“Indecência de sutura”: uma vergonha em nossa classe

CALDAS, P. N.

¹ Hospital Veterinário Niterói  – RJ. E-mail: [email protected] .           

Na clínica cirúrgica de pequenos animais, podemos afirmar que 60% dos procedimentos cirúrgicos realizados correspondem às laparotomias. Seja para cirurgias vesicais, esplenectomias digestivas, pan-histerectomias e outras. Entretanto, é assustador o índice de deiscência de sutura nessas abordagens. As causas são as mais diversas, desde processos infecciosos, bem como fios cirúrgicos inadequados e uso incorreto da técnica de ráfia desobedecendo aos planos anatômicos. Penso que este último tem um significado muito maior no rol de todas as causas. Existe até um comércio de roupas e cintas pós-cirúrgicas para animais submetidos a cirurgias abdominais. Sentimo-nos incomodados quando profissionais da área humana criticam o grande número de deiscências cirúrgicas. Temos que admitir também que na última década o ensino da técnica cirúrgica ficou aquém das necessidades de aprendizado dos alunos, face à legislação de proteção ao bem estar animal. Precisamos ir em busca de alternativas que melhorem o ensino nas universidades.  

O objetivo deste trabalho é alertar nossos colegas de que as deiscências de suturas podem ser evitadas. Com mais de dez mil cirurgias de abdômen realizadas, contabilizo um índice zero de deiscência de suturas. Qual segredo? Nenhum. Apenas utilizo a técnica de sutura em planos anatômicos, com poliglactina. A espessura do fio será de acordo com o porte do animal, entretanto não será um fio muito grosso que garantirá uma boa sutura e evitará a deiscência. Claro que os outros procedimentos, tais como uma boa anestesia, pré-assepsia e assepsia precisam estar presentes no conjunto das técnicas. O hábito dos nossos colegas de fecharem a parede abdominal englobando peritônio, reto abdominal e fáscias dos músculos oblíquo interno e externo é o maior equívoco. O aporte vascular no foco da sutura fica prejudicado, assim como a microcirculação do reto abdominal é diminuída ocorrendo ao invés de cicatriz, necrose no foco da sutura, sem contar que na maioria dos casos o peritônio escorrega pela parede interna e não é englobado no conjunto da sutura. Em minhas abordagens abdominais, obedeço rigorosamente aos planos anatômicos tendo a preocupação de só fechar o peritônio com sutura contínua festonada, dando preferência a um fio fino entre 4.0 e 0.0 variando de acordo com o porte do animal. Em seguida procedo à sutura contínua de padrão Lembert das fáscias dos músculos oblíquo interno e externo, deixando livre o reto abdominal, continuando com aproximações do celular subcutâneo, tendo o cuidado de fixá-los levemente à parede a fim de evitar espaço morto. Após a máxima aproximação finalizo com sutura intradérmica, a fim de evitar o retorno do paciente para retirada dos pontos.   

Em minha clínica recebo constantemente animais eventrados e eviscerados parcial e/ou total.  Observo que na maioria dos casos o equívoco constituiu-se na ráfia.

Tenho certeza de que se melhorarmos o ensino em técnicas cirúrgicas, aperfeiçoarmos os procedimentos cirúrgicos em todos os seus aspectos, adestrarmos nossos cirurgiões veterinários em educação continuada e difundirmos as boas práticas e técnicas que oferecem bons resultados, conseguiremos reverter essa triste tragédia da medicina veterinária de pequenos animais.     

Dr. Pedro Nunes Cladas                                                           [email protected]

Médico veterinário                                                                    youtube: pedrovet100

Diretor do Hospital Veterinário Niterói                                         site: pedovet.com.br