Índios do Brasil

Toda a terra era deles.

Todos os rios, todas as árvores, todos os bichos lhes pertenciam. Não porque eram donos, mas porque tudo era de todos: um comunismo germinal, tanto que era radical.

Além de comunista, a vida era coletiva, assim como coletivas eram as caças, as pescas, as plantas e as colheitas. Só pertencia a cada um aquilo que era de uso pessoal, mas também isso não como propriedade absoluta, mas tão somente como uso.

Entre os índios do Brasil, não havia pobreza, embora não se possa dizer que eram ricos. Viviam integrados com a natureza, embora não se possa dizer que a preservassem como pretendem os ecologistas. Eles a respeitava ou temiam, mas sabiam pela experiencia cotidiana que ela lhes proporcionava tudo de que necessitavam. Ela era, portanto, venerada como a uma divindade. E como tinham tudo em comum sua riqueza era poder usufruir de todas as coisas sem que nada faltasse a alguém e sem que nada sobrasse de alguns, em prejuízo de outros. Pode até parecer um sonho, mas havia entre eles um modelo de sociedade que pode nos causar inveja.

Vivemos, hoje, numa sociedade com costumes linguísticos e culinários que, em muitos aspectos, originam-se dos índios do Brasil. Mas, infelizmente, os valores de igualdade social não herdamos deles. Nossa perversidade veio da Europa, junto com o anseio pelo lucro.

Nossa sociedade desenvolveu-se baseada no capital e no lucro. São modelos europeus que, em sua essência, são oposto do que viviam os índios do Brasil. Por isso é que nossa sociedade não aprendeu a ser solidária, apesar do substrato cristão. Nossa sociedade é excludente, mesmo se confessando cristã. Valores de integração humana e com a natureza não aprendemos com os índios do Brasil. Pelo contrário, tiramos deles até isso; a dominação europeia impôs a eles valores e coisas estranhas à sua cultura.

Desse ponto de vista cultural, vale a pena lembrar um poema de Oswald de Andrade: Erro de Português. Nesse poema o modernista brasileiro que diz:

Quando o português chegou

Debaixo duma bruta chuva

Vestiu o índio.

Que pena!

Fosse uma manhã de sol

O índio tinha despido

O português.”

Podemos supor que se não tivesse ocorrido esse erro do português, talvez ainda hoje poderíamos viver como os índios do Brasil.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO