Lei da palmada: um tapinha não dói

É possível que você se lembre de “Mc Naldinho e Bella”, “As meninas”, “Bonde do tigrão”, “Furacão 2000”. Grupos que cantaram “Tapinha”, música, alguns anos atrás:

“Vai Glamurosa / Cruze os braços no ombrinho / Lança ele prá frente /E desce bem devagarinho... /Dá uma quebradinha / E sobe devagar / Se te bota maluquinha / Um tapinha eu vou te dar / Porque: Dói, um tapinha não dói / Um tapinha não dói / Um tapinha não dói / Só um tapinha...(2x)”

Embora fizesse apologia ao tapa, ele era “sensual”, destinado ao bumbum das mulheres, com finalidades eróticas, por isso foi cantado e divulgado por todas as redes de TV!

Claro que de lá para cá as coisas pioraram. Naquela época os “autores’ criavam um texto. E davam um jeito de fazer o povão acreditar que aquilo era música. Tudo se misturava com muita bunda se mexendo em todas as posições. Atualmente ainda abundam as bundas, cada vez mais rebolantes. O que desapareceu foi a letra da música. “Canta-se” uma frase ou palavra, como se fosse musica. Entretanto, se tem esperto pra fazer, tem otário para repetir e comprar o CD ou baixar da internet... E já que gosto é como aquilo, cada um tem o seu...

Entretanto, não queremos falar sobre a linha (decadente) da música. A intenção é refletir sobre o tapa. Instrumento educacional que vem rareando e agora entrou para a lista de espécimes em extinção no processo educacional. E se observarmos veremos que o caos se instalou nos lares na proporção inversa ao uso do tapa (ou vara, ou chinelo) disciplinador.

Hoje, o problema do tapa é outro. Relaciona-se com as crianças sem limites, sem parâmetros, superprotegidas pelo ECA – que até pode ter sido mal interpretado, mas produziu efeitos permissivos. As crianças aprenderam a fazer birra pelos direitos, sem que delas seja possível cobrar obrigações, pois sempre tem alguém dizendo que isso vai contra tal princípio.

E agora me aparecem com uma tal “lei da palmada”. Uma emenda no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Diz a emenda, lá no artigo 17-A, que crianças e adolescentes têm direito à educação “sem o uso de castigo corporal ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação, ou qualquer outro pretexto”.

Aqui entre nós, e que nenhum integrante dos “direitos das crianças” nos leia: você já viu ou ouviu falar que alguém tenha começado o processo de repreensão a uma traquinagem com uma palmada, ou varada, ou chinelada ou coisa parecida? NÃO. Primeiro vem as advertências, as ameaças... só depois do insucesso do argumento brando é que se lança mão do recurso extremo. E você, como eu, sabe que existem situações em que os argumentos não funcionam. Você, como eu, conhece casos e casos em que o recurso extremo foi necessário. E também sabe de outras tantas situações em que por falta de umas palmadas o menor se tornou delinquente... E que a delinquência infantil vem aumentando... pois não podem ser punidas.

Existe uma máxima, lá no livro dos provérbios (na bíblia), dizendo que "o que não faz o uso da vara odeia seu filho, mas o que o ama, desde cedo o castiga". Também existe uma frase, atribuída a Rui Barbosa, dizendo: “eduquem as crianças para não ser preciso castigar os adultos”. E, se procurarmos entre nós, dificilmente encontraremos alguém que nunca tenha levado umas chilapadas educativas no traseiro. Veremos que as pessoas decentes, vieram de lares em que não se economizava chinelo. Da mesma forma que os safados que poluem todos os ambientes – da política à bandidagem – são frutos escrotos da impunidade.

Não defendemos o uso indiscriminado da violência ou o espancamento. O que defendemos é o direito – e obrigação! – dos pais educarem seus filhos. Para os casos de excessos existe outra lei que fala sobre agressão e lesão corporal. É só aplicá-la! Do lado dos cidadãos de bem é consenso a afirmação de que “a impunidade aumenta a violência”. Nossa legislação, dia após dia, aumenta as condições para a impunidade. Esta e outras leis produzem a certeza da impunidade, pois assegura ao bandido mais direito que o cidadão de bem.

Daí nos vem a indagação: se nos tiram os direitos de educarmos nossos filhos, como serão os adultos que governarão a sociedade na qual seremos os velhos? Se hoje os menores agridem, roubam e matam, impunemente, como agirão quando adultos? Será que num passe de mágica aprenderão a respeitar as pessoas? Que sociedade é essa que depende de leis dizendo como o menor deve ser educado? Que famílias são essas que dependem de leis para lhes dizer como devem ser educadas as crianças?

Se chegamos ao ponto do Estado ter que dizer como as crianças devem ser educadas no seio familiar é porque alguma coisa está errada ou com a família ou com o Estado.

Para terminar, lembremo-nos de que se estamos permitindo esse tipo de lei nós é que merecemos umas palmadas, pois estamos deixando as raposas tomarem conta do galinheiro. Por outro lado, se no mundo erótico “um tapinha não dói”, no processo educacional ele não é dispensável.

 

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO