O Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) divulgou em 30 de junho estudo mostrando que os brasileiros mais pobres, com renda até dois salários mínimos (R$ 930), têm de trabalhar 197 dias do ano para pagar os tributos cobrados pela União, Estados e municípios.

É quase o dobro dos 106 dias exigidos dos brasileiros mais ricos, que ganham mais de 30 mínimos (R$ 13,9mil). O estudo revela ainda que a injustiça tributária no País aumentou no governo Lula, mesmo com a melhoria da distribuição de renda e cortes de tributos.

Algumas camadas da população acabam fazendo um esforço maior para financiar o funcionamento do Estado e das políticas públicas porque a distribuição da carga tributária no Brasil não é equânime.

De acordo com a pesquisa, em 2004, as famílias mais pobres gastavam 48,8% da renda com impostos. Em 2008, o custo subiu para 53,9% - um salto de quase cinco pontos porcentuais em quatro anos. Já para as famílias mais ricas, o peso dos tributos cresceu menos. Subiu de 26,3% para 29%.

Tributos indiretos
Segundo o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, um dos motivos para esse quadro de injustiça é o grande número de tributos indiretos. "A experiência dos países desenvolvidos aponta a importância da elevação dos tributos diretos, dos impostos sobre a riqueza, e a redução dos impostos indiretos que incidem sobre o consumo básico, alimentação e transporte", disse.

Ainda segundo o Ipea, a diferença na carga de impostos paga em cada faixa de renda se deve à cobrança indireta de tributos. Pelos cálculos do instituto, de cada R$ 100 de impostos pagos no país, R$ 42 são indiretos.

Os trabalhadores com rendimentos menores são isentos do IR. Mas os tributos são cobrados em todos os itens que consomem, na chamada tributação indireta. Como as alíquotas são as mesmas, independentemente da renda de quem compra, elas pesam mais para os contribuintes que ganham menos.

Carga tributária
O esforço dos contribuintes de todas as faixas de renda para pagar impostos aumentou nos últimos anos. Isso porque a carga tributária total do país subiu. No ano passado, o Ipea calcula que ela tenha ficado em 36,2% do PIB, ante 32,8% em 2004.

O número do Ipea segue a metodologia do IBGE, diferentemente do método da Receita Federal. Portanto, quando o fisco apresentar o cálculo da carga fiscal de 2008, este será menor porque não inclui os gastos com FGTS, por exemplo.

O estudo do Ipea mostrou que os trabalhadores com renda familiar mensal de até dois salários mínimos gastaram 53,9% da sua renda em tributos em 2008. Em 2004, eram 48,8%. Os contribuintes com renda acima de 30 salários mínimos, por sua vez, destinaram 29% do que ganharam aos impostos. Em 2004, eram 26,3%.
Segundo o IBPT, a carga tributária do ano passado foi de 36,56% do PIB.

Pacote de bondades
Pochmann reconheceu que as isenções tributárias de mais de R$ 100 bilhões dadas desde o início do governo pouco alteraram o quadro. Pelo contrário, só pioraram. "Pelas informações que nós dispomos, há um aumento da regressividade e injustiça tributária. As isenções pouco alteraram o quadro que já é reconhecido no Brasil", disse.

Os novos benefícios tributários concedidos pelo governo Lula para enfrentar a crise financeira podem ainda agravar a situação porque se concentram no investimento. E, mesmo quando voltadas para o consumidor, as desonerações tributárias alcançam produtos mais caros, como automóveis, que não são comprados pelas faixas de renda mais baixas.

Outro fator que pode estar contribuindo para agravar a injustiça tributária é a constatação de que empresários não têm repassado todo o ganho com isenções para o consumidor, motivo do desabafo, na semana passada, do presidente Lula. O presidente disse que dar dinheiro aos pobres é mais eficaz do que reduzir impostos das empresas.

O levantamento do Ipea aponta ainda que os brasileiros que não possuem propriedade pagam uma carga tributária 78,1% superior à dos proprietários. "Ser proprietário no Brasil é ser beneficiado pelo sistema tributário", disse Pochmann.

Dia a dia
O estudo mostra a destinação dos tributos. O trabalho de 24 dias arcou com os benefícios da Previdência Social. Outros 7,7 dias foram destinados à cobertura das pensões e aposentadorias dos servidores federais. Enquanto o pagamento de juros da dívida pública foi responsável por absorver 20,5 dias de trabalho dos cidadãos, o Bolsa Família demandou 1,4 dia.

O Impostômetro, painel eletrônico mantido pela Associação Comercial de São Paulo, cravou na tarde de ontem o valor de R$500 bilhões em impostos pagos nas três esferas de governo desde o início do ano. Em 2008, a marca foi alcançada cinco dias antes. Responsável pelos cálculos, o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Gilberto Luiz do Amaral, prevê que a arrecadação no ano deve superar R$1 trilhão pelo segundo ano.

O que o governo faz com os impostos
O Ipea também fez uma radiografia de como o governo gasta os tributos recolhidos, tomando por base alguns dos principais itens da despesa pública. Segundo a classificação usada pelo Ipea, a maior parte vai para o pagamento de juros da dívida da União, Estados e municípios.

Os brasileiros gastaram, em 2008, 20,5 dias de trabalho para pagar os juros da dívida pública. Já o programa Bolsa Família, do governo federal, custou 1,4 dia. Os brasileiros precisaram de 16,5 dias de trabalho para pagar as aposentadorias e pensões da área urbana. As aposentadorias dos servidores do Executivo, Legislativo e Judiciário custaram 6,9 dias.
  
Bibliografia
Jornal O Estado de S. Paulo de 01 de julho de 2009
Jornal Folha de S. Paulo de 01 de julho de 2009
Jornal O Globo de 01 de julho de 2009