A obesidade infantil constitui, na atualidade, um dos mais sérios desafios de saúde pública, tendo atingido níveis epidémicos em vários países do Mundo. 1 Nos últimos 30 anos a prevalência mundial da obesidade infantil triplicou, sendo os países da bacia do Mediterrâneo os mais atingidos da Europa. 2

Segundo um estudo divulgado pela Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto em 2004, Portugal é o segundo país europeu com maior prevalência de excesso de peso em crianças, com 31,5% das crianças portuguesas entre os 7 e os 9 anos com excesso de peso ou obesidade. 3

Durante 3 anos consecutivos, de 2007 a 2009, foi anualmente levada a efeito uma Jornada Nacional de Sensibilização para o problema da obesidade infantil promovido pela Secção de Pediatria Ambulatória da Sociedade Portuguesa de Pediatria. Esta iniciativa permitiu a a avaliação de 6985 crianças a verificou-se uma prevalência de obesidade de 20 %. Verificou-se também que a obesidade é mais prevalente nas faixas etárias compreendidas entre os 6 e os 12 anos.4

A avaliação do estado nutricional representa o primeiro passo na abordagem da obesidade infantil e têm de ser considerados critérios diferentes dos que são utilizados nos adultos. Ainda não existe um consenso universal relativamente aos critérios de Classificação do Índice de Massa Corporal (IMC) para a população pediátrica. Em Setembro de 2005, Portugal adaptou as tabelas de crescimento e curvas de percentis estabelecidas pelo Center for Disease Control and Prevention (CDC) dos EUA. De acordo com estas curvas, uma criança com um IMC entre o percentil 85 e 95 para a idade e sexo tem excesso de peso e acima do percentil 95 para a idade e sexo tem obesidade. 2

Definida como uma das doenças crónicas mais difíceis de tratar, acarreta diversas complicações e é a segunda causa evitável de morte após o tabagismo. Os crescentes custos económicos associados ao aumento do sobrepeso e os seus problemas médicos poderão ser responsáveis pela falência do sistema de saúde nos próximos anos. Uma criança com obesidade tem maior probabilidade de vir a desenvolver patologias na sua vida futura que lhe dificultarão tanto a vida pessoal como a social. 3 Uma criança com obesidade tem maior probabilidade de vir a desenvolver patologias na sua vida futura que lhe dificultarão tanto a vida pessoal como a social.5

São frequentes os distúrbios psicossociais: uma auto-imagem progressivamente fragilizada conduz a situações de depressão, auto-exclusão social, abuso de substâncias e mau rendimento escolar. A compulsão alimentar terá uma prevalência de 30% em raparigas adolescentes com excesso de peso. Na idade adulta, os obesos têm menor probabilidade de encontrar um parceiro e maior risco de viver na pobreza, particularmente as mulheres. 6

A obesidade encontra-se também associada a outras doenças crónicas tais como o cancro, hipertensão, dislipidémia, intolerância à glicose, apneia do sono e infertilidade. 7

A obesidade pode ser de origem exógena e endógena. No caso da endógena deve-se identificar a doença primária e tratá-la. A obesidade exógena origina-se do desequilíbrio entre ingestão e gasto calórico, devendo ser manejada com orientação alimentar, especialmente mudança de hábitos e otimização da atividade física. Na infância, o manejo da obesidade pode ser ainda mais difícil do que na fase adulta, pois está relacionado com mudanças de hábito e disponibilidade dos pais, além de uma falta de entendimento da criança quanto aos danos da obesidade.8

A sensibilização para o problema da obesidade infantil é reduzida, as consequências reais a longo prazo podem passar despercebidas aos pais. Aparício et al. verificou que na sua maioria (65%), os pais se sentem pouco ou nada preocupados que o filho venha a ter excesso de peso ou obesidade. 9

A evolução tecnológica e a urbanização reduziram a atividade física diária e aumentaram as atividades sedentárias, particularmente a televisão e o computador. Nos EUA, somente 22% das crianças seguem as recomendações para os níveis básicos de atividade física e 25% são completamente sedentárias. 6 Há estudos que relacionam o tempo gasto a assistir televisão com a prevalência da obesidade. A taxa de obesidade em crianças que assiste a menos de 1 hora diária é de 10 %, enquanto o hábito de persistir por 3, 4, 5 ou mais horas por dia a ver televisão está associado a uma prevalência de cerca de 25%, 27% e 35%, respetivamente. 8 Para além de haver uma diminuição do gasto energético pela substituição de atividade física pela televisão, há também o aumento da ingestão alimentar durante a observação ou por estímulo da publicidade alimentar. 3 A moda do fast ou junk food é amplamente difundida pelos meios audiovisuais sem qualquer controlo de qualidade. Os estudos demonstram que as crianças são as mais vulneráveis, bastando apenas 30 segundos de publicidade para as influenciar. Apenas nos países da Europa do Norte (Noruega, Finlândia e Suécia) é que existem leis claras e altamente restritivas que regulamentam a publicidade alimentar infantil. 6

A alimentação constitui um elemento chave na abordagem da obesidade infantil. 2 A maior disponibilidade de alimentos hipercalóricos e o maior número de refeições em restaurantes aumenta consideravelmente o risco de obesidade.6 Os pais têm um papel essencial na alimentação da criança. Obrigar uma criança a comer tudo o que é servido pode provocar a perda do ponto de saciedade, aumentando o risco de desenvolver obesidade. É recomendável o fornecimento de refeições e lanches saudáveis, equilibrados e nutritivos que permitam à criança escolher a qualidade e a quantidade que elas desejam comer. 8

A escola por sua vez, é um local privilegiado de intervenção, onde pequenas mudanças ao nível da alimentação e atividade física, podem contribuir para travar a escalada da obesidade e conduzir a estilos de vida mais saudáveis. 3

Bibliografia

  1. Lobstein, T. & Frelut, M. Prevalence of overweight among children in Europe. Obes. Rev. 195–200 (2003).
  2. Carvalho, M. A., Carmo, I. do, Breda, J. & Rito, A. I. Análise comparativa de métodos de abordagem da obesidade infantil. Rev. Port. Saúde Pública 29, 148–156 (2011).
  3. Jorge, P. & Pereira, D. E. A. Obesidade infantil: estudo em crianças num ATL. Millenium 42, 105–125 (2012).
  4. Prazeres, T. & Fonseca, J. L. Rastreio da obesidade infantil – três anos de jornadas nacionais. Acta Pediátrica Port. 122–126 (2010).
  5. Amaral, O. & Pereira, C. Obesidade, da genética ao ambiente. Rev. Millenium (2008).
  6. Carvalho, S. G. Obesidade infantil, a epidemia do século XXI - revisão da literatura sobre estratégias de prevenção. (2009).
  7. World Health Organization. The challenge of obesity in the WHO European Region and the strategies for response. (2007). at <http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0010/74746/E90711.pdf>
  8. Mello, E. D. De, Luft, V. C. & Meyer, F. Obesidade infantil : como podemos ser eficazes? J. Pediatr. (Rio. J). 173–182 (2004).
  9. Aparício, G., Cunha, M., Duarte, J. & Pereira, A. Olhar dos pais sobre o estado nutricional das crianças pré-escolares. Millenium 99–113 (2011).