo melhor e fará parte da tua "caixa" e não vale a pena descarta-la, ela faz parte de ti agora, vai estar lá sempre a relembrar-te como chegaste ao presente e foi através dela que passaste à próxima. Nós nunca mudamos sozinhos, as pessoas que passam na nossa vida são como espelhos, refletem os nossos maiores medos, os nossos defeitos, as nossas qualidades. Elas têm sempre um propósito na tua vida, por mais mínima que seja a sua contribuição é através delas que vais conseguir transitar e crescer. Algumas podem-te trazer boas memórias, outras más ou ambas. Elas podem acompanhar-te para sempre, podem cruzar-se apenas contigo na rua, podem trazer-te felicidade ou até mesmo magoarem-te ao longo da vida. Mas não as detestes, afinal de conta porque haveria de odiar alguém que me ajudou a ver o mundo de forma mais lúcida e consciente. O mundo para mim vai ser sempre diferente, sou um colecionador de longa data de memórias e ainda não cheguei a metade da minha coleção, ainda me falta percorrer um longo caminho, que só por si só já me deixa entusiasmado porque nunca saberei qual será a próxima lente a passar pelos meus olhos.