LEGALIZAÇÃO DA CANNABIS: DEBATE JURÍDICO ACERCA DA LEGALIZAÇÃO DA MACONHA NO BRASIL
Por Pedro Carvalho Gonçalves | 18/04/2022 | DireitoUNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL
HISTÓRIA E ESTUDO DO DIREITO
RUBENS FALCÃO MORAIS NETO
PEDRO CARVALHO GONÇALVES
JOAO LUCAS LOPES DE QUEIROZ
FRANCISCA ISABELLE SOUSA CARVALHO
MARCOS FELIPE LACERDA PEREIRA
FRANCISCO YTALLO DA SILVA
LEGALIZAÇÃO DA CANNABIS: DEBATE JURÍDICO ACERCA DA LEGALIZAÇÃO DA MACONHA NO BRASIL
FORTALEZA
2021
Trabalho apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina História e Estudo do Direito, do Curso de Direito, da Universidade Federal do Ceará. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Márcia Correia Chagas
1 INTRODUÇÃO
Há alguns anos, no Brasil, discute-se acerca da legalização e descriminalização da planta Cannabis, ou, como é socialmente conhecida, a maconha. Discute-se também sobre seus princípios ativos, como é o caso do mais conhecido componente dessa planta, que possui comprovadas ações terapêuticas, o canabidiol (CBD) e do tetrahidrocanabinol (THC), substância que causa efeitos psicoativos e neurotóxicos (LORENZETTI; SOLOWIJ; YÜCEL, 2016). É importante frisar que a legalização da maconha atinge não apenas os campos da saúde, seja ela individual, seja ela coletiva, que abrange as redes de saúde públicas e as unidades de tratamentos, mas também aborda as áreas de cunho social, por vezes não levadas em consideração ao se retratar sobre essa questão. Há, ainda, a discussão acerca do poderio econômico creditado ao narcotráfico e seus respectivos comércios ilegais de drogas ilícitas e lícitas, como será explanado acerca do tabagismo. Tais discussões evidenciarão em como a legalização da maconha influencia não apenas no âmbito da saúde, mas em diversos outros campos também bastante problemáticos em nossa sociedade, como o tráfico de drogas e a disseminação da violência. Para iniciar a discussão acerca da legalização da maconha, foram apresentados os pontos negativos que a legalização da maconha pode acarretar não apenas em seus próprios usuários, mas também no SUS (SUS) e, consequentemente, para o Brasil. Destacou-se, também, seus usos medicinais e diferenciou-se o que de fato é utilizado com o fito terapêutico e o que de fato é a droga recreativa, bem como o grupo de doenças contempladas que são amenizadas seus sintomas e ocorrências com a utilização da planta para fins medicinais. Posteriormente, discute-se acerca das finanças públicas, respondendo perguntas como: será que, de fato, a maconha favorece uma alta arrecadação fiscal aos cofres públicos? Seria isso benéfico? O âmbito financeiro é bastante argumentado e se evidencia o que de fato ocorre ao se legalizar a maconha, baseando-se em outras drogas já legalizadas, como o álcool e o tabaco. Adiante, a questão da segurança pública é bastante abordada ao se retratar a legalização da maconha, bem como os reais rendimentos da maconha no tráfico, se realmente essa receita é um alto valor que estaria deixando de ser recebido devido à possível entrada da iniciativa privada na comercialização da droga, com sua plena legalização. Será que realmente trará mais segurança à sociedade brasileira? A maconha ainda assim estaria fora do controle dos narcotraficantes? Além disso, há, posteriormente, os casos comparativos, nos quais se atesta a legalização da maconha e os seus desdobramentos no contexto internacional, com enfoque em países que já legalizaram a droga, como o Uruguai, a Holanda e como é o caso de alguns estados dos Estados Unidos da América, especificamente o Colorado e a Califórnia. Por fim, retrata-se acerca dos limites do direito à liberdade, posto que, se a legalização permite um exercício mais pelo de tal direito, que é considerado fundamental pela Constituição Federal de 1988, então por que há ainda discussões acerca dessa problemática? É, de fato, necessário haver um sopesamento entre os direitos que a legalização da maconha afeta. Questionamentos assim aduzidos são precisamente elucidados no decorrer deste trabalho, no qual foram abordadas as consequências que a legalização da maconha trouxe e pode trazer aos países e regiões em que a legalizaram, evidenciando que não apenas o campo social está sendo analisado, mas também o político e o econômico.
2 OBJETIVOS
O presente trabalho visa analisar os efeitos que seriam gerados pela legalização da maconha no Brasil, especialmente os efeitos sobre a coletividade, mostrando que esses estes se mostram majoritariamente deletérios. Provando, dessa forma, que tal substância não deve ser legalizada.
3 JUSTIFICATIVA
O seguinte trabalho é pautado sobre a polêmica da legalização da maconha no Brasil, tema que, muitas vezes, é discutido sem a devida profundidade que ele necessita. Este texto visa, justamente, aprofundar o debate, analisando aspectos, como saúde e segurança pública e, por fim, explorando o sopesamento dos direitos que a legalização impacta.
4 METODOLOGIA
Este trabalho consistiu em pesquisas bibliográficas acerca dos efeitos da maconha na saúde individual e dos efeitos da sua legalização na segurança e finanças públicas, além de uma análise geral da experiência de outros países que passaram por esse processo de legalização.
5 A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA E SEUS IMPACTOS NA SAÚDE
A discussão acerca da temática da legalização da maconha tem sido uma questão polêmica nos últimos anos, pois a possível legalização e comercialização gera dúvidas nos indivíduos, tais como se o uso é ou não prejudicial à saúde. Aduzir-se-á os malefícios e, também, alguns dos benefícios do uso da Cannabis e sua utilização psicoterapêutica, evidenciando que somente alguns componentes na planta Cannabis são extraídos laboratorialmente e, assim, a partir de diversas técnicas biomédicas e farmacológicas, cria-se os fármacos medicamentosos.
5.1 Consequências danosas e os fatores psíquicos afetados pela maconha
Em um contexto relativo às consequências nefastas do uso da maconha para consumo próprio ao indivíduo, evidencia-se que tal erva causa dependência, isto é, vício. O risco de vício é de aproximadamente 9% daqueles que experimentaram a droga, esse número sobe para cerca de 1 em 6 para aqueles que iniciaram o consumo da maconha ainda na adolescência e para 25% a 50% entre aqueles que fumam diariamente. Além do vício, a maconha causa Síndrome de Abstinência, cujos sintomas englobam a irritabilidade, dificuldades para dormir, ansiedade e depressão, o que contribui com a dificuldade em se parar de utilizar a droga. Ademais, aponta-se que os indivíduos que começaram, ainda na adolescência, a fazer uso da maconha, são, quando comparados aos adultos, de duas a quatro vezes mais propensas a sentir os efeitos da Síndrome de Abstinência dentro de dois anos depois do primeiro uso. Isso ocorre pois o cérebro, incluindo o sistema chamado de endocanabinoide (SECB), passa por um desenvolvimento ativo durante a adolescência e, com a recepção dos princípios ativos da planta da maconha, pode ser prejudicado tal sistema, podendo aumentar até mesmo o risco de o indivíduo vir a fazer uso de outras drogas ilícitas, tornando-se, portanto, mais vulnerável e prejudicado com relação às atividades nos neurônios em que atua o sistema endocanabinoide (VOLKOW et al., 2014). É sabido que o cérebro possui um período de desenvolvimento do pré-natal até a infância e da adolescência até aproximadamente aos 21 anos e é nessas fases em que qualquer interferência na atividade cerebral, isto é, qualquer alteração em suas funções, seja em sua superatividade, seja em escassez ou excesso de neurotransmissores, pode ser irreversível e altamente prejudicial. A exposição ao princípio ativo mais concentrado da planta da maconha, o THC pode recalibrar e potencializar o sistema de recompensas cerebral, deixando a mente mais vulnerável a outras drogas, bem como pode afetar até mesmo o a dinâmica do citoesqueleto em crianças, tornando crítica a situação sináptica entre os neurônios. Além dessas consequências desastrosas, há ainda um dado amostral de que, ao se comparar o grupo controle não exposto aos efeitos da maconha e o grupo exposto, fica evidente que o grupo exposto à droga desde a adolescência teve suas conectividades neurais prejudicadas, isto é, possuem menos fibras em regiões específicas do cérebro, e, ainda, quem se utiliza da Cannabis tem revelado um decrescimento da atividade em regiões de pré-frontal e reduzidos volumes do hipocampo. Isso mostra os gravíssimos riscos que o uso dessa droga causa aos indivíduos, especialmente àqueles que iniciam durante a adolescência ou na infância ainda, podendo causar declínio do quociente de inteligência (QI) e torná-los incapazes de exercer simples atividades, como raciocínio lógico e leituras (LORENZETTI; SOLOWIJ; YÜCEL, 2016).
5.2 Complicações orgânicas envolvendo a intoxicação da maconha
Outro efeito altamente nefasto do uso da maconha é o aumento à propensão de desenvolvimento de câncer, diminuição da coordenação motora, alterações da atenção, concentração e memória. O risco de desenvolvimento de um câncer de pulmão através do uso da maconha ainda não se mostra tão bem esclarecido, mas estudos comparativos, evidenciados ainda pela mesma matéria, atestam para uma associação entre o uso da maconha com o aumento da incidência de câncer de pulmão e críticos cânceres no alto do trato digestivo, como boca, esôfago e laringe. A maconha sozinha causa menos risco quando se compara ao cigarro, mas seu uso em conjunto ao tabaco, ou alternado, desenvolve sérios danos ao organismo, bem como acarreta, também, na resistência das vias aéreas, tornando-as mais espessas e rígidas, causando graves inflamações, bronquites e até mesmo queda no sistema imunológico respiratório, facilitando o acometimento pela pneumonia, doença que pode ser considerada grave para pacientes com complicações fisiológicas como os usuários dessa droga. O uso frequente da Cannabis prejudica a habilidade motora que possibilita, por exemplo, dirigir um veículo, o que, consequentemente, aumenta as chances de se haver um acidente, muitas vezes fatal. Isso porque, como os níveis de THC sanguíneo estão altos, diminui-se a atividade cerebral, causando perda da atenção e relaxamento excessivo dos músculos, impedindo o indivíduo de possuir respostas rápidas quando situação exige. O índice de desatenção piora quando se combina bebidas alcoólicas e a droga (GRUBER; SAGAR, 2017).
5.3 A relação do uso da maconha com o surgimento de psicoses
É um fato bem estabelecido que o uso de maconha acarreta efeitos negativos que são bastante significativos para a saúde e o bem-estar individual, especialmente a saúde mental. Um estudo bastante significativo, realizado pela coletânea de artigos e estatísticas feita pela Academias Nacionais de Ciências, Engenharia e Medicina, descobriu que existem associações entre os transtornos de humor, depressão, ideação suicida, esquizofrenia e psicoses e o uso da Cannabis quando se analisa o uso prolongado, ainda na adolescência, e uso contínuo, ainda na fase adulta ou adolescência. Vale ressaltar que se evidencia, também, prejuízos com relação à aprendizagem e à memória, pois os princípios ativos da Cannabis podem, de acordos com os termos da pesquisa, inibir permanentemente a capacidade do cérebro de funcionar adequadamente (NATIONAL ACADEMIES OF SCIENCES, ENGINEERING AND MEDICINE, 2017).
5.4 Maconha: prejudicial ou medicinal?
É importante destacar outro ponto bastante discutido: não é a planta de maconha (Cannabis) per se que tem propriedades medicinais, mas sim os canabinóides que são encontrados nessa planta. Algumas pesquisas evidenciam a importância do uso desses canabinóides e não da maconha em si (BERNARDO, 2021). Indivíduos que possuem doenças como esclerose múltipla, epilepsia, altos graus de autismo, insônia, depressão ou até mesmo sintomas decorrentes de uma quimioterapia, como náuseas fortíssimas e enjoos, podem, de acordo com os rígidos critérios da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e dos próprios médicos, fazer uso da Cannabis medicinal. Tal droga é um extrato rico em CBD, um dos princípios ativos presentes na planta da maconha, ricos em propriedades que se relacionam harmonicamente com a recepção pelas células do organismo via sistema endocanabinoide. Essa droga ameniza os fortes sintomas de outras doenças crônicas, ainda em sua fase inicial de desenvolvimento, como Alzheimer, fibromialgia e paralisia cerebral. É importante salientar que é o CBD que auxilia no tratamento e auxílio dos efeitos danosos de todas essas doenças supracitadas, e não o THC, responsável pela animosidade e pelos perigos que o uso recreativo da maconha causa em seus usuários. Portanto, deve-se diferenciar quais são os princípios ativos importantes e medicinais, e quais são os nefastos e negativos ao organismo. Entretanto, mesmo com os vastos benefícios da Cannabis medicinal, deve-se atentar seguramente aos efeitos colaterais inevitáveis da droga, bem como seu maior cuidado ao ser direcionado aos adolescentes (HEMPMEDS, 2020). Em suma, o uso de maconha foi associado a substanciais efeitos adversos e, assim como outras drogas de consideradas ilícitas, pode causar dependência. Durante a intoxicação, a maconha pode interferir na função cognitiva (memória e percepção) e função motora (coordenação), e esses efeitos podem ter consequências prejudiciais (acidentes automotivos). O frequente uso da maconha durante a adolescência pode resultar em mudanças permanentes na função cerebral que podem prejudicar as atividades educacionais, profissionais e sociais. No entanto, os efeitos de uma droga (legal ou ilegal) na saúde individual são determinados não apenas por suas propriedades farmacológicas, mas também por sua disponibilidade e aceitabilidade social. Nesse sentido, as drogas lícitas (álcool e tabaco) apresentam um grave cenário, sendo responsáveis pela maior carga de doenças associadas às drogas, de acordo com os estudos estatísticos da pesquisa do National Institutes of Health (NIH) não porque sejam mais perigosas do que as ilegais, mas porque seu status legal permite uma exposição mais ampla. À medida que a política muda em direção à legalização da maconha, é razoável e provavelmente prudente levantar a hipótese de que seu uso aumentará e que, por extensão, também aumentará o número de pessoas para as quais haverá consequências negativas para a saúde, sufocando, por sua vez, o SUS (VOLKOW et al., 2014).
5.5 Impactos no Sistema Único de Saúde
É importante evidenciar o reconhecimento de que o Brasil não possui estruturas suficientes para abarcar as possíveis consequências em caso de descriminalização e legalização da maconha para consumo próprio. Tal despreparo é aduzido por juízes e desembargadores do Fórum Nacional de Juízes Criminais. Para a entidade, fica nítido que o país se tornaria mais violento devido à ausência de preparamento prévio do SUS para receber novas e diferentes demandas sociais, haja vista que a rede de saúde pública possivelmente sobrecarregaria em decorrência das altas internações dos usuários dessa droga (CONJUR, 2018). Não há, no SUS, uma diferença institucional entre um enfermo decorrente do uso de drogas e outro decorrente de doenças crônicas, por exemplo, logo a chance de um paciente usuário retirar o leito de outro paciente não usuário é bastante alta, o que evidencia um prejuízo ao sistema de saúde em sua totalidade, que já se encontra atrasado, defasado em alguns setores e carente de recursos médico-hospitalares (LAVIERI, 2020). Em suma, ao legalizar e descriminalizar o uso da maconha, o SUS sofrerá para abarcar o contingente de usuários, o que ocasionaria um aumento do custo com despesas médico-hospitalares, através de verbas do SUS (SUS), devido aos danos psicológicos e fisiológicos, que serão aduzidos posteriormente, causados no indivíduo pela erva (VOLKOW et al., 2014), o que implicará, consequentemente, em mais investimentos, que já são insuficientes atualmente, não apenas na própria unidade do SUS, mas em novos centros de tratamento e de prevenção, que com certeza estarão sobrecarregados, devido às altíssimas taxas de ocupação dos leitos e das unidades de tratamento aos usuários dependentes. É sabido, também, que o SUS carece no quesito investimento. Em 2020, o Ministério da Saúde deixou de enviar cerca de 10 bilhões de reais ao sistema público de saúde, fato esse que evidencia a ineficácia de os hospitais públicos do país abarcarem o contingente de futuros viciados e prejudicados pelo frequente uso da intoxicação da maconha. Há aproximadamente dois leitos para cada dez mil habitantes no país, porém tal proporção, apesar de recomendável pela Organização Mundial da Saúde, se mostra ineficiente para suportar o aumento das internações desses pacientes que utilizam a maconha, bem como ineficiente para suprir as necessidades de outros pacientes enfermos que não são usuários (LAVIERI, 2020).
6 FINANÇAS PÚBLICAS E A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA
Um dos argumentos mais utilizados por aqueles que são a favor da legalização da substância é o fato de que uma possível liberação representaria uma maior arrecadação fiscal para os cofres públicos, de forma que o dinheiro recolhido poderia ser investido em outros setores que beneficiassem a sociedade. No entanto, tais afirmações desconsideram os possíveis custos decorrentes dessa medida, que poderiam inclusive ultrapassar as quantidades arrecadadas, causando prejuízos ao Estado, fato que veremos que já ocorre com substâncias já legalizadas no país. É lícito, portanto, analisar essas situações que vão de encontro aos argumentos que alegam existir apenas vantagens na legalização da maconha no que diz respeito à parte financeira.
6.1 O exemplo das drogas já legalizadas
6.1.1 O tabaco
Apesar das tentativas do Estado de reduzir o consumo dessa substância no Brasil, o uso de tabaco ocupa o segundo lugar no ranking de drogas mais utilizadas no país, segundo levantamento de dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) (OBSERVATÓRIO DA POLÍTICA NACIONAL DE CONTROLE DO TABACO, 2021b). Diante dessa considerável demanda, em 2019, de acordo com dados da Agência Câmara de Notícias, o setor de cigarros no Brasil representou um total de R$ 14,478 bilhões em tributos, quantia certamente expressiva (MACHADO, 2020). No entanto, quando comparada com os custos resultantes da utilização do tabaco pelos brasileiros, os quais o Estado tem que arcar, a soma arrecadada se mostra irrelevante, visto que só em relação às doenças causadas diretamente pelo tabagismo o valor estimado dos gastos é em torno de R$ 125.148 bilhões ao ano, como mostra uma das pesquisas do Inca, quantia muito superior ao valor recolhido pelo poder público através da tributação e que pode ser ampliada se considerados os gastos com ações de prevenção e tratamento para cessação do tabagismo, de prevenção e mitigação dos danos previdenciários, sociais e ambientais decorrentes da produção de tabaco e do mercado ilegal de tabaco. Nessa perspectiva, é evidente o desequilíbrio entre o que Estado gasta e o que está sendo coletado com o uso do tabaco (OBSERVATÓRIO DA POLÍTICA NACIONAL DE CONTROLE DO TABACO, 2021a).
6.1.2 O álcool
Já o álcool, droga lícita mais consumida no país, segundo dados da Fiocruz , é responsável por uma arrecadação de mais de R$ 21 bilhões em impostos por ano. Apesar de expressiva, tal quantia arrecadada não é suficiente para suprir as despesas decorrentes do alcoolismo para os cofres públicos, que já em 2014 somavam cerca de R$ 372 bilhões (SILVEIRA et al., 2015). Dessa quantia destaca-se o valor de R$ 249,3 milhões que foram gastos pelo SUS (SUS) para tratar problemas decorrentes do alcoolismo, sendo as internações psiquiátricas incluídas nessa fatura, visto que 50% das internações masculinas nesse setor foram em decorrência do abuso de álcool (AMORIM, 2014). Além disso, poucos anos antes, o governo federal gastou R$ 200 milhões no SUS com a internação de pacientes que se envolveram em acidentes de trânsito, dos quais 37% envolveram o uso de álcool, de acordo com levantamento de dados do Ministério da Saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013).
6.2 Relacionando com a legalização da maconha
Diante desses dados, é evidente que o argumento de que a legalização traria vantagens por conta da arrecadação de tributos é falacioso, visto que podemos presumir, por conta da experiência do país com drogas legalizadas, que os gastos do governo para mitigar os efeitos da maconha seriam maiores do que as quantidades recolhidas para os cofres públicos. Primeiramente, deve-se considerar que a arrecadação estimada com a venda legal da substância, segundo estudo da Consultoria Legislativa do Congresso Nacional, seria de R$ 5,9 bilhões ao ano, valor muito inferior ao que é arrecadado com a venda das drogas lícitas no país (SILVA; LIMA; TEIXEIRA, 2016). Além disso, a maconha pode causar, da mesma forma que o álcool e o tabaco, problemas à saúde dos indivíduos, como já foi analisado, podendo causar dependência e tendo forte ligação com problemas psíquicos e até mesmo com acidentes de trânsito, segundo o jornal Hoje em Dia, que aponta vários estudos que analisam a ligação da Cannabis com acidentes de trânsito em países que legalizaram a droga (LAGOA; MORAES, 2017). Dessa forma, percebe-se que o dinheiro que retornaria para o Estado com a liberação da maconha seria um valor menor do que o que já é arrecadado com as substâncias já legalizadas, com prejuízos semelhantes aos dessas drogas, o que pode ser indicador de uma discrepância entre as receitas e os custos da legalização e consequentemente de prejuízos às finanças públicas.
7 SEGURANÇA PÚBLICA E A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA
É frequente no debate público a narrativa de que a legalização da maconha permitirá a entrada da iniciativa privada na comercialização da droga, o que daria fim ao tráfico e ,consequentemente, excluiria das facções criminosas a receita obtida com essa atividade. Seguindo a lógica, com menos financiamento, essas organizações perderiam o seu financiamento para realizar outras atividades danosas para a sociedade. Em um primeiro momento, essa lógica se mostra persuasiva, mas esse argumento se trata de uma falácia que será desmentida no decorrer deste tópico. Também será abordado sobre como a legalização da maconha irá impactar em mais insegurança ao trânsito brasileiro.
7.1 Rendimentos da maconha no tráfico
A narrativa de que uma suposta retirada do comércio da maconha das operações do tráfico pela entrada da iniciativa privada com a legalização dessa droga é falsa. A maior parte do rendimento das facções criminosas advém do contrabando de cigarro, bem mais do que as drogas. Haja vista a ausência tributária imposta nesses produtos ilegais, o consumidor se inclina, mais positivamente, à vontade de adquirir tais produtos, pois possuem um preço bastante acessível e atrativo. Luciano Timm, secretário Nacional do Consumidor, atuante no Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirma que o cigarro ilegal, isto é, contrabandeado, corresponde a mais de 50% do comércio de cigarros no Brasil, número alarmante quando se percebe que as duas principais marcas comercializadas são as contrabandeadas. A Polícia Federal evidencia que o contrabando de tabaco, adotado comercialmente pelos membros de organizações criminosas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), gera uma receita bastante expressiva quando comparada às margens de lucro do tráfico de drogas para esses grupos. Portanto, não haveria um sério impacto no rendimento das organizações criminosas se por acaso a comercialização ilegal da maconha saísse de suas operações (KADANUS, 2019).
7.2 A venda da maconha continuaria na mão do tráfico
A suposição de que a entrada do mercado privado seria o suficiente para retirar o mercado consumidor do tráfico também se mostra falsa. Embora a maconha se torne mais facilmente disponível ao ser vendida no mercado legal, ela estará submetida a tributos e custos adicionais que a tornarão menos acessível financeiramente que a vendida pelo tráfico, o que renderia ainda um bom consumo das classes menos favorecidas. Com a legalização, muito provavelmente a Cannabis deixará de ser traficada e simplesmente passará a ser contrabandeada, como é o caso do cigarro no Brasil, em que os custos elevados desse produto legalizado fazem com que 6 em cada 10 cigarros consumidos no país sejam advindos do contrabando por facções criminosas , sendo a vasta maioria proveniente do Paraguai, onde a carga tributária é de 18%, a menor do mundo. Enquanto a alíquota no Brasil parte de 71%, podendo chegar a 90% dependendo do estado . A receita obtida com o contrabando do cigarro é uma importante fonte de renda para o financiamento das atividades de organizações como o PCC e o Comando Vermelho (KADANUS, 2019).
7.2.1 Aumento da receita das facções criminosas
Como exposto anteriormente, a receita obtida com o contrabando do cigarro é uma importante fonte de renda para o financiamento das atividades de organizações como o PCC e o Comando Vermelho. Uma possível legalização da maconha tornaria esta droga melhor vista pela sociedade, estimulando o seu consumo. Como já se há no Brasil uma tradição de adquirir produtos pelas mãos do tráfico, uma camada maior da população iria recorrer ao consumo da maconha mais acessível financeiramente, comercializada na clandestinidade, o que por sua vez geraria maior rendimento para as facções criminosas com o contrabando do que se continuasse ilegal, à exemplo da Califórnia, nos Estados Unidos, em que os californianos continuaram comprando com traficantes e o mercado ilegal segue mais forte do que nunca (FULLER, 2019).
7.3 Ameaça da maconha para o trânsito
Dirigir é uma atividade que requer bastante atenção e reflexo do motorista, visto que é preciso lidar com eventos rápidos e inesperados que ocorrem no trânsito. É amplamente conhecido pela sociedade os perigos que o álcool gera à condução de veículos, mas pouco se fala do risco que a maconha representa para o trânsito. A maconha possui uma substância depressora do sistema nervoso central que “relaxa” o cérebro e diminui a capacidade de se prestar atenção (VOLKOW et al., 2014). Esses efeitos representam um perigo para a capacidade de condução dos motoristas e , em outros países onde a droga é legalizada, já tem causado inúmeras mortes no trânsito, como é o caso de alguns estados dos Estados Unidos. Outro agravante se trata de que, diferentemente do álcool, o qual pode ser medido no sangue através do aparelho do Bafômetro, ainda não há um teste rápido que possa mostrar os níveis de maconha de um condutor, o que dificulta a fiscalização da polícia. Além de não ser facilmente medido, outro problema é que a maconha fica no seu sistema por muito mais tempo que o álcool, que deixa o organismo algumas horas depois de parar de beber. Estudo recentes mostram que, mesmo que uma pessoa não use maconha há um mês, ela ainda pode ser detectada em seu sangue, o que pode ter um grande efeito negativo na capacidade de uma pessoa de dirigir com segurança (BELLUM, 2014).
7.3.1 Efeitos da legalização da maconha no trânsito norte-americano
Um dos mais marcantes acidentes dos Estados Unidos foi em março de 2017, quando caminhão bateu em um ônibus da igreja em Concan, Texas, matando 12 pessoas. De acordo com o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes (NTSB), a causa provável do acidente foi o motorista do caminhão sob influência de um sedativo e de maconha (HAYDEN, 2017). Há uma correlação entre a legalização da maconha e o aumento das mortes no trânsito. Pesquisadores analisaram as mortes no trânsito no Colorado, Oregon e Washington. São três estados que legalizaram a maconha recreativa. O estudo também analisou nove jurisdições vizinhas. Nos primeiros seis meses após a legalização, Oregon, Colorado e Washington tiveram uma morte adicional no trânsito para cada um milhão de residentes. Em outubro de 2018, o Instituto de Dados de Perdas rodoviárias (HLDI) e o Insurance Institute for Highway Safety (IIHS) realizaram um par de estudos. Eles descobriram que houve 6% mais acidentes de trânsito em estados onde a maconha é legalizada. Esse aumento foi em comparação com locais vizinhos onde a maconha ainda é ilegal (LANE; HALL, 2019).
8 A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA NO CENÁRIO INTERNACIONAL
Há uma tendência internacional atualmente de legalizar a maconha, seja seu uso medicinal, recreativo, sua produção ou sua comercialização, e essa política traz em si consequências a quem a adota, não sendo raro ver nações tomadas por essa tendência enfrentando problemas causados pela progressista política e antigos apoiadores desta inclusive se arrependendo de seu suporte à causa. Falando-se do tema, vem à mente os Países Baixos e o Uruguai como exemplos do sucesso de tal iniciativa, mas será exposto por que os tão falados benefícios dessa legalização não passam de falácias e sonhos longínquos de otimistas ativistas e de oportunistas políticos, utilizando-se os próprios “paraísos da maconha” como prova.
8.1 O caso do Uruguai
Quando o país legalizou a venda, o cultivo e a distribuição da droga em 2013, havia um poderoso sentimento de otimismo permeando os debates acerca do tema, a crença de sucesso e vitória sobre o narcotráfico enchia os apoiadores da legalização de orgulho e esperança, porém a situação do país após a legalização foi bastante distante daquilo pretendido por esses otimistas. Logo de início, aqueles que esperavam ansiosamente tal “progresso” foram pegos de surpresa pelos elevados preços e pela burocracia enfrentada para comprar a droga, com uma limitação de 10g por semana, uma inspeção minuciosa por parte do governo e a taxação sobre o produto, o que tornava-o pouco acessível a camadas mais pobres da sociedade, além da baixa qualidade da erva legalizada, de acordo com os próprios consumidores, o que gerou um profundo descontentamento na população, conforme já apurado pela Folha de São Paulo (COLOMBO; VERPA, 2020). Nessa perspectiva, em vista de consumir um produto de maior qualidade e com menor custo, é necessário cultivar a Cannabis na própria casa, algo que também enfrenta diversos níveis de burocracia governamental, como a inscrição em clubes de cultivadores de Cannabis, o registro em cadastros nacionais de consumidores e produtores, a espera pela conclusão dos trâmites da autorização estatal, a inspeção recorrente e o pagamento de taxas anuais para continuar plantando e cultivando, o que desestimula aqueles que desejam fazer isso, outro fator gerador de críticas e dificultador do sucesso da política (INTERNACIONAL, 2014). Ainda é importante citar a exclusividade desse consumo no país, porque os valores- cerca de R$50,00 por um pacote de 10g - são pouco acessíveis às pessoas mais pobres, que conseguem a droga mais barata no mercado paralelo e, por consequência, abastecem-no, como exposto pelo Grupo de Investigação da RBS(GDI), o qual apurou que, dos 147 milhões de reais movimentados com a venda de maconha no Uruguai em 2018, somente 36 milhões foram provenientes da maconha legalizada, que mostra um insucesso no combate ao tráfico, o qual manteve seu lucro (TREZZI, 2019). Também há o fato de que apreciadores da droga dificilmente se satisfazem com 10g semanais, precisando adquirir mais do entorpecente, mas de forma ilegal, o que dá uma sobrevida ao tráfico e o alimenta, além de que o mercado interno do país não é suficientemente abastecido, faltando maconha frequentemente - muito porque, graças à elevada regulação estatal, somente duas empresas possuem permissão para realizar a distribuição -, como já afirmado por consumidores e vendedores entrevistados pela Folha de São Paulo: “Os pacotes se esgotam em questão de segundos quando chegam”, diz Sérgio Redin, 56, responsável pela farmácia Antártida. “É difícil comprar, para cada reserva precisamos ficar insistindo em mais de uma farmácia até conseguir”, conta Nahum Martínez, 19, consumidor (COLOMBO; VERPA, 2020). Tendo em vista todos esses fatos, é ilógico manter a fantasia de que o Uruguai foi um sucesso nas políticas de liberação da maconha, pois, com base no exposto no decorrer dessa dissertação, a política uruguaia não passou de um trágico fracasso, e, àqueles que creem que é possível haver uma real competição da droga legalizada com a ilegal, resta mostrar que é totalmente improvável que um produto sobre o qual incidem taxas e é protegido por uma forte burocracia desafie o domínio do tráfico de maneira satisfatória, pois o produto mais acessível tende a ser o mais consumido.
8.2 O caso dos Países Baixos
Os Países Baixos, que possuem uma política em relação às drogas consideravelmente progressista, - embora não tenham oficialmente legalizado, e nem criminalizado, o consumo de maconha- são frequentemente utilizados como exemplo de sucesso das políticas permissivas sobre drogas, não passam de outro caso de fracasso e de falácia generalizada, sofrendo com problemas relacionados ao narcotráfico, o vício e criminalidade relacionadas ao consumo de drogas. De princípio, a questão da criminalidade foi muito pouco afetada pela tolerância ao consumo e venda de entorpecentes, com a Holanda movimentando cerca de 21% do lucro do narcotráfico na Europa na década de 2000, sendo a maconha o maior expoente e “contribuidor” desse lucro (CORRENTE, 2019). A partir da década de 1970- época da descriminalização da maconha -, também houve uma escalada nos assassinatos no país, ao ponto que Jan Struijs, presidente sindical holandês, disse: “Claro que não somos o México. Não temos 14.400 assassinatos. Mas se você olhar para a infraestrutura, a quantidade de dinheiro arrecadada pelo crime organizado, a economia paralela (. . . ) Sim, temos um narco-Estado” (HOLLIGAN, 2019). Não se pode dizer que essa escalada da violência não se deu pela política de drogas, já que, a partir da década de 1980, a criminalidade tem uma ascensão constante no país, com a proliferação de gangues e organizações criminosas, o que leva a um aumento de assassinatos, extorsões e outros crimes relacionados ao tráfico, como já dito por diversos sindicatos de polícia holandeses, além de que, conforme a Europol, os Países Baixos são o principal núcleo do tráfico de drogas na Europa, junto a um aumento dos chamados matadores de aluguel, que agora matam por cerca de US$3,6 mil, os mesmos que protagonizaram crimes brutais, como o assassinato de Derk Wiersum, o qual nem sequer utilizava drogas, mas foi morto em uma tentativa de cartéis de drogas de intimidar a sociedade civil (LIMA, 2018). Nessas condições, o que explicaria um país tão permissivo às drogas ter uma criminalidade tão assustadora e um poder narcótico tão proeminente? Caso a política de liberação funcionasse, o mercado paralelo deveria ser esvaziado e mitigado, porém isso não ocorre, ele cresce e se mostra cada vez mais ativo na sociedade, e isso é a prova da ineficácia de tais políticas progressistas.
8.3 O caso dos Estados Unidos da América
Os Estados Unidos jamais legalizaram as drogas ou as descriminalizaram em escala federal, mas, por sua condição federalista, os estados possuem autonomia para conduzir sua política de drogas. Assim, algumas unidades federativas já cometeram o equívoco da permissividade sobre as drogas e trabalharemos especificamente dois desses estados: Colorado e Califórnia.
8.3.1 O caso do Colorado
O estado do Colorado legalizou a maconha recreativa em 2014, com uma expectativa similar às que os exemplos anteriores tinham, muito iludidos pelas promessas de solução da criminalidade e aumento das receitas, o que se mostrou muito distante da realidade. O ano de 2016, quando comparado a 2013, teve um índice de criminalidade 5% maior, enquanto o resto do país passava por uma queda na criminalidade; os crimes violentos, 12,5%, enquanto o aumento nacional foi de 5%, esses dados mostram um assustador aumento na condição de insegurança que sitia os cidadãos daquele estado, aumento esse movido principalmente pela legalização da maconha, embora apoiadores da liberação neguem esse fato, porém é irreal considerar que isso seria somente uma coincidência, considerando que tal aumento se dá na mesma época em que a droga foi liberada. Ainda há o aumento de 44% nos índices de violência em Denver, capital do Colorado, após a legalização, segundo relatório do procurador distrital Mitch Morrissey, junto ao aumento da atividade policial para combater crimes relacionados a drogas nesse período, maior do que em qualquer outra época; é claro, não se pode atribuir todo o aumento da criminalidade à maconha, mas ela exerce um papel fundamental, uma vez que tal situação ocorre paralelamente à legalização e muitos dos crimes ocorrem em razão da droga (NOGUEIRA, 2018). Apesar disso, o governador do estado alega que a erva é um fator minoritário nessa alarmante situação, dizendo:
Quando você tem esse tipo de crescimento (econômico), você atrai todos os tipos de pessoas e algumas delas são indesejáveis. Elas vêm atraídos pelo [comércio] da maconha? Ou eles vêm porque há um monte de dinheiro na comunidade e este é um ótimo lugar para tentar roubar alguém ? (NOGUEIRA, 2018)
A defesa do governador não é surpreendente, uma vez que seu estado recebeu US$ 247 milhões em impostos, além de que o comércio moveu US$ 1,51 bilhão em 2017, então ele busca manter essa atividade tão lucrativa funcionando, pois seria um prejuízo à economia da unidade federativa a nova criminalização, mesmo que a insistência na legalização traga trágicas consequências como as já citadas (NOGUEIRA, 2018). Portanto, tendo em vista a condição aqui exposta, não há como dizer que a liberação do referido entorpecente não trouxe consequências ao estado, consequências essas que, inclusive, tiram a vida, um direito fundamental e natural, um dos direitos mais importantes, ao qual nenhuma receita pode sobrepor. As consequências da legalização da maconha, como já expostas no caso do Colorado, superam muito os possíveis benefícios.
8.3.2 O caso da Califórnia
Sendo outro exemplo de estado iludido pelas falácias pró-legalização, a Califórnia o fez, e os resultados da legalização são nada mais que um retumbante fracasso. Baixa adesão, baixa competitividade com o mercado paralelo, elevada regulação estatal, tudo isso ajuda a explicar o fracasso da liberação da droga. A produção do estado é 7 vezes maior que a quantidade consumida, com esse excedente sendo utilizado para o contrabando, porque contrabandistas adquirem o entorpecente naquela região, em que ele é mais barato, e o vendem para outros estados os quais vendem por um preço mais elevado; então, o maior sucesso propiciado pela legalização foi o dos contrabandistas, que adquiriram um lucro impressionante. A população também reclama da regulação do Estado, que cada vez mais busca centralizar o comércio, buscando obter maiores receitas, criminalizando recentemente cooperativas médicas de Cannabis, gerando um oligopólio no mercado do estado, com empresas grandes licenciadas pelo estado sendo as únicas distribuidoras, ofertando preços mais elevados aos consumidores, que não compram de varejo, diferente dos contrabandistas, fato esse o qual só tem dois efeitos: o prejuízo ao cidadão, o benefício ao criminoso (FULLER, 2019). Nessa condição desvantajosa enfrentada pelos consumidores, estes acabam por muitas vezes buscando o produto no mercado ilegal, como já visto no Uruguai e no Colorado, o que alimenta o crime, aumentando, por consequência, a violência, o que frustra os sonhos de ativistas pró-legalização, algo que se mostra como um padrão ao redor do mundo, seja no Canadá, nos Países Baixos, no Uruguai ou em qualquer outro lugar analisado. As consequências detalhadas de tal política na Califórnia quanto à violência não podem ser especificamente analisadas, pois as novas políticas de regulação da droga só foram implantadas em 2019, e as pesquisas, em decorrência da pandemia de Covid-19, não foram plenamente realizadas.
8.4 O caso do Canadá
Em 2018, o Canadá se tornou o primeiro país do G7 a legalizar o uso recreativo da maconha e, desde lá, muito ocorreu quanto a essa droga, mas quase nada positivo. A burocracia e as dificuldades logísticas ocasionadas por essa foram fundamentais para o fracasso da política no país, um padrão que se repete globalmente. Em Ontário, província mais populosa do Canadá, que possui 14 milhões de habitantes, somente 50 lugares possuem permissão para vender a droga, o que gera a concentração do produto e a dificuldade de acesso, tenho poucas corporações licenciadas para produzir ou para distribuir, ainda demorando para obter tal licença; com poucos locais de venda e a burocracia exigida pelo governo para que a droga seja distribuída, o produto torna-se pouco procurado exatamente pela dificuldade de obtê-lo, o que levou a um consumo de somente cerca de 7% do produzido no país, segundo o governo canadense. Ademais, 75% dos usuários de erva no país usam Cannabis ilegal, muito pelos fatores anteriormente citados e pelo preço elevado do entorpecente no mercado legal, custando quase o dobro do produto ilegal (LEVINSON-KING, 2020). Enquanto o mercado legalizado continua monopolizado e encarecido pela ação governamental, o mercado paralelo cresce e, por conseguinte, o crime avança, com grupos criminosos obtendo lucros por essas vendas e custeando suas atividades, o que influi para a violência, contrariando a promessa feita antes da legalização. Isso pode ser percebido facilmente pela continuidade do mercado negro mesmo após a legalização da maconha, sendo este controlador de 80% do mercado da droga no país, conforme o Departamento Canadense de Estatística (DW ECONOMIA, 2019). Portanto, não resta dúvidas, o Canadá é mais um exemplo de fracasso da legalização, assim como todos os citados anteriormente; sabendo-se desse constante fracasso, por que deveria ser praticada a mesma política falida que faz tão mal aos países citados? Os “exemplos internacionais de sucesso” não passam de casos de fracasso constante de uma política nascida da utopia e defendida por utopistas sem compromisso com a realidade.
9 OS LIMITES DO DIREITO À LIBERDADE
É inegável que a legalização da maconha significaria um exercício mais pleno do direito à liberdade, um dos direitos fundamentais estabelecidos pelo artigo 5° da Constituição Federal (BRASIL, 1988). No entanto, a legalização teria impactos não só na vida individual, mas também na coletividade, afetando outros direitos fundamentais. Desse modo, é preciso realizar um sopesamento entre tais direitos. Com efeito, o debate acerca da legalização da maconha implica no conflito entre o direito à liberdade e o direito à vida. Como mostrado anteriormente, a legalização impactaria grandemente o SUS, sobrecarregando ainda mais a sua já carente estrutura, devido ao aumento da demanda que seria gerada pelas doenças advindas do uso contínuo da maconha. Nesse contexto, esse impacto negativo no SUS implicaria, além da precarização do direito à saúde, na debilidade do direito à vida. Pois, como mostra o jurista André Ramos Tavares, o direito à vida é, além do direito à mera existência, um direito a um nível adequado de vida. O direito à vida não existe sem o direito à saúde, visto que este é necessário para a dignidade humana (TAVARES, 2009). Não obstante, esse conflito é resolvido quando se verifica que o direito à vida é mais importante do que o direito à liberdade. Segundo o jurista Alexandre de Moraes, “o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais” (MORAES, 2005). Dessa forma, se o direito à vida não for assegurado pelo Estado, o restante perde o seu sentido de ser, logo ele possui prioridade sobre os demais. Destarte, verifica-se que a ampliação do direito à liberdade que seria promovida pela legalização da maconha se daria em detrimento do direito à vida, o que não pode ocorrer, visto que o direito à vida é o principal direito no ordenamento jurídico brasileiro, do qual decorrem todos os demais. Logo, tal substância não deve ser legalizada.
10 CONCLUSÃO
A problemática abordada infere em diversos aspectos da sociedade, desde os campos da área da saúde, até aos de segurança pública, economia e geopolítica. É importante salientar que o crescente uso recreativo dessa droga causou, infelizmente, prejuízos ao Estado. Os estudos supracitados apontam para os prejuízos altamente nefastos à saúde e ao SUS daqueles que consomem a planta Cannabis, assim como abordam os problemas relacionados ao narcotráfico, principalmente os que envolvem a violência e os diferentes modelos de legalização da maconha, adotados por países da Europa, Américas do Norte e Sul, que fracassam a cada período, aumentando o vício e a criminalidade, alicerçada ao consumo de drogas, e sem possuírem sequer a especulada arrecadação da receita proposta pela tributação das respectivas drogas legalizadas por parte do Estado que a legalizou esse produto. Apesar de ser amplamente defendido que a Cannabis possui propriedades medicinais, abomina-se a ideia de que é a maconha em si que seja medicinal, pois, como muito se sabe, o que de fato é medicinal não é a maconha per se, e sim alguns dos componentes, extraídos de maneira cuidadosa e especializada, que são bastante pesquisados acerca de seus efeitos já comprovadamente terapêuticos. Argumentos assim são muito utilizados pelos defensores da legalização dessa droga, porém não consideram todos os aspectos acima supracitados, desde os problemas na saúde do indivíduo e do coletivo, com o envolvimento do inchaço do SUS, até a impossibilidade de redução da violência, do narcotráfico e do aumento da receita arrecadatória tributária por parte do Estado, argumentos esses que são comprovadamente válidos e possuem ampla gama de exemplificações internacionais e nacionais em fatos concretos. Nesse sentido, conclui-se que, no Brasil, não se deve legalizar a maconha, devido aos seus desdobramentos no âmbito social, político e econômico. Portanto, espera-se que, em breve, o Brasil possa se posicionar de maneira contundente, a fim de explanar adequadamente os pontos aqui aduzidos e debatidos, seja com a criação de Projetos de Lei ou melhorias com relação ao combate às drogas, seja com mais investimentos em políticas públicas que possam mitigar toda essa problemática que assola o país.
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